28 janeiro 2007

A missão da Igreja Cristã

A Igreja necessita resgatar o discipulado como uma prática normal em contraste com a filosofia pluralista. Tanto um conceito, como uma prática correta de discipulado evidenciará a saúde espiritual da Igreja. O pastor Dietrich Bonhoeffer notou que "em tudo que segue, queremos falar em nome de todos aqueles que estão perturbados e para os quais a palavra da graça se tornou assustadoramente vazia. Por amor a verdade, essa palavra tem que ser pronunciada em nome daqueles de entre nós que reconhecem que, devido à graça barata, perderam o discipulado de Cristo, e, com o discipulado de Cristo, a compreensão da graça preciosa. Simplesmente por não querermos negar que já não estamos no verdadeiro discipulado de Cristo, que somos, é certo, membros de uma igreja ortodoxamente crente na doutrina da graça pura, mas não membros de uma graça do discipulado, há que se fazer a tentativa de compreender de novo a graça e o discipulado em sua verdadeira relação mútua. Já não ousamos mais fugir ao problema. Cada vez se torna mais evidente que o problema da Igreja se cifra nisso: como viver hoje uma vida cristã."[1]

Este é o modelo Bíblico onde é possível desenvolver o caráter de Cristo na vida dos envolvidos. Conhecer a Deus por meio de Jesus, e glorifica-lo num relacionamento construtivo como Igreja. Nesse relacionamento construtivo o alvo é preparar discípulos para um envolvimento nos ministérios e departamentos da igreja, proporcionando um fortalecimento qualitativo, que resultará naturalmente na multiplicação de outros discípulos. John Sittema nos lembra que discipular é “reproduzir a si mesmo e sua fé na vida de outros.”[2] Evidentemente não podemos confundir, porque o Senhor Jesus exige que façamos discípulos dele e não nossos. Novamente podemos citar Sittema observando que “esse processo requer o desenvolvimento de um relacionamento de confiança, de exemplo, de revelação do nosso coração e da nossa fé ao discípulo que, por sua vez deve imitar o padrão de fé do seu mestre.”[3]

A Igreja não é testemunha de si mesma. Os salvos são chamados para proclamar a soberana graça do redentor. A Palavra de Deus como meio de graça para alcançar e transformar o pecador é o intrumento do Espírito Santo. A Igreja não prega um misticismo irracional, nem mesmo supostas novas revelações, mas ela instrui a Escritura Sagrada que “é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça” (2 Tm 3:16). O conteúdo registrado na Escritura Sagrada não é o resultado da experiência evolutiva dos povos antigos, mas a auto-revelação do Deus de Israel. W. Gary Crampton observa que "a concepção ortodoxa da inspiração também declara que a revelação bíblica é proposicional em natureza; ela ensina uma verdade proposicional. Proposições são lógicas, com importantes combinações de palavras que declaram alguma coisa. Elas possuem o significado das sentenças declaradas. A verdade da Escritura não está 'em meio', 'acima', ou 'além' das palavras, ou somente na mente do intérprete. Nem estão as palavras secretamente simbolizadas, insinuando alguma verdade mais "elevada" ou "profunda". Pelo contrário, a verdade de Deus repousa no significado lógico e organização que as palavras possuem. Nem numerologistas, nem poetas, nem aqueles que vêem códigos acrósticos na Escritura que compreende a Escritura. A verdade de Deus vem via o nosso entendimento das proposições da Escrituras conforme as regras ordinárias da gramática e da lógica (que estão presentes na Escritura). Por isso, a Bíblia não contém paradoxos lógicos."[4]

A doutrina de que a Escritura é inerrante não surgiu com o movimento Fundamentalista no início do século XX. Este tão antigo ensino pode ser encontrado, com clareza, durante o escolasticismo protestante no século XVII, por exemplo, o teólogo luterano alemão Johann A. Quenstedt (1617-1688) declarou que "a Sagrada Escritura canônica no texto original é infalível verdade e livre de todo erro; em outras palavras, na sacra Escritura canônica não existe mentira, nem falsidade, nem erro mínimo qualquer, seja no assunto ou de expressão, mas em todas as coisas e em todos os detalhes que são manuseados nela, ela é a mais segura verdade, tanto no que pertence a doutrinas, ou moral, à história ou cronologia, a topografia ou nomenclatura. Nem a ignorância, nem negligência, nem esquecimento, nem lapso de memória puderam e ousaram atribuir aos amanuenses do Espírito Santo em seu registro dos Escritos Sagrados."[5] Sustentando a mesma opinião acerca da inerrância das Escrituras, o teólogo reformado suíço Francis Turrentin (1623-1678) afirmou que “os escritores sacros foram movidos e inspirados pelo Espírito Santo, envolvendo tanto os pensamentos, como a linguagem, e que eles foram preservados livres de todo erro, fazendo com que os seus escritos sejam inteiramente autênticos e divinos.”[6]

A salvação pressupõe que a humanidade perdeu a sua identidade original, tornando-se deturpada e alienada moral e espiritualmente. O ser humano não é moralmente neutro, mas inclinado a tomar decisões que refletem a sua natureza. As pessoas, no estado natural em que se encontram são movidas intuitivamente, acima de tudo, pela cobiça e pelo egoísmo. Toda a humanidade está num estado espiritual decaído, diferente daquele em que foi originalmente criada. A ética cristã reconhece que as pessoas são incapazes por si mesmas de aceitar a perfeita vontade de Deus, expressa na Escritura Sagrada, e muito menos de obedecê-la.

A explicação que a Escritura oferece da Queda é a única que esclarece o real relacionamento que o ser humano tem com Deus. O apologista Francis A. Schaeffer argumenta que existiu "um período anterior à queda, e então, o homem desviou-se do seu ponto de integração apropriado, por sua escolha; e, assim procedendo, houve uma descontinuidade moral – o homem tornou-se anormal. Remova estes fatos e a resposta cristã às questões da moral se vai. Freqüentemente encontro evangélicos levando a primeira parte do Gênesis na brincadeira. Mas o fato é que, se desprezarmos a Queda verdadeira, espaço-temporal e histórica, as respostas deixarão de existir. Não se trata apenas de uma extinção do Cristianismo histórico e bíblico, como se coloca na corrente da história, mas toda e qualquer resposta que possamos ter para o homem e o seu dilema moral, também estará extinta."[7]

A salvação dos eleitos de Deus ocorre num processo temporal: presente, passado e futuro. R.C. Sproul observa que "a Bíblia refere-se ao fato de termos sido salvos antes da criação do mundo (Ef 1:4). Nesse trecho o tempo passado foi empregado em relação à salvação no sentido mais extremo. [...] Há um sentido no qual somos ou estamos salvos. No momento em que depositamos nossa confiança em Cristo, e somente em Cristo, Deus nos declara justificados. [...] Seremos salvos, visto que aguardamos nossa salvação com Cristo e a consumação definitiva da nossa salvação."[8]

A sociedade pós-moderna experimenta a deterioração dos valores que a preserva. A falta de sentido e propósito também produz a desesperança. Esta sociedade busca a redenção na tecnologia, cultura, e no sexo, todavia, estes meios são ineficazes de transformá-la. Todavia, somente com os valores do reino de Deus, num discipulado integral, em que os cristãos se envolvem produtivamente em todas as áreas da vida, é possível participar dum processo de transformação cultural, político, econômico e científico reconhecendo Cristo como o Senhor em todas as esferas da existência humana. A sociedade pós-moderna inclina-se a não reconhecer a verdade como absoluta, ridicularizando a concepção e a ação de Deus no mundo; entretanto, os cristãos são responsáveis de construir uma sociedade influenciada pelo Evangelho de Cristo que ofereça o bem-estar a todos.

Notas:
[1] Dietrich Bonhoeffer, Discipulado (São Leopoldo, Ed. Sinodal, 1995), p. 18.
[2] John Sittema, Coração de Pastor (São Paulo, Ed. Cultura Cristã, 2004), p. 173.
[3] John Sittema, Coração de Pastor, p. 173.
[4] W. Gary Crampton, By Scrypture Alone (Unicoi, The Trinity Foundation, 2002), p. 78
[5] Citado em Gordon H. Clark, The Pastoral Epistles (Unicoi, The Trinity Foundation, 1998), p. 131.
[6] citado por W.G.T. Shedd, Dogmatic Theology (Nashville, Thomas Nelson Publishers, 1980), vol. 1, p. 72
[7] Francis A. Schaeffer, O Deus que se revela (São Paulo, Editora Cultura Cristã, 2002), p. 74.
[8] R.C. Sproul, Salvo de quê? (São Paulo, Editora Vida, 2006), p. 23.

26 janeiro 2007

As funções dos presbíteros

As funções atribuídas aos presbíteros aqui descritas não são exaustivas. Elas mencionam o que o presbítero deve ser e fazer, mas ele não pode se limitar a elas. Todos os presbíteros devem exercer o seu ofício em conformidade com a diversidade dos dons de cada um, e discernindo segundo a necessidade da Igreja. A vitalidade da igreja muito depende da operosidade dos presbíteros.

Uma palavra grega usada para se referir ao ofício de presbítero é episcopos. Sabemos que “o uso no N.T., em referência aos líderes, parece ser menos técnica do que uma tradução como ‘bispo’ sugeriria; daí, superintendente, ou supervisor At 20:28; Fp 1:1; 1 Tm 3:2; Tt 1:7.”[1] O presbítero tem a responsabilidade de supervisionar a igreja que o escolheu para ser o seu líder. Louis Berkhof afirma que “claramente se vê que estes oficiais detinham a superintendência do rebanho que fora entregue aos seus cuidados. Eles tinham que abastecê-lo, governá-lo e protegê-lo, como sendo a própria família de Deus.”[2]

A responsabilidade dos presbíteros de supervisão não se limita aos membros da igreja. Os presbíteros devem supervisionar o seu pastor. R.B. Kuiper observa que "um dos seus mais solenes deveres é vigiar a vida e o trabalho do pastor. Se o pastor não leva uma vida exemplar os presbíteros regentes da igreja devem chamar-lhe a atenção, e corrigi-lo. Se não é tão diligente em sua obra pastoral como deveria sê-lo, devem estimulá-lo para que tenha maior zelo. Se a falta de paixão que deve caracterizar a pregação da Palavra de Deus, os presbíteros regentes devem dar os passos necessários para ajudá-lo a superar tal defeito. E, se a pregação do pastor, em qualquer assunto de maior ou menor importância, não está de acordo com a Escritura, os presbíteros não devem descansar até que o mal tenha sido resolvido." [3] Entretanto, os presbíteros devem oferecer liberdade e recursos para que o seu pastor desenvolva-se e possa oferecer mais ao rebanho.

A autoridade do presbítero
A autoridade dos governadores é puramente ministerial e declarativa. Cada função do Conselho, como o ensino, a admoestação, governo e o exercício da disciplina, devem fundamentar-se na Palavra de Deus. Os presbíteros não possuem autoridade inerente. Não possuem o direito de impor as suas opiniões pessoais, preferências, filosofias sobre o culto, a doutrina, ou o governo da igreja, antes, devem examinar e extrair das Escrituras os padrões e princípios estabelecidos por Deus.

A autoridade do presbítero procede de:
1. A autoridade de Cristo como cabeça da Igreja.
2. Submissão à Cristo como o Senhor da Igreja.
3. A obediência e fidelidade à Escritura Sagrada como única regra de fé e prática.
4. Uma vida de santidade pessoal e familiar.
5. O exercício responsável da sua vocação e dos seus dons segundo o seu chamado.

As funções pastorais
1. Visitar os membros menos assíduos às reuniões da igreja;
2. Resolver os desentendimentos entre os membros;
3. Instar os disciplinados ao sincero arrependimento;
4. Orar por/com todas as famílias da igreja;
5. Consolar os aflitos e necessitados;
6. Supervisionar o bom andamento das atividades da igreja;
7. Exortar aos pais que tragam os seus filhos ao batismo;
8. Ser um pacificador em assuntos controversos;
9. Lembrar aos membros da sua fidelidade com os dízimos e ofertas;
10. Dar assistência e/ou liderar as congregações (quando houver);
11. Auxiliar na distribuição da Ceia do Senhor.

As funções doutrinárias
Os presbíteros em nosso sistema de governo têm a responsabilidade de guardarem a doutrina da corrupção. (1 Tm 3:16; Tt 2:7-8). Entretanto, para isto é necessário:
1. Conhecer o sistema e doutrinas presbiterianas;
2. Zelar pela fidelidade e pureza doutrinária da igreja;
3. Avaliar a qualificação doutrinária do pastor;
4. Examinar os candidatos ao rol de membros da igreja;
5. Discernir os novos “movimentos” que os membros estejam se envolvendo;

As funções administrativas (indivíduo)
1. Representar as necessidades dos membros nas reuniões do Conselho;
2. Zelar para que as decisões do Conselho sejam cumpridas pela igreja;
3. Lembrar os membros dos seus deveres e privilégios;
4. Acompanhar o funcionamento das sociedades e ministérios da igreja;
5. Elaborar propostas e projetos para a edificação da igreja.

As funções administrativas (concílio)
1. Reunir periodicamente para decidir sobre o bem estar da igreja;
2. Divulgar na igreja local as decisões dos concílios superiores (presbitérios, sínodo, SC);
3. Avaliar candidatos ao batismo e profissão de fé;
4. Participar na aplicação da disciplina bíblica para que atinja a sua finalidade;
5. Analisar se a Junta Diaconal está realizando as suas atribuições;
6. Acompanhar o bom andamento das sociedades internas e ministérios da igreja;
7. Avaliar para o envio ao presbitério os candidatos ao sagrado ministério pastoral;
8. Participar da ordenação e instalação de novos pastores e presbíteros;
9. Representar a igreja local nos concílios superiores.

Notas:
[1] F. Wilbur Gingrich & F.W. Danker, Léxico do N.T. Grego/Português (São Paulo, Ed. Vida Nova, 1993), p. 83.
[2] Louis Berkhof, Teologia Sistemática (Campinas, LPC, 1990), p. 590.
[3] R.B. Kuiper, El Cuerpo Glorioso de Cristo (Michigan, T.E.L.L., 1985), p. 132.

Rev. Ewerton B. Tokashiki

24 janeiro 2007

A justiça de Deus

Uma definição simples da justiça divina é que ele é o atributo que reflete a integridade moral de Deus. A justiça de Deus não inocenta os culpados, por mais escondidos que eles estejam, nem culpabiliza os inocentes, por mais caluniados que eles sejam. Deus é onisciente e conhece a dimensão exata da nossa culpa, e também sabe quando alguém está transferindo sobre outrem uma falsa culpa. Assim, quando Adão lançou a sua acusação contra Deus e sua esposa, pelo seu pecado, o Senhor puniu todos segundo a iniqüidade de cada um. Não há injustiçados nem omissões no tribunal divino.

A justiça de Deus tem motivo certo e medida certa. Embora a santidade ofendida seja de grau infinito, exigindo uma punição eterna, ela não será aplicada nos escolhidos de Deus, pois, esta punição foi imputada no amado Filho, sobre a cruz. Mas, por causa do Seu redentor propósito eterno, Ele decidiu condicionar o Seu perdão ao nosso arrependimento (At 3:19). Ele nos pune para manifestar a Sua glória, sem excessos, corrigindo e educando-nos para vivermos a Sua santidade, à imagem de Cristo.

A justiça de Deus não é negociada, não é comprada, nem é subornada. A Sua justiça muitas vezes, ao nosso parecer, é lenta: porque ela não está a serviço de poder econômico algum, de poder político algum, de religioso algum. Deus é independente de qualquer necessidade e absoluto em Suas decisões. Nada pode intimidá-lo na aplicação da Sua justiça. Ninguém pode manipular os resultados dos Seus juízos, nem torcer aos padrões da Sua retidão.

Deus retribui a cada um segunda a sua medida. A justiça de Deus separa o falso do verdadeiro, o joio do trigo, o fingido do autêntico, o condenado do perdoado, o incrédulo do crente, o perdido do salvo. A justiça de Deus coloca de um lado as boas obras meritórias e do outro, as boas obras produzidas pelo coração purificado e agradecido. Deus é inerrante em Suas sentenças, bem como é exato em suas recompensas.

A justiça de Deus traz à tona os pecados não confessados nem abandonados, e joga no lixo os pecados arrependidos. A justiça de Deus é terrível para aqueles que amam mais a impiedade do que a Sua santidade. Ela se manifesta agora de forma esporádica e há de se revelar no futuro próximo de forma conclusiva. É o que chamamos de juízo final! A Escritura declara em tom absoluto e solene: Deus é justo juíz, Deus que sente indignação todos os dias (Sl 7:11).

Rev. Ewerton B. Tokashiki

13 janeiro 2007

Todos devem ser teólogos

Meu querido leigo, leigos precisam ser teólogos. Não, eles não necessitam ser teólogos profissionais. Eles não precisam estudar grego e hebraico. Nem carecem necessariamente serem capazes de instruir outras pessoas. Mas, eles devem ser teólogos. Isto é, devem conhecer a Deus. Precisam fundamentar o seu conhecimento a respeito de Deus. Não podem se excusar de terem claros e corretos conceitos acerca da Deidade, desculpando-se de não serem ordenados para trabalharem na igreja em tempo integral, entretanto, eles foram chamados para algum outro serviço.

por Dr. John H. Gerstner

Extraído de http://www.the-highway.com/theology1_Gerstner.html [13/01/2006]

Traduzido por Rev. Ewerton B. Tokashiki

12 janeiro 2007

A santificação

Escrito por A. A. Hodge e revisado por B.B. Warfield

A santificação (do latim sanctificatio [derivado de sanctificare, santificar; sanctus, santo] tradução do grego agiazein, consagrar, fazer santo, derivado de àgios, santo) é a obra da graça de Deus pela qual aqueles que crêem em Cristo são libertos do pecado e fortalecidos, edificados em santidade. Na teologia protestante ela é distinta da justificação e da regeneração, as quais se encontram em sua raíz, e que não está separada, de fato, de nenhuma das duas; entretanto, o termo justificação está limitada ao ato ou sentença judicial por parte de Deus, pela qual o pecador recebe o favor de Deus, em consideração do que Cristo fez em seu favor, e dela a santificação é a execução eficiente; e o termo regeneração se limita ao ato eficiente inicial pelo qual se implanta a nova vida, da qual a santificação é o desenvolvimento progressivo. Tanto a regeneração como a justificação são atos momentâneos, e atos de Deus em que o pecador permanece passivo; a santificação, por outro lado, é uma obra progressiva de Deus, na qual o pecador coopera.

A natureza da santificação, como o seu método e a relação dos fatores divinos e humanos em sua seqüência, são concebidas de diferentes modos pelos vários tipos de teologias:

1. A visão Pelagiana e a Racionalista excluem totalmente a ação do Espírito Santo; e, faz com que a santificação seja nada mais do que a contínua ação correta, baseada nos poderes inatos do agente moral livre, pela qual gradualmente conquista as tendências da maldade e edifica um carácter santo.

2. A visão Medieval e Romana recusa fazer uma distinção entre justificação e santificação; e faz da justificação e a santificação, o processo da purificação do pecado, e a infusão dos hábitos da graça por parte do Espírito Santo, a causa de Cristo, por meio do instrumento do batismo, pelo qual se condicionam as mudanças subjetivas da remoção da culpa e a recepção do favor divino. 1) Portanto, sustenta-se que é progressiva, e que se fomenta por meio das boas obras, as quais possuem mérito real, que tanto merecem como asseguram o acréscimo da graça. 2) O mesmo ocorre por penitências, orações, jejuns, etc., que satisfazem a justiça de Deus e purificam a alma. 3) Se o crente morrer antes que se consuma o processo da libertação do pecado, ele deve completar no purgatório, cujas dores são expiatórias e purificadoras; e ali pode ser ajudado pelas orações, as missas e o poder dispensador da Igreja na terra. 4) Mas, é possível inclusive, que antes da morte, que um crente se conforme perfeitamente a todas as exigências da lei de Deus no que se ajusta a esta vida. 5) É inclusive possível, por causa do amor realizar um serviço superrogatório.6 Por obediência aos conselhos de Cristo, que têm caráter de conselho, mas que não são obrigatórios até que sejam assumidos voluntariamente. Estes são a pobreza voluntária, o celibato voluntário e a obediência às normas monásticas; e alcançarão mais do que a mera salvação pessoal, pois contribuem com o “tesouro de méritos” à disposição da Igreja, que é imputada naqueles que ostentam a jurisdição dos crentes na terra, ou no purgatório, dos que ainda não foram plenamente justificados.7

3. A visão Mística da santificação, ainda que nunca tenha sido expressa em nenhum credo eclesiástico, existiu como uma doutrina e como uma tendência em todos os períodos, e entre todas as denominações cristãs. O misticismo cristão deprecia a dependência da alma na revelação objetiva da palavra de Deus, e a necessidade dos meios de graça e o esforço humano, e enfatiza a intuição espiritual, o valor regulativo do sentimento religioso, a comunhão física da alma com a substância de Deus, condicionada pelo silêncio e a passividade da mente. Tais enfoques se difundiram grandemente na Igreja através dos escritos do Pseudo-Dionísio, que foram publicados em grego no século VI, e traduzidos para o latim por John Scotus Erigena, no século IX. Estes influenciaram no ensino de muitos eminentes eruditos evangélicos, tais como Bernardo de Clairvaux, Hugo y Ricardo de Saint Victor, e conseqüentemente Thomás de Kempis. Foram ensinados com grande influência entre os primeiros protestantes como Schwenckfeld (1490-1561), Paracelso (1493-1541), Weigel (1533-1588), e Jacobo Bohme (1575-1620); e entre os católicos romanos como São Francisco de Sales (1567-1622), Molinos (1640-1697), Madame Guyón (1648-1717), e o Arcebispo Fenelon (1651-1715). Os Quáquers originais sustentaram ênfases semelhantes, como se pode verificar nos escritos de George Fox (1691), William Penn (1718), e Robert Barclay (1648-1690). Uma visão mística está presente cada vez que a santificação se concebe, não como a meta do esforço, mas como um dom imediato que alma que espera receber.

4. A doutrina evangélica da santificação, comum nas Igrejas Luteranas e Reformadas, inclui os seguintes pontos: 1) A alma, após a regeneração, continua dependendo das constantes operações de graça do Espírito Santo, mas é, por meio da graça, capaz de cooperar com elas. 2) As operações santificadoras do Espírito são sobrenaturais, e não obstante, efetuados em conexão com, e através da instrumentalidade dos meios: sendo os meios da santificação, sejam internos, tais como a fé e a cooperação da vontade regenerada pela graça, ou externos, tais como a palabra de Deus, os sacramentos, a oração, a comunhão cristã e a disciplina providencial do nosso Pai celestial. 3) Neste processo o Espírito completa gradualmente a obra de purificação moral começada na regeneração. A obra tem duas operações: a) a limpeza da alma do pecado e a emancipação do seu poder, e b) o desenvolvimento do príncipio implantado da vida espiritual e os hábitos implantados pela graça, até que o indivíduo chegue a estatura do varão perfeito, em Cristo. O seu efeito é a transformação espiritual e moral do homem total, o intelecto, os afetos, a vontade, a alma e o corpo. 4) A obra continua com vários graus de rigorosidade durante a vida, mas nunca se alcançará a absoluta perfeição moral até que o sujeito seja glorificado.

Em oposição a esta doutrina é ensinado uma teoria da santificação perfeccionista nesta vida, a partir de vários pontos de vista distintos. Segue alguns casos:

1. Segundo os príncipios do Pelagianismo, é perfeito um homem que obedece as leis de Deus até a medida da sua habilidade natural presente, sendo que a lei moral é uma escalada, ajustando as suas exigências às várias habilidades do sujeito; e isto é possível para cada homem.

2. Conforme a idéia Mística a perfeção consiste na assimilação da essência divina, ou, numa forma menos extrema, na assimilação dos desejos e a vontade humana na vontade divina, num amor desinteressado; e, isto pode ser alcançado através de um persistente desprendimento do ego e a meditação em Deus.

3. Segundo a teoria Católica Romana, ou Ritualista, a perfeição consiste na perfeita conformidade da lei de Deus, ajustada – pela graça misericordiosa de Cristo – às capacidades do homem regenerado nesta vida; e esta perfeição se alcança por meio das obras meritórias e as penitências, as orações, os jejuns, os atos voluntários de auto-negação, e a obediência eclesiástica. Isto não somente se encontra ao alcance dos homens, mas está incluso no rendimento de um serviço superrogatório na forma de uma auto-negação extra legal a partir de um príncipio do amor evangélico.

4. A teoria wesleyana da perfeição concebe que a satisfação e o mérito de Cristo fazem que seja consistente com a justiça divina oferecer a salvação aos homens em termos mais fáceis que a antiga lei Adâmica da perfeição absoluta; e essa perfeição é alcançada quando se cumpre com estes termos: “o carácter cristão se valoriza pelas condições do evangelho; a perfeição cristã implica no desempenho perfeito destas condições, e nada mais.”8

Notas:
1 Concílio de Trento, sessão 6, canônes 7.
2 Concílio de Trento, sessão 6, canônes 32.
3 Concílio de Trento, sessão 14, cap. viii; sessão 6, canônes 29 e 30.
4 Bellarmin, O Purgatório., ii. 9.
5 Concilio de Trento, sessão 6, cap. xvi, canônes 25.
6 Superrogação: ação executada acerca, ou além das exigências da obligação.
7 Bellarmino, De Monachiis, cap. vi e vii.
8 João Wesley, A Perfeção Cristã (São Paulo, Imprensa Metodista, 1990).

Traduzido por Rev. Ewerton B. Tokashiki

06 janeiro 2007

Amado Timóteo: uma resenha

A Editora Fiel acertadamente lançou um livro com o título Amado Timóteo. Esta obra é uma série de cartas fictícias com conselhos práticos forjados pelos anos de experiência baseados em princípios bíblicos do exercício do ministério pastoral. São recomendações especificamente na área familiar, pregação, ensino, aconselhamento e liderança.

As sugestões são endereçadas ao Amado Timóteo. Embora seja útil a todos os pastores, ele é dedicado a um [fictício] jovem pastor batista chamado Timóteo, de 26 anos, recém formado, com apenas seis meses de experiência pastoral na Primeira Igreja Batista, casado com Mary, têm um filho e está grávida. Ele contactou vários ministros e lhes pediu conselhos para um ministério pastoral bem sucedido. A partir deste contato, os pastores retribuem com os seus conselhos demonstrando certa intimidade com o jovem Timóteo, de modo semelhante com o velho apóstolo Paulo.

Os autores que contribuiram são ministros de renome por sua formação acadêmica e larga experiência pastoral, a maioria é batista e alguns presbiterianos. Todos os articulistas na época que escreveram estavam pastoreando alguma igreja local, e são ministros dedicados à formação acadêmica dos pastores. São homens que equilibram a erudição e o pastoreio provando que não há necessidade de dicotomizar a piedade e uma boa formação acadêmica para serem bons pastores.

O organizador Thomas K. Ascol tem divulgado o Calvinismo entre os batistas. Mesmo dentro da Convenção Batista do Sul dos EUA que tem a tradição de ser calvinista, este sistema doutrinário tem enfraquecido e perdido a sua influência nos Seminários e púlpitos daquela denominação. Por isso, os founders têm escrito e divulgado o Calvinismo na tentativa de provocar um retorno às raízes[ www.founders.org ]. Este livro é outro projeto nesta direção. Entretanto a obra tem uma proposta maior do que simplesmente apontar uma identidade denominacional. A pretensão de indicar referências mais bíblicas do que os modelos pastorais que têm se estabelecidos no contexto do pós-modernismo norte americano. O surgimento de pastores que são showmen, executivos, estrategistas pragmáticos, etc.. Padrões estranhos que tendem a levar fogo estranho ao altar do Senhor.

No final de cada capítulo, o autor oferece uma lista de leituras que poderão complementar o assunto discutido. Algumas sugestões são repetitivas, creio que outros autores merecem ser citados além dos que são exclusivamente calvinistas. Entretanto, entendo a preocupação de indicar obras de um perfil muito restrito, para se evitar que os jovens ministros bebam em fontes duvidosas. Mas, por ser uma obra de publicação recente [Founders Press, 2003] os autores poderiam indicar obras mais atualizadas.

Embora os autores sejam norte americanos e vivam em outro contexto social e econômico, pode-se perceber que os problemas eclesiásticos e as preocupações pastorais são as mesmas. Não podemos esquecer que a verdade é absoluta e desdobra-se em princípios universais que podem reger os mais diferentes contextos do rebanho de Cristo.

Creio que todos os seminaristas que estão se formando, licenciados para a ordenação, recém ordenados, e mesmo pastores experientes deveriam ler este livro. Quer seja para repensar, ou uma sugestão de ministério, esta obra será muito útil para [re]examinarmos o nosso chamado e o nosso exercício pastoral. Este livro não se propõe a lançar um perfil pastoral, mas apontar um modelo fundamentado em princípios bíblicos que nos alerta dos perigos e doenças que cercam e ameaçam o pastor e o rebanho de Cristo. Boa leitura.

Rev. Ewerton B. Tokashiki

28 dezembro 2006

Breve histórico da Igreja Presbiteriana dos EUA

Os puritanos de convicção presbiteriana imigraram para os Estados Unidos da América, quando esta ainda era uma colônia da Inglaterra. Durante a colonização do novo mundo, os presbiterianos chegaram da Europa, e se estabeleceram no hemisfério Norte dos EUA, participando da formação das primeiras treze colônias. Estas treze colônias buscaram a sua independência da Inglaterra, dando origem a Revolução Americana. A história registra que pelo menos catorze presbiterianos assinaram a “Declaração de Independência”, sendo o mais conhecido deles o Rev. John Witherspoon.

O primeiro presbitério se formou na Philadelphia, em 1705. Mas, em 1837, a Igreja Presbiteriana dividiu-se internamente entre dois grupos que ficaram conhecidos como a “Nova Escola” e a “Velha Escola”. O desentendimento era causado pelas questões sobre a cooperação na formação teológica dos ministros e possibilidade de unificação entre a Igreja Presbiteriana e a Igreja Congregacional, pois a Velha Escola era teologicamente mais conservadora, e rejeitou a cooperação por questões de desvios doutrinários da parte de alguns pastores congregacionais.

Em 1861, por causa da Guerra civil, a Igreja Presbiteriana se dividiu em linhas nacionais, ou seja, os presbiterianos do Norte e do Sul separaram-se em duas denominações. Os presbiterianos do Sul se uniram em 1861, e formaram a Presbiterian Church of USA (PCUS), e os do norte se uniram em 1869, e formaram a Presbiterian Church of USA (PCUSA). Esta divisão consolidou-se com a Guerra Civil americana que durou quatro anos, de 1861 a 1865. Este cisma ocorreu devido aos problemas com a interpretação da Escritura acerca da escravatura. Entretanto, os presbiterianos do Sul afirmam que eles não dividiram do norte motivados pela questão da escravatura, mas, por causa da imposição de lei nacional sobre a igreja do Sul. Foi neste período que o Rev. Ashbel G. Simonton foi enviado como missionário para o Brasil pela Junta de New York, da Igreja do Norte, embora posteriormente, a Junta de Nashville, da Igreja do Sul também enviou os seus missionários.

Os presbiterianos do norte e do sul reunificaram-se somente em 1983, cento e vinte e dois anos após o cisma. Naquela época, a Igreja do norte era conhecida como a United Presbyterian Church, porque em 1958 a Presbiterian Church of the United States havia se unido com a United Presbyterian Church, e a nova denominação adotou o nome de United Presbyterian Church. Esta divisão durou mais de meio século, e que terminou em Junho de 1883, quando se reuniram as duas Igrejas conhecidas até esse momento como a United Presbyterian Church of USA (PCUSA que era do norte) e a Presbyterian Church in the U.S. (PCUS do sul). A união das duas denominações forjou a United Presbyterian Church of USA (UPCUSA).

Em 1924, cerca de 1300 ministros presbiterianos assinaram a liberal Declaração de Auburn, que nega a inerrância da Bíblia, e declara que a crença em doutrinas essenciais, como a expiação substitutiva de Cristo e a sua ressurreição corpórea não deveriam ser “testes para a ordenação, ou para a boa norma da nossa igreja.” A United Presbyterian Church in the United States of America (UPCUSA) é um ramo do norte do Presbiterianismo dos EUA. Ela foi formada pela união da Presbyterian Church in the United States of America (PCUSA - o principal ramo da Igreja Presbiteriana do norte) com a United Presbyterian Church of North America (uma pequena igreja de tradição escocesa sucessora dos Pactuantes) em 1958. A UPCUSA mantém a Confissão de Fé e os Catecismos de Westminster, mas acrescentou outras confissões e guias doutrinários (opondo-se aos “restritos” padrões) em seu Book of Confessions, como também criou a Confession of 1967 como uma contemporânea declaração de fé.

O Princeton Theological Seminary em New Jersey, representou por muitas décadas a ortodoxia presbiteriana dentro da UPCUSA. Mas, em 1929, a sua Junta [Conselho Diretor] foi reorganizada com uma decisão de colocar professores liberais para lecionar na faculdade. Quatro professores deixaram o Princeton Theological Seminary e fundaram o Westminster Theological Seminary na Philadelphia como uma instituição independente para dar continuidade ao ensino do Cristianismo bíblico.[1]

O grande opositor ao liberalismo dentro da UPCUSA naqueles dias foi J. Gresham Machen. Era um ministro presbiteriano e professor no Princeton Theological Seminary, e posteriormente no Westminster Theological Seminary. Quando J. Gresham Machen denunciou que o liberalismo teológico havia contaminado a junta de missões da UPCUSA, a Assembléia Geral nada fez acerca do assunto. Por causa disto, em 1933, ele e outros reivindicando a genuína pregação do evangelho estabeleceram The Independent Board for Presbyterian Foreign Missions. Em 1934, a Assembléia condenou a sua ação, e foi deposto do seu ofício. Em resposta, 34 ministros, 17 presbíteros regentes, e 79 leigos reuniram-se na Philadelphia, em 11 de Junho de 1936, para constituir a Presbyterian Church of America, que posteriormente, em 1939, o nome da nova igreja foi mudado para Orthodox Presbyterian Church (OPC). Quando foi organizada, a OPC perdeu para a PCUSA todo o seu patrimônio, especialmente os templos.

A Orthodox Presbyterian Church que começou no norte dos EUA, mas implantou novas igrejas na região Sul. Outro grupo enfraqueceu a OPC, quando dividiram formando a dividiu da Reformed Presbyterian Church, Evangelical Synod. Este grupo separou-se da OPC sob a liderança de Rev. Carl McIntyre, por causa de discussões que envolveram questões da liberdade cristã, adotavam o Dispensacionalismo, mantendo um maior vínculo com o movimento Fundamentalista. O grupo que se separou da OPC em 1937, ficou conhecido como Bible Presbyterian Church, e mais tarde mudou o seu nome para Evangelical Presbiterian Church, e então, tornou-se a Reformed Presbyterian Church, Evangelical Synod (RPC). Em 1982, a Reformed Presbyterian Church, Evangelical Synod, uniu-se com a Presbyterian Church in America. A Reformed Presbyterian Church, Evangelical Synod havia se formado em 1965 por uma união da Evangelical Presbyterian Church e da Reformed Presbyterian Church in North America, General Synod.

Surge outra denominação presbiteriana de orientação teológica Reformada. Em dezembro 1973, delegados, representando cerca de 260 congregações com aproximadamente 41.000 membros comungantes deixaram a Presbyterian Church in the United States (a PCUS da região do sul). Separaram da PCUS em oposição ao liberalismo teológico que negava a divindade de Jesus Cristo, a inerrância e a autoridade de Escritura. A PCA manteve a posição tradicional acerca de que as mulheres não devem receber o governo como oficiais da Igreja. Então, reunidos na Briarwood Presbyterian Church, no Alabama, organizaram a National Presbyterian Church, que se transformou mais tarde, em 1974, na Presbyterian Church in América (PCA). Embora esta denominação tenha iniciado no sul, atualmente tem novas congregações no Norte e no Oeste dos EUA.

A maior das denominações presbiterianas é a PCUSA, mas, está perdendo muitos dos seus membros por causa do seu pluralismo [e liberlismo] teológico. A segunda mais expressiva denominação presbiteriana é a PCA, que está crescendo, como também a OPC, embora ainda sejam pequenas denominações mantém-se como referências da ortodoxia reformada nos EUA.

Rev. Ewerton B. Tokashiki

23 dezembro 2006

Resgatando o significado do Natal

Para aqueles que desejam refletir acerca do significado bíblico do Natal, indico o artigo do Dr. Augustus Nicodemus com o título Não sou totalmente contra o Natal.

No meu blog pode-se ler um artigo mais conciso, com uma abordagem um pouco diferente, com o título Celebrando a nova Aliança no Natal.

Boa leitura, e feliz verdadeiro Natal, em Cristo Jesus

Rev. Ewerton B. Tokashiki

20 dezembro 2006

Carta do Diabão para a Igreja de Cristo

Saudações meus caros!

Quero primeiramente agradecer àqueles que têm facilitado o meu difícil trabalho. Sinceramente me orgulho em ter alguns amigos cooperando comigo, nesta tão querida igreja. Sou grato por estarem fazendo o meu trabalho. Consigo economizar tempo e esforço para planejar outras coisas. Quero agradecer e reforçar solicitando, especialmente, por estes assuntos abaixo:

1. Continuem formando as panelinhas, dividam as opiniões, causando desordem e confusão para que a liderança se estresse tentando resolver;

2. Economizem o seu dízimo e as ofertas. Quem realmente precisa de dinheiro são vocês, meus queridos;

3. Zombem dos professores da Escola Dominical, eles nada têm a ensinar, vocês são os verdadeiros "sabe-tudo";

4. Desprezem a liderança da igreja, critiquem e não contribuam;

5. Orar? Pra quê? Deus já sabe tudo! Afinal, Ele é muito ocupado, para cuidar da sua vida. Não percam tempo orando, façam vocês mesmos. Sejam mais autoconfiantes;

6. Dêem um descanso para as suas Bíblias. Ela está tão surrada, tão usada! Se vocês as amam, guardem-na com carinho. Evitem folheá-las, e quanto menos lê-las, melhor! Vocês poderão preservá-las por muitos anos guardada-as na gaveta. Afinal, vocês já sabem tanto, não há necessidade de se aprender mais. Como seu amigo, me preocupo com vocês, não quero que fiquem loucos de tanto ler a Bíblia;

7. Vocês são os donos da igreja! As melhores idéias são suas. A sua opinião sempre é a mais sábia! Vocês são os mais preparados. Vocês tê0m mais dinheiro. Isso mesmo, vocês são quem mandam;

8. Critiquem uns aos outros. Analisem bem os seus defeitos e notifiquem-se de que todos os membros saberão de todos os erros, pecados e escândalos que ocorrem com as famílias da igreja;

9. Quanto aos músicos não percam tempo ensinando a igreja a cantar. O que ela quer mesmo é vê-los exibindo um bem animado “show”, enquanto assiste admirada os arranjos que vocês conseguem fazer com os seus instrumentos e vozes;

10. Não percam tempo em visitar os enfermos. Sejam realistas, logo, logo, eles estarão bem e sadios, e nem vão te agradecer pela sua visitinha;

11. Não se esqueçam de difamar o pastor. Nem dêem ouvidos ao que ele diz. O pastor só fala de assuntos chatos, como santidade, família, evangelização, comunhão, missões, etc., tudo isso exige muito esforço. É muito importante, também, que vocês ensinem os seus filhos a desrespeitar e criticar o pastor;

12. Não se preocupem em vir aos cultos, vocês não fazem falta! Certamente, vocês possuem bons motivos para faltar nos cultos. Se chover, tem muito barro; se for sol, faz calor; se for frio cuidado com o seu reumatismo. E lembre-se o quanto é cansativo ficar sentado o culto todo! Vocês deveriam desfrutar mais da sua casa, e ir menos nas reuniões da igreja. Não podemos nos esquecer da querida TV, e dos elaborados programas que passam bem no horário dos cultos, que coincidência! Puxa tem tanto filme legal na locadora que seria um crime não assistir na noite de domingo.

Não se preocupem com os novos convertidos, em breve, com o seu exemplo eles estarão tão maduros quanto vocês, no mesmo desânimo e mornidão. O seu mau testemunho sempre é útil para escandalizá-los.

Novamente agradeço por facilitarem o meu difícil trabalho. Sinceramente não sei o que seria de mim se vocês não cooperassem comigo. Não se preocupem com mudanças, nem se esforcem por melhorias, apenas obedeça “a lei do menor esforço”. Continuem assim, e em breve estaremos juntos, tirando umas merecidas férias, por toda a eternidade.

Do seu mui amigo, o Diabão.

Rev. Ewerton B. Tokashiki
Artigo fictício
20/12/2006 revisado

12 dezembro 2006

Chuta que é macumba

Há muitos anos atrás me envolvi com o movimento Batalha Espiritual. Lembro quando o primeiro livro Este Mundo Tenebroso de Frank Peretti foi lançado, foi uma loucura! Implantou-se entre os evangélicos uma percepção da realidade totalmente demonizada! Deus deixou de ser o centro das atenções e a preocupação teve como prioridade "amarrar Satanás". Hoje, graças à Deus, coloquei as idéias no lugar, e estou estudando um pouco mais a Bíblia, e descobri que bem pouco de fidelidade à Escritura existe neste movimento. Num precisa dizer que abandonei este troço!?

O problema central do movimento Batalha Espiritual é que ele é demonologocêntrico (desculpem-me o neologismo), ou seja, tudo é causado pelo demônio! Bom já seria ruim se fosse só isso. Mas, toda cosmovisão tem implicações intensas. Olhando o mundo à partir das lentes do movimento Batalha Espiritual, se vê demônio em tudo. Tem capeta prá tudo que é gosto, lugar e função.

Mesmo enquanto adotava a mentalidade deste movimento, fiquei horrorizado quando, certa feita fui num culto, numa dessas igrejas que você num sabe o que está, nem o que vai acontecer! Pois é, de repente, o pastor [?] gritou: "manifeste-se! Eu sei que você está aqui!" E, olha que aquilo não foi a introdução do sermão, mas uma pausa para pararmos de focalizar a nossa adoração e pensamentos em Cristo, para bater um papo com o Tinhoso. Como nada aconteceu, nenhuma manifestação demoníaca, o tal pastor continuou e teve a coragem de dar a esfarrapa desculpa de que o "Espírito Santo havia lhe revelado que haviam pessoas naquele momento que estavam dando lugar ao diabo". Bom, esse negócio do Espírito Santo ficar falando toda hora, trazendo revelações fresquinhas que não estão na Escritura, é outro negócio muito complicado. Mas, dizer que crentes estavam dando lugar ao diabo, é no mínimo uma frase sem sentido.

Os caras que estão envolvidos no movimento crêem que para evangelizar é necessário antes fazer demarcação territorial para saber quais e quantos demônios mandam naquele pedaço. A maioria das suas orações têm uma boa porcentagem de conversa com o demônio. O culto de adoração inclui na liturgia um momento de exorcismo [no estilo "xô Satanás"]. Simplesmente, porque Deus deixou de ser o soberano Senhor e regente do universo, e os demônios entraram na S/A (sócios anônimos) de toda a propriedade que Deus criou. Não me perguntem como se explica isto, num encontrei este ensino em lugar nenhum da Bíblia!

Tem um pastor por aí que diz que foi expulsar o demônio de uma pessoa e ela vomitou uma cobra! Cada bizarrice que choca o mais crédulo dos evangélicos. Fico muito preocupado, porque em nosso meio se deixa de viver o antigo e puro evangelho de Cristo, e estamos presenciando a prática de uma verdadeira macumbaria evangélica! Se você acha que estou sendo exagerado, ligue a TV e veja alguns canais que apresentam "cultos evangélicos" onde tem pastor até vestindo roupa branca na sexta-feira, parecendo uns "pais-de-santo".

Chego a pensar que a síndrome de Adão não ficou lá no Jardim do Éden. Ainda hoje continuamos com a mania de querer transferir para o Diabo a causa da nossa desobediência [embora, não nego que Satanás tenha a sua significativa parcela de culpa], mas, vamos pôr menos culpa no infeliz do "Coisa ruim", e assumir a nossa responsabilidade diante de Deus, com as pessoas, vivendo o nosso chamado de obediência à Palavra de Deus. Soli Deo Gloria!

Rev Ewerton B Tokashiki

07 dezembro 2006

A origem do ofício de presbítero

A palavra “presbítero” é uma transliteração do grego presbyterós, que significa literalmente “ancião”. No sentido do Novo Testamento, quando se refere à liderança da Igreja Cristã, indica uma pessoa que possuí um ofício de autoridade, mas, em outros contextos do grego coinê,[1] pode-se referir simplesmente a um homem idoso. A palavra presbyterion encontrado em Lc 22:66; At 22:5 e 1 Tm 4:14 significa “concílio de anciãos”. Herman Ridderbos observa que o ofício de presbítero “certamente possuí antecedentes patriarcais e se originou no judaísmo, onde é a designação de uma classe social.”[2] Então, não era necessariamente a liderança realizada somente por homens idosos, mas idôneos. A palavra indica no Novo Testamento não a maturidade biológica, mas a espiritual, ou seja, não especificamente a sua idade, mas a transformação que o discípulo de Cristo alcançou sobressaindo aos demais, deixando de ser considerado neófito (1 Tm 3:6).

Desde o Antigo Testamento o sistema de governo é exercido através de anciãos (presbíteros). Tanto Moisés, como os sacerdotes e levitas, os juízes e os reis de Israel, eram auxiliados pelos “anciãos de Israel” (Êx 3:16-18; 4:39; 17:5-6; 18:13-17; 19:7; 24:1, 9-11; Lv 4:15; 9:1-2; Nm 11:14-25; Dt 5:23; 22:15-17; 27:1; Js 7:6; 8:33; Jz 21:16; 1 Rs 8:1-3; 1 Cr 21:16; Sl 107:32; Ez 8:1). Este era o exercício comum de governo do povo de Deus na antiga Aliança.

A prática do povo de Israel de ser governado pelos anciãos (presbíteros) continuou no Novo Testamento. O julgamento de Jesus foi realizado no amanhecer, quando “reuniu-se a assembléia dos anciãos do povo, tanto os principais sacerdotes como os escribas, e o conduziram ao Sinédrio...” (Lc 22:66; veja também At 22:5).

O sistema de governo pelos anciãos (presbíteros) foi mantido num processo natural de continuidade da antiga para a nova Aliança na Igreja Cristã. Paulo não inventou um novo sistema de governo para as igrejas que implantou, apenas o adaptou para uma perspectiva e necessidade cristã. A pluralidade de anciãos (presbíteros) em cada igreja local era o padrão estipulado para que aquela comunidade pudesse ser governada. Esta era a prática de Paulo (At 14:23), e foi assim que ele instruiu os pastores que lhe sucederam (2 Tm 2:2; Tt 1:5). Rudolf Bultmann conclui que "um conselho dos “presbíteros” é por excelência uma instituição na qual se unem a validade de autoridade ex officio; e justamente por meio dele a autoridade de lideranças pôde ser fortalecida. A formação de um colégio de presbíteros também não foi algo extraordinário, porque a comunidade cristã procedeu também neste ponto conforme o modelo das comunidades sinagogais judaicas; quanto à sua forma, a comunidade primitiva apresentava-se inicialmente como uma sinagoga dentro do judaísmo."[3]

Os presbíteros sucederam aos apóstolos como liderança da Igreja. Enquanto os apóstolos ainda eram vivos, os presbíteros simultaneamente exerciam o governo ao seu lado (At 11:30; 15:2; 20:17-35; Tg 5:14; 1 Pe 5:1-4). Quando o apostolado cessou, os presbíteros continuaram, e são estes que devem governar a Igreja, como substitutos dos apóstolos e representantes da autoridade de Cristo. Como já foi observado o apostolado foi um ofício transitório. Não há apóstolos hoje. Eles formavam um grupo único com as seguintes características:[4]
1. Eles foram pessoalmente escolhidos, chamados, instruídos e designados por Cristo, e não por qualquer outra instituição humana.
2. Eles foram testemunhas oculares do Jesus histórico (Mc 3:14; Jo 15:27; At 1:21,22; 1 Co 9:1; 15:8-9).
3. Foi-lhes prometido uma inspiração especial do Espírito Santo, que iria tanto lembra-los de tudo o que Jesus lhes ensinou, guiando-os à toda verdade (Jo 14:25-26; 16:12-15).

Os apóstolos participaram desta transição de autoridade. (1 Pe 5:1; 2 Jo vs.1; 3 Jo vs.1). Houve uma transferência de autoridade dos apóstolos para os presbíteros. Quando o ofício apostólico desapareceu permaneceram apenas os presbíteros que foram instituídos, ordenados e estabelecidos em todas as igrejas. Esta transição pode ser verificada através de documentos nos primeiros séculos da Igreja. Clemente de Roma, entre 95 a 98 d.C., afirma que os apóstolos "pregavam pelos campos e cidades, e aí produziam suas primícias, provando-as pelo Espírito, a fim de instituir com elas bispos e diáconos dos futuros fiéis. Isso não era algo novo: desde há muito tempo, a Escritura falava dos bispos e dos diáconos. Com efeito, em algum lugar está escrito: 'estabelecerei seus bispos na justiça e seus diáconos na fé.'"[5]

Em outro lugar ele ainda menciona os termos episcopado, geralmente traduzido por bispo ou supervisor, e presbíteros, como sendo intercambiáveis. Ele afirma que os "nossos apóstolos conheciam, da parte do Senhor Jesus Cristo, que haveria disputas por causa da função episcopal. Por esse motivo, prevendo exatamente o futuro, instituíram aqueles de quem falávamos antes, e ordenaram que, por ocasião da morte desses, outros homens provados lhes sucedessem no ministério. Os que foram estabelecidos por eles ou por outros homens eminentes, com a aprovação de toda a igreja, e que serviram irrepreensivelmente ao rebanho de Cristo, com humildade, calma e dignidade, e que durante muito tempo receberam o testemunho de todos, achamos que não é justo demiti-los de suas funções. Para nós, não seria culpa leve se exonerássemos do episcopado aqueles que apresentaram os dons de maneira irrepreensível e santa. Felizes os presbíteros que percorreram seu caminho e cuja vida terminou de modo fecundo e perfeito. Eles não precisam temer que alguém os afaste do lugar que lhes foi designado."[6]

O mais antigo manual de catecúmenos, conhecido como Didaquê, instrui que “escolham para vocês bispos e diáconos dignos do Senhor. Eles devem ser homens mansos, desprendidos do dinheiro, verazes e provados, porque eles também exercem para vocês o ministério de profetas e mestres.”[7] Novamente, usa-se o título bispo em lugar de presbíteros para se referir ao mesmo oficial. Não é ao sistema episcopal que os autores da Didaquê fazem menção, pois estes bispos eram eleitos pela igreja, e não por um colégio episcopal.


Notas:
[1] William D. Mounce, The Anayitical Lexicon to the Greeek New Testament (Zondervan Publishing House, 1992), p. 389.
[2] Herman Ridderbos, El Pensamiento del Apóstol Pablo (Grand Rapids, Libros Desafio, 2000), p. 592.
[3] Rudolf Bultmann, Teologia do Novo Testamento (São Paulo, Editora Teológica, 2004), p. 540-541.
[4] John R.W. Sott, O chamado para líderes cristãos (São Paulo, Ed. Cultura Cristã, 2005), p. 16.
[5] Clemente de Roma in: Padres Apostólicos (São Paulo, Ed. Paulus, 1995), vol. 1, p. 53. Clemente cita o livro de Is 60:17 na versão grega do AT conhecida como Septuaginta.
[6] Clemente de Roma in: Padres Apostólicos, vol. 1, p. 54-55.
[7] Didaquê in: Padres Apostólicos, vol. 1, p. 358.

Rev. Ewerton B. Tokashiki

05 dezembro 2006

Calvino e as novas revelações

Os fanáticos, pondo de lado a Santa Escritura, passam por cima da revelação e subvertem todos os princípios da piedade

APELO DOS FANÁTICOS AO ESPÍRITO EM PREJUÍZO DA ESCRITURA

Além disso aqueles que repudiam as Escrituras, imaginando que podem ter outro caminho que o leve a Deus, devem ser considerado não tanto como dominados pelo erro, mas como tomados por violenta forma de loucura. Recentemente, apareceram certos tipos de mau caráter que atribuindo a si mesmos, com grande presunção, o magistério do Espírito, faziam pouco caso de toda leitura da Bíblia, e riam-se da simplicidade dos que ainda seguem o que esses, de mau caráter, chamam de letra morta e que mata.

Eu gostaria de saber deles, porém, que Espírito é esse por cuja inspiração eles são levados a alturas sublimadas, a ponto de terem a ousadia de desprezar, como infantil e rasteiro, o ensino da Escritura. Se eles responderem que é o Espírito de Cristo quem os inspira, consideramos absurdamente ridículo esse tipo de certeza uma vez que eles, se concordam, como penso que o fazem, que os Apóstolos de Cristo e todos os fiéis, na Igreja Primitiva, foram iluminados por esse mesmo Espírito. O fato é que nenhum dos Apóstolos ou fiéis aprenderam desse Espírito a desprezar a Palavra de Deus. Ao contrário, cada um deles foi antes tomado de profunda reverência (para com a Escritura), como seus escritos o comprovam muito luminosamente. Na verdade, assim foi predito pela boca do Isaías, pois o Profeta não cerca o povo antigo com um ensino meramente externo, como se fosse para o povo como as primeiras letras, mas diz: "O meu Espírito que está sobre ti, e as minhas palavras que pus na tua boca, não se desviarão da tua boca nem da boca tua descendência..." (Is 59.21), considerando antes que a nova Igreja terá, sob o reino de Cristo, a verdadeira e plena felicidade, que consiste em ser regida pela voz de Deus, não menos que pelo seu Espírito. Concluímos daqui que esses fanáticos cometem abominável sacrilégio quando separam estes dois elementos que o Profeta uniu por meio de um vínculo inviolável.

A isto, acrescente-se que Paulo, não obstante ter sido arrebatado até o terceiro céu (II Co 12.2) - não deixou, entretanto, de aproveitar o ensino da Lei e dos Profetas, exortando também a Timóteo - mestre de projeção singular - a que se dedicasse à sua leitura (1 Tm 4.13). É também digno de ser lembrado aqui o que Paulo diz da Escritura: "Que ela é útil para ensinar, admoestar, redargüir, para que os servos de Deus se tornem perfeitos" (II Tm 3.16). Não será, portanto, diabólica loucura imaginar como transitório ou temporário o valor da Escritura, destinada a conduzir os filhos de Deus até a perfeição final?

Quero que esses fanáticos me respondam também o seguinte: Terão eles bebido de outro Espírito e não daquele que o Senhor prometeu aos seus discípulos? Ainda que estejam possuídos de loucura tão extrema, não os considero contudo, arrebatados de tão furiosa demência a ponto de terem a ousadia de gabar-se disso. Mas, ao prometer o Espírito, de que natureza declarou ele haver de ser esse Espírito? Na verdade, era um Espírito que não falaria por si mesmo, mas, ao contrario, sugeriria a mente deles e nela instilaria aquilo que ele mesmo, Jesus, havia transmitido por meio da Palavra (Jo 16.13). Portanto, não é função do Espírito que Cristo nos prometeu desvendar novas e indizíveis revelações, ou forjar novos tipos de doutrina, pelos quais sejamos desviados do ensino do Evangelho já recebido. Ao contrario, a função do Espírito é a de selar, na nossa mente, a mesma doutrina que o Evangelho nos recomenda.

A BÍBLIA É O ÁRBITRO DO ESPÍRITO

Se ansiamos obter algum uso e fruto da parte do Espírito de Deus, podemos entender facilmente como é imperioso para nós aplicar-nos, com grande diligência, tanto a ler quanto a ouvir a Escritura. É por isso que Pedro até louva (II Pe I.19) o zelo dos que estão atentos ao ensino profético, ensino que, todavia, depois de começar a brilhar a luz do Evangelho poderia parecer ter perdido a validade. Muito ao contrário, se algum espírito, desprezando a sabedoria da Palavra de Deus, nos impõe outra doutrina, devemos suspeitar com justa razão, de que seu ensino é vaidade e mentira (Gl. 1:6-9).

Sim, porque se Satanás se transforma em anjo de luz (II Co 11.14), que autoridade poderá ter o Espírito entre nós, se não soubermos discerni-lo por meio de sinal de absoluta certeza? E muito claramente a voz do Senhor no-lo tem apontado, mas esses infelizes (embusteiros) tudo fazem por extraviar-se, buscando a própria ruína, quando buscam o Espírito por si mesmos, ao invés de busca-lo por ele próprio.

Alegam eles que é ofensivo ao Espírito de Deus - a quem tudo deve estar sujeito -, ficar subordinado a Escritura. Como se fosse, na verdade, repulsivo ao Espírito Santo ser igual a si mesmo, por toda parte, ou permanecer de acordo consigo mesmo em todas as coisas, e em não variar em coisa alguma! De fato, se fôssemos obrigados a julgar de acordo com a norma humana, angélica ou estranha, então poder-se-ia considerar o Espírito como reduzido à subordinação, e até a servidão, se se preferir. Quando, porém comparamos o Espírito consigo mesmo, e em si mesmo o consideramos, quem poderá dizer que, com isso, o estejamos ofendendo?

Confesso que o Espírito, desse modo, é submetido a um exame através do qual Ele quis fosse estabelecida a sua majestade entre nós. Ele deve ficar plenamente manifestado a nós tão logo entre no nosso coração. No entanto, para que o Espírito de Satanás não nos persuada em nome do Espírito Santo, este quer ser reconhecido por nós na imagem que imprimiu de si mesmo nas Escrituras, pois sendo ele mesmo o autor da Escritura, não pode variar nem ser inconstante consigo mesmo. Portanto, do modo como nelas se manifestou, tem de permanecer para sempre. Isto não pode ser modificado, a menos que julguemos - como dignificante -, o Espírito abdicar e degenerar de si mesmo!

A BÍBLIA E O ESPÍRITO SANTO NÃO SE SEPARAM

Quando a acusação que fazem contra nós, de que nos apegamos demasiadamente à letra que mata, acabam eles incorrendo na pena de desprezarem a Escritura. Ora, salta aos olhos o fato de Paulo (II Co 3.6), estar contendendo com os falsos apóstolos os quais, insistindo na Lei separada de Cristo, estavam, na realidade, alienando o povo da Nova Aliança, na qual o Senhor prometeu que haveria de gravar a sua Lei nas entranhas dos fiéis, e imprimi-la no coração deles (Jr. 31:33), Portanto, a letra está morta e a Lei do Senhor mata a seus leitores, guando não apenas se divorcia da graça de Cristo, mas, também, não tocando o coração, atinge só os ouvidos. Se ela, porém, por meio do Espírito, se imprime de modo eficaz nos corações e manifesta a Cristo, ela é a Palavra da vida (Fl. 2:16), que converte as almas e da sabedoria aos símplices (Sl. 19:7).

Além disso, nessa mesma passagem (II Co 3.8), Paulo chama a sua pregação de ministério do Espírito, querendo dizer com isso, sem dúvida, que o Espírito Santo de tal modo se prende à sua verdade expressa na Escritura, nela manifestando e patenteando o seu poder, que nos leva a reconhecer na Palavra a devida reverência e dignidade. E isto não contradiz o que foi dito pouco atrás quando afirmamos que a Palavra não é absolutamente certa para nós, se não for confirmada pelo testemunho do Espírito, visto que o Senhor uniu entre si - como se fosse por mútua ligação -, a certeza de sua Palavra e a certeza do seu Espírito, de maneira que a firme religião da Palavra seja implantada em nossa alma, quando brilha o Espírito, fazendo-nos contemplar a face de Deus. Do mesmo modo, reciprocamente, abraçamos ao Espírito sem nenhum temor ou engano, quando o reconhecemos na sua imagem ou, seja, na Palavra! E, de fato, é assim!

Deus não deu a Palavra aos homens tendo em vista uma apresentação passageira, que fosse abolida assim que viesse o seu Espírito. Ao contrário enviou-nos o mesmo Espírito por meio de cujo poder nos deu a Palavra, com o fim de realizar a sua obra, confirmando eficazmente a mesma Palavra. Por isso, Cristo abriu o entendimento dos dois discípulos de Emaús (Lc 24.27, 45), não para que, pondo de lado as Escrituras, esses discípulos se fizessem sábios a si mesmos, mas para que fossem capazes de entender essas Escrituras. Igualmente Paulo, quando exorta os cristãos de Tessalônica (I Ts 5.19-20) a não extinguirem o Espírito, não os eleva as altura com vãs especulações fora da Palavra, mas acrescenta imediatamente que não se deveriam desprezar a profecias. Com isso, o Apóstolo diz, de maneira não duvidosa, que quando se desprezam as profecias, a luz do Espírito fica obscurecida.

Que dirão a respeito destas coisas esses fanáticos que consideram com validas apenas esta iluminação, desprezando e dizendo adeus a Divina Palavra, sem qualquer preocupação? Não menos confiantes e temerários são eles quando se agarram ambiciosamente a qualquer coisa que conceberam enquanto dormiam! Aos filhos de Deus, certamente, convém sobriedade bem diferente, pois eles, ao mesmo tempo que, sem o Espírito, se sentem privados de toda verdadeira luz, não ignoram, todavia, que a Palavra é o instrumento pelo qual o Senhor concede aos fiéis a iluminação do seu Espírito. Os fiéis não conhecem outro Espírito senão aquele mesmo Espírito que habitou nos Apóstolos e falou através deles, e desses oráculos os fiéis são continuamente convocados a ouvir a Palavra.

Extraído de João Calvino, As Institutas da Religião Cristã - Livro I, Capítulo 9

24 novembro 2006

Há veneno na panela

O Supremo Concílio da Igreja Presbiteriana do Brasil em sua última reunião, em Julho, decidiu sair da AMIR - Aliança Mundial das Igrejas Reformadas. Talvez, alguém que esteja descontextualizado se pergunte, porque a IPB, sendo uma denominação histórico e teologicamente "reformada" deixou a AMIR? A resposta é simples, porque embora as denominações que participem da AMIR descendam historicamente da Reforma calvinista, abandonaram a sua identidade doutrinária realmente reformada. Muitos deles poderiam ser classificados como adeptos da teologia feminista e da teologia da libertação, Bultmannianos, Tillichianos, e principalmente Barthianos, mas não calvinistas!

Após ler o artigo[1] da colunista Letícia Ferreira fornecendo uma descrição fiel aos fatos da “24ª Assembléia Geral da Aliança Mundial de Igrejas Reformadas” (AMIR) qualquer um ficaria estarrecido com o seu teor! Ciente de que a apostasia doutrinária, de vários grupos intitulados reformados, têm se tornado uma realidade cada vez maior, é preocupante que se torne também cada vez mais próxima de nós presbiterianos brasileiros.

Deveríamos continuar participando desse banquete pagão e celebrar a comunhão dos que ceiam a comida sacrificada aos ídolos? Nesse caldeirão onde se encontram as mais diversas tendências teológicas neo-ortodoxas, sendo apresentadas com naturalidade, exigindo tolerância ao pecado e, redefinindo o amor cristão como adoção dum pluralismo confessional e sexual, devemos gritar com eloqüência profética “há veneno na panela”!

As fotos da 24ª Assembléia Geral da AMIR podem ser usadas para descrever eventos totalmente diferentes daquilo que chamamos de cristãos. A foto do púlpito (pág. 14) assemelha-se a um altar de Umbanda. O arco-íris cobrindo os participantes do congresso parece mais um encontro da “Parada Gay” (pág. 15). O que seria a celebração da Santa Ceia é um ritual da Nova Era. Mas fazer da cruz um manequim de mãe-de-santo já é o cúmulo do absurdo!

Qual seria a explicação que devo dar àqueles que conhecendo o compromisso teológico da AMIR, me questionam acerca do propósito da participação da IPB nela? Membros da igreja que pastoreio ficaram horrorizados! Alunos de seminários ficaram confusos! Se somos uma denominação confessional calvinista, e creio, que seja num sentido estrito do termo. Se somos conservadores, crendo que a Escritura Sagrada é a Palavra de Deus, padrão absoluto de verdade, única regra de fé e prática. Se somos uma igreja que tem procurado encontrar-se fiel e pura, tanto em doutrina como na prática. Se somos chamados pela graça para pregar acerca do Deus Santo, que odeia o pecado e ama o pecador, chamando-o ao arrependimento e fé em Cristo Jesus e, que nos santifica pela obra do seu Espírito Santo. Então, abertamente, eu mesmo pergunto: o que estaríamos fazendo no meio da AMIR?

O que procuramos na AMIR? Perdemos alguma coisa essencial para reencontrar ali? Está nos faltando alguma coisa que somente eles podem dar? Somos tão ignorantes que apenas eles têm o melhor ensino para passar-nos? Para quem não entendeu ainda, faço uma declaração bastante sincera, saímos desse meio, porque tem veneno na panela.


Rev. Ewerton Barcelos Tokashiki

Nota:
[1] Jornal Brasil Presbiteriano, Outubro de 2004. Ano 46/ No. 601, pp. 14-15

21 novembro 2006

Congresso Fé Reformada




Olá amados

Desculpem-me não atualizar o blog durante todo esse tempo. Estive em Manaus participando do Congresso Fé Reformada. Este foi o 7o. congresso realizado em Manaus, por iniciativa da Igreja Presbiteriana de Cidade Nova. Tivemos dias de banquete espiritual, foi maravilhoso ouvir e compartilhar as exposições bíblicas e teológicas daqueles servos de Deus.

Os palestrantes foram:
1. Jaime Marcelino
A Comunhão do Espírito Santo

2. Iain Murray
O Espírito Santo na História da Igreja

3. Frederico Orr
O Preparo de Obreiros à Seara

4. Solano Portela
A Multiforme Atuação do Espírito Santo

5. Hermisten M.P. Costa
O Espírito Santo e a Palavra

6. Mauro Meister
O Espírito Santo no Antigo Testamento

7. Ronaldo Lidório
O Espírito Santo e as Missões

Acima estão as fotos de alguns dos preletores. Mas, deixo aqui o convite para que agendem para o ano de 2007, que se realizará em 31 de Outubro à 3 de Novembro, sendo o próximo tema "a família na Palavra" [informações do próprio Rev. Jaime, organizador do evento]. Espero que mais servos comprometidos com a Palavra e com a Igreja de Cristo sejam despertados para participar deste congresso tão edificante.

Abraços

Rev. Ewerton B. Tokashiki

14 novembro 2006

A plenitude e batismo com o Espírito

Os equívocos sempre foram inimigos de uma correta ortodoxia e, conseqüentemente, de uma correta ortopraxia. Se não se entender perfeitamente o que se ensina a conseqüência será uma vida marcada por uma prática deficiente e frustrante. Diante disso, este artigo identifica dois pressupostos a respeito do assunto, o carismático e o reformado, e se propõe a expô-los argumentando a favor do pressuposto reformado. Estaremos dando, assim, condições de melhor desfrutar da ação do Espírito Santo em nós. O que se tem visto nos arraiais da igreja evangélica brasileira é que, quando um indivíduo recebe o batismo com o Espírito Santo, ele é autenticado por uma espiritualidade emergente e “num passe de mágica” torna-se um super crente.

Muitas são as doutrinas formuladas em relação ao Batismo com o Espírito Santo. Afinal, em qual momento a pessoa é batizada com o Espírito? É claro que não se tem a intenção de se alongar nesse ponto, pois não é o objetivo primário do artigo, mas algumas coisas devem ser ditas, para que o ensaio seja embasado em uma posição firme e pautada na Bíblia. Iniciaremos a abordagem a respeito do Espírito Santo analisando alguns pressupostos carismáticos, já que estes diferem em pontos vitais sobre a questão, e é o que mais tem assolado as igrejas nesses últimos tempos. E, também, o que mais confunde “plenitude do Espírito” com “batismo com o Espírito”.

Pressupostos Carismáticos

O modelo de Atuação do Espírito Santo na vida do pecador, segundo esse pressuposto, diz que, primeiro, o Espírito Santo batiza o pecador arrependido no corpo, na regeneração e, segundo, Cristo batiza o crente com o Espírito Santo, posteriormente, com poder para servir, mediante busca pessoal. Para isso, usam como argumentação alguns textos das Escrituras, como vemos abaixo:
1.º - João 7.39; 16.7 - Jesus precisava ir/ser glorificado, antes do Espírito Santo ser enviado.
2.º - João 20.1-9 - Jesus ressuscita glorificado.
3.º - João 20.22 - Jesus envia o Espírito Santo sobre os discípulos já convertidos.
4.º - Atos 1.4,5,8 - Jesus manda esperar um batismo/revestimento de poder para testemunhar.
5.º - Atos 2.1-4 - Tal batismo se dá!

Diante desses argumentos carismáticos, faz-se necessária uma contra argumentação para um esclarecimento completo. Primeiramente, deve-se levar em conta que para haver batismo tem que estar presente: o batizador, o batizando, o elemento e o propósito. No modelo carismático, onde o Espírito Santo batiza o pecador arrependido no corpo, na regeneração, a pergunta é: qual o elemento do batismo aqui? Com o que o Espírito Santo batiza? Com o próprio Espírito Santo? Não há como o Espírito Santo ser o batizador e o elemento ao mesmo tempo. Esse modelo carismático trás o Espírito Santo como Batizador; como Batizando o pecador arrependido; como propósito a regeneração. Mas, e o elemento? Nesse modelo carismático fica faltando o elemento para que seja válido e, ainda, o objetivo é somente a regeneração, sendo necessário uma “segunda bênção” para que o propósito seja totalmente completo.

Passemos agora, ao problema dos textos usados pelos carismáticos como argumentação para se afirmar o batismo com o Espírito Santo como uma bênção posterior e distinta da conversão. Trabalharemos com o texto de João 20.22: “E, havendo dito isto, soprou sobre eles e disse-lhes: Recebei o Espírito Santo”.

Decifrando o texto de João 20.22:
Pedro decifra-o ao explicar o fenômeno em Atos 2.1-4. Regra número dois de Hermenêutica: “A Bíblia é seu Intérprete; a Escritura explica melhor a Escritura”.[1]
1.º - Refere-se a Atos 2.4 como sendo a sua experiência inicial com o Espírito Santo (Atos 11.15);
2.º - Identifica a experiência de Cornélio (Atos 11.15-17 – arrependimento/batismo com Espírito Santo) com a sua própria experiência em Pentecostes (Atos 2.4), ambas prometidas em Atos 1.5 (v. Joel 2.28-32);
3.º - Prega o recebimento do dom/promessa do Espírito Santo aos três mil - 3.000 – (Atos 2.38,39), a mesma promessa, derramada em Atos 2.4 (v.2.33) – Atos 2.16-21; 1.5, com base exclusivamente no arrependimento;
4.º - Afirma que somente após a total e completa exaltação de Cristo (cruz, ressurreição, exaltação) [2] é que Cristo derramou o Espírito Santo e não antes (i.e., João 20.22).[3]

Como conclusão inicial observaremos que é Atos 2.1-4 e não João 20.22 o cumprimento da promessa de João 1.33; 7.39; 14.16; 16.7; Atos 1.5; 2.16-21 na experiência atípica dos apóstolos (atípica porque creram em Cristo antes da inauguração da Era do Espírito Santo em Pentecostes) ou mesmo durante o Pentecostes (!?) – ver Atos 11.17.
- Mas... e João 20.22?

1.º - Deve-se atentar para as regras da hermenêutica bíblica, em especial à da ANALOGIA DA ESCRITURA que, considerando a Bíblia como um todo inerrante e auto-explicativo, propõe que uma doutrina, como a da segunda bênção, baseada em João 20.22, deva ser descartada porque:
a) O número de passagens que apóiam a doutrina é extremamente reduzido;
b) João 20.22 é tido pelos estudiosos como texto de difícil interpretação, e não se deve apoiar uma doutrina em cima de um único texto, ainda mais com este grau de dificuldade. Champlin[4] lista seis interpretações para esse texto, somada à interpretação carismática, tem-se sete interpretações para um único texto. Vejamos, brevemente, as seis interpretações de João 20.22:
1. Meramente um anúncio simbólico sobre a futura vinda do Espírito Santo;
2. O Senhor teria transmitido aos discípulos os dons da santificação e do apostolado, embora não ainda os dons plenos do Espírito Santo, que se daria no dia do Pentecostes;
3. Jesus teria soprado “um espírito santo” e não “o Espírito Santo”;
4. Houve ali uma doação preliminar do Espírito Santo, que era a promessa e a garantia de que seria concretizada aquela doação mais completa, quando o Senhor Jesus fosse glorificado;
5. Este texto do Evangelho de João equivale à narrativa sobre o dia do Pentecostes, no segundo capítulo do livro de Atos;
6. Aqueles discípulos receberam uma comissão e uma missão especial (ofício especial de apostolado – v.23).

2.º - Pode-se crer que em João 20.22 aconteceu algo semelhante ao modo de operação do Espírito Santo no Velho Testamento, isto é, o Espírito Santo “habitava com” mas não “estava em” os apóstolos (João 14.17). Qual a finalidade de João 20.22? Missão apostólica (v.23).

3.º - Ou que João 20.22 foi um ato simbólico de Cristo diante da solene hora que se aproximava do início da Nova Aliança, inaugurada pelo Espírito Santo em Atos 2.1-4.
- O simbolismo profético era tipicamente judaico (Ex. Ágabo – Atos 21.10,11);
- Gênesis 2.7 usa o mesmo verbo “soprar” quando da criação do homem (analogia).

Como conclusão final observaremos que a interpretação carismática para João 20.22, das sete possíveis, é a que mais contraria o restante do Novo Testamento, por não levar em conta todos os aspectos mencionados acima.

Pressupostos Reformados

A teologia reformada, ao abordar sobre o batismo com o Espírito Santo, relaciona-o ao ato da conversão. Ato único e restritivo aos que nasceram de novo , ou seja, aos que foram levados pelo Espírito a Cristo para a salvação.[5] Podemos definir este conceito de forma mais clara dizendo que a escritura ensina que a experiência normal do Espírito Santo coincide com a regeneração-conversão, e que são selados por este mesmo Espírito todos os que crêem genericamente em Cristo Jesus. E, qualquer pessoa que tenha sido regenerada pelo Espírito Santo, também foi batizada no Espírito Santo e tem o seu selo do Espírito.

É importante que se diga que o Espírito Santo não batiza, ele é o elemento do batismo interior. Quem batiza é o Senhor Jesus, pois nos diz o texto sagrado: "...e Ele vos batizará com o Espírito Santo, e com fogo" (Mt.3.11).[6] Diante disso, podemos começar dizendo que uma das finalidades do batismo com o Espírito Santo na vida do crente, seria a nossa inclusão na igreja ou corpo de Cristo, que é composta de todos os salvos.[7] Através do batismo somos introduzidos e unidos ao corpo místico de Cristo. Entendendo desta forma não podemos desvencilhar, ou seja, separar o batismo do ato da conversão.

O batismo com o Espírito Santo, segundo a teologia reformada, introduz no cristão selo, a marca de Deus, que o torna separado (Ef.1.13), como propriedade exclusiva de um Deus zeloso (1Pe.2.9). Somos separados do mundo para Deus, e comissionados para irmos ao mundo.
Desta forma ganhamos o direito de sermos chamados filhos de Deus, e o privilégio de sermos co-herdeiros com Cristo das promessas presentes e, também, futuras. Esse selo nos estimula a justificarmos a nossa eleição e vocação, ou seja chamado, através de uma vida de santidade e serviço, aos santos e a Deus (Ef 5.21). O batismo pode ser entendido como algo que transforma o nosso caráter e nos conduz a buscarmos uma vida de fé, pureza e santidade, ao mesmo tempo que nos capacita para a obra de Deus no mundo.

Como já começamos a dizer logo acima, o agente deste batismo é o Senhor Jesus. Os receptores são todos aqueles que crêem nele, e só nele confiam como Senhor e salvador. É desta forma que entende a teologia reformada, pois compreende que, em nenhum momento, as Sagradas Escrituras encorajam o buscar por esse batismo com o Espírito Santo após a conversão ou regeneração, já que é um ato único e restritivo ao momento da conversão.[8]

Na teologia reformada somos encorajados a buscarmos a evidência do Espírito Santo em nós através de um encher diário e constante do Espírito Santo.[9] No modelo reformado, o batismo com o Espírito Santo trás Jesus como Batizador; o pecador arrependido como batizando; o Espírito Santo como o elemento nesse batismo; e, como propósito, a regeneração e a capacitação (dons) do pecador, não sendo necessário, portanto, nenhuma segunda bênção.

Não há, na teologia reformada, algum tipo de ritual para a recepção do Espírito Santo, tal como a crisma na igreja católica ou a oração comunitária no pentecostalismo. Na visão reformada, a experiência do batismo é instantânea e inesperada. Não existe um local marcado para que tal aconteça, como querem os chamados movimentos pentecostais.
Não há nenhum sinal externo específico para aquele que foi batizado com o Espírito Santo. Quando se fala que não há nenhum sinal externo, é bom que fique claro que se refere a manifestações sobrenaturais como evidência de ter se recebido tal batismo. Agora, é claro que aquele que foi batizado pelo Espírito Santo no ato de sua conversão, começa a evidenciar mudanças profundas em seu caráter e modo de vida. O que se pode dizer com certeza, é que os sinais que atestam esta experiência são os mesmos da conversão. O fruto do Espírito, presente na vida do cristão, é que evidencia essa experiência ímpar.

O batismo e plenitude do Espírito Santo sempre foram conceitos confusos para alguns crentes. Muitos confundem tais conceitos, sendo, então, tidos como sinônimos, ou desconhecendo totalmente o que seja plenitude. Portanto, é imprescindível que se diga que o primeiro se refere a um ato único, como já foi dito, restritivo ao momento da conversão. O segundo é um processo constante que, por durar a vida inteira, deve ser estimulado e exercitado pelo crente.

Notas:
[1] Princ. Interp. Bíblia. W. Henrichsen, pp.14-16.
[2] A glorificação de Cristo, iniciada na cruz, inclui sua ressurreição, mas atinge o ápice glorioso quando da Sua designação como Soberano, a direita de Deus (...na ascensão!).
[3] Atos 2.32,33,36; 5.31; João 7.39; 17.5; 14.16; 16.7; Efésios 1.20-23. Ver também João 20.17 (após a ressurreição!!!)e imediatamente antes de João 20.22.
[4] CHAMPLIM, R. N. O Novo Testamento Interpretado – Versículo por Versículo. São Paulo: Candeia, 1995. p.640.
[5] CALVINO, Juan. Breve Instruccion. Baíses Bajos: Felire, 1990. pp.41,42
[6] Sobre isto ver a página 13 deste trabalho, onde desenvolveu-se um pouco sobre a questão de que o Espírito Santo não pode ser o batizador e o elemento ao mesmo tempo. Portanto, no ato do batismo/regeneração, Jesus é o batizador e o Espírito Santo o Elemento.
[7] CALVINO, Juan. Op. Cit., pp.50,51.
[8] Confissão de Fé de Westminster, Cap. XI, da Justificação
[9] Confissão de Fé de Westminster, Cap. XII, da Santificação.

Rev. Baltazar Lopes Fernandes