22 novembro 2015

Breve relato da vida e obra de Matthew Henry

Escrito por Allan M. Harman

Dificilmente há um homem tão conhecido entre os comentaristas bíblicos como Matthew Henry. Desde a publicação de seu primeiro volume (o Pentateuco) em 1706 até o presente, o comentário de Henry foi repetidamente reimpresso, traduzido a outros idiomas, combinado com o comentário de Thomas Scott para formar o comentário de Henry e Scott, ou impresso em formato resumido. Ele tem exercido uma grande influência na formação espiritual de uma multidão de leitores que dele utilizam para devocionais pessoais, ou para preparar-se para o ensino, ou pregação. Destacados líderes cristãos como George Whitefield e William Carey testemunharam da influência que receberam dele.

Para mencionar o caso de Whitefield, que pouco depois de sua conversão, adotou a prática de levantar às cinco da manhã. Ajoelhado ele lia a Bíblia, em seguida o seu Novo Testamento grego e finalmente consultava o comentário de Matthew Henry acerca daquela passagem. Posteriormente, a sua pregação esteve intensamente influenciada pela exposição de Henry. Arnold Dallimore chega ao ponto de dizer que “de tal modo bebeu dos mananciais da exposição bíblica de Matthew Henry que muita de sua expressão pública era pouco mais do que o pensamento do grande comentarista; pensamento que havia chegado a assimilar em sua própria mente e alma, e que se derramava espontaneamente tanto quanto preparava como quando pregava os seus sermões”. Era capaz de recordar citações de Henry, e sua lista de regras para o seu Instituto em Bethesda na Georgia incluía, entre os livros sobre teologia, o comentário de Matthew Henry. Quando escreveu a sua famosa carta a João Wesley sobre o tema da redenção universal, não deu a sua própria explicação de algumas passagens bíblicas, mas remeteu Wesley que lesse aos comentaristas como Ridgely, Edwards e Henry. O seu desejo era que estes tratados pudessem levar Wesley a reconhecer o seu erro.

Mas para a imensa maioria dos leitores a vida de Matthew Henry é algo desconhecido, e há uma falta de valorização crítica de sua obra e ministério. Ao apresentar alguns de seus sermões até agora inéditos, é necessário oferecer um breve relato de sua vida e ministério, junto com uma avaliação dele como pregador assim como comentarista.

Acesse o texto completo [CLIQUE AQUI]

08 outubro 2015

Por que as igrejas deveriam repensar o salário do pregador?

A relação entre o trabalho que um pregador realiza e o dinheiro que ele leva para casa parece ser muito clara para a maioria dos membros de igrejas: “nosso pregador ‘ministra’ à esta igreja – ele visita os doentes, ela aconselha, ele evangeliza, ele prega, ele ensina, ele faz o boletim e tudo o mais que pedirmos a ele – e nós o pagamos para que ele faça estas coisas.” Esta é a forma como a maioria dos cristãos pensam sobre seus pregadores e o “salário” que pagam para ele. Mas será que esta é de fato a forma como deveríamos pensar sobre isto? Pessoalmente, eu creio que não. Aqui estão algumas coisas para considerarmos…

1. Pare de pensar que o Pregador faz o que faz pelo pagamento.

A maioria dos membros de igrejas pensam que os seus pregadores fazem o que fazem porque eles o pagam para fazê-lo. Eu creio que esta é uma forma invertida de se pensar sobre a situação. É muito mais saudável pensar da seguinte forma: “O pregador comprometeu sua vida à proclamação do evangelho e nós o apoiamos financeiramente neste esforço.” Ele não faz o que faz porque vocês dão dinheiro a ele, vocês dão dinheiro a ele porque ele faz o que ele faz.

O Apóstolo Paulo abriu mão do seu direito de coletar apoio financeiro da maioria das igrejas nas quais ele trabalhou, mas ela afirmou que as igrejas deveriam apoiar aqueles que trabalhavam espalhando o evangelho (1 Coríntios 9). A igreja deve sustentar tantos quantos pregadores, professores, evangelistas e missionários ela for capaz. Quando homens querem devotar a vida deles à proclamação do evangelho, nós devemos considerar como nosso privilégio e alegria sustentar estes homens.

2. Pare de pensar que seu pregador faz o que ele faz em seu lugar.

Muitos membros de igrejas pensam em seus pregadores como os ministros (servos) da igreja. Eles consideram como tarefa do ministro fazer o aconselhamento, a visitação, o evangelismo e o ensino da igreja. E quer admitamos ou não muito deste pensamento vem do fato de que nós não queremos fazer este trabalho, pensamos que não temos tempo, então contratamos alguém que faça por nós.

Dizemos coisas do tipo: “Eu não sei como fazer e não tenho tempo para ir no hospital e visitar as pessoas que estão doentes, nem para fazer estudos bíblicos com incrédulos; é para isso que pagamos o pastor.” Mas não poderíamos estar mais errados por esta forma de pensarmos.

Não existe nenhum precedente bíblico para se contratar alguém para fazer a obra que nós deveríamos estar fazendo. De fato, uma das tarefas do pastor é “equipar” os membros da igreja para que eles façam a “obra do ministério” (Efésios 4.11-12). Você não sustenta um pastor para que você possa ser aliviado do trabalho, você sustenta um pastor, em parte, para que ele ajude a te equipar e motivar para a obra que você deve estar fazendo.

É óbvio que ele ajuda a equipar a igreja sendo um bom exemplo de serviço, mas se ele começar a fazer o trabalho por você, ele estará te mimando e não te equipando. Muitos pastores precisam parar de mimar a igreja e começar a equipar a igreja.

3. Pare de pensar que seu pregador pertence a você

Quando uma igreja pensa em seu pregador como empregado dela, ela entendeu errado a situação. O pastor não trabalha para a igreja. Ele não trabalha para os presbíteros. Ele trabalha para o Senhor. Paulo chama os pregadores de “servos do Senhor” (2 Timóteo 2.24), e é isto o que o pregador é, o servo do Senhor. Não o nosso servo.

É claro que o pregador e seu trabalho estão sob a supervisão dos presbíteros da igreja. Os presbíteros pastoreiam o pregador, ajudando-o a balancear o trabalho que ele realiza especificamente para a igreja local e o trabalho que ele realiza pelo Reino. Um pregador pode decidir junto com seus presbíteros que seu trabalho precisa focar primariamente – ou até mesmo exclusivamente – na obra local; enquanto outro pregador e seus presbíteros podem decidir focar as habilidades do pregador mais em espalhar o evangelho ao redor do mundo.

Mas é vergonhoso quando uma igreja acredita que o pregador pertence a eles e se ressentem pelo tempo que ele investe pregando e ensinando em outros lugares.

4. Deixe seu pregador ser um membro de sua igreja

Quando as igrejas pensam que seus pastores são empregados que pertencem a eles, elas com frequência falham ao não tratá-los como co-membros de igreja. Nossos pregadores precisam ser capazes de ter comunhão, aprender, confessar seus pecados e dificuldades, serem encorajados, aconselhados e ter todos os benefícios que desfrutamos como membros de uma família da fé. Mas muitas vezes nós negamos estas bençãos a eles porque os tratamos como nossos empregados.

Considere algumas destas questões:

O pregador está sempre ensinando na Escola Bíblica Dominical, ou vocês deixam que ele seja o aluno algumas vezes?
Você espera que seu pregador seja sempre quem estará ensinando, aconselhando e encorajando você, ou algumas vezes você oferece a ele os seus ouvidos?
O seu pregador se sente como um membro da sua igreja ou como um empregado da sua igreja?
Conclusão

O ponto central é este, temos que parar de pensar que o dinheiro que damos ao nosso pregador faz com que ele tenha uma dívida com a gente. Ao invés disto, devemos considerar nosso privilégio podermos sustentar homens que fiel e diligentemente proclamam a mensagem do evangelho em nossa igreja ou ao redor do mundo. Devemos encoraja-los de todas as formas que pudermos na obra que eles realizam.

Wes McAdams

Extraído do Blog REVIVE.

27 setembro 2015

Intoxicação teológica e dúvidas sinceras

Após o almoço olhando as postagens nas redes sociais, aparece a seguinte conversa:[1]

Jovem teólogo:[2]
Boa tarde. Irmão, é que eu estou passando por um momento intelectualmente complicado.
Pode me ajudar?

Eu:
Se possível, sim

Jovem teólogo:
Sou cristão há 5 anos, tenho 19. Creio nas doutrinas da Graça, o calvinismo. Só que nos últimos muitos meses, eu tenho visto tanta contradição entre doutrinas, nas próprias igrejas... Li matérias de que a Bíblia que temos em mãos é cópia de cópia de cópia, por isso seria adulterada. Vi trechos e textos que firmam que YaHVeH pode ser uma mistura de deuses pagãos. E tenho me sentido inclinado ao agnosticismo... Estou confuso e cansado, irmão.

Eu:
Peço que considere algumas ideias. Primeiro, creio que você precisa ler a Escritura e confiar no testemunho interno do Espírito Santo, que testifica ser a Bíblia a Palavra de Deus. Você está fraco na fé. O alimento da fé é a Escritura, nutra-se dela. Segundo, as teorias críticas foram produzidas por estudiosos ímpios e refletem a sua incrédula rebeldia. São ideias altamente venenosas. Mas existe excelente antídoto para neutralizar os seus efeitos nocivos. Terceiro, estude autores que comprometidos com a verdade, produzem textos bem pesquisados, seriamente escritos para promover vigor e fortalecer uma cosmovisão coerentemente cristã. Quarto, a dúvida é saudável quando me desafia a conhecer a verdade. Se a dúvida induz à incredulidade ou ao agnosticismo, então, ela apenas está revelando uma reação pecaminosa do seu coração. Aconselho, no amor de Cristo, que se arrependa! Duvide de si mesmo, questione a sua sabedoria, pergunte-se seriamente se os pensamentos que estão te afastando do verdadeiro Deus, se, de fato, são verdadeiros. E, por último, tenha um mentor teológico que te oriente em suas leituras. De certa forma, ler é alimentar-se. A questão é se você está se nutrindo, ou se intoxicando. Oro para que este momento ruim passe. Se precisar de algo mais pode consultar-me. No amor e temor de Cristo, o nosso Redentor.

Jovem teólogo:
Certo, vou reler isto que o senhor me disse e refletir... Desde já eu agradeço, de verdade, me deu uma resposta diferente da maioria.
Deus abençoe. Certo, eu agradeço de verdade por sua ajuda.
Obrigado por estar disponível.


NOTAS:
[1] O texto é o resultado de uma conversa que tive com um jovem que leu teologia liberal.
[2] A sua identidade será preservada. Pessoalmente não o conheço.

02 junho 2015

O calvinismo, a política e a Bíblia - H. Henry Meeter

Começaremos o nosso estudo dos princípios do calvinismo quanto à esfera política fazendo uma breve introdução histórica. Afirmam, às vezes, que o calvinismo pode ser bom como sistema teológico, mas que aparte de certas verdades gerais sobre a soberania de Deus em todas as esferas da vida e ao que se acrescente a obediência os cidadãos a seu governo, o calvinismo não tem um programa político a oferecer. Mantém-se que o calvinismo nunca chegou a desenvolver um sistema político próprio. E, em casos em que se chega a admitir tal possibilidade, então, afirma-se que este sistema consiste em teorias meramente abstratas que nunca foram provadas no plano político, de maneira que, não se pode saber se realmente são funcionais.

RESUMO HISTÓRICO DA POSIÇÃO CALVINISTA EM RELAÇÃO À POLÍTICA

Àqueles que sustentam tais opiniões, o estudo da história política do calvinismo lhe reservará grandes surpresas. Assim, não somente o calvinismo desenvolveu princípios políticos próprios, senão que diversas foram as teorias políticas que se estruturaram sobre estes princípios, e igualmente aplicadas em diferentes países da história moderna. Quem se der ao trabalho de examinar, por exemplo, o índice do livro de história das teorias políticas do Dr W.A. Dunning, professor de história e filosofia política na Universidade de Columbia, e que leva o título: Uma História das Teorias Políticas, não tardará em perceber tão importante lugar que estas teorias políticas ocupam e que, em parte ou na sua totalidade, deve a sua origem ao calvinismo. Uma das causas pelas quais hoje em dia não se sabe muito dos pontos de vista calvinista sobre a política, há que busca-la no fato de que ultimamente o mundo inglês mostra pouca simpatia pelas perspectivas políticas que se baseiam na soberania de Deus e nos princípios da Escritura. Consequentemente, se estas perspectivas ocupassem de novo um primeiro plano, pesa sobre os calvinistas a missão de fazê-las conhecidas.

Continue a leitura do texto completo [ AQUI ]


Extraído de H. Henry Meeter, La Iglesia y el Estado (Grand Rapids, TELL, 1963), pp. 93-101. Este livro originalmente foi publicado sob o título de THE BASIC IDEAS OF CALVINISM.

Traduzido por Rev. Ewerton B. Tokashiki
2 de Junho de 2015.

30 maio 2015

O calvinismo e a cultura - H. Henry Meeter

O dicionário define a palavra cultura como “o ato de cultivar, ou o resultado desta cultivação.” A continuação explica o que se entende por esta cultivação: implica educação, qualquer disciplina ou desenvolvimento que se traduza num melhoramento – seja nas plantas, nos animais ou nos seres humanos -. Dai que se pode falar da “cultura das plantas, das flores, das abelhas”, etc. Todavia, num sentido estrito o termo cultura se aplica à cultura humana, e em referência a “qualquer cultivo dentro da raça humana que resulte no melhoramento, esclarecimento e disciplina, e que se adquire pela educação moral e mental, pela civilização, por uma superação dos usos e costumes, etc.”

A palavra é de uma significação muito ampla. Nós a usarmos, na maioria dos casos, em sua significação restrita e referida somente aos seres humanos. Mas, ainda aqui a palavra é susceptível de diferentes significações. Para alguns a palavra não vem a significar mais do que um mero refinamento. Assim quando alguém começa a trabalhar num escritório, pelo contato com a sociedade que o rodeia, adquire certo grau de refinamento, aprende algumas expressões seletas, desenvolve modos agradáveis e se veste segundo a última moda. Esta pessoa será catalogada como culta.

LEIA O TEXTO COMPLETO [ AQUI ]


Extraído de H. Henry Meeter, La Iglesia y el Estado (Grand Rapids, TELL, 1963), pp. 75-91. Este livro originalmente foi publicado sob o título de THE BASIC IDEAS OF CALVINISM.

Traduzido por Rev. Ewerton B. Tokashiki
30 de Maio de 2015.

06 maio 2015

O Princípio Regulador de Culto é o Princípio Fundamental do Protestantismo

“Então, aqui temos o princípio [de culto] tingido com o sangue de nossos antepassados puritanos - tanto os pactuantes [escoceses] como os huguenotes [franceses] - o que não é ordenado, explícito ou implicitamente nas Escrituras, é proibido para a Igreja. Ela não pode ditar nova doutrina, bem como lhe é permitido fazer novas leis, ou ordenar que hajam novas formas de governo, e nem pode inventar novos modelos de culto. Esta é apenas uma declaração de um princípio fundamental do Protestantismo para distingui-lo do Racionalismo de um lado e, por outro do Catolicismo Romano - que as Escrituras, como a palavra de Cristo, são a regra completa e final da nossa fé e dever. Elas são completas, uma vez que elas fornecem tão perfeitamente uma provisão tanto para o espiritual, assim como a natureza para o desenvolvimento físico do homem, e, portanto, exclui todas as outras regras como desnecessárias e supérfluas. Elas são final porque, sendo a Palavra de Deus, elas devem pronunciar infalível e supremamente sobre todas as questões relativas à fé e prática religiosa. O dever da Igreja, consequentemente, é conformar-se estritamente à palavra divina, e sua culpa e perigo é de apartar-se dela, e isto parece ter evidente clareza. Mas, os princípios mais claros, através da cegueira, falibilidade e da perversidade da mente humana, frequentemente provam-se inoperantes na experiência real; e, a história da Igreja fornece lamentáveis provas de que a verdade reguladora da integridade e supremacia das Escrituras não constitui exceção a esta observação.”

—John L. Girardeau (1825-1898) “The Discretionary Power of the Church


Extraído de The Heidelblog acessado em 6 de Maio de 2015.

07 abril 2015

Por que não existem calvinistas pacifistas?

Thomas S. Kidd

Por que tão poucos cristãos reformados figuram entre os pacifistas? Uma leitura rápida dos ensinos de Jesus parece encorajar uma interpretação pacifista, ao menos no nível cristão mais individual. Tal como a conhecida declaração: “... não resistais ao perverso; mas, a qualquer que te ferir na face direita, volta-lhe também a outra” (Mt 5.39). Ainda assim, a tradição pacifista tem muito maior influência nos anabatistas, e entre católicos e protestantes liberais, do que sobre os cristãos reformados.

Se a palavra de Deus é a autoridade máxima de fé e prática, é desejável que perguntemos a razão dos protestantes reformados serem inclinados a não serem pacifistas. Mesmo que minhas respostas sobre um assunto tão vasto não vá além das tentativas, eu arrisco duas razões principais: uma admirável e, outra problemática.

Abordagem bíblica

A primeira razão é que os cristãos reformados tradicionalmente são cautelosos em realçar qualquer passagem da Escritura isoladamente, e são inclinados a ler (mesmo de forma imperfeita) a Bíblia como um todo. Cristãos pacifistas são, às vezes, como eles mesmos confessam, leitores do tipo “ênfase em vermelho”, versões bíblicas que dão destaque aos ensinos de Jesus no campo da ética. Por vezes, isso implica, até involuntariamente, que outras passagens da Escritura – como a história das guerras dos israelitas contra os cananeus – não tenham necessariamente a mesma autoridade que os demais ensinos de Jesus.

Ao mesmo tempo que os cristãos reformados jamais aconselhariam negligenciar os ensinos de Jesus, rejeitam que algumas passagens da Escritura possuem certa precedência sobre outras, ou, que tais passagens sejam contraditórias. Portanto, por mais que seja difícil explicar, cristãos reformados já partem da premissa de que o ensino de Cristo sobre não retaliação de alguma forma está conectado aos israelitas passando ao fio da espada homens, mulheres e crianças. Dado que admitimos a perfeita inspiração das Escrituras, bem como a suficiência delas como guia nos caminhos de Deus, tal correta premissa é que de fato deve alicerçar nossa interpretação.

Igualmente, cristãos reformados tendem a ver certa continuidade entre Antigo e Novo Testamento. Mesmo que Israel e a Igreja sejam entidades distintas, eles sustentam que há semelhanças na forma como Deus se relacionava com Israel e a forma como Ele se relaciona com a Igreja. Portanto, se Deus por vezes ordenava que Israel fizesse manobras militares e conquistasse territórios, não é disparate pensar que a Igreja também seja convocada por Deus a atos semelhantes sob cujo governo civil ela eventualmente esteja.

Passado sombrio

É onde repousa o fator mais problemático para a ausência de uma tradição pacifista entre os reformados. Cristãos reformados se mostraram em várias ocasiões muito à vontade com a violência sob chancela estatal. Desde a reforma, muitos protestantes têm visto governos, tronos e exércitos como detentores de um importante papel no avanço do Reino. Se alguém acredita na providência, então a agenda das nações de alguma forma cumpre o plano de Deus para a humanidade. Porém, os cristãos reformados poderiam tomar emprestado um pouco do pessimismo de outros cristãos, como os anabatistas (menonitas e outros), ou de teólogos como Stanley Hauerwas, profundamente cético quanto às ações estatais e suas intenções militares.

Para citar apenas um episódio do atrelamento ao estado, considere a Nova Inglaterra após a Revolução Gloriosa (1688-1689). A deposição do rei católico romano James II do trono britânico provocou décadas de luta imperial entre os católicos romanos europeus e as forças protestantes. As colônias da Nova Inglaterra foram arrastadas para este conflito, sendo diretamente afetadas, especialmente em lutas cruéis com os vizinhos ao norte do Canadá.

Os anglo-americanos nos primeiros sessenta anos do séc. 18 atribuíram uma enorme importância religiosa ao sucesso do exército britânico bem como à proteção do trono inglês, e tudo em nome da causa protestante. Para eles, significava o trono permanente da Casa de Hanover, do rei protestante George (incluindo, inicialmente, o rei George III. Benjamim Colman, o principal pastor em Boston quando do Grande Avivamento, declarou uma vez que para os da Nova Inglaterra “a adesão à dinastia protestante da Casa de Hanover é a nossa fidelidade a Cristo e à sua santa religião”. Endossar o rei “é” nossa fidelidade a Cristo? Se esse tipo de pronunciamento cívico-religioso não lhe faz remexer na cadeira, você não está pensando claramente sobre as nossas prioridades como cristãos.

Claro que muitos calvinistas reprovaram as conseqüências da guerra e da agressão imperial britânica, mas estes ficaram muitas vezes às margens do poder estatal. Os batistas perseguidos na América colonial tardia ou os índios convertidos durante o Grande Avivamento tinham uma visão bem atenuada da causa patriótica quando da Revolução Americana. Eles haviam sofrido nas mãos dos mesmos homens que agora solicitavam que empunhassem armas contra os britânicos. Os principais pastores batistas Isaac Backus e James Manning não demonstraram zelo marcial quando as primeiras batalhas da Revolução Americana ocorreram. Em lugar disso, lamentaram que o conflito contribuísse para sufocar um avivamento recém-iniciado na Nova Inglaterra: “Oh horrenda batalha” lamentaram. “Como é contrária ao espírito de Cristo.”

O renomado pastor batista calvinista, Charles Spurgeon, registrou preocupações semelhantes para com a exploração colonial britânica no século XIX. Mas apesar da sonoridade pacifista de suas citações, Spurgeon parece não ter abraçado completamente a causa anti-imperial. Reagindo a uma rebelião na Índia em 1857, Spurgeon fez alguns comentários que retirados de seu contexto, permitiriam rotulá-lo como um pacifista. “há muito tempo vejo a guerra como um crime gigantesco”, diz ele, “desde muito tempo considero todas as batalhas apenas como assassinato em larga escala”. Ainda assim ele cita Rm 13, observando que a autoridade não traz a espada em vão. “Desta vez”, ele disse, “eu, como homem pacífico, seguidor do Salvador Pacífico, recomendo a guerra”. Ele via, nos rebeldes, assassinos criminosos que deveriam receber a justa punição do Estado.

Ceticismo moderado e apoio consternado

Sou um cristão reformado evangélico, e não sou pacifista. Não vejo nenhuma exigência pacifista consistente na Escritura, especialmente para com governos e mandatários. Mas os cristãos reformados poderiam usar de mais ceticismo a respeito da prudência e valor de uma guerra, e das reivindicações da nação onde vivem.

Devemos orar pela sabedoria dos líderes, e apoiar com certo pesar guerras quando estas atendem os padrões de uma causa justa (devem ser limitadas, contra-ataque, defesa, etc.) Em lugar disso, os cristãos reformados e evangélicos americanos em geral, algumas vezes se comportam mais como zelosos guerrilheiros, por crer que sua nação está perfeitamente levando a adiante os propósitos do Reino de Deus.


O articulista Thomas S. Kidd é professor de História na Baylor Universiy e autor de vários livros, entre eles Patrick Henry: First Among Patriots (Basic, 2011) e George Whitefield: America’s Spiritual Founding Father (Yale, 2014).

Extraído de The Gospel Coalition e acessado em 06/04/2015.
Traduzido por Lucas Paulo de Freitas
Revisado por Ewerton B. Tokashiki

05 março 2015

As 7 coisas que você não pode fazer como um relativista moral

Greg Koukl

Então, você decidiu se converter num relativista moral? Que bom para você! O que poderia ser melhor do que fazer o que te pareça correto? O que poderia ser pior do que deixar que outro te diga o que deve ou não fazer? Além do mais, esta é uma das cosmovisões mais fáceis de adoptar: somente deixa os demais em paz, e lhes pede que façam o mesmo consigo, e você nunca terá que voltar a se preocupar se suas ações são boas ou más. De fato, só há sete coisas que não poderá fazer como um relativista moral. Simplesmente siga a estas regras e você será livre de absolutos para sempre!

Regra#1: Os relativistas não podem acusar os outros de fazerem o que é mal.
O relativismo torna impossível criticar o comportamento dos outros porque, em última instância, nega que exista o que se chama atuar mal. Em outras palavras, se você crê que a moral deve ser definida de forma individual, então, jamais poderá julgar as ações alheias. Os relativistas nem sequer podem objetar o racismo em termos morais. Afinal, em que sentido se pode ter a opinião «é algo mal a discriminação racial» se isto vem de alguém que não crê em categoria absoluta de bondade e maldade ética? Com que justificação poderia intervir? Certamente não com os direitos humanos, pois para ele tal coisa não existe. O relativismo é a máxima postura a favor da livre escolha moral, porque aceita todas as decisões pessoais — mesmo que seja a de ser um racista —.

Regra #2: Os relativistas não podem reclamar do problema do mal.
A realidade do mal no mundo é uma das principais objeções que levantam contra a existência de Deus. O argumento é que, se Deus fosse absolutamente poderoso e em última instância bom, então ele eliminaria o mal. Mas o mal existe, a realidade deve corresponder a um destes três cenários possíveis: (1) Deus é demasiadamente fraco para opor-se ao mal; (2) Deus é demasiadamente indiferente como para preocupar-se com o mal; ou (3) Deus simplesmente não existe. Evidentemente, promover qualquer um destes argumentos implica, também, crer no mal, coisa que um relativista não poderia fazer. De fato, nada pode ser qualificado como mal — nem mesmo o Holocausto — porque fazê-lo equivaleria afirmar que existe alguma espécie de regra moral.

Regra #3: Os relativistas não podem culpar, nem aceitar elogios.
Dentro do relativismo os conceitos de elogio e reprovação carecem completamente de sentido porque não há uma regra moral com que se possa julgar se algo deveria ser aplaudido ou condenado. Sem absolutos, nada é realmente mal, deplorável, trágico, ou digno de reprovação. Tampouco podemos dizer que algo seja realmente bom, honroso, nobre, ou digno de elogio. Tudo se perde numa dimensão desconhecida de um vácuo moral. Quase sempre os que dizem ser relativistas se contradizem neste ponto (evadindo a reprovação, mas aceitando de bom tom o elogio), assim, seja cuidadoso!

Regra #4: Os relativistas não podem afirmar que algo é injusto.
Sob o relativismo a justiça é um conceito que não tem sentido algum. Para começar a própria palavra não significa nada: esta sugere que as pessoas merecem um trato igualitário baseado num padrão externo de que está bem, e como o disse em várias oportunidades, os relativistas não podem crer em algo bom e mal. Em segundo lugar, não existe o que chamamos de culpa. A justiça implica castigar aos culpados, e a culpa supõe ter algo que reprovar — o qual, como demostrei, não existe no relativismo —.

Regra #5: Os relativistas não podem fazer progressos morais.
Com o relativismo é impossível progredir moralmente. Os relativistas podem modificar a sua ética pessoal, isso é seguro, mas nunca poderão se transformar em pessoas morais. Uma reforma moral supõe uma espécie de regra de conduta objetiva que sirva como um padrão que se aspira. Todavia, esta regra é exatamente o que os relativistas negam. Sem um caminho melhor não se pode progredir, e além do mais, tampouco há uma motivação para fazê-lo. O relativismo destrói o impulso moral que leva as pessoas a se superarem, pois não há nada «superior» para se alcançar. Para que mudar o seu ponto de vista moral, se o que você tem favorece o seu próprio interesse e, no momento, faz com você se sinta bem?

Regra #6: Os relativistas não podem sustentar discussões morais significativas.
O relativismo torna impossível falar de moral. Do que se poderia falar? Uma discussão ética implica comparar os méritos de dois pontos de vista diferentes para descobrir qual é melhor. Mas, se a moral é completamente relativa e todas as posturas são igualmente válidas, então nenhuma ideologia é melhor do que outra. Nenhuma postura moral pode ser julgada como adequada, deficiente, irracional, inaceitável, ou mesmo bárbara. De fato, se as discussões éticas só tem sentido quando a moral é objetiva, então só se pode ser um relativista consequente vivendo em silêncio. Nem sequer poderia dizer: «é algo mal impor a sua moral a outros».

Regra #7: Os relativistas não podem promover a obrigação de ser tolerantes.
Finalmente, no relativismo não há tolerância porque a obrigação moral de ser tolerante transgride as regras. O princípio da tolerância é frequentemente considerado como uma das virtudes chaves do relativismo. A moral é pessoal e, portanto, deveríamos tolerar os pontos de vista dos demais abstendo-nos de julgar a sua conduta, ou atitude. Todavia, deveria ser óbvio que este princípio caia numa contradição. Se as regras morais não existem, não pode haver uma regra que exija a tolerância como um princípio moral. E de fato, se não há absolutos morais, por que haveríamos de sequer ser tolerantes? Por que não impor a sua moral a outros se é o que você deseja e sua ética pessoal o permite? Somente tenha certeza de não falar quando não puder suportar.


Extraído de http://www.accesodirecto.org/index.php/recursos-cristianos/articulos/siete-cosas-que-no-puedes-hacer-como-un-relativista-moral-greg-koukl/#.VPhoHnzF966 acessado em 5 de Março de 2015.

Traduzido por Rev. Ewerton B. Tokashiki
Pastor da Primeira Igreja Presbiteriana de Porto Velho
Professor de Teologia Sistemática do SPBC-RO.

10 fevereiro 2015

A desobediência civil

Trata-se de uma forma de protesto político, caracterizado pelo ato de transgredir abertamente a lei por motivos de consciência. As campanhas de desobediência civil se organizam por diversas causas, por exemplo, para lutar contra a guerra, a segregação racial, diversos impostos e o aborto. Normalmente estas campanhas transgridem leis relevantes ou desafiam a determinadas instituições. Os métodos de protesto podem consistir em sentar em lugares públicos, marchas, ou protestos ilegais, boicotes a algum imposto ou ataque de manifestantes, por exemplo, a bases militares ou clínicas onde se prática abortos.

A desobediência civil aos poucos difere em geral de outros atos de índole semelhante, ou seja, a objeção de consciência que implica violência, e de outras formas legítimas de protesto. A objeção de consciência nem sempre é ilegal, dado que em certos países se faz provisão legal para este caso. Inclusive quando é ilegal, não se pode ter uma intenção diretamente política; seu interesse primário é a rejeição de envolver-se ativamente na prática do serviço militar. As campanhas violentas não têm gozado de apoio público, nem se submetem ao governo da lei como um todo global. Consequentemente, as campanhas violentas como as que levam a cabo certos ativistas que defendem os direitos dos animais e alguns grupos anti-aborto, se parecem mais com campanhas de insurgência, como as que lançam, em diversas medidas, os movimentos nacionalistas. Por outro lado, o protesto legal, como por exemplo, as manifestações e marchas pacíficas, que não transgridem a lei, formam ocasionalmente parte da vida política e, não suscitam nenhuma questão moral especial. A desobediência civil transgride abertamente a lei para chamar a atenção sobre a injustiça política, ou para mudar uma lei, ou uma política pública. Inclusive quando descumpre a lei, continua submissa ao governo da lei como um todo, e seus praticantes estão dispostos a sofrer a pena legal correspondente como castigo.

As teorias modernas sobre a desobediência civil podem afirmar a sua autoridade baseando-se na tradição cristã. Pedro e os apóstolos quando recusaram não deixar de ensinar no nome de Jesus, argumentaram que “é necessário obedecer a Deus antes que aos homens” (At 5:29). Muito depois, Tomás de Aquino arguiu que a justiça formava parte tão essencial da lei que uma lei injusta não era uma lei, da qual se deduza que não incite à obediência. Todavia, mais frequentemente a igreja ensina com grande cautela o dever dos cidadãos de obedecer a um regime político, inclusive quando é injusto. Ao fazê-lo segue uma clara tendência do pensamento do Novo Testamento (cf. Rm 13:1-7; 1 Pe 2:13-14). Mas há uma série de pontos em que o pensamento cristão alcançou o consenso geral sobre o dever de desobedecer ao Estado e as suas leis, que são as seguintes: 1) quando exige aos crentes que neguem a sua fé em Cristo, ou rejeitem explicitamente ao seu Senhor; 2) quando o Estado exige aos cristãos que participem em ações que são claramente contrárias a sua consciência conformada pelo Cristianismo.

No final dos anos 60 os filósofos políticos dedicaram muita atenção a esta questão e, hoje em dia continuam debatendo-a. Naquela época surgiram dois movimentos que deram relevância a este tema: o movimento dos direitos civis, dirigido por Martin Luther King, e dos protestos contra a guerra do Vietnam. Isto suscita pontos de grande interesse para a teoria política. A sua qualidade paradoxal tem um interesse evidente, mas, mais fundamentalmente, levanta perguntas básicas sobre a natureza da lei e a obediência civil. Naturalmente os diversos filósofos respondem a estas questões de distintas maneiras. Mas, é certo que todos estariam de acordo de que, ainda que a desobediência civil não possa descartar absolutamente em todas as ocasiões, deve estar plenamente justificada. Deve estar baseada numa série de critérios relativamente poderosos. Estes critérios constituiriam um bom ponto de partida para todo o paradigma cristão sobre o tema.

Os critérios que apresentaremos em seguida são deduzidos da natureza da desobediência civil como a expressamos antes: 1) Devem se esgotar, primeiro e completamente, todos os meios constitucionais e democráticos. É muito melhor convencer às pessoas com um argumento democrático. Alguns argumentam que na prática nunca se pode esgotar as possibilidades dos métodos democráticos genuínos e, concluir que praticamente todos os casos da desobediência civil prejudicam a energia e os recursos dos canais democráticos mais corretos [1]. 2) A desobediência civil deveria ser aberta e pública. Deveria submeter-se à prisão e ao castigo, e estar disposta à responsabilizar-se por seus atos ilegais. 3) Deveria optar por métodos não violentos; alguns diriam que deve insistir na não violência. 4) Os atos de desobediência civil devem manifestar um bom conhecimento da lei e em pleno respeito por ela. 5) As ações devem ser proporcionais a sua causa. 6) A desobediência deveria ter um objetivo específico e realista. Não deveria designar, nem abordar-se de modos que resultem politicamente contraproducentes. Sobretudo, continua sendo uma mera forma extrema de protesto e persuasão, e não um modo de aplicar a coerção.

NOTA:
[1] Este contra-argumento deve ser seriamente considerado recordando o fato histórico da Alemanha durante o período antecedente à Segunda Guerra. Os judeus e alemães de oposição nazista foram presos, enquanto que majoritariamente a Alemanha sofria um golpe através de falsas e perigosas promessas, e iludida pela mídia que divulgava a ideologia do Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães. Nota do tradutor.


D.J.E. Attwood, "Desobediencia civil" in: David Atkinson & David H. Field, orgs., Diccionario de Ética y Teología Pastoral (Barcelona, Editorial CLIE, 2004), p. 382.

Deontologia

A deontologia (do grego deon, aquilo que é obrigatório) é, em geral, o estudo da obrigação moral, e em concreto de um tipo específico de teoria da obrigação. Em contraste com as teorias consequencialistas da obrigação, as deontológicas sustentam que os atosnão são bons ou maus devido simplesmente a suas consequências boas ou más. Entretanto, os atos são, ou não, cumprimento do dever e o dever não é determinado plenamente em termos de suas consequências.

As teorias deontológicas diferem no que se refere a qual é o fundamento do dever: para alguns é a vontade de Deus; para outros a racionalidade como tal; para outros os deveres carecem de fundamento, sendo realizados arbitrariamente. As teorias também discrepam sobre até que ponto a obrigação é independente das consequências. Para Kant as consequências eram irrelevantes para a obrigação ("cumpre com o teu dever ainda que o mundo se acabe!"), enquanto que W.D. Ross (1877-1940) defendia que as consequências eram somente um fator entre muitos dos relevantes para a obrigação. As teorias deontológicas foram elaboradas pela congruência com as intuições morais das pessoas normais, incluindo aquela de que "o fim nem sempre justifica os meios". Elas são criticadas para dar a impressão de que a obrigação moral é arbitrária ou inexplicável, e por viciar os incentivos para agir de uma forma moral.


M.T. Nelson, "Deontología" in: David Atkinson & David H. Field, orgs., Diccionario de Ética y Teología Pastoral (Barcelona, Editorial CLIE, 2004), p. 426.

07 fevereiro 2015

A Convenção de Genebra

Esta expressão é usada para se referir a uma série de tratados internacionais que codificaram as regras de guerra. O Comitê Internacional da Cruz Vermelha realizou um papel fundamental nesta missão; este organismo foi fundado em 1863 graças a inspiradora liderança cristã de Jean Henri Dunant (1828-1910).

O primeiro tratado, que firmaram em 1864 dezesseis poderes europeus, centrava-se no cuidado dos soldados enfermos e feridos, a neutralidade do corpo médico, o trato humano dos prisioneiros e a identificação de um emblema distintivo, a Cruz Vermelha, às pessoas e lugares dedicados ao trabalho médico. Estes artigos se extenderam e emendaram numa série de reuniões celebradas em Haya em 1899 e 1977, e em Genebra 1906, 1926, 1949 e 1977. A mais importante destas reuniões foi realizada em 1949, como resposta aos horrores da Segunda Guerra Mundial , e nela se elaborou a mais relevante das Convenções de Genebra.

Os artigos abordaram os seguintes temas: 1) a provisão para o cuidado dos feridos e enfermos na luta em terra; 2) normas para o cuidado dos que resultaram feridos, ou naufragaram no mar; 3) leis que garantiriam o trato justo dos prisioneiros de guerra; e 4) regras que protegiriam os cidadãos dos territórios ocupados, proibindo práticas tais como a deportação, a tomada de bens, a tortura, as represálias coletivas, a destruição injustificada de suas propriedades e a discriminação baseada na raça, na religião ou na nacionalidade. Em 1977, outra conferência complementou esta normativa com dois protocolos adicionais que extendiam a proteção da lei internacional para as guerras de libertação e guerras civis. Mais de 150 países subscreveram estas convenções de 1949, mas muitos não concordaram com os protocolos de 1977.


R.G. Clouse, "Convención de Ginebra" in: David Atkinson & David H. Field, orgs., Diccionario de Ética y Teología Pastoral (Barcelona, Editorial CLIE, 2004), p. 382.

06 janeiro 2015

Blog de tradução de documentos da Reforma do século XVI

Há algum tempo percebia a necessidade de disponibilizar algumas cartas, tratados e documentos dos reformadores do século XVI. O meu público algo primariamente é estudantes de teologia, história e pesquisadores iniciantes que se interessem conhecer o contexto, aspectos pessoais e convicções destes homens. O meu anseio é que eles sejam lidos em seus escritos e não por intérpretes de suas personalidades e pensamentos.

As traduções seguem certa regularidade sem o dever de datas fixas para as postagens. Por enquanto com o auxílio de alguns amigos, temos traduzido estes textos, sendo que assumo a responsabilidade de, quando necessário, revisar a tradução, adicionar notas históricas, e postar no blog.

Desejo uma boa leitura e que retorne sempre que possível para ver as novas postagens. Ajude-nos a divulgar este trabalho a fim de outros estudantes de teologia, e especificamente de história da igreja e história da teologia, possam acessar este material.

Acesse e conheça o blog REFORMADOS DO SÉCULO XVI

31 dezembro 2014

Breve biografia de Robert L. Dabney

Morton H. Smith

Robert L. Dabney foi um presbiteriano sulista que viveu durante o século XIX. Archibald Alexander, o fundador do Princeton Theological Seminary, disse que ele foi “o melhor professor de teologia dos Estados Unidos, se não do mundo.” O seu biógrafo Thomas Carey Johnson disse a seu respeito em The Life and Letters of Robert Lewis Dabney (1903), que ele foi o primeiro a receber o título de “o primeiro entre os pensadores escritores teológicos do seu século.”

Como um homem que desfrutava de tal reputação entre os seus próprios contemporâneos não é de se admirar que Dabney fosse considerado o mais influente homem da Igreja Presbiteriana do Sul[1] durante o auge de seu ministério, entre 1865 a 1895.

Dabney era natural da Virginia, nascido no condado de Louisa, em 1820. Era descendente de ingleses e huguenotes franceses. Foi educado em Hampden Sydney College, Virginia, na University of Virginia e, no Union Theological Seminary, em Hampden Sydney; foi ordenado ao ministério da Igreja Presbiteriana em 1847. Exerceu os seus primeiros anos de sua vida ministerial na histórica Tinkling Springs Church no vale da Virginia. Em 1853 foi convidado para lecionar na cátedra de História e Política Eclesiástica no Union Theological Seminary. Em 1859 foi transferido para o Departamento de Teologia Sistemática. Em 1860 recebeu um convite para juntar-se à faculdade do Princeton Theological Seminary. Mas, devido à sua fidelidade ao Sul, preferiu não ir para o Norte dos EUA naquele período. Durante a Guerra Civil dos Estados, serviu por um período como capelão do Exército Confederado, e depois como chefe de assistência ao General T.J. (Stonewall) Jackson, com o posto oficial de major. Serviu com Jackson durante a rigorosa Campanha do Vale em 1862. Jackson disse a seu respeito que ele foi o mais eficiente oficial que havia conhecido. Depois da morte do General Jackson, em Maio de 1863, Dabney foi solicitado pela sra. Jackson que preparasse uma biografia do General. Ela foi publicada em 1866 sob o título de The Life and Campaigns of Lieutenant General Thomas J. Jackson (Stonewall Jackson). Esta obra foi considerada como a melhor biografia do General Jackson, e permanece como uma das maiores produções literárias de Robert L. Dabney.

Terminada a guerra, Dabney retornou ao Union Seminary e, continuou ensinando na área de Teologia Sistemática até 1883. Então, ele se mudou para o Texas, onde se tornou professor na nova faculdade da University of Texas, na cadeira de Filosofia Mental e Moral e Economia Política. Ensinou nesta universidade de 1883 à 1894. Durante este mesmo período em campanha com o Rev. Robert K. Smoot, organizaram a Austin School of Theology, que posteriormente tornou-se a Austin Presbyterian Theological Seminary. Morreu em Victoria, Texas, em 3 de Janeiro de 1898, e foi sepultado em Hampden Sydney, Virginia.

Dabney foi antes de tudo um mestre. A sua principal realização foi em sala de aula, onde sempre afirmou, com intensidade e vigor, os princípios da fé reformada. Também foi um fértil escritor produzindo inúmeros artigos em várias publicações. Em acréscimo à vida de Jackson, escreveu A Defense of Virginia (and through her of the South) in the recent and pending contests against the sectional party (1967). Em 1870, produziu um livro sobre pregação com o título de Sacred Rhetoric.[2] A presente obra foi inicialmente publicada pelos alunos de Dabney sob o título de Syllabus and Notes of the Course of Systematic and Polemic Theology[3] conforme ensinado no Union Theological Seminary, Virginia (1878). Esta obra foi revisada pelo autor e reimpressa em 1878. Ela envolveu seis edições sendo a última em 1927. Escreveu também dois volumes na área de Filosofia: The Sensualistic Philosophy of the Nineteenth Century (1875) e Practical Philosophy (1896).

O presente volume foi inicialmente publicado pelos alunos, com a sua autorização. Posteriormente, ele o revisou e levou ao seu formato final. Este volume reflete o seu melhor estilo de ensinar teologia. Thomas Carey Johnson, o seu biógrafo, descreve-o assim:
duas aulas eram dedicadas à cada tópico, separadas pelo intervalo de dois dias. No término do segundo encontro, a classe colocava no quadro-negro um programa dos próximos tópicos para que fosse entregue. A condução dos pontos no tópico era exposta em forma de perguntas, e quais autores tratavam daquele ponto específico. A referência mais importante era escrito primeiro, o seguinte mais importante, e etc., e os estudantes eram obrigados a ler o máximo que eles conseguissem. O livro-texto usado era o compêndio de teologia do Francis Turrentin, em latim.[4] No encontro seguinte ele prosseguia com uma recitação de Turrentin, abrangendo cerca de dez ou doze páginas. Os alunos eram obrigados, durante o segundo intervalo de dois dias, a escrever cada uma de suas próprias teses sobre o tópico. No segundo momento da reunião, ele se detinha em entregar à classe a sua própria preleção sobre o mesmo tópico. Este programa e preleções compunham a principal parte de sua obra teológica (p. 196).

Na nota original aos leitores sobre a obra foi aludido que as preleções assumiam “como um postulado determinado por outro departamento no Seminário, a inspiração e infalibilidade das Escrituras.” A sequência geral de todo o conteúdo do manual é aquela da Confissão de Fé de Westminster. É lamentável que não tenhamos do próprio Dabney, o desenvolvimento da doutrina da inspiração da Escritura. Mas, encontramos na página 144, a sua posição declarada de modo inequívoco “eu defendo que as Escrituras são, em todas as suas partes, plenamente inspiradas... isto tem determinado, e podemos assumi-la como inspirada e infalível.”

Esta obra foi mantida como livro-texto de Teologia Sistemática no Union Theological Seminary na Virginia até 1930. Ela é uma vigorosa e didática exposição da fé reformada. O leitor não encontrará simplesmente a reafirmação de antigas verdades, mas a ampliação dos problemas que algumas vezes envolvem aquelas verdades. Esta obra é digna de ser estudada por todos os que desejam entender o Evangelho e suas implicações mais plenas.

A influência de Dabney foi fortemente percebida entre os presbiterianos sulistas. Este volume, como já observamos, tornou-se o livro-texto de Teologia Sistemática nos Seminários do Sul. Ele foi considerado por Auguste Lecerf da França em sua Introduction to Reformed Dogmatics, e por Herman Bavink, dos Países Baixos, em sua Gereformeerde Dogmatiek[5] como estando entre os excelentes teólogos da América.

Num período em que a igreja certamente precisa de uma voz tão clara acerca de sua teologia, creio que não há obra melhor do que a de Robert L. Dabney, a ser reproduzida e entregue à nossa geração. Desejo que esta republicação da Teologia Sistemática de Dabney seja apresentada com renovado interesse no estudo e propagação da fé reformada.[6]

NOTAS:
[1] Presbyterian Church in United State – PCUS.
[2] Publicado e pode ser adquirido pela The Banner of Truth.
[3] A tradução deste artigo foi extraída de uma edição da Zondervan Publishing House, que está esgotada, mas pode ser adquirida usada pelo site da Amazon, entretanto, a The Banner of Truth assumiu a sua publicação.
[4] Francis Turrentin, Instituto theologiae elenticae. Traduzido e publicado com o título de Compêndio de Teologia Apologética, em 3 volumes, pela Editora Cultura Cristã.
[5] Herman Bavink, Gereformeerde Dogmatiek. Traduzido e publicado sob o título de Dogmática Reformada, em 4 volumes, pela Editora Cultura Cristã.
[6] Seria de grande proveito se alguma editora brasileira publicasse este manual de teologia sistemática.


O Dr. Morton H. Smith foi professor de Teologia Sistemática no Reformed Theological Seminary, Jackson e, posteriormente no Greenville Presbyterian Theological Seminary, onde se aposentou. Ele é o autor de um precioso manual de Systematic Theology, em 2 volumes, publicado pela Press GPTS. Tive o privilégio de receber um exemplar do próprio autor.
Este artigo foi escrito em 20 de Julho de 1971, Jackson, Mississippi.

Extraído de Robert L. Dabney, Lectures in Systematic Theology (Grand Rapids, Zondervan Publishing House, 1980), in: Preface to 1972 Edition.
Tradução e notas por Rev. Ewerton B. Tokashiki [revisado em 31/12/2014].

27 dezembro 2014

A heresia de Auburn


Escrito por Gordon H. Clark

Quando futuros historiadores da Igreja avaliarem a presente época, a publicação da Auburn Affirmation[1] se destacará em importância do mesmo modo que Lutero quando fixou as suas noventa e cinco teses. Todavia, será importante por uma razão diferente.

A razão pela qual a Auburn Affirmation é tão importante é que se trata de uma grande ofensiva contra a Palavra de Deus.[2] É, ou pelo menos a sua teologia foi, a raiz de apostasia presbiteriana.[3]

As autoridades da Igreja Presbiteriana nos EUA espalharam o boato de que não há nada doutrinário envolvido Auburn Affirmation. Este rumor, independentemente da sua origem, é falso. É verdade que a Auburn Affirmation é um documento escrito de modo inteligente, com uma fraseologia piedosa, que ligeiramente obscurece a sua real intenção. Mas uma vez que se percebe exatamente o que diz, não há como disfarçar o fato de que é um ataque vicioso contra a Palavra de Deus.

As cinco doutrinas envolvidas são a verdade da Sagrada Escritura, a realidade do nascimento virginal de Cristo, seus milagres, o seu sacrifício no Calvário para satisfazer a justiça divina e nos reconciliar com Deus, e por último, a sua ressurreição física.[4]

O verdadeiro propósito do documento é parcialmente obscurecido porque afirma que alguns dos signatários acreditam em algumas destas doutrinas. Isso é verdade. Alguns dos apoiadores acreditam em alguns pontos declarados, mas, todos eles negam a infalibilidade das Escrituras Sagradas.[5] Todos eles afirmam que a base da Confissão de Westminster é prejudicial e que a Bíblia contém erro. Este ataque contra a Bíblia é de fundamental importância porque, obviamente, se a Bíblia ser rejeitada, por que a religião da Bíblia seria mantida? De fato, você não pode rejeitar a veracidade das Escrituras e, em seguida, aceitar o conteúdo das Escrituras.

Uma vez que este ponto demonstre ser tão grave, a evidência não deve ser omitida. Na página cinco da Auburn Affirmation você pode ler estas palavras: “Não há nenhuma afirmação nas Escrituras que os seus escritores foram ‘livres de erro’. A Confissão de Fé não faz essa afirmação ... . A doutrina da infalibilidade que destina-se a reforçar a autoridade das Escrituras, de fato prejudica a sua autoridade sobre a fé e de vida, e enfraquece o testemunho da Igreja para o poder de Deus na salvação através de Jesus Cristo. "

Agora note este estranho fato. A Auburn Affirmation afirma que crer na Bíblia na verdade prejudica a sua autoridade e enfraquece o testemunho da Igreja. Ou, em outras palavras, a fim de que a Bíblia seja autoridade, ele deve conter erro; e, sem dúvida, quanto mais errada ela for, mais autoridade ela poderá ser.

Mas o que a Confissão de Westminster quer dizer? No Capítulo I, Seção 4, você pode ler que: “A autoridade da Escritura Sagrada, razão pela qual deve ser crida e obedecida, depende ... por completo somente de Deus (que é a própria verdade) o seu autor; e, portanto, deve ser recebida, porque é a Palavra de Deus.”

Estudando também o Capítulo XIV, Seção 2 lemos que “Por isso, pela fé [salvadora], um cristão crê ser verdade tudo o que é revelado na Palavra, pela autoridade do próprio Deus que fala ...”.

A Auburn Affirmation diz que é errado e prejudicial acreditar ser verdade tudo quanto nela é revelado. Assim, os signatários da Auburn Affirmation são vistos como antagônicos para o próprio fundamento da fé cristã. Ao negar a verdade da Bíblia, eles repudiam a sua própria confissão, e por isso não têm lugar legítimo no ministério presbiteriano. Será que eles responderiam que concordam com a Confissão de Westminster de que a Escritura é a Palavra de Deus, e que eles apenas negam que a Escritura é inerrante? Deus não permite que eles deem essa resposta. Porque, se eles dizem que acreditam que a Bíblia é a Palavra de Deus, e ao mesmo tempo alegam que a Bíblia contém erros, segue-se, não é verdade então, que eles chamam Deus de mentiroso, já que ele tem falado falsamente. Ou, eles repudiam abertamente a Confissão de Westminster, ou então, eles têm chamado Deus de mentiroso. Em ambos os casos, não têm lugar legítimo no ministério presbiteriano.

A Auburn Affirmation é mais generosa para com os outros quatro pontos. O nascimento virginal, os milagres, a ressurreição, que presbiterianos ortodoxos consideram como fatos históricos, os proponentes da declaração consideram como teorias permitidas.

Depois de se referir aos cinco pontos enfatizados pela Assembleia Geral de 1923, na página seis, a Auburn Affirmation declara:

... este parecer da Assembleia Geral intenciona promover em nossa Igreja alguma teorias sobre a inspiração da Bíblia, Encarnação, Expiação, Ressurreição .... Alguns de nós consideramos as teorias específicas contidas nas deliberações da Assembleia Geral de 1923, como explicações satisfatórias de tais fatos e doutrinas. Todavia, estamos unidos na crença de que estas não são as únicas teorias permitidas pelas Escrituras e pelos nossos padrões como explicações sobre esses fatos e doutrinas de nossa religião, e que todos os que defendem a estes fatos e doutrinas, ou quaisquer outras teorias que podem recorrer para explicá-las, também são dignos de toda a confiança e comunhão.

Agora, para ser concreto, qual “teoria” que não seja o fato histórico do nascimento virginal você poderia pensar para explicar a encarnação? Há um que o Celsus[6] anticristão usou em seu esforço para difamar Cristo. Se Cristo não teve um nascimento virginal, e se, como José e Maria reivindicam, José não foi o pai de Jesus, então, de quem ele foi filho? Será que a Auburn Affirmation realmente quer dizer que alguém que aceita este ponto de vista do nascimento de nosso Senhor é digno de toda confiança e comunhão? Isso é exatamente o que significa a Auburn Affirmation. Ela diz definitivamente que os ministros são dignos de confiança "independente das teorias que possam ser empregadas para explicar" a Encarnação.

Em seguida considere a morte sacrificial de Cristo pela qual ele satisfaz a justiça divina e nos reconcilia com Deus. Isto, também, é declarado como não essencial, e os cristãos são convidados a colocar a confiança nos homens que negam esta doutrina, desde que eles usem a palavra "expiação" podem empregar qualquer teoria aleatória para explicá-la. A morte de Cristo, então, pode ser nada além do que um exemplo, e nossa salvação pode depender de nossos esforços para imitar as suas boas obras. Já não será totalmente salvação pela graça. E nos dizem que estes homens são dignos de confiança "independente das teorias que possam ser empregadas para explicar" a Expiação.

Ainda há tempo para se referir brevemente sobre a ressurreição? Esta também é reduzida a uma teoria permitida, mas não essencial. Os signatários da Auburn Affirmation podem ter em mente alguma teoria de uma ressurreição espiritual em oposição ao fato de que Cristo ressuscitou dos mortos com o mesmo corpo com que ele padeceu. Os proponentes da Auburn Affirmation, por um lado, podem sustentar algum tipo de ressurreição espiritual; mas, por outro lado, Jesus Cristo disse: “toque-me e vede, pois um espírito não tem carne nem ossos, como vedes que eu tenho.” Aparentemente, Jesus não teria escolhido assinar a Auburn Affirmation. Os signatários da Auburn Affirmation dizem que a ressurreição corporal que é o único tipo de ressurreição que vale a pena falar - não é essencial. Mas Paulo diz: "Se Cristo não ressuscitou, logo, é vã a nossa pregação, e a sua fé também é vã." Você notará que o nome de Paulo não estaria entre os signatários da Auburn Affirmation. Não, você não encontraria Paulo nos pedindo para confiar em homens “independente das teorias que possam ser empregadas para explicar”, ou melhor, para explicar a ressurreição.

Então, se a Auburn Affirmation fosse assinada por apenas duas ou três pessoas, ainda assim seria dever dos presbiterianos pedir-lhes que se arrependessem e retratassem, ou, ainda de removê-los do ministério. Se apenas dois ou três tivessem assinado, haveria pouca razão para alarme. Mas, o fato foi que 1.300 ministros da PCUSA assinaram este documento herético. E, no entanto, este número, grande como é, por si só não revela o significado completo da situação. É preciso ver também em que medida esse tipo de teologia controla as Juntas e Agências da Presbyterian Church of USA. De tempos em tempos tem havido listas preparadas por proponentes pertencentes da Auburn Affirmation que ocupam cargos de responsabilidade na estrutura eclesiástica. Estas posições incluem os presidentes de Presbitérios, de Sínodos, e da Assembleia Geral; diretores de seminários; de uma só vez 22 membros da Junta de Missões Nacionais se tornaram proponentes desta declaração; e assim por diante através dos vários cargos importantes na Presbyterian Church of USA.

Mas nem mesmo esta lista de posições indica a depravação total daquela igreja. Perceba também que existem inúmeros outros titulares de cargos que, embora ainda não assinaram a Auburn Affirmation, aprovam os seus princípios, e, longe de protestar contra ele, alegremente cooperam com os seus apoiadores no trabalho dos vários conselhos e agências. Tente mencionar qualquer secretário de qualquer conselho, mencione qualquer oficial que tentou defender a Palavra de Deus contra este ataque de Auburn. Ninguém poderia ser nomeado; não há nenhum; cooperam com os proponentes, aprovando as mesmas políticas, e têm, pois, a sua posição contra as Sagradas Escrituras e contra a Confissão de Westminster que juraram defender.

Além desses oficiais há aqueles que cooperam com os signatários da herética Auburn Affirmation, são os ministros que aceitam as suas decisões a partir de suas regiões, que em seus Presbitérios votam regularmente com este partido que desonra a Bíblia. É que eles não assinaram o documento, mas eles votaram os seus princípios em vigor e baniram os ortodoxos de sua denominação. Tente mencionar qualquer ministro que tenha feito qualquer tentativa séria e pública, para disciplinar os signatários da herética Auburn Affirmation. Quando foi que alguém na Presbyterian Church of USA ouviu um sermão defendendo a expiação e a ressurreição contra este ataque? Que ministro trouxe a matéria para que fosse discutida em seu Presbitério?

Há alguns anos que os modernistas falam a favor de uma igreja inclusiva. A igreja, segundo eles, é grande o suficiente para incluir todos os partidos teológicos. Hoje, no entanto, eles mudaram o tom. Eles excomungaram grupo o ortodoxo. Os oficiais proponentes e seus apoiadores decretaram que aqueles que permaneceram fiéis à Palavra de Deus, aqueles que se opuseram à Assembleia Geral de colocar a sua própria autoridade superior à da Bíblia, aqueles que não obedeceram a uma ordem para apoiar o modernismo, aqueles que tomaram os seus votos de ordenação a sério, tinham que ser expulsos da igreja.

A mais importante destas expulsões foi a do falecido J. Gresham Machen.[7] Ele foi acusado de desobedecer a uma ordem legal e de dizer mentiras sobre o Conselho de Missões Estrangeiras. Ele foi levado a julgamento. Ele queria se defender, argumentando que a decisão de apoiar o modernismo era ilegal, e que o que ele tinha dito sobre a Junta de Missões Estrangeiras era verdade. Era para ser um julgamento judicial, mas seus juízes absolutamente recusaram-lhe o direito de apresentar a sua defesa. Na Comissão Judicial Permanente, que fez disposição final de seu caso, metade destes ministros eram signatários da Auburn Affirmation. Não nos causa admiração que os cristãos que criam na Bíblia foram expulsos da Presbyterian Church of USA.

Esta, então, em suma, é a situação do por que cristãos conservadores devem se unir. Porventura a verdade da Bíblia seria sustentada, ou ordenaria apoiar o modernismo para que se tornasse a autoridade suprema sobre a consciência dos homens? Esta não é uma questão trivial; é sim uma luta de vida e morte entre duas religiões que se excluem mutuamente. Uma religião poderia, sem ofensa à sua integridade, rejeitar a infalível Palavra de Deus, negar o nascimento virginal, repudiar o sacrifício propiciatório de Cristo, e negar a ressurreição. Uma religião permaneceria completa mesmo que todas estas coisas fossem eliminadas; mas esta religião não seria o Cristianismo.[8]

A outra religião é o Cristianismo porque ele aceita a Bíblia como a própria Palavra de Deus, que não pode mentir, porque faz com que o sacrifício de Cristo satisfaça a justiça divina, sendo a única base de salvação, e porque ela enaltece o fato histórico da ressurreição.

NOTAS:
[1] Gordon H. Clark se refere ao que foi originalmente um documento sob o título de “The Affirmation” publicado e assinado primeiramente por 150 ministros em Janeiro de 1924, e posteriormente sob o título de The Auburn Affirmation subscrito por 1274 oficiais da Presbyterian Church of USA.
[2] O texto integral de The Auburn Affirmation - http://www.pcahistory.org/documents/auburntext.html acessado em 27 de Dezembro de 2014.
[3] Segundo A.H. Freundt “sem negar as doutrinas específicas, a Auburn Affirmation se opunha ao empenho de fazer os cinco pontos um teste para ordenação ou ortodoxia. Elas deveriam ser consideradas apenas teorias acerca dos fatos ou doutrinas, em relação a outras possíveis explicações ou teorias que poderiam ser aceitas, se deduzidas da Escritura e dos padrões presbiterianos.” D.G. Hart, ed., Dictionary of the Presbyterian & Reformed Tradition in America (Phillipsburg, P&R Publishing, 1999), pp. 23.
[4] O grupo dos 150 pastores teologicamente liberais se reuniram em Auburn, New York e, produziram uma declaração repudiando os Five Point Deliverance da Assembleia Geral de 1910 que afirmava o que eram os pontos doutrinários essenciais e necessários para a ortodoxia reformada histórica. Veja* A.H. Freundt, “Auburn Affirmation (1924)” in: D.G. Hart, ed., Dictionary of the Presbyterian & Reformed Tradition in America (Phillipsburg, P&R Publishing, 1999), pp. 22-23.
[5] W.A. Hoffecker observa que A.A. Hodge “reafirmou a sua visão sobre inerrância num artigo chamado ‘Inspiração’, escrito em parceria com Benjamin B. Warfield, em 1881, para a Presbyterian Review. A sua denominação adotou a visão de Princeton acerca da Bíblia como o seu oficial ensino na Portland Deliverance (1892) e no Five Point Deliverance (1910), que influenciou o debate Fundamentalista-Modernista”. W.A. Hoffecker, “Hodge, A.A. (1823-1886)” in: D.G. Hart, ed., Dictionary of the Presbyterian & Reformed Tradition in America (Phillipsburg, P&R Publishing, 1999), p. 120.
[6] Sobre este assunto recomendo o artigo de Carolline da Silva Soares, “VIDA E OBRA DO FILÓSOFO PAGÃO CELSO” in: Alétheia Revista de Estudos sobre Antiguidade e Medievo – Volume 1/1, 2013.
[7] Para um excelente resumo deste caso é recomendada a leitura do artigo de D. Clair Davis, “Machen and Liberalism” in: Charles G. Dennison & Richard C. Gamble, eds., Pressing toward the mark – essays commemorating fifty years of the Orthodox Presbyterian Church – 1936-1986 (Philadelphia, The Committee for the Historian of the Orthodox Presbyterian Church, 1986), pp. 247-258.
[8] A.H. Freundt concluí que “a Assembleia Geral de 1924 abriu o caminho para o maior pluralismo teológico ao declarar que o presbiterianismo admite uma diversidade de concepções”. “Auburn Affirmation (1924)” in: D.G. Hart, ed., Dictionary of the Presbyterian & Reformed Tradition in America (Phillipsburg, P&R Publishing, 1999), pp. 23.


SOBRE O AUTOR:
Dr. Gordon H. Clark quando escreveu este artigo era presbítero na Orthodox Presbyterian Church, sendo anteriormente um presbítero na Presbyterian Church of USA. Este foi o resumo de um discurso proferido, no dia 28 de Fevereiro de 1935, numa reunião de presbiterianos Leigos da Filadélfia e arredores, e posteriormente publicado em forma de folheto pela Comissão de Educação Cristã da Orthodox Presbyterian Church.


Acessado em 21 de Dezembro de 2014 de http://opc.org/cce/clark.html
Traduzido em 24 de Dezembro de 2014.
Tradução e notas por Rev. Ewerton B. Tokashiki

19 dezembro 2014

Eu creio nos 5 solas da Reforma

Somos uma igreja herdeira da Reforma protestante do século XVI. Os 5 pilares da nossa herança são:
Sola Scriptura: somente a Escritura Sagrada
Solus Christus: somente em Cristo
Sola gratia: somente a graça
Sola fide: somente a fé
Soli Deo gloria: somente a Deus toda glória

1. Somente a Escritura Sagrada: é a nossa única fonte e regra de fé e prática
O calvinismo possui o seu sistema doutrinário centrado na Escritura Sagrada. Desde a Reforma do século XVI foi ensinada a doutrina da sola Scriptura – ou seja, que a Escritura é a única fonte e regra de autoridade. Entretanto, a autoridade da Escritura resultado do fato dela ser a Palavra de Deus. John H. Armstrong corretamente observa que “a autoridade é encontrada no próprio Deus soberano. O Deus que ‘soprou’ as palavras por meio dos escritores humanos está por trás de toda afirmação, toda doutrina, toda promessa e toda ordem contidas na Escritura”.[1] Se rejeitarmos a Escritura Sagrada estamos desprezando a vontade preceptiva de Deus.

A Bíblia tem autoridade porque ela é revelação da vontade de Deus. Por isso, “as inspiradas Escrituras, revelando a vontade transcendente de Deus em forma escrita e objetiva, são a regra de fé e conduta através da qual Jesus exerce sua autoridade divina na vida do crente.”[2] Em outras palavras, esta doutrina significa que a base da nossa doutrina, forma de governo de igreja, culto e todas as esferas da vida, não se fundamentam no tradicionalismo, no subjetivismo, no relativismo, no pragmatismo, ou no pluralismo, mas é extraída somente na Escritura Sagrada. Cremos que suficientemente ela é a verdade absoluta, porque somente a Escritura é a Palavra de Deus (2 Tm 3:16-17; 2 Pe 1:19-20).

2. Somente Cristo: o único mediador da nossa salvação
O nosso Senhor Jesus se fez um de nós para ser o nosso substituto. Ele é o nosso único representante diante de Deus. O Pai firmou o pacto da redenção que estipulava que o Filho viesse ao mundo para cumprir a sua vontade (Jo 4:34; 6:38-40; 10:10). A Confissão de Fé de Westminster declara que
aprouve a Deus em seu eterno propósito, escolher e ordenar o Senhor Jesus, seu Filho Unigênito, para ser o Mediador entre Deus e o homem, o Profeta, Sacerdote e Rei, o Cabeça e Salvador de sua Igreja, o Herdeiro de todas as coisas e o Juiz do Mundo; e deu-lhe desde toda a eternidade um povo para ser sua semente e para, no tempo devido, ser por ele remido, chamado, justificado, santificado e glorificado.[3]

Não temos outro mediador pelo qual possamos ser reconciliados com Deus, a não ser Jesus Cristo (At 4:11-12; 1 Tm 2:5). A sua obra lhe confere autoridade para declarar justo todos quantos o Pai lhe deu (Jo 6:37,39,65). Toda a obra expiatória de Jesus é suficiente para a nossa salvação (Rm 8:1). Somente através da perfeita obra de Cristo seremos salvos. A nossa culpa e merecida condenação caiu sobre ele (Hb 2:10). A sua obediência ativa cumpriu todas as exigências da Lei, bem como submetendo passivamente à condenação, fez com que pela sua humilhação, obtivesse plena satisfação da justiça de Deus. O Pai retirou o seu consolo e derramou sobre Cristo a sua ira divina, punindo nele o nosso pecado. As nossas iniquidades estavam sobre o Filho, e a justa ira de Deus veio sobre o nosso pecado na cruz (Hb 2:10). Jesus tornou-se amaldiçoado em nosso lugar sobre o madeiro (2 Co 5:21). O Filho de Deus sofreu os tormentos do inferno intensivamente na cruz, o que sofreríamos extensivamente na eternidade. Cremos que a sua morte expiatória na cruz satisfez a justiça de Deus e, eliminou completamente a nossa condenação futura (Rm 3:24-25), redimindo-nos de todos os nossos pecados (Ef 1:7).

3. Somente a graça: a única causa da nossa aceitação
Cremos que a salvação do homem não é resultado de algum mérito pessoal (Rm 3:20, 24, 28; Ef 2:1-10). Todo ser humano possui uma disposição moral totalmente corrompida, de modo que, ele é incapaz de satisfazer perfeitamente a Lei de Deus (Tg 2:8-10). O empenho de merecer a salvação pelas boas obras somente resulta em condenação. Sem a graça a nossa predisposição natural é somente para o pecado (Rm 7:13-25).

A Escritura nos revela que todo ser humano em seu estado natural é inimigo de Deus (Rm 3:23; 5:10). O teólogo puritano Stephen Charnock observou que “todo pecado é uma espécie de amaldiçoar a Deus no coração. O homem tenta destruir e banir Deus do coração, não realmente, mas virtualmente; não na intenção consciente de cada iniquidade, mas na natureza de cada pecado.”[4] A dureza de coração lhe é normal, porque ele está rígido como uma pedra (Ez 36:26-27).

O livre arbítrio perdeu-se com a Queda.[5] Esta capacidade de agir contrário à própria natureza foi perdida com a escravidão do pecado. No início, Adão criado em santidade, foi capaz de escolher contrário à sua inclinação natural de perfeita santidade e, decidiu pecar. O primeiro homem livremente passou a agir de acordo com a escravidão dos desejos mais fortes da sua alma corrompida pela iniquidade. Ele é livre, mas a sua liberdade é usada tendenciosamente para pecar conforme os impulsos de sua inclinação para o pecado. Se ele for deixado para si mesmo, ele sempre agirá de acordo com a sua disposição interna, ou seja, naturalmente escolherá pecar (Rm 1: 24-32; 3:9-18; 7:7-25; Gl 5:16-21; Ef 2:1-3).

A nossa salvação é resultado da ação da livre e soberana graça do nosso Deus. A Confissão de Fé de Westminster declara que
todos aqueles que Deus predestinou para a vida, e só esses, é ele servido, no tempo por ele determinado e aceito, chamar eficazmente pela sua palavra e pelo seu Espírito, tirando-os por Jesus Cristo daquele estado de pecado e morte em que estão por natureza, e transpondo-os para a graça e salvação. Isto ele o faz, iluminando os seus entendimentos espiritualmente a fim de compreenderem as coisas de Deus para a salvação, tirando-lhes os seus corações de pedra e dando lhes corações de carne, renovando as suas vontades e determinando-as pela sua onipotência para aquilo que é bom e atraindo-os eficazmente a Jesus Cristo, mas de maneira que eles vêm mui livremente, sendo para isso, dispostos pela sua graça.[6]

Somente a ação soberana e eficaz do Espírito Santo é capaz de regenerar corações implantando uma nova disposição santa. O resultado é a libertação da escravidão do pecado. Esta obra Deus a realiza pela graça somente.

4. Somente a fé: é o único instrumento de posse da nossa salvação
A fé é o meio normal pelo qual o Espírito Santo aplica o processo da salvação nos eleitos. Entretanto, devemos lembrar que a fé é dom de Deus e não uma virtude humana (Rm 4:5; 10:17; Ef 2:8-9; Fp 1:9). O Breve Catecismo de Westminster define este dom: “fé em Jesus Cristo é uma graça salvadora, pela qual o recebemos e confiamos só nele para a salvação, como ele nos é oferecido no Evangelho.”O Catecismo de Heidelberg esclarece que
a verdadeira fé é a convicção com que aceito como verdade tudo aquilo que Deus nos revelou em sua Palavra. É também a firme certeza de que Deus garantiu – não só aos outros como também a mim – perdão de pecados, justiça eterna, e salvação por pura graça e somente pelos méritos de Cristo. O Espírito Santo realiza essa fé em meu coração por meio do evangelho.[7]

Por isso, a teologia reformada entende que a verdadeira fé é o resultado de um iluminado conhecimento, da plena concordância verdade e da firme confiança na Palavra de Deus.

A justificação vem pela fé somente na obra de Cristo. Nenhum homem pode ser salvo, a não ser que creia na expiação realizada por Cristo, confiando exclusivamente nele (Rm 1:17; Tt 3:4-7; 1 Jo 5:1). A justiça de Cristo que é imputada sobre nós concede, garante e mantém-nos aceitos na comunhão eterna de Deus.

A verdadeira fé conduz as boas obras que evidenciam a salvação e glorificam a Deus. A salvação é pela fé somente, mas a fé salvadora nunca está sozinha. A fé salvadora produz amor prático ao próximo, santidade pessoal em obediência à Palavra de Deus. A Escritura Sagrada declara que “pois somos feitura dele, criados em Cristo Jesus para boas obras, as quais Deus de antemão preparou para que andássemos nelas” (Ef 2:10).

5. Somente a Deus toda glória: o único objetivo da nossa salvação
Cremos no único Deus, que é Senhor da história e do universo, “que faz todas as coisas segundo o conselho da sua vontade” (Ef 1:11). É nossa convicção que a finalidade principal da vida não é necessariamente o bem-estar, a saúde física, a prosperidade, a felicidade, ou mesmo a salvação do homem, mas, a glória de Deus e na manifestação de todos os seus atributos. Johannes G. Vos comentando o Catecismo Maior de Westminster observa que “quem pensa em gozar a Deus sem o glorificar corre o risco de supor que Deus existe para o homem, e não o homem para Deus. Enfatizar o gozar a Deus mais do que o glorificar a Deus resultará num tipo de religião falsamente mística ou emocional.”[8] Deus não existe para satisfazer as necessidades do homem, embora ele o faça por amor de si mesmo (Ez 20:14). O homem foi criado para o louvor da glória de Deus (Rm 11:36; Ef 1:6-14).[9]

É verdade que a glória de Deus transcende ao nosso entendimento, mas ela pode ser percebida pela sua manifestação na criação e pela revelada Palavra da Deus. João Calvino no início de suas Institutas escreve que
a soma total da nossa sabedoria, a que merece o nome de sabedoria verdadeira e certa, abrange estas duas partes: o conhecimento que se pode ter de Deus, e o de nós mesmos. Quanto ao primeiro, deve-se mostrar não somente que há um só Deus, a quem é necessário que todos prestem honra e adorem, mas também que Ele é a fonte de toda verdade, sabedoria, bondade, justiça, juízo, misericórdia, poder e santidade, para que dele aprendamos a ouvir e a esperar todas as coisas. Deve-se, pois, reconhecer, com louvor e ação de graças, que tudo dele procede.[10]

Mas, por que a nossa felicidade depende da glória de Deus? Simplesmente porque a nossa dignidade e satisfação dependem de vivermos sem a insensatez, vícios e destruição causados pelo pecado. Somente quando obedecemos à vontade de Deus, segundo as Escrituras, podemos andar aceitáveis em sua presença e desfrutar dos benefícios das suas promessas. Aurélio Agostinho em sua obra Confissões declarou que “Tu o incitas para que sinta prazer em louvar-te; fizeste-nos para ti, e inquieto está o nosso coração, enquanto não repousa em ti.”[11] Assim, quanto maior for a nossa satisfação em Deus, ele será mais glorificado em nós!

O soberano Senhor não compartilha a sua glória com ninguém! O nosso orgulho é uma ofensa gravíssima ao nosso Deus. Não é em vão que ele denúncia a sua rejeição aos soberbos (Tg 4:6-10). Somente ele é o Altíssimo, enquanto o pecador consegue em suas fúteis pretensões ser apenas uma ilusória altivez. Não podemos esquecer de que somos chamados para ser servos do seu reino, e de que toda a abrangência de nossa vida está ao seu serviço (Rm 11:36).

O profeta Jeremias disse que "assim diz o SENHOR: não se glorie o sábio na sua sabedoria, nem se glorie o forte na sua força; não se glorie o rico nas suas riquezas; mas o que se gloriar, glorie-se nisto: em entender, e em me conhecer, que eu sou o SENHOR, que faço benevolência, juízo e justiça na terra; porque destas coisas me agrado, diz o SENHOR." (Jr 9:23-24). Assim, em compromisso, confessamos que “porque dele, e por meio dele, e para ele são todas as coisas. A ele, pois, a glória eternamente. Amém.” (Rm 11:36).

NOTAS:
[1] John H. Armstrong, “A autoridade da Escritura” in: Bruce Bickel, ed., Sola Scriptura numa época sem fundamentos, o resgate do alicerce bíblico (São Paulo, Editora Cultura Cristã, 2000), p. 90.
[2] Carl F.H. Henry, “A autoridade da Escritura” in: Philip W. Comfort, ed., A origem da Bíblia (Rio de Janeiro, CPAD, 1998), p. 28.
[3] Confissão de Fé de Westminster VIII.1.
[4] Stephen Charnock, The Existence and the Attributes of God (Grand Rapids, Baker Books, 2000), vol. 1, p. 93.
[5] A tradição agostiniana/calvinista interpreta a doutrina do livre arbítrio da seguinte forme: “o livre arbítrio é dividido em quatro modos, por causa dos quatro estados do homem. No primeiro estado a vontade do homem era livre para o bem e para o mal. No estado caído o homem é livre somente para o mal. O homem nascido de novo, ou o homem em estado de graça, é livre do mal e para o bem, pela graça de Deus somente, mas imperfeitamente. No estado de glória ele será perfeitamente livre do mal para o bem. No estado de inocência o homem era capaz de não pecar [posse non peccare]. No estado de miséria ele é incapaz de não pecar. No estado de graça, o pecado não pode governar o homem. No estado de glória ele se tornará incapaz de pecar.” Johannes Wollebius, Compendium Theologicae Christianae in: John W. Beardslee III, ed., Reformed Dogmatics (Grand Rapids, Baker Books, 1977), p. 65. Este manual de teologia de Wollebius [1586-1629] influenciou os teólogos que elaboraram os Padrões de Westminster.
[6] Confissão de Fé de Westminster, X.1.
[7] Catecismo de Heidelberg, Domingo 7, perg./resp. 21.
[8] Johannes G. Vos, Catecismo Maior de Westminster Comentado (Editora Os Puritanos), pág. 32.
[9] Breve Catecismo de Westminster, perg./resp. 1.
[10] João Calvino, Institutas, (edição estudo de 1541), vol. I, p. 55.
[11] Santo Agostinho, Confissões(Editora Paulus), vol. 10, p. 19.