05 novembro 2008

Esboço da Confissão de Fé de Westminster I.1

Benjamin B. Warfield sugere o seguinte esboço do primeiro capítulo da Confissão de Fé de Westminster.

I. A Necessidade da Escritura
1. A realidade e inexatidão da teologia natural.
2. A insuficiência da revelação natural.
3. A realidade e importância da revelação supernatural.
4. O seu completo encerramento na Escritura Sagrada.
5. A conseqüente necessidade da Escritura.

II. A definição de Escritura
1. Extensivamente: o cânon
2. Intensivamente: a inspiração
3. Exclusivamente: os apócrifos

III. As propriedades da Escritura
1. A autoridade da Escritura
A. A fonte de autoridade da Escritura
B. A prova da autoridade da Escritura
(a) A realidade e valor da evidência externa.
(b) A realidade e valor da evidência interna.
(c) A necessidade e função da evidência divina.

2. A perfeição da Escritura
A. O absoluto objetivo da Escritura em sua completitude.
B. A necessidade da iluminação espiritual para o seu completo uso.
C. O lugar da prudência cristã e do correto raciocínio.

3. A clareza da Escritura
A. Diversidade na Escritura nos pontos de clareza.
B. Revelação clara de toda verdade necessária.
C. Acessibilidade da verdade salvadora pelos meios ordinários.

IV. O uso da Escritura
1. Em relação a sua forma e transmissão
A. O valor primário e autoridade dos originais.
(a) A imediata inspiração das Escrituras hebraica e grega.
(b) A sua preservação providencial em pureza [textual].
B. O direito, dever e propósito das traduções.
2. Em relação à interpretação
A. Somente a Escritura é o infalível intérprete da Escritura.
B. O sentido simples da Escritura.
3. Em relação às controvérsias
A. A Escritura o supremo juiz em controvérsias.
B. A Escritura é o teste de toda e qualquer fonte de verdade.

Extraído de Benjamin B. Warfield, The Westminster Assembly and Its Work in: The Works of Benjamin B. Warfield (Grand Rapids, Baker Book House Company, 2003), vol. VI, pp. 191-192
Traduzido por Rev. Ewerton B. Tokashiki

Breve introdução ao livro de Rute

Título
O nome Rute significa amizade, uma característica muito aguçada da personagem principal.

Autoria
Entre os críticos liberais é quase por consenso que o livro tem uma datação pós-exílica. Muitos deles entendem como tendo sido escrito em oposição às medidas de Esdras e Neemias contra os casamentos mistos. Vejamos alguns argumentos destes críticos:[1]
1. No cânon hebraico, o livro de Rt não se encontra junto com os primeiros profetas, onde também se encontra Jz e, sim, com os livros da terceira coleção chamados poéticos. Dizem tais críticos que foram os últimos a serem canonizados.
2. A influência do aramaico é notório no estilo do autor, o que indicaria um autor influenciado pelo exílio babilônico.
3. Em 4:7 o autor menciona o costume de descalçar o sapato, para confirmar um negócio, costume este, aparentemente, não praticado entre o povo de Israel, quando o livro foi escrito.
4. O estilo poético do livro marcado pela simplicidade e beleza pastoril, sugere que temos aqui uma idealização do período dos juízes.

A tradição judaica, o Talmud, Baba Bathra 14b, afirma literalmente que “Samuel escreveu o seu livro e Juízes e Rute”. Normalmente cogita-se com simpatia a possibilidade de Samuel ser o autor do livro de Rute. Mas há os que consideram esta possibilidade como improvável, com base na afirmação de Rt 4:22 que parece implicar que Davi era uma pessoa bem conhecida por ocasião da redação do texto. Todavia, devemos analisar que a genealogia vai somente até Davi (4:17,22) não incluindo Salomão, isso indica que o livro foi escrito depois de Davi ser ungido rei, mas antes dele tornar-se de fato regente em Israel, ou antes de Salomão tornar-se rei. Samuel ainda vivia, e é ele o escritor mais provável do livro.

Gênero literário
Entre os críticos o livro de Rt é entendido de muitas maneiras diferentes, até como lenda popular ou como novela! R.H. Pfeiffer baseando-se nos significados dos nomes tenta interpretar simbolicamente todo o conteúdo do livro:[2]
Malom....... doença;
Quilom...... esbanjador;
Orfa........ obstinado;
Noemi....... minha doçura;
Rute........ companheira.

No entanto, o NT decide a questão. Em Mt 1:5, Rute é aceito como personagem histórico, e não como um livro de romance ou novela fictícia. A genealogia de Lc 3:32 concorda com a que consta em Rt 4:13-22. O texto faz sentido tal qual se encontra. Ele registra um episódio familiar dum período pré-monárquico. O livro se enquadra dentro do cenário histórico do período dos Juízes, e não há razões para alterações. Edward Young comenta que "outrora relações amistosas ligavam os dois países: Israel e Moabe (1 Sm 22:3-4), [...]. Se tal livro não for histórico, mas simplesmente obra de alguém que procurou explicar a origem da descendência de Davi, não seria porventura mais provável que tal escritor se esforçasse por descobrir aquela origem numa israelita e não numa estrangeira? O fato da moabita Rute ser tronco da descendência da linha de Davi é por si argumento suficiente para a historicidade do livro."[3]

Data
A questão da data está diretamente vinculada à questão da autoria do livro. Assim, como a autoria, é difícil identificar explicitamente a data da redação do livro. As evidências lingüísticas dão alguma pista. A linguagem e o estilo de Rt são puros, clássicos, em nível semelhante a Sm. Via de regra, o hebraico clássico implica em data da monarquia unida entre os reinados de Saul à Salomão. Afirma-se também que a menção do rei Davi pelo nome implica num período de redação obviamente não anterior ao reino davídico. Nenhum outro rei é mencionado, nem mesmo Salomão. Para alguns, isto é indício que o livro não foi escrito no período de Salomão. Assim, a conclusão mais segura é que este livro foi composto no início, ou durante o reinado de Davi. Os comentaristas judeus apontam o ano de 973 a.C. como marca em seu calendário.[4]

Situação histórica e geográfica
O texto de Rt 1:1 situa a história de Rute no tempo dos juízes. O livro começa com a circunstância não muito comum de que havia fome em Belém (“casa do pão”). A história apresenta a característica irônica de uma mulher virtuosa, que veio de um povo nascido de incesto (Ló e suas filhas). Os moabitas, ancestrais de Rute, tinham atraído Israel para a idolatria e imoralidade (Nm 25:1-3), mas agora ela estava influenciando Israel com o seu amor e fidelidade. A história acontece no interior da Judéia, saindo da cidade de Belém, indo para a região de Moabe, e depois retornam para Belém (Rt 1:1-7).

Propósito
Propósito histórico
O comentarista David Atkinson observa que "o que está claro é que, através de sua leitura, aprendemos algo da vida rural do século XI ou XII a.C. na Palestina, a rotina do dia-a-dia, a necessidade do trabalho, as alegrias familiares, a dor da morte, a separação dos parentes, o relacionamento com a sogra. E, na ilustração de pureza, inocência, fidelidade e lealdade, dever e amor, o escritor deseja que os seus leitores percebam a mão de Deus, que cuida, sustenta e provê."[5]

Propósito teológico
A história seria o cenário para mostrar a graça divina salvando uma gentia moabita, de origem tão vergonhosa (Gn 19:30-38), enxertando-a na Aliança, fazendo dela uma ancestral do Messias (Rt 4:13-22; Mt 1:5). Davi teria em sua árvore genealógica Raabe, a prostituta, uma cananita, e Rute, a moabita. “O livro pode servir ainda para firsar que a verdadeira religião é supranacional e não se limita às fronteiras de qualquer país.”[6]

Estrutura do livro
Primeira sugestão de estrutura:
1. A peregrinação de Rute......... Rt 1
2. Encontro de Rute e Boaz........ Rt 2
3. Rute apela a Boaz.............. Rt 3
4. O casamento de Rute com Boaz... Rt 4

Segunda sugestão de estrutura:
1. Introdução: a família de Elimeleque.... 1:1-18
2. A dor e a pobreza de Noemi............. 1:19-22
3. Diálogo: Noemi e Rute.................. 2:1-2
4. Diálogo: Rute e Boaz................... 2:3-17
5. Diálogo: Rute e Noemi.................. 2:18-23
6. Diálogo: Noemi e Rute.................. 3:1-5
7. Diálogo: Rute e Boaz................... 3:6-15
8. Diálogo: Rute e Noemi.................. 3:16-18
9. Processo legal......................... 4:1-2
10.A satisfação de Noemi.................. 4:13-17
11.Genealogia: a família de Davi.......... 4:18-22

Análise do conteúdo
A comentarista Joyce W. Every-Clayton observa que "o livro de Rute relata a história de uma pequena família. Mas uma família é a célula na qual age o Deus da história; como conseqüência, o livro e a história da família de Rute também abordam assuntos de vida nacional e vida religiosa. Porém a ênfase principal não é política, mas pessoal."[7]

Contribuição para Teologia AT
1. Oferece uma prefiguração duma benção maior do porvir: os gentios poderão juntar-se à comunhão de Israel, na condição de se arrependerem e de crerem no Senhor. Rute não seria uma mera exceção, mas se tornaria a regra.[8]
2. A providência maravilhosa e inesperada de Deus é verificada também na inclusão duma gentia na linhagem real do Messias.
3. O parente-redentor serve como um tipo, ou prenúncio do Messias.
4. Um entendimento de ligação entre Jz e Rt é absolutamente indispensável para compreender a mensagem do livro. Rute é mais que um apêndice do livro de Jz (Jz 17-21), mas agora trazendo uma história de graça e amor fiel, não de decadência e infidelidade.

Fatos interessantes
1. Não há a ação sobrenatural divina no decorrer da história, como ocorre em Juízes; Rute é uma das 4 mulheres na genealogia de Jesus (Mt 1:5).
2. Os moabitas eram os descendentes da união incestuosa de Ló com sua filha (Gn 19:33-37).
3. Boaz era filho de Raabe, a prostituta de Jericó (Js 2:1; Mt 1:5). Desta forma Davi, o bisneto de uma moabita, e trisneto de uma cananita, demonstrou mais ainda a graça de Deus.
4. A lei levita do parente-remidor exigia que o parente tomasse a viúva como esposa e desse filhos ao seu falecido irmão (Dt 25:5-10; Lv 25:25-31).[9]
5. Este livro é anualmente lido pelos judeus na Festa de Pentecoste.

Notas:
[1] Edward J. Young, Introdução ao Antigo Testamento, pág. 353.
[2] R. H. Pfeiffer, Introduction to the Old Testament, pág. 718.
[3] Edward Young, Introdução ao Antigo Testamento, pág. 355.
[4] Menahem Mendel Diesendruck, ed., Tora & Meguilot, pág. 658.
[5] David Atkinson, A Mensagem de Rute, págs. 25-26.
[6] Edward J. Young, Introdução ao Antigo Testamento, pág. 355.
[7] Joyce W. Every-Clayton, Em Diálogo com a Bíblia: Rute, pág. 11.
[8] Gleason L. Archer, Jr., Merece Confiança o Antigo Testamento?, págs. 205-206.
[9] Para um estudo mais detalhado do assunto veja Stanley A. Ellisen, Conheça Melhor o Antigo Testamento, pág. 87.

Rev. Ewerton B. Tokashiki