26 dezembro 2015

Johannes Wollebius começa a falar português!

DA IMPORTÂNCIA

O teólogo reformado Johannes Wollebius ainda é desconhecido pela maioria dos leitores brasileiros. Numa busca rápida na internet pode-se perceber que são poucos os textos encontrados em português, quer artigos publicados ou traduzidos acerca deste reformador.[1] O fato é que o período dos séculos XVI e XVII ainda é uma área de pesquisa, em geral, pouco explorada entre os teólogos de nosso país. O Dr Heber C. Campos Jr, dentre os reformados brasileiros, é um pioneiro no desbravamento da produção acadêmica do protestantismo escolástico, inclusive atraindo outros pesquisadores para este amplo campo de estudo. Apesar de ter em minha biblioteca o Compendium Theolociae Christianae[2] de Wollebius desde 2009, foi no módulo “Puritanismo e Protestantismo Escolástico” realizado em 2013 no CPAJ, que interessei em conhecê-lo a fim de produzir um artigo como exigência daquela disciplina. Confesso que fiquei motivado a traduzi-lo após descobrir a sua relevância para entendermos o cenário teológico antecedente a Assembleia de Westminster.

Por que ler Wollebius? John W. Beardslee III oferece em sua introdução uma breve descrição da importância da obra
Johannes Wollebius (1586-1629) nasceu e foi educado em Basiléia, onde se tornou pastor em 1611, e professor de Antigo Testamento e pregador da catedral em 1618. O Compendium Theologicae Christianae foi publicado em 1626, sendo várias vezes, reimpresso em Latim (Basiléia, 1634; Amsterdã, 1638; 1642; Oxford, 1657; Londres, 1760), e foi traduzido para o holandês e inglês. Ernst Bizer quem reeditou o original em nossa geração, poderia agora prevenir-nos contra superestimar a sua importância, concordando com diversos historiadores do século XIX, mas não seria possível negar que seu extenso uso durante o século XVII, a sua brevidade, clareza e fidelidade, não fosse uma positiva expressão característica dos teólogos reformados nos tempos do Sínodo de Dort e que poderia manter esta afirmação concedendo-lhe o título por considera-lo como uma avenida para uma completa descrição do entendimento “ortodoxo” aceito pela Fé Reformada – o “que comumente é ensinado com aceitação em nossas igrejas” e que pode ser encontrado em Voetius, Turretin e igualmente em outros.[3]

Nesta breve nota introdutória algumas informações foram omitidas por Beardslee III que precisam ser acrescidas à importância deste manual de dogmática.[4] Após a sua primeira publicação, em 1626, em Basiléia, ela se tornou em várias universidades reformadas da Europa o livro-texto tanto para dogmática como para o ensino de ética. Assim, o seu Compendium foi um dos mais influentes manuais de dogmática na formação de teólogos no século XVII.

Os teólogos reformados necessitam conhece-lo, em especial, por causa da sua influência sobre os divines da Assembleia de Westminster. Wollebius oferece de modo preciso, conciso e perspicaz várias definições que permanecem na linguagem dos Padrões de Westminster. É fato, que a precisão nas definições e maturidade teológica dos teólogos da Assembleia de Westminster muitíssimo supera a Wollebius, mas, é evidente a sua dívida a ele.

O período do protestantismo escolástico padece de um preconceito negativo que precisa ser revisado. Infelizmente repousa sobre os teólogos do século XVII o estigma de serem áridos e apegados a sutilezas conceituais. Entretanto, uma leitura nos seus escritos, mesmo que superficial, revela algo surpreendente. Em especial porque neste período os puritanos eram homens de marcante piedade, zelosos pela pregação expositiva e a observância da santidade aplicada a todas as esferas da vida e sociedade. Este manual de teologia de Wollebius desmitifica essa deformada caricatura. A sua linguagem é cheia de citações das Escrituras, e por vezes, oferecendo a sua própria tradução dos originais, demonstrando boa exegese, e uma linguagem piedosa na construção de seus argumentos. Há ainda uma preocupação na área da teologia prática, tanto no conteúdo dogmático, como na parte em que ele interpreta e aplica o decálogo. É um excelente sumário da teologia reformada do período do protestantismo escolástico, e isto justificou a sua adoção em várias universidades na Europa no século XVII.

O retorno aos textos clássicos é uma necessidade nestes tempos de reiterado interesse pelo Calvinismo. Diante do perigo de descuidadas redefinições, que por vezes são confusas e imprecisas, torna-se urgente um retorno aos autores clássicos. Termos como Neocalvinismo, Novo Calvinismo, Calvinismo Moderado, dentre outros, representam versões revisionistas, subdivisões ou desvios do tronco principal. Em muitos casos há o real risco de afastamentos, como o Amiraldianismo e Arminianismo, que em seu surgimento alegavam serem intérpretes fiéis da teologia calvinista. É neste aspecto que ler os clássicos é ter acesso aos passos de maturidade que a Igreja Reformada deu em sua imponente jornada na história da teologia, e assim, evitando se perder nestas ramificações distorcidas.


DA TRADUÇÃO

A primeira tradução para a língua inglesa apareceu em 1650. Alexander Ross publicou o Compendium sob o título de Abridgement of Christian Divinitie, em Londres.[5]

A tradução de Beardslee III surgiu em 1965. Ela obteve várias publicações, inclusive por diferentes editoras, todavia, está esgotada. Beardslee III baseou a sua tradução no texto latino, holandês e na versão de Alexander Ross. Esta tradução preserva algumas palavras ou expressões latinas, e obviamente alguns termos tem uso técnico e precisam ser entendidos segundo o uso original.[6] O mesmo ocorre quando Wollebius cita alguma palavra hebraica ou grega. A tradução de Beardslee III é melhor que a de Ross, por ser num inglês moderno, e por oferecer notas explicativas, bem como a sua diagramação torna mais clara a apresentação do conteúdo.

A minha tradução foi realizada a partir do texto de Beardslee III. Todavia, simultaneamente comparei com o texto de Ross, a fim revisar e, quando necessário, acrescentar notas explicativas onde estes tradutores divergiam. Nas poucas vezes em que me deparei com uma aparente discrepância entre ambos, recorri ao texto latino para conferir a exatidão das traduções.[7] Acusei nalgumas notas quais foram as diferentes nuanças na tradução de um ou do outro, bem como outras notas foram adicionadas para explicar personagens ou movimentos da história da teologia. Quando o autor cita a Escritura Sagrada, normalmente uso a versão Almeida Revista e Atualizada [ARA da SBB], a não ser quando o versículo em questão é tradução de Wollebius, ou possuí uma explicação de Beardslee III em algum aspecto gramatical original. Assim, nestes casos para distinguir não uso a sigla ARA a fim de preservar a tradução original em inglês.

Tenho esperança de que o texto se torne acessível ao maior número possível de leitores. Até agora Wollebius é desconhecido pela maioria de nós, e a sua importância igualmente ignorada. Creio que a sua influência outrora sobre os teólogos puritanos do século XVII pode contribuir para um refinamento no pensamento cristão do século XXI. Por isso decidi torná-lo acessível aos que apreciam a teologia reformada em sua fonte, mas que por causa da limitação do idioma, ou acesso ao texto original, são impossibilitados de lê-lo. Sirvamo-nos deste rico legado da teologia reformada.

A minha oração é que o Senhor Deus com a sua rica graça novamente use este precioso livro para fortalecer a fé do seu povo.

NOTAS:
[1] Em inglês também há escassez de pesquisa e produção de artigos sobre a sua pessoa ou obra, sendo R.S. Clark uma das exceções.
[2] O título completo em latim é Compendium Theologiae Christianae Accurata Methodo Sic Adornatum. Doravante apenas Compendium e a indicação da página. A edição mencionada é a publicada pela Baker Book House de 1977.
[3] Veja o prefácio de John W. Beardslee III, Reformed Dogmatics, pp. 10-11.
[4] W. Hadorn, “Wolleb, Johannes” in: Samuel M. Jackson, ed., The New Schaff-Herzog Encyclopedia of Religious Knowledge (Grand Rapids, Baker Book House, 1950), p. 407.
[5] Esta versão se encontra disponível na internet.
[6] Recomendo Richard Muller, Dictionary for Latin and Greek Theological Terms (Baker Books).
[7] Uso o texto latino publicado em Amsterdã, de 1655, disponibilizado digitalmente pela Bayer Staatsbibliothek [Biblioteca Estatal de Bayer].

15 dezembro 2015

Por que devemos ser zelosos no exame de candidatos a membros?

Rev. Ewerton B. Tokashiki

É esperado que a Igreja Visível cresça numericamente. Ela aumentará tanto pelas famílias da aliança e seus descendentes, como por conversões de pessoas que não têm convivência com a igreja local. Este desenvolvimento é resultado do testemunho da grande comissão de Jesus Cristo (Mt 28:18-20). A questão é: como devemos receber os novos membros da igreja? Devemos ser tão criteriosos quanto possível, ou, aceitar uma ampla afirmação de concordância como suficiente para a pública profissão de fé?

ONDE SURGE O PROBLEMA?

As pessoas com potencial de causar problemas, em geral, é resultado de má formação na recepção como membro. A prudência sempre é necessária, entretanto, nem sempre é assim. Não podemos negar que há alguns fatores que motivam o Conselho[1] no recebimento relapso de membros. A primeira causa é a pressa de integrá-los. Há situações em que novos convertidos, ou pessoas procedentes de outra comunidade evangélica desejam ser recebidas com poucos meses de frequência na igreja local. Este é um perigo, porque elas ainda não conhecem a identidade e estrutura da igreja, nem verdadeiramente podem responder as questões no exame público[2] que as vinculará à sua identidade confessional.

Segundo, a falta de um critério claro de recepção de membros. Infelizmente, há Conselhos que não tem um padrão muito definido no preparo e recebimento de novos membros. Essa falha criará um disparate na qualificação, bem como propiciará uma pluralidade doutrinária, e consequentemente resultará em infidelidade confessional. Por isso, a liderança deve planejar o treinamento dos novos membros para evitar possível confusão doutrinário entre os membros.

Terceiro, a falta de compromisso com a identidade confessional. A nossa igreja possuí uma identidade solidamente confessional.[3] Temos documentos que resumidamente expressam a nossa cosmovisão reformada. Entretanto, é possível que no exame a confessionalidade seja deixada de lado. Infelizmente isso pode acontecer nos seguintes casos. Primeiro, por subestimar que o novo membro seja capaz de assimilar o conteúdo da fé reformada. Segundo, por negligenciar a importância do calvinismo para toda a vida cristã. E por último, por desprezar a teologia reformada como parte de sua formação. Essas são perigosas falhas que um Conselho não pode cometer!

A descuidada admissão de membros aumenta a impureza da igreja local. A má formação bem como a recepção de membros heterodoxos fomenta danosos desvios doutrinários e éticos. A recepção de membros não convertidos, ou com falhas teológicas, ou desvios morais de conduta, é a porta para a corrupção de uma denominação inteira. Uma vez aceito como membro, ele tentará fazer com que as suas crenças e falhas morais sejam aceitas. É ele quem deve se modelar à identidade da Igreja de Cristo, e não o contrário.

A pureza doutrinária propicia a formação de pessoas piedosas. Os novos membros devem aprender a viver fielmente para Cristo. A vida cristã abrange uma inteligível obediência do evangelho coerentemente aplicado a todas as esferas da vida.

ALGUMAS PROPOSTAS PARA O EXERCÍCIO DE ZELO COM A PUREZA DA IGREJA

O Conselho da igreja deve adotar um programa para o recebimento de novos membros que envolva. Este treinamento e avaliação pode ser: 1) discipulado; 2) catecúmenos; 3) leituras extraclasse; 4) exame verbal pelo Conselho do candidato. É especificamente neste último ponto que este artigo se concentra. O exame verbal é parte do processo e ele precisa ser respondido satisfatoriamente. As questões devem ser calmamente respondidas com entendimento, sinceridade e verdade.

QUESTÕES DE CONVERSÃO

1. Você poderia explicar resumidamente o que é o evangelho?
2. Quando foi que você começou a entender o evangelho de Cristo Jesus?
3. Há algum momento específico que você fez um pacto/compromisso de seguir a Cristo como o seu Senhor?
4. Você tem certeza da sua salvação?
5. Quais são as evidências que você identifica de que é convertido a Cristo?

QUESTÕES DA VIDA CRISTÃ

1. Você sabe da necessidade de uma ininterrupta prática da oração?
2. Você sabe a oração do Senhor: o Pai nosso?
3. Você se compromete para preservar a verdade e a paz no meio do povo de Deus?
4. Você está convicto da necessidade de mortificar os seus pecados diariamente?
5. Você tem discernimento de como o sexo, dinheiro e poder podem se tornar ídolos em sua vida?
6. Deus usa o sofrimento em sua vida para manifestar o Seu divino amor?
7. Você se rebelaria contra Deus, diante da dor, enfermidades e até mesmo a morte de entes queridos?
8. Você sabe de cor os Dez Mandamentos? Consegue explica-los resumidamente?
9. A salvação é pelo seu esforço de obedecer perfeitamente a Lei de Deus?
10. Você acredita que os Dez Mandamentos são algo somente do Antigo Testamento, ou, nós cristãos devemos obedecê-los como nosso padrão ético?
11. Numa situação de contenda com algum irmão em Cristo, você se compromete em seguir os passos de Mt 18:15-20?
12. Você se compromete em denunciar ou, servir de testemunha, numa situação de disciplina eclesiástica?
13. Você se compromete em orar e apoiar a liderança da igreja local, enquanto ela permanecer fiel ao ensino da Escritura Sagrada?
14. Você entende a necessidade de respeitar a autoridade da liderança da igreja?
15. Você está comprometido em viver tudo para a glória de Deus?
16. Você anseia viver diante de Deus em tudo o que pensa, fala e faz?
17. Se você um dia se mudar para outra cidade procurará congregar noutra igreja reformada que seja comprometida com a centralidade da Escritura e submissa ao senhorio de Jesus Cristo?
18. Residindo numa localidade que não exista nenhuma igreja reformada, você se compromete de iniciar um grupo de reunião em sua residência?

QUESTÕES FAMILIARES

1. Você entende que o namoro e casamento devem ser no Senhor, isto é, somente com outra pessoa que vive no pacto com Deus? Você entende que namorar ou casar com uma pessoa não convertida é uma decisão pecaminosa?
2. Você entende a necessidade de evitar a lascívia, a fornicação e qualquer imoralidade sexual durante o período antecedente ao casamento?
3. Você entende que o divórcio é algo odioso a Deus e indesejável para um cristão?
4. Você entende o seu dever de discipular os seus filhos no puro e completo evangelho de Cristo, ajudando-os a formar uma cosmovisão cristã para todas as esferas da vida?
5. Você entende o seu dever de disciplinar os seus filhos conforme o ensino das Escrituras?
6. Você sabe do seu dever de proteger os seus filhos de predadores sexuais?
7. Você sabe do seu dever de advertir os seus filhos de más companhias?
8. Você sabe do seu dever de instruir os seus filhos a discernirem quanto ao que veem na TV, acessam na internet, redes sociais e mídia em geral?

QUESTÕES DE TESTEMUNHO PÚBLICO

1. O que a sua família pensa da sua decisão de tornar-se membro desta igreja?
2. Os seus amigos e conhecidos sabem que você é um cristão?
3. Você se compromete, se necessário, abrir as portas de sua casa para a implantação de uma nova congregação?
4. Você ora para que Deus te dê discernimento de que pessoas Ele quer que você evangelize?
5. Você está comprometido com a grande comissão de Cristo: fazer discípulos?
6. Você está decidido a viver o evangelho em suas conversações, pensamentos e atitudes?
7. Você está disposto a auxiliar os pobres e necessitados, com discernimento, quando for possível e realmente necessário?
8. Você sabe que deve usar com moderação e sem desperdício os bens e o sustento que Deus te dá, de modo a não se tornar inadimplente?
9. Você entende que a sua roupa não pode associá-lo ao desiquilíbrio, falta de modéstia, ou a sensualidade, de modo a provocar desejos lascivos, ou escandalizando o próximo?

QUESTÕES DE CULTO

1. Você está comprometido de fazer de toda a sua vida um culto a Deus?
2. Você está convencido de que diariamente deve separar um tempo para orar e meditar na Palavra de Deus?
3. Você está ciente da necessidade de realizar o culto doméstico com regularidade?
4. Você concorda com o princípio regulador do culto? Resumidamente explique.
5. Você crê ser necessário guardar diligentemente o Dia do Senhor?
6. Você se compromete em não deixar de congregar nas reuniões e nos cultos públicos?
7. Você aceita a Pastoral de Liturgia da IPB?
8. Você entende que o culto solene não deve ter danças, coreografias e teatro? Por que?
9. Você entende que é desprezível o uso de imagens, quer pinturas ou esculturas, no culto ao Senhor?
10. Você rejeita o culto ecumênico?

QUESTÕES DOUTRINÁRIAS

1. Você já leu toda a Bíblia?
2. Você se compromete em continuamente estudar a Escritura Sagrada?
3. Para o exame no Conselho você leu atentamente os Padrões de Westminster [Confissão de Fé e Catecismos de Westminster]?
4. Você recebe e subscreve integralmente os Padrões de Westminster como fiel sistematização do ensino das Escrituras?
5. Você crê que os dons revelacionais [línguas, profecias, curas e apostolado] cessaram, por terem cumprido a sua função na história da redenção, e que não são para hoje, porque somente a Escritura Sagrada é a Palavra de Deus?
6. Você se compromete de continuamente ler literatura da fé reformada para o seu amadurecimento cristão?
7. Você se compromete abandonar toda crença e prática que contrarie o claro ensino da Escritura Sagrada?
8. Quantos livros doutrinários você leu desde a sua conversão?

QUESTÕES DO GOVERNO DA IGREJA

1. Você aprendeu e entendeu como se organiza a nossa igreja?
2. Você entendeu que o nosso sistema de governo eclesiástico é conforme o ensino do Novo Testamento?
3. Você se compromete a submeter ao governo dos presbíteros e diáconos enquanto estes forem fiéis ao ensino da Sagrada Escritura?
4. Você se compromete em servir nos cargos e funções que o Conselho poderá designá-lo dentro da estrutura da nossa igreja?
5. Você se compromete de contribuir com seus dízimos e ofertas conforme o ensino da Escritura Sagrada para o sustento da igreja?
6. Caso seja necessário você se submeterá à disciplina e acompanhamento pastoral?
7. Você se compromete com os projetos de crescimento de nossa igreja?

NOTAS:
[1] Este artigo pressupõe um sistema de governo onde há a pluralidade de presbíteros. Entretanto, os problemas diagnosticados aqui são comumente encontrados na maioria das igrejas evangélicas brasileiras.
[2] Refiro às questões para a profissão de fé feitas pelo ministro durante o culto solene.
[3] A Igreja Presbiteriana do Brasil adota os Padrões de Westminster como documentos que representam a sua identidade doutrinária e fiel sistematização do ensino da Escritura Sagrada.

03 dezembro 2015

Como começaram os rumores?

Breve história contra a má impressão sobre João Calvino

Ryan Glomsrud


Os mitos acerca de Calvino persistem nos textos didáticos das escolas, aulas da universidade e ainda nos institutos bíblicos. Apesar da muita informação crítica que hoje temos sobre Calvino, muitos desconhecem a sua verdadeira história. Com ironia Marilynne Robinson expressa o que muitos creem: “nós sabemos que o Calvinismo é uma importante tradição entre nós. Mas a única coisa que sabemos de João Calvino é que era um escocês do século XVIII, de perspectiva excessivamente estrita, como uma fivela em seu chapéu e, possivelmente queimou bruxas ...”. Assim, continuamos no mesmo ano de 500 anos do aniversário do seu nascimento. Para os que não saibam, Calvino foi um francês do século XVI, viveu no exílio de Genebra, Suíça. Os que usavam fivelas eram os puritanos e os de perspectiva excessivamente estrita eram os vitorianos.

Alguns pontuam a Calvino como o sicário da Reforma Protestante, o verdugo dos hereges, ou um pervertido sexual. Com maior frequência lhe atribuem o título de maior herege, alguém que talvez negava a doutrina da Trindade, e quem inventou a sua terrível doutrina da predestinação e reprovação.

Os eruditos recentes sobre Calvino têm mostrado que a grande maioria destes rumores maliciosos procedem de uma única fonte, um indivíduo particular. O seu nome era Jerônimo Bolsec, um refugiado leigo que passou um tempo em Genebra. Ao falhar em seu exame de ordenação nas Igrejas Reformadas em Paris, voltou para a Igreja Católica Romana, e chegou a ser o primeiro biógrafo católico de Calvino. Publicou a sua obra em 1577 e, as histórias que Bolsec narra têm uma larga trajetória na história.

A vida de Bolsec foi intrigante, e nos provê um excelente exemplo de como o gênero de biografias era usado para as polêmicas violentas do século XVI na Europa, utilizando toda forma possível, desde panfletos de papel até tábuas de madeira esculpidas. De acordo com um autor, Bolsec “queria destruir a imagem de Genebra (e Calvino) tão rápido e efetivamente quanto possível.” Então, incluía em sua biografia temas como os seguintes:

1. A influência destrutiva de Calvino sobre a França e seu papel na destruição da paz na Europa.
2. Calvino como “a encarnação de todas as heresias” antes conhecidas na Igreja.
3. Calvino como o sodomita (homossexual) acusado e julgado, quem deveria ser queimado, mas no último momento mudaram a sua sentença ao receber uma marca com um ferro quente no ombro.
4. Calvino como um tirano promíscuo que “se deitado com a maioria das mulheres em Genebra sob o pretexto de dar conselhos pastorais”.
5. Calvino como o único responsável pela execução de Serveto (um mito que tem longa duração). Bolsec não foi o único que “adornou” relatos sobre o caráter de pessoas importantes. Os protestantes encontravam ampla oportunidade para fazer o mesmo com os papas corruptos de sua época, e sem dúvida, nem tudo o que diziam era verdade. Mas parece que algumas das histórias absurdas sobre Calvino perduram mais tempo do que os mitos mitos protestantes sobre a corrupção católica, apesar de que há muitos intérpretes católicos, utilizando métodos críticos de investigação, em que questionam radicalmente A vida de Calvino escrito por Bolsec. Depois de investigar os relatos sobre Calvino, estes autores católicos rejeitam a maioria, senão todos, os mitos a respeito de Calvino, chegando à conclusão que Bolsec inventou suas fontes, e que estava pessoalmente cego por seu profundo ódio contra Calvino.

No caso de Calvino, é proveitoso conhecer a origem da grande maioria dos mitos sobre ele. Com tantas falsas lendas sobre Calvino, quase seria melhor pedir uma moratória das opiniões populares caso não se baseiem na verdade histórica.

Originalmente publicado em Modern Reformation, Jun/Jul, 2009.
Extraído de Nicolás G. Lammé, ed., Reforma Siglo 21 – Boletín teológico de la Confraternidad Latinoamericano de Iglesias Reformadas (Guadalupe, CLIR, Outubro de 2009), pp. 64-66.
Traduzido por Ewerton B. Tokashiki em 3 de Dezembro de 2015.

22 novembro 2015

Breve relato da vida e obra de Matthew Henry

Escrito por Allan M. Harman

Dificilmente há um homem tão conhecido entre os comentaristas bíblicos como Matthew Henry. Desde a publicação de seu primeiro volume (o Pentateuco) em 1706 até o presente, o comentário de Henry foi repetidamente reimpresso, traduzido a outros idiomas, combinado com o comentário de Thomas Scott para formar o comentário de Henry e Scott, ou impresso em formato resumido. Ele tem exercido uma grande influência na formação espiritual de uma multidão de leitores que dele utilizam para devocionais pessoais, ou para preparar-se para o ensino, ou pregação. Destacados líderes cristãos como George Whitefield e William Carey testemunharam da influência que receberam dele.

Para mencionar o caso de Whitefield, que pouco depois de sua conversão, adotou a prática de levantar às cinco da manhã. Ajoelhado ele lia a Bíblia, em seguida o seu Novo Testamento grego e finalmente consultava o comentário de Matthew Henry acerca daquela passagem. Posteriormente, a sua pregação esteve intensamente influenciada pela exposição de Henry. Arnold Dallimore chega ao ponto de dizer que “de tal modo bebeu dos mananciais da exposição bíblica de Matthew Henry que muita de sua expressão pública era pouco mais do que o pensamento do grande comentarista; pensamento que havia chegado a assimilar em sua própria mente e alma, e que se derramava espontaneamente tanto quanto preparava como quando pregava os seus sermões”. Era capaz de recordar citações de Henry, e sua lista de regras para o seu Instituto em Bethesda na Georgia incluía, entre os livros sobre teologia, o comentário de Matthew Henry. Quando escreveu a sua famosa carta a João Wesley sobre o tema da redenção universal, não deu a sua própria explicação de algumas passagens bíblicas, mas remeteu Wesley que lesse aos comentaristas como Ridgely, Edwards e Henry. O seu desejo era que estes tratados pudessem levar Wesley a reconhecer o seu erro.

Mas para a imensa maioria dos leitores a vida de Matthew Henry é algo desconhecido, e há uma falta de valorização crítica de sua obra e ministério. Ao apresentar alguns de seus sermões até agora inéditos, é necessário oferecer um breve relato de sua vida e ministério, junto com uma avaliação dele como pregador assim como comentarista.

Acesse o texto completo [CLIQUE AQUI]

08 outubro 2015

Por que as igrejas deveriam repensar o salário do pregador?

A relação entre o trabalho que um pregador realiza e o dinheiro que ele leva para casa parece ser muito clara para a maioria dos membros de igrejas: “nosso pregador ‘ministra’ à esta igreja – ele visita os doentes, ela aconselha, ele evangeliza, ele prega, ele ensina, ele faz o boletim e tudo o mais que pedirmos a ele – e nós o pagamos para que ele faça estas coisas.” Esta é a forma como a maioria dos cristãos pensam sobre seus pregadores e o “salário” que pagam para ele. Mas será que esta é de fato a forma como deveríamos pensar sobre isto? Pessoalmente, eu creio que não. Aqui estão algumas coisas para considerarmos…

1. Pare de pensar que o Pregador faz o que faz pelo pagamento.

A maioria dos membros de igrejas pensam que os seus pregadores fazem o que fazem porque eles o pagam para fazê-lo. Eu creio que esta é uma forma invertida de se pensar sobre a situação. É muito mais saudável pensar da seguinte forma: “O pregador comprometeu sua vida à proclamação do evangelho e nós o apoiamos financeiramente neste esforço.” Ele não faz o que faz porque vocês dão dinheiro a ele, vocês dão dinheiro a ele porque ele faz o que ele faz.

O Apóstolo Paulo abriu mão do seu direito de coletar apoio financeiro da maioria das igrejas nas quais ele trabalhou, mas ela afirmou que as igrejas deveriam apoiar aqueles que trabalhavam espalhando o evangelho (1 Coríntios 9). A igreja deve sustentar tantos quantos pregadores, professores, evangelistas e missionários ela for capaz. Quando homens querem devotar a vida deles à proclamação do evangelho, nós devemos considerar como nosso privilégio e alegria sustentar estes homens.

2. Pare de pensar que seu pregador faz o que ele faz em seu lugar.

Muitos membros de igrejas pensam em seus pregadores como os ministros (servos) da igreja. Eles consideram como tarefa do ministro fazer o aconselhamento, a visitação, o evangelismo e o ensino da igreja. E quer admitamos ou não muito deste pensamento vem do fato de que nós não queremos fazer este trabalho, pensamos que não temos tempo, então contratamos alguém que faça por nós.

Dizemos coisas do tipo: “Eu não sei como fazer e não tenho tempo para ir no hospital e visitar as pessoas que estão doentes, nem para fazer estudos bíblicos com incrédulos; é para isso que pagamos o pastor.” Mas não poderíamos estar mais errados por esta forma de pensarmos.

Não existe nenhum precedente bíblico para se contratar alguém para fazer a obra que nós deveríamos estar fazendo. De fato, uma das tarefas do pastor é “equipar” os membros da igreja para que eles façam a “obra do ministério” (Efésios 4.11-12). Você não sustenta um pastor para que você possa ser aliviado do trabalho, você sustenta um pastor, em parte, para que ele ajude a te equipar e motivar para a obra que você deve estar fazendo.

É óbvio que ele ajuda a equipar a igreja sendo um bom exemplo de serviço, mas se ele começar a fazer o trabalho por você, ele estará te mimando e não te equipando. Muitos pastores precisam parar de mimar a igreja e começar a equipar a igreja.

3. Pare de pensar que seu pregador pertence a você

Quando uma igreja pensa em seu pregador como empregado dela, ela entendeu errado a situação. O pastor não trabalha para a igreja. Ele não trabalha para os presbíteros. Ele trabalha para o Senhor. Paulo chama os pregadores de “servos do Senhor” (2 Timóteo 2.24), e é isto o que o pregador é, o servo do Senhor. Não o nosso servo.

É claro que o pregador e seu trabalho estão sob a supervisão dos presbíteros da igreja. Os presbíteros pastoreiam o pregador, ajudando-o a balancear o trabalho que ele realiza especificamente para a igreja local e o trabalho que ele realiza pelo Reino. Um pregador pode decidir junto com seus presbíteros que seu trabalho precisa focar primariamente – ou até mesmo exclusivamente – na obra local; enquanto outro pregador e seus presbíteros podem decidir focar as habilidades do pregador mais em espalhar o evangelho ao redor do mundo.

Mas é vergonhoso quando uma igreja acredita que o pregador pertence a eles e se ressentem pelo tempo que ele investe pregando e ensinando em outros lugares.

4. Deixe seu pregador ser um membro de sua igreja

Quando as igrejas pensam que seus pastores são empregados que pertencem a eles, elas com frequência falham ao não tratá-los como co-membros de igreja. Nossos pregadores precisam ser capazes de ter comunhão, aprender, confessar seus pecados e dificuldades, serem encorajados, aconselhados e ter todos os benefícios que desfrutamos como membros de uma família da fé. Mas muitas vezes nós negamos estas bençãos a eles porque os tratamos como nossos empregados.

Considere algumas destas questões:

O pregador está sempre ensinando na Escola Bíblica Dominical, ou vocês deixam que ele seja o aluno algumas vezes?
Você espera que seu pregador seja sempre quem estará ensinando, aconselhando e encorajando você, ou algumas vezes você oferece a ele os seus ouvidos?
O seu pregador se sente como um membro da sua igreja ou como um empregado da sua igreja?
Conclusão

O ponto central é este, temos que parar de pensar que o dinheiro que damos ao nosso pregador faz com que ele tenha uma dívida com a gente. Ao invés disto, devemos considerar nosso privilégio podermos sustentar homens que fiel e diligentemente proclamam a mensagem do evangelho em nossa igreja ou ao redor do mundo. Devemos encoraja-los de todas as formas que pudermos na obra que eles realizam.

Wes McAdams

Extraído do Blog REVIVE.

27 setembro 2015

Intoxicação teológica e dúvidas sinceras

Após o almoço olhando as postagens nas redes sociais, aparece a seguinte conversa:[1]

Jovem teólogo:[2]
Boa tarde. Irmão, é que eu estou passando por um momento intelectualmente complicado.
Pode me ajudar?

Eu:
Se possível, sim

Jovem teólogo:
Sou cristão há 5 anos, tenho 19. Creio nas doutrinas da Graça, o calvinismo. Só que nos últimos muitos meses, eu tenho visto tanta contradição entre doutrinas, nas próprias igrejas... Li matérias de que a Bíblia que temos em mãos é cópia de cópia de cópia, por isso seria adulterada. Vi trechos e textos que firmam que YaHVeH pode ser uma mistura de deuses pagãos. E tenho me sentido inclinado ao agnosticismo... Estou confuso e cansado, irmão.

Eu:
Peço que considere algumas ideias. Primeiro, creio que você precisa ler a Escritura e confiar no testemunho interno do Espírito Santo, que testifica ser a Bíblia a Palavra de Deus. Você está fraco na fé. O alimento da fé é a Escritura, nutra-se dela. Segundo, as teorias críticas foram produzidas por estudiosos ímpios e refletem a sua incrédula rebeldia. São ideias altamente venenosas. Mas existe excelente antídoto para neutralizar os seus efeitos nocivos. Terceiro, estude autores que comprometidos com a verdade, produzem textos bem pesquisados, seriamente escritos para promover vigor e fortalecer uma cosmovisão coerentemente cristã. Quarto, a dúvida é saudável quando me desafia a conhecer a verdade. Se a dúvida induz à incredulidade ou ao agnosticismo, então, ela apenas está revelando uma reação pecaminosa do seu coração. Aconselho, no amor de Cristo, que se arrependa! Duvide de si mesmo, questione a sua sabedoria, pergunte-se seriamente se os pensamentos que estão te afastando do verdadeiro Deus, se, de fato, são verdadeiros. E, por último, tenha um mentor teológico que te oriente em suas leituras. De certa forma, ler é alimentar-se. A questão é se você está se nutrindo, ou se intoxicando. Oro para que este momento ruim passe. Se precisar de algo mais pode consultar-me. No amor e temor de Cristo, o nosso Redentor.

Jovem teólogo:
Certo, vou reler isto que o senhor me disse e refletir... Desde já eu agradeço, de verdade, me deu uma resposta diferente da maioria.
Deus abençoe. Certo, eu agradeço de verdade por sua ajuda.
Obrigado por estar disponível.


NOTAS:
[1] O texto é o resultado de uma conversa que tive com um jovem que leu teologia liberal.
[2] A sua identidade será preservada. Pessoalmente não o conheço.

02 junho 2015

O calvinismo, a política e a Bíblia - H. Henry Meeter

Começaremos o nosso estudo dos princípios do calvinismo quanto à esfera política fazendo uma breve introdução histórica. Afirmam, às vezes, que o calvinismo pode ser bom como sistema teológico, mas que aparte de certas verdades gerais sobre a soberania de Deus em todas as esferas da vida e ao que se acrescente a obediência os cidadãos a seu governo, o calvinismo não tem um programa político a oferecer. Mantém-se que o calvinismo nunca chegou a desenvolver um sistema político próprio. E, em casos em que se chega a admitir tal possibilidade, então, afirma-se que este sistema consiste em teorias meramente abstratas que nunca foram provadas no plano político, de maneira que, não se pode saber se realmente são funcionais.

RESUMO HISTÓRICO DA POSIÇÃO CALVINISTA EM RELAÇÃO À POLÍTICA

Àqueles que sustentam tais opiniões, o estudo da história política do calvinismo lhe reservará grandes surpresas. Assim, não somente o calvinismo desenvolveu princípios políticos próprios, senão que diversas foram as teorias políticas que se estruturaram sobre estes princípios, e igualmente aplicadas em diferentes países da história moderna. Quem se der ao trabalho de examinar, por exemplo, o índice do livro de história das teorias políticas do Dr W.A. Dunning, professor de história e filosofia política na Universidade de Columbia, e que leva o título: Uma História das Teorias Políticas, não tardará em perceber tão importante lugar que estas teorias políticas ocupam e que, em parte ou na sua totalidade, deve a sua origem ao calvinismo. Uma das causas pelas quais hoje em dia não se sabe muito dos pontos de vista calvinista sobre a política, há que busca-la no fato de que ultimamente o mundo inglês mostra pouca simpatia pelas perspectivas políticas que se baseiam na soberania de Deus e nos princípios da Escritura. Consequentemente, se estas perspectivas ocupassem de novo um primeiro plano, pesa sobre os calvinistas a missão de fazê-las conhecidas.

Continue a leitura do texto completo [ AQUI ]


Extraído de H. Henry Meeter, La Iglesia y el Estado (Grand Rapids, TELL, 1963), pp. 93-101. Este livro originalmente foi publicado sob o título de THE BASIC IDEAS OF CALVINISM.

Traduzido por Rev. Ewerton B. Tokashiki
2 de Junho de 2015.

30 maio 2015

O calvinismo e a cultura - H. Henry Meeter

O dicionário define a palavra cultura como “o ato de cultivar, ou o resultado desta cultivação.” A continuação explica o que se entende por esta cultivação: implica educação, qualquer disciplina ou desenvolvimento que se traduza num melhoramento – seja nas plantas, nos animais ou nos seres humanos -. Dai que se pode falar da “cultura das plantas, das flores, das abelhas”, etc. Todavia, num sentido estrito o termo cultura se aplica à cultura humana, e em referência a “qualquer cultivo dentro da raça humana que resulte no melhoramento, esclarecimento e disciplina, e que se adquire pela educação moral e mental, pela civilização, por uma superação dos usos e costumes, etc.”

A palavra é de uma significação muito ampla. Nós a usarmos, na maioria dos casos, em sua significação restrita e referida somente aos seres humanos. Mas, ainda aqui a palavra é susceptível de diferentes significações. Para alguns a palavra não vem a significar mais do que um mero refinamento. Assim quando alguém começa a trabalhar num escritório, pelo contato com a sociedade que o rodeia, adquire certo grau de refinamento, aprende algumas expressões seletas, desenvolve modos agradáveis e se veste segundo a última moda. Esta pessoa será catalogada como culta.

LEIA O TEXTO COMPLETO [ AQUI ]


Extraído de H. Henry Meeter, La Iglesia y el Estado (Grand Rapids, TELL, 1963), pp. 75-91. Este livro originalmente foi publicado sob o título de THE BASIC IDEAS OF CALVINISM.

Traduzido por Rev. Ewerton B. Tokashiki
30 de Maio de 2015.

06 maio 2015

O Princípio Regulador de Culto é o Princípio Fundamental do Protestantismo

“Então, aqui temos o princípio [de culto] tingido com o sangue de nossos antepassados puritanos - tanto os pactuantes [escoceses] como os huguenotes [franceses] - o que não é ordenado, explícito ou implicitamente nas Escrituras, é proibido para a Igreja. Ela não pode ditar nova doutrina, bem como lhe é permitido fazer novas leis, ou ordenar que hajam novas formas de governo, e nem pode inventar novos modelos de culto. Esta é apenas uma declaração de um princípio fundamental do Protestantismo para distingui-lo do Racionalismo de um lado e, por outro do Catolicismo Romano - que as Escrituras, como a palavra de Cristo, são a regra completa e final da nossa fé e dever. Elas são completas, uma vez que elas fornecem tão perfeitamente uma provisão tanto para o espiritual, assim como a natureza para o desenvolvimento físico do homem, e, portanto, exclui todas as outras regras como desnecessárias e supérfluas. Elas são final porque, sendo a Palavra de Deus, elas devem pronunciar infalível e supremamente sobre todas as questões relativas à fé e prática religiosa. O dever da Igreja, consequentemente, é conformar-se estritamente à palavra divina, e sua culpa e perigo é de apartar-se dela, e isto parece ter evidente clareza. Mas, os princípios mais claros, através da cegueira, falibilidade e da perversidade da mente humana, frequentemente provam-se inoperantes na experiência real; e, a história da Igreja fornece lamentáveis provas de que a verdade reguladora da integridade e supremacia das Escrituras não constitui exceção a esta observação.”

—John L. Girardeau (1825-1898) “The Discretionary Power of the Church


Extraído de The Heidelblog acessado em 6 de Maio de 2015.

07 abril 2015

Por que não existem calvinistas pacifistas?

Thomas S. Kidd

Por que tão poucos cristãos reformados figuram entre os pacifistas? Uma leitura rápida dos ensinos de Jesus parece encorajar uma interpretação pacifista, ao menos no nível cristão mais individual. Tal como a conhecida declaração: “... não resistais ao perverso; mas, a qualquer que te ferir na face direita, volta-lhe também a outra” (Mt 5.39). Ainda assim, a tradição pacifista tem muito maior influência nos anabatistas, e entre católicos e protestantes liberais, do que sobre os cristãos reformados.

Se a palavra de Deus é a autoridade máxima de fé e prática, é desejável que perguntemos a razão dos protestantes reformados serem inclinados a não serem pacifistas. Mesmo que minhas respostas sobre um assunto tão vasto não vá além das tentativas, eu arrisco duas razões principais: uma admirável e, outra problemática.

Abordagem bíblica

A primeira razão é que os cristãos reformados tradicionalmente são cautelosos em realçar qualquer passagem da Escritura isoladamente, e são inclinados a ler (mesmo de forma imperfeita) a Bíblia como um todo. Cristãos pacifistas são, às vezes, como eles mesmos confessam, leitores do tipo “ênfase em vermelho”, versões bíblicas que dão destaque aos ensinos de Jesus no campo da ética. Por vezes, isso implica, até involuntariamente, que outras passagens da Escritura – como a história das guerras dos israelitas contra os cananeus – não tenham necessariamente a mesma autoridade que os demais ensinos de Jesus.

Ao mesmo tempo que os cristãos reformados jamais aconselhariam negligenciar os ensinos de Jesus, rejeitam que algumas passagens da Escritura possuem certa precedência sobre outras, ou, que tais passagens sejam contraditórias. Portanto, por mais que seja difícil explicar, cristãos reformados já partem da premissa de que o ensino de Cristo sobre não retaliação de alguma forma está conectado aos israelitas passando ao fio da espada homens, mulheres e crianças. Dado que admitimos a perfeita inspiração das Escrituras, bem como a suficiência delas como guia nos caminhos de Deus, tal correta premissa é que de fato deve alicerçar nossa interpretação.

Igualmente, cristãos reformados tendem a ver certa continuidade entre Antigo e Novo Testamento. Mesmo que Israel e a Igreja sejam entidades distintas, eles sustentam que há semelhanças na forma como Deus se relacionava com Israel e a forma como Ele se relaciona com a Igreja. Portanto, se Deus por vezes ordenava que Israel fizesse manobras militares e conquistasse territórios, não é disparate pensar que a Igreja também seja convocada por Deus a atos semelhantes sob cujo governo civil ela eventualmente esteja.

Passado sombrio

É onde repousa o fator mais problemático para a ausência de uma tradição pacifista entre os reformados. Cristãos reformados se mostraram em várias ocasiões muito à vontade com a violência sob chancela estatal. Desde a reforma, muitos protestantes têm visto governos, tronos e exércitos como detentores de um importante papel no avanço do Reino. Se alguém acredita na providência, então a agenda das nações de alguma forma cumpre o plano de Deus para a humanidade. Porém, os cristãos reformados poderiam tomar emprestado um pouco do pessimismo de outros cristãos, como os anabatistas (menonitas e outros), ou de teólogos como Stanley Hauerwas, profundamente cético quanto às ações estatais e suas intenções militares.

Para citar apenas um episódio do atrelamento ao estado, considere a Nova Inglaterra após a Revolução Gloriosa (1688-1689). A deposição do rei católico romano James II do trono britânico provocou décadas de luta imperial entre os católicos romanos europeus e as forças protestantes. As colônias da Nova Inglaterra foram arrastadas para este conflito, sendo diretamente afetadas, especialmente em lutas cruéis com os vizinhos ao norte do Canadá.

Os anglo-americanos nos primeiros sessenta anos do séc. 18 atribuíram uma enorme importância religiosa ao sucesso do exército britânico bem como à proteção do trono inglês, e tudo em nome da causa protestante. Para eles, significava o trono permanente da Casa de Hanover, do rei protestante George (incluindo, inicialmente, o rei George III. Benjamim Colman, o principal pastor em Boston quando do Grande Avivamento, declarou uma vez que para os da Nova Inglaterra “a adesão à dinastia protestante da Casa de Hanover é a nossa fidelidade a Cristo e à sua santa religião”. Endossar o rei “é” nossa fidelidade a Cristo? Se esse tipo de pronunciamento cívico-religioso não lhe faz remexer na cadeira, você não está pensando claramente sobre as nossas prioridades como cristãos.

Claro que muitos calvinistas reprovaram as conseqüências da guerra e da agressão imperial britânica, mas estes ficaram muitas vezes às margens do poder estatal. Os batistas perseguidos na América colonial tardia ou os índios convertidos durante o Grande Avivamento tinham uma visão bem atenuada da causa patriótica quando da Revolução Americana. Eles haviam sofrido nas mãos dos mesmos homens que agora solicitavam que empunhassem armas contra os britânicos. Os principais pastores batistas Isaac Backus e James Manning não demonstraram zelo marcial quando as primeiras batalhas da Revolução Americana ocorreram. Em lugar disso, lamentaram que o conflito contribuísse para sufocar um avivamento recém-iniciado na Nova Inglaterra: “Oh horrenda batalha” lamentaram. “Como é contrária ao espírito de Cristo.”

O renomado pastor batista calvinista, Charles Spurgeon, registrou preocupações semelhantes para com a exploração colonial britânica no século XIX. Mas apesar da sonoridade pacifista de suas citações, Spurgeon parece não ter abraçado completamente a causa anti-imperial. Reagindo a uma rebelião na Índia em 1857, Spurgeon fez alguns comentários que retirados de seu contexto, permitiriam rotulá-lo como um pacifista. “há muito tempo vejo a guerra como um crime gigantesco”, diz ele, “desde muito tempo considero todas as batalhas apenas como assassinato em larga escala”. Ainda assim ele cita Rm 13, observando que a autoridade não traz a espada em vão. “Desta vez”, ele disse, “eu, como homem pacífico, seguidor do Salvador Pacífico, recomendo a guerra”. Ele via, nos rebeldes, assassinos criminosos que deveriam receber a justa punição do Estado.

Ceticismo moderado e apoio consternado

Sou um cristão reformado evangélico, e não sou pacifista. Não vejo nenhuma exigência pacifista consistente na Escritura, especialmente para com governos e mandatários. Mas os cristãos reformados poderiam usar de mais ceticismo a respeito da prudência e valor de uma guerra, e das reivindicações da nação onde vivem.

Devemos orar pela sabedoria dos líderes, e apoiar com certo pesar guerras quando estas atendem os padrões de uma causa justa (devem ser limitadas, contra-ataque, defesa, etc.) Em lugar disso, os cristãos reformados e evangélicos americanos em geral, algumas vezes se comportam mais como zelosos guerrilheiros, por crer que sua nação está perfeitamente levando a adiante os propósitos do Reino de Deus.


O articulista Thomas S. Kidd é professor de História na Baylor Universiy e autor de vários livros, entre eles Patrick Henry: First Among Patriots (Basic, 2011) e George Whitefield: America’s Spiritual Founding Father (Yale, 2014).

Extraído de The Gospel Coalition e acessado em 06/04/2015.
Traduzido por Lucas Paulo de Freitas
Revisado por Ewerton B. Tokashiki

05 março 2015

As 7 coisas que você não pode fazer como um relativista moral

Greg Koukl

Então, você decidiu se converter num relativista moral? Que bom para você! O que poderia ser melhor do que fazer o que te pareça correto? O que poderia ser pior do que deixar que outro te diga o que deve ou não fazer? Além do mais, esta é uma das cosmovisões mais fáceis de adoptar: somente deixa os demais em paz, e lhes pede que façam o mesmo consigo, e você nunca terá que voltar a se preocupar se suas ações são boas ou más. De fato, só há sete coisas que não poderá fazer como um relativista moral. Simplesmente siga a estas regras e você será livre de absolutos para sempre!

Regra#1: Os relativistas não podem acusar os outros de fazerem o que é mal.
O relativismo torna impossível criticar o comportamento dos outros porque, em última instância, nega que exista o que se chama atuar mal. Em outras palavras, se você crê que a moral deve ser definida de forma individual, então, jamais poderá julgar as ações alheias. Os relativistas nem sequer podem objetar o racismo em termos morais. Afinal, em que sentido se pode ter a opinião «é algo mal a discriminação racial» se isto vem de alguém que não crê em categoria absoluta de bondade e maldade ética? Com que justificação poderia intervir? Certamente não com os direitos humanos, pois para ele tal coisa não existe. O relativismo é a máxima postura a favor da livre escolha moral, porque aceita todas as decisões pessoais — mesmo que seja a de ser um racista —.

Regra #2: Os relativistas não podem reclamar do problema do mal.
A realidade do mal no mundo é uma das principais objeções que levantam contra a existência de Deus. O argumento é que, se Deus fosse absolutamente poderoso e em última instância bom, então ele eliminaria o mal. Mas o mal existe, a realidade deve corresponder a um destes três cenários possíveis: (1) Deus é demasiadamente fraco para opor-se ao mal; (2) Deus é demasiadamente indiferente como para preocupar-se com o mal; ou (3) Deus simplesmente não existe. Evidentemente, promover qualquer um destes argumentos implica, também, crer no mal, coisa que um relativista não poderia fazer. De fato, nada pode ser qualificado como mal — nem mesmo o Holocausto — porque fazê-lo equivaleria afirmar que existe alguma espécie de regra moral.

Regra #3: Os relativistas não podem culpar, nem aceitar elogios.
Dentro do relativismo os conceitos de elogio e reprovação carecem completamente de sentido porque não há uma regra moral com que se possa julgar se algo deveria ser aplaudido ou condenado. Sem absolutos, nada é realmente mal, deplorável, trágico, ou digno de reprovação. Tampouco podemos dizer que algo seja realmente bom, honroso, nobre, ou digno de elogio. Tudo se perde numa dimensão desconhecida de um vácuo moral. Quase sempre os que dizem ser relativistas se contradizem neste ponto (evadindo a reprovação, mas aceitando de bom tom o elogio), assim, seja cuidadoso!

Regra #4: Os relativistas não podem afirmar que algo é injusto.
Sob o relativismo a justiça é um conceito que não tem sentido algum. Para começar a própria palavra não significa nada: esta sugere que as pessoas merecem um trato igualitário baseado num padrão externo de que está bem, e como o disse em várias oportunidades, os relativistas não podem crer em algo bom e mal. Em segundo lugar, não existe o que chamamos de culpa. A justiça implica castigar aos culpados, e a culpa supõe ter algo que reprovar — o qual, como demostrei, não existe no relativismo —.

Regra #5: Os relativistas não podem fazer progressos morais.
Com o relativismo é impossível progredir moralmente. Os relativistas podem modificar a sua ética pessoal, isso é seguro, mas nunca poderão se transformar em pessoas morais. Uma reforma moral supõe uma espécie de regra de conduta objetiva que sirva como um padrão que se aspira. Todavia, esta regra é exatamente o que os relativistas negam. Sem um caminho melhor não se pode progredir, e além do mais, tampouco há uma motivação para fazê-lo. O relativismo destrói o impulso moral que leva as pessoas a se superarem, pois não há nada «superior» para se alcançar. Para que mudar o seu ponto de vista moral, se o que você tem favorece o seu próprio interesse e, no momento, faz com você se sinta bem?

Regra #6: Os relativistas não podem sustentar discussões morais significativas.
O relativismo torna impossível falar de moral. Do que se poderia falar? Uma discussão ética implica comparar os méritos de dois pontos de vista diferentes para descobrir qual é melhor. Mas, se a moral é completamente relativa e todas as posturas são igualmente válidas, então nenhuma ideologia é melhor do que outra. Nenhuma postura moral pode ser julgada como adequada, deficiente, irracional, inaceitável, ou mesmo bárbara. De fato, se as discussões éticas só tem sentido quando a moral é objetiva, então só se pode ser um relativista consequente vivendo em silêncio. Nem sequer poderia dizer: «é algo mal impor a sua moral a outros».

Regra #7: Os relativistas não podem promover a obrigação de ser tolerantes.
Finalmente, no relativismo não há tolerância porque a obrigação moral de ser tolerante transgride as regras. O princípio da tolerância é frequentemente considerado como uma das virtudes chaves do relativismo. A moral é pessoal e, portanto, deveríamos tolerar os pontos de vista dos demais abstendo-nos de julgar a sua conduta, ou atitude. Todavia, deveria ser óbvio que este princípio caia numa contradição. Se as regras morais não existem, não pode haver uma regra que exija a tolerância como um princípio moral. E de fato, se não há absolutos morais, por que haveríamos de sequer ser tolerantes? Por que não impor a sua moral a outros se é o que você deseja e sua ética pessoal o permite? Somente tenha certeza de não falar quando não puder suportar.


Extraído de http://www.accesodirecto.org/index.php/recursos-cristianos/articulos/siete-cosas-que-no-puedes-hacer-como-un-relativista-moral-greg-koukl/#.VPhoHnzF966 acessado em 5 de Março de 2015.

Traduzido por Rev. Ewerton B. Tokashiki
Pastor da Primeira Igreja Presbiteriana de Porto Velho
Professor de Teologia Sistemática do SPBC-RO.

10 fevereiro 2015

A desobediência civil

Trata-se de uma forma de protesto político, caracterizado pelo ato de transgredir abertamente a lei por motivos de consciência. As campanhas de desobediência civil se organizam por diversas causas, por exemplo, para lutar contra a guerra, a segregação racial, diversos impostos e o aborto. Normalmente estas campanhas transgridem leis relevantes ou desafiam a determinadas instituições. Os métodos de protesto podem consistir em sentar em lugares públicos, marchas, ou protestos ilegais, boicotes a algum imposto ou ataque de manifestantes, por exemplo, a bases militares ou clínicas onde se prática abortos.

A desobediência civil aos poucos difere em geral de outros atos de índole semelhante, ou seja, a objeção de consciência que implica violência, e de outras formas legítimas de protesto. A objeção de consciência nem sempre é ilegal, dado que em certos países se faz provisão legal para este caso. Inclusive quando é ilegal, não se pode ter uma intenção diretamente política; seu interesse primário é a rejeição de envolver-se ativamente na prática do serviço militar. As campanhas violentas não têm gozado de apoio público, nem se submetem ao governo da lei como um todo global. Consequentemente, as campanhas violentas como as que levam a cabo certos ativistas que defendem os direitos dos animais e alguns grupos anti-aborto, se parecem mais com campanhas de insurgência, como as que lançam, em diversas medidas, os movimentos nacionalistas. Por outro lado, o protesto legal, como por exemplo, as manifestações e marchas pacíficas, que não transgridem a lei, formam ocasionalmente parte da vida política e, não suscitam nenhuma questão moral especial. A desobediência civil transgride abertamente a lei para chamar a atenção sobre a injustiça política, ou para mudar uma lei, ou uma política pública. Inclusive quando descumpre a lei, continua submissa ao governo da lei como um todo, e seus praticantes estão dispostos a sofrer a pena legal correspondente como castigo.

As teorias modernas sobre a desobediência civil podem afirmar a sua autoridade baseando-se na tradição cristã. Pedro e os apóstolos quando recusaram não deixar de ensinar no nome de Jesus, argumentaram que “é necessário obedecer a Deus antes que aos homens” (At 5:29). Muito depois, Tomás de Aquino arguiu que a justiça formava parte tão essencial da lei que uma lei injusta não era uma lei, da qual se deduza que não incite à obediência. Todavia, mais frequentemente a igreja ensina com grande cautela o dever dos cidadãos de obedecer a um regime político, inclusive quando é injusto. Ao fazê-lo segue uma clara tendência do pensamento do Novo Testamento (cf. Rm 13:1-7; 1 Pe 2:13-14). Mas há uma série de pontos em que o pensamento cristão alcançou o consenso geral sobre o dever de desobedecer ao Estado e as suas leis, que são as seguintes: 1) quando exige aos crentes que neguem a sua fé em Cristo, ou rejeitem explicitamente ao seu Senhor; 2) quando o Estado exige aos cristãos que participem em ações que são claramente contrárias a sua consciência conformada pelo Cristianismo.

No final dos anos 60 os filósofos políticos dedicaram muita atenção a esta questão e, hoje em dia continuam debatendo-a. Naquela época surgiram dois movimentos que deram relevância a este tema: o movimento dos direitos civis, dirigido por Martin Luther King, e dos protestos contra a guerra do Vietnam. Isto suscita pontos de grande interesse para a teoria política. A sua qualidade paradoxal tem um interesse evidente, mas, mais fundamentalmente, levanta perguntas básicas sobre a natureza da lei e a obediência civil. Naturalmente os diversos filósofos respondem a estas questões de distintas maneiras. Mas, é certo que todos estariam de acordo de que, ainda que a desobediência civil não possa descartar absolutamente em todas as ocasiões, deve estar plenamente justificada. Deve estar baseada numa série de critérios relativamente poderosos. Estes critérios constituiriam um bom ponto de partida para todo o paradigma cristão sobre o tema.

Os critérios que apresentaremos em seguida são deduzidos da natureza da desobediência civil como a expressamos antes: 1) Devem se esgotar, primeiro e completamente, todos os meios constitucionais e democráticos. É muito melhor convencer às pessoas com um argumento democrático. Alguns argumentam que na prática nunca se pode esgotar as possibilidades dos métodos democráticos genuínos e, concluir que praticamente todos os casos da desobediência civil prejudicam a energia e os recursos dos canais democráticos mais corretos [1]. 2) A desobediência civil deveria ser aberta e pública. Deveria submeter-se à prisão e ao castigo, e estar disposta à responsabilizar-se por seus atos ilegais. 3) Deveria optar por métodos não violentos; alguns diriam que deve insistir na não violência. 4) Os atos de desobediência civil devem manifestar um bom conhecimento da lei e em pleno respeito por ela. 5) As ações devem ser proporcionais a sua causa. 6) A desobediência deveria ter um objetivo específico e realista. Não deveria designar, nem abordar-se de modos que resultem politicamente contraproducentes. Sobretudo, continua sendo uma mera forma extrema de protesto e persuasão, e não um modo de aplicar a coerção.

NOTA:
[1] Este contra-argumento deve ser seriamente considerado recordando o fato histórico da Alemanha durante o período antecedente à Segunda Guerra. Os judeus e alemães de oposição nazista foram presos, enquanto que majoritariamente a Alemanha sofria um golpe através de falsas e perigosas promessas, e iludida pela mídia que divulgava a ideologia do Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães. Nota do tradutor.


D.J.E. Attwood, "Desobediencia civil" in: David Atkinson & David H. Field, orgs., Diccionario de Ética y Teología Pastoral (Barcelona, Editorial CLIE, 2004), p. 382.

Deontologia

A deontologia (do grego deon, aquilo que é obrigatório) é, em geral, o estudo da obrigação moral, e em concreto de um tipo específico de teoria da obrigação. Em contraste com as teorias consequencialistas da obrigação, as deontológicas sustentam que os atosnão são bons ou maus devido simplesmente a suas consequências boas ou más. Entretanto, os atos são, ou não, cumprimento do dever e o dever não é determinado plenamente em termos de suas consequências.

As teorias deontológicas diferem no que se refere a qual é o fundamento do dever: para alguns é a vontade de Deus; para outros a racionalidade como tal; para outros os deveres carecem de fundamento, sendo realizados arbitrariamente. As teorias também discrepam sobre até que ponto a obrigação é independente das consequências. Para Kant as consequências eram irrelevantes para a obrigação ("cumpre com o teu dever ainda que o mundo se acabe!"), enquanto que W.D. Ross (1877-1940) defendia que as consequências eram somente um fator entre muitos dos relevantes para a obrigação. As teorias deontológicas foram elaboradas pela congruência com as intuições morais das pessoas normais, incluindo aquela de que "o fim nem sempre justifica os meios". Elas são criticadas para dar a impressão de que a obrigação moral é arbitrária ou inexplicável, e por viciar os incentivos para agir de uma forma moral.


M.T. Nelson, "Deontología" in: David Atkinson & David H. Field, orgs., Diccionario de Ética y Teología Pastoral (Barcelona, Editorial CLIE, 2004), p. 426.

07 fevereiro 2015

A Convenção de Genebra

Esta expressão é usada para se referir a uma série de tratados internacionais que codificaram as regras de guerra. O Comitê Internacional da Cruz Vermelha realizou um papel fundamental nesta missão; este organismo foi fundado em 1863 graças a inspiradora liderança cristã de Jean Henri Dunant (1828-1910).

O primeiro tratado, que firmaram em 1864 dezesseis poderes europeus, centrava-se no cuidado dos soldados enfermos e feridos, a neutralidade do corpo médico, o trato humano dos prisioneiros e a identificação de um emblema distintivo, a Cruz Vermelha, às pessoas e lugares dedicados ao trabalho médico. Estes artigos se extenderam e emendaram numa série de reuniões celebradas em Haya em 1899 e 1977, e em Genebra 1906, 1926, 1949 e 1977. A mais importante destas reuniões foi realizada em 1949, como resposta aos horrores da Segunda Guerra Mundial , e nela se elaborou a mais relevante das Convenções de Genebra.

Os artigos abordaram os seguintes temas: 1) a provisão para o cuidado dos feridos e enfermos na luta em terra; 2) normas para o cuidado dos que resultaram feridos, ou naufragaram no mar; 3) leis que garantiriam o trato justo dos prisioneiros de guerra; e 4) regras que protegiriam os cidadãos dos territórios ocupados, proibindo práticas tais como a deportação, a tomada de bens, a tortura, as represálias coletivas, a destruição injustificada de suas propriedades e a discriminação baseada na raça, na religião ou na nacionalidade. Em 1977, outra conferência complementou esta normativa com dois protocolos adicionais que extendiam a proteção da lei internacional para as guerras de libertação e guerras civis. Mais de 150 países subscreveram estas convenções de 1949, mas muitos não concordaram com os protocolos de 1977.


R.G. Clouse, "Convención de Ginebra" in: David Atkinson & David H. Field, orgs., Diccionario de Ética y Teología Pastoral (Barcelona, Editorial CLIE, 2004), p. 382.

06 janeiro 2015

Blog de tradução de documentos da Reforma do século XVI

Há algum tempo percebia a necessidade de disponibilizar algumas cartas, tratados e documentos dos reformadores do século XVI. O meu público algo primariamente é estudantes de teologia, história e pesquisadores iniciantes que se interessem conhecer o contexto, aspectos pessoais e convicções destes homens. O meu anseio é que eles sejam lidos em seus escritos e não por intérpretes de suas personalidades e pensamentos.

As traduções seguem certa regularidade sem o dever de datas fixas para as postagens. Por enquanto com o auxílio de alguns amigos, temos traduzido estes textos, sendo que assumo a responsabilidade de, quando necessário, revisar a tradução, adicionar notas históricas, e postar no blog.

Desejo uma boa leitura e que retorne sempre que possível para ver as novas postagens. Ajude-nos a divulgar este trabalho a fim de outros estudantes de teologia, e especificamente de história da igreja e história da teologia, possam acessar este material.

Acesse e conheça o blog REFORMADOS DO SÉCULO XVI