31 dezembro 2018

A adoração reformada explicada

Mike Brown e Ewerton B. Tokashiki


O culto semanal de adoração pública é a atividade mais importante na vida cristã.[1] Deus se encontra nele com o seu povo. Ele nos fala em sua Palavra e sacramentos, e nós respondemos em oração, confissão e com cânticos. Ele se inclina para alimentar nossas almas, fortalecer nossa fé e nos edificar como o corpo de Cristo. Estamos prontos para ouvir, receber e para agradá-lo.

Hoje em dia, os cultos de adoração costumam mais agradar a nós mesmos do que a Deus. Tornou-se comum que os atos do culto se concentrem em entreter o público, parecendo mais como concertos de rock e palestras motivacionais, do que a santa adoração do Deus Trino. Mas a Bíblia nos ordena a “oferecer a Deus a adoração aceitável, com reverência e temor, pois o nosso Deus é um fogo consumidor” (Hb 12.28-29).

Numa igreja reformada que pratica o Princípio Regulador do Culto você não encontrará o último modismo dos cultos evangélicos.[2] Não há bandas de rock, efeitos especiais ou pastores contando histórias irreverentes. Em vez disso, encontrará adoração alegre e reverente ao Deus vivo, uma liturgia bíblica e Cristo sendo proclamado a partir de toda a Escritura, em cada ato do culto.


O QUE É LITURGIA?
A palavra “liturgia” refere-se simplesmente à organização da adoração em um serviço público. Toda igreja tem alguma forma de liturgia. A liturgia que você vivencia numa igreja presbiteriana/reformada tem precedentes históricos: cada parte pode ser encontrada nas liturgias da igreja cristã histórica, especialmente naquelas da Reforma do século XVI e dos primeiros pais da igreja.

Mais importante ainda é que a nossa liturgia está totalmente de acordo com a Palavra de Deus e é cuidadosamente planejada para nos conduzir em um diálogo com o nosso Criador e Redentor. É um diálogo em que Deus fala ao seu povo através da sua Palavra e dos sacramentos, e nós respondemos em nossa oração, confissão e canto.

Deus entra nesse diálogo com o seu povo a cada semana no culto público para renovar conosco o seu pacto da graça. Abaixo está uma breve explicação de cada parte da liturgia reformada.


CONVOCAÇÃO À ADORAÇÃO
O culto inicia com o Deus Trino convocando-nos com sua Palavra para adorá-lo com reverência e respeito. Um texto bíblico, muitas vezes um salmo, é lido como uma convocação ao povo de Deus: “Oh, vamos adorar e curvar-nos; ajoelhem-se diante do Senhor nosso Criador!” (Sl 95.6). Ele nos chama para adorá-lo e receber de sua mão bondosa as boas dádivas que Ele fornece às nossas almas.

O culto não é uma iniciativa humana, mas Deus nos despertando, convencendo, atraindo, estimulando e promovendo a sua santidade em nós, para que correspondamos ao seu chamado e obedeçamos a sua ordenança de adorá-lo. Sabemos que “Deus é quem efetua em vós tanto o querer como o realizar, segundo a sua boa vontade” (Fp 2.13). E Agostinho escreveu que “fizeste-nos para ti e inquieto está nosso coração enquanto não repousa em ti”.


INVOCAÇÃO
Tendo ouvido o chamado de Deus para adorá-lo, respondemos em oração. Como o povo que possui um pacto com Deus invocamos o nome de Deus, confessando que “o nosso auxílio está no nome do Senhor, que fez o céu e a terra” (Sl 124.8).

Esta é a resposta de Deus ao seu povo invocando seu nome. Ele anuncia a sua graça e paz a todos que vêm a ele através de Jesus Cristo. Como ministro designado de Deus, o ministro levanta as mãos e anuncia a bênção de Deus em sua Palavra: “Graça a ti e paz da parte de Deus nosso Pai e do Senhor Jesus Cristo” (Rm 1.7).


LEITURA DA LEI
Deus nos revela a sua vontade para nossas vidas em sua lei, isto é, os mandamentos das Escrituras. A lei de Deus nos diz claramente como devemos viver e o que Deus espera de nós. Também revela a santidade de Deus, bem como a nossa pecaminosidade, pois “se não fosse pela lei, eu não teria conhecido o pecado” (Rm 7.7).


CONFISSÃO DE PECADO
Tendo ouvido Deus falar conosco em sua lei, somos levados a confessar nossos pecados. Em primeiro lugar, fazemos isso pública e coletivamente, confessando a Deus como povo, “contra ti somente pequei e fiz o que é mal diante dos teus olhos” (Sl 51.4). Então, fazemos isso em silêncio, confessando nossos próprios pecados.


LEITURA DO EVANGELHO
Somos incapazes de obedecer perfeitamente a lei de Deus como Ele requer, por isso, tornamo-nos merecedores de sua ira. Todavia, “não há mais condenação para aqueles que estão em Cristo Jesus” (Rm 8.1). A leitura de textos com a instrução, promessas e a certeza da salvação para os que creem em Cristo Jesus complementam, logicamente, a leitura da lei de Deus.


DECLARAÇÃO DE PERDÃO
Tendo confessado nossos pecados a Deus, ouvimos o alegre anúncio de sua promessa de que “se confessarmos os nossos pecados, Ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça” (1Jo 1.9). Como o embaixador de Cristo, o ministro declara o perdão a todos os que confiam em Cristo e se arrependem de seus pecados.


CONFISSÃO DE FÉ
Confessamos juntos o Credo dos Apóstolos, o Niceno ou Calcedônio, ou um parágrafo da Confissão de Westminster, ou questão do Catecismo de Heidelberg. Fazemos isso não apenas para sermos instruídos na fé cristã, mas também como uma oração a Deus na qual declaramos estar unidos na verdade que ele revelou: “Um só Senhor, uma só fé, um só batismo, um só Deus e Pai de tudo ”(Ef 4.5-6). Os credos e confissões resumem com beleza essa verdade revelada.


ORAÇÃO PASTORAL
O ministro ora em favor da congregação, trazendo “o fruto dos lábios que reconhecem o seu nome” (Hb 13.15), bem como a intercessão pela igreja e pelo mundo. Este ato pode ser concluído com a congregação recitando juntos a oração do Senhor.


CÂNTICOS DE LOUVOR
Tendo ouvido a bênção de Deus, nós respondemos levantando nossas vozes para ele e cantando um salmo, um hino ou cântico bíblico. Como está ordenado: “Vinde à sua presença cantando!” (Sl 100.2). As palavras que cantamos ao Senhor são cuidadosamente escolhidas, pois o conteúdo de cada canção deve estar de acordo com as Escrituras e deve nos proporcionar uma compreensão mais profunda de Deus.


OFERTÓRIO
Nós respondemos à graça de Deus com nossas ofertas e dízimos, que são para a propagação do evangelho no mundo e para a formação de discípulos. Fazemos isto como um ato de adoração, sabendo que “cada um contribua segundo tiver proposto no coração, não com tristeza ou por necessidade, porque Deus ama a quem dá com alegria” (2 Cor 9.7).


CÂNTICO DE PREPARAÇÃO
Cantamos em preparação para a refeição que Deus está prestes a nos dar para as nossas almas na pregação de sua Palavra. Cantamos outro salmo, cântico ou hino, essencialmente dizendo ao Senhor: “A tua palavra é lâmpada para os meus pés e luz para o meu caminho” (Sl 119.105).


ORAÇÃO POR ILUMINAÇÃO
Chamamos o Senhor novamente, desta vez pedindo-lhe para que nos dê “o Espírito de sabedoria e de revelação no conhecimento dele, tendo os olhos de nossos corações iluminados, que possamos saber qual é a esperança que Ele nos chamou, quais são as riquezas de sua herança gloriosa nos santos, e qual é a imensurável grandeza de seu poder em relação a nós, os que cremos” (Ef 1.17-19).


O SERMÃO
Tendo pedido a Deus que abra os nossos ouvidos e corações para recebermos a sua Palavra, nós o ouvimos falar enquanto a sua Palavra é lida. Igualmente - “a leitura pública da Escritura” (1Tm 4.13) - é um ato de adoração.

Deus continua a falar enquanto a sua Palavra é explicada e proclamada. Como o apóstolo Paulo disse ao pastor Timóteo: “Prega a Palavra, insta, quer seja oportuno, quer não, corrige, repreende, exorta com toda a longanimidade e doutrina. Pois haverá tempo em que não suportarão a sã doutrina; pelo contrário, cercar-se-ão de mestres segundo as suas próprias cobiças, como que sentindo coceira nos ouvidos; e se recusarão a dar ouvidos à verdade, entregando-se às fábulas” (2Tm 4.2-4). O ministro faz uma exposição fiel do texto, que finalmente nos chama ao arrependimento do pecado e para a fé em Cristo.


CEIA DO SENHOR
Tendo ouvido uma breve instrução da nossa aliança de Deus em sua Palavra, agora nos reunimos com Ele em uma refeição pactual. Como a Palavra pregada nos prometeu o favor de Deus, em Cristo, assim também nosso Pai celestial acrescenta esta confirmação visível de sua promessa imutável. Celebramos juntos para comungar e participar do corpo e sangue de Cristo (1Co 10.16). Não acreditamos que os elementos da ceia se transformem, ou contenham o corpo físico de Cristo, mas cremos que, o pão e o vinho permanecem inalterados, e a presença espiritual de Cristo nos comunica graça, por meio deles, para a nossa santificação.


CÂNTICO DE RESPOSTA
Tendo ouvido a Palavra de Cristo e participado no seu corpo e sangue, “deixamos a Palavra de Cristo habitar em nós, ricamente, cantando salmos e hinos e cânticos espirituais, com ações de graças em nossos corações a Deus” (Cl 3.16).


BENÇÃO FINAL
No culto de adoração, o Deus Trino dá a primeira palavra e a palavra final. E ambas são anúncios de sua graça. Com as mãos erguidas, o ministro abençoa o povo de Deus com a Palavra de Deus, que está disponível a todos os que o recebem por meio da fé: “A graça do Senhor Jesus Cristo, o amor de Deus e a comunhão do Espírito Santo sejam com todos vós” (2Co 13.14).


CÂNTICO DO TRÍPLICE “AMÉM”
Tendo recebido a benção apostólica, cantamos “amém” [que significa “assim seja”] em resposta a cada benção proferida em relação às Pessoas da Trindade.


APRESENTAÇÃO DE VISITANTES E AVISOS
Encerrado o culto solene os visitantes poderão ser apresentados. Deve-se usar de discrição, respeito e alegria pela sua presença, convidando-os a retornar mais vezes, e a continuarem no conhecimento de Cristo.

Os avisos, de modo apropriado, são entregues para notificar, orientar, ou esclarecer as atividades da agenda da igreja local ou situações urgentes.


NOTAS:
[1] Traduzido e adaptado de http://www.christurc.org/reformed-worship-explained/ . Este é apenas um modelo de liturgia reformada de um culto comum, obviamente, há elementos que foram omitidos como batismo, votos e juramentos de ordenação, etc. A ordem, o modo e outros detalhes de como realizar os elementos do culto são chamados de circunstâncias do culto, e devem ser decididos pelo pastor junto aos presbíteros. Barry Gritters observa que “a pregação está no coração e no centro de cada culto de adoração reformado” in: Public Worship ant the Reformed Faith, p. 18. Por isso, o Princípio Regulador do Culto é parte essencial da identidade do culto reformado.
[2] D.G. Buttrick afirma que “o que distingue a adoração Reformada é mais a sua teologia do que a sua prática particular. A tradição presbiteriana/reformada de culto a Deus é para a glória a Deus. O nosso “principal fim” é glorificar a Deus. Assim, a adoração nas igrejas Reformadas tem muitas vezes designada pelo objetivo – o foco é Deus e não os sentimentos religiosas.” D.G. Buttrick, “Worship, Presbyterians and,” in: Mark A. Noll, ed., Dictionary of the Presbyterian & Reformed Tradition in America, p. 281.