Há alguns anos atrás, a era da informática ainda não havia se estabelecido em nossas vidas, nossa linguagem, nossos lazeres, e assim por diante. Desde o primeiro computador, surgido em 1946, até os dias atuais, cada vez mais temos sido fortemente influenciados pela era digital.
Seguindo os passos do computador, veio a internet. No princípio era de uso exclusivo dos militares americanos (isso na década de 60). Depois é que veio a se popularizar. No Brasil, a internet só ganhou notoriedade em 1995 pela iniciativa do Ministério das Telecomunicações e Ministério da Ciência e Tecnologia, quando foi aberta ao setor privado para exploração comercial da população brasileira. A partir daí, ele rapidamente se popularizou, criando conceitos e padrões e uma nova forma de viver e ver o mundo.
Assim como a invenção da impressa por Gutenberg revolucionou a informação, o advento da internet mostra-se cada vez mais que veio para ficar e mudar paradigmas. Cabe uma cuidadosa e séria análise, partindo de uma ética cristã, sobre os benefícios e perigos que a cibercultura trás à sociedade.
É extremamente oportuno e relevante falarmos sobre ética, explorando a cosmovisão reformada sobre o assunto. Tudo é muito veloz no mundo da web. As informações e tecnologias se processam numa velocidade estonteantes. É impressionante que um tema tão atual e relevante como esse, tenha tão pouca notoriedade nos círculos evangélicos. São pouquíssimos os artigos sérios que temos acesso. Da mesma forma, livros e outros impressos ainda não circulam o suficiente, para dar à população uma visão bíblica e reformada sobre o tema.
A falta de material foi um obstáculo a ser superado na elaboração desse trabalho. Montamos uma estratégia de pesquisa partindo de artigos que tratam diretamente sobre internet, mas principalmente, buscamos argumentos na ética reformada para tratar o assunto. Vale dizer que, de qualquer forma, a ética está envolvida na utilização da informação virtual. No momento certo, trataremos qual é a natureza dela.
Ao desenvolver o trabalho, notamos que faltam materiais que tratem do assunto, de forma mais abrangente, nas nossas Escolas Dominicais; não há um controle eficiente por parte das autoridades; as leis não acompanham a velocidade das contravenções virtuais. Há muito a ser feito nesse “novo mundo”. E a igreja deve ser uma voz profética, apontando erros e indicando caminhos.
A INTERNET E A ÉTICA
Seria possível viver sem internet hoje? Não! Pelo menos não a vida nos moldes que conhecemos do mundo atual. Para bem ou mal, ela já se ajustou às necessidades da presente geração. Já se fala e se vive em realidades virtuais. A mídia, a indústria, o comércio e as pessoas têm no mundo virtual uma nova maneira de comprar, vender, informar, se divertir, enfim, se relacionar de uma maneira nova, sem precedentes históricos.
Mais do que nunca, são necessários parâmetros éticos que possam regularizar esse mundo sem fronteiras. E por falar em fronteiras, foram todas removidas em se tratando de web. Hoje falamos de adultério virtual, sexo virtual, jogos ilegais e imorais, pirataria via internet, entre outras formas imorais e ilícitas de se usar a rede. Precisamos mencionar a criação de comunidades virtuais se expressando contra grupos étnicos e religiosos; orkut usado para “passar cola” aos estudantes; ofensas, mensagens racistas, entre outras[1]; fotos em blogs, sites e comunidades sem o consentimento[2] da pessoa, inclusive imagens de crianças e adolescentes, em situações que caracterizam pedofilia; envio de vírus de computador[3]; dar forward para várias pessoas de um boato eletrônico, e assim por diante.
Diante de tantas coisas ilícitas que vemos na internet, algumas pessoas podem usar o conhecido argumento: “... mas todo mundo faz”. Esta é a nossa maior vulnerabilidade hoje. Lembremos que isso não nos exime de responsabilidade legal, e nem moral.
O que motiva uma pessoa a usar ilicitamente e/ou imoralmente a internet? O que está por trás de suas ações[4]? A questão ética! A nossa cultura está profundamente influenciada por uma ética humanista[5]. Nesse tipo de conceito ético, o importante é o prazer pessoal. Sou levado a tomar atitudes, tendo-as como certas ou erradas, apenas se me dão alegria ou não. Construímos mecanismos de defesa, tais como: “não estou fazendo mal a ninguém. Só estou me divertindo”. Ou ainda: “É melhor fazer isso sozinho do que envolver outras pessoas, correndo riscos desnecessários”.
O certo e o errado são vistos a partir de uma perspectiva isenta de absolutos. Assim, certo ou errado é apenas uma questão de visão pessoal da situação em que o indivíduo está envolvido. A ausência de absolutos abre as portas para tolerância e prática de qualquer desvio de conduta. Outras conseqüências poderiam ser mencionadas quando a verdadeira ética é distorcida ou descartada. E nada tem feito isso de forma mais incisiva do que o mundo da internet.
A net também molda os conceitos éticos de seus cibernautas. Assim como a televisão, a exposição freqüente de crianças, adolescentes e jovens a site, chats e comunidades não recomendáveis, sem qualquer critério por parte de pais e responsáveis, acabam por moldar ou reformular os conceitos e pensamentos deles. Terão uma visão de mundo influenciada pelo pluralismo e relativismo que, com certeza marcará sua maneira de se relacionar com Deus e as pessoas.
REDIMINDO A INTERNET COM UMA ÉTICA BÍBLICA-REFORMADA
Ao analisarmos a internet com todos os seus prós e contras, podemos perceber que não dá para usá-la responsavelmente, sem uma base ética totalmente pautada nas Escrituras Sagradas. É claro que tais princípios, em todas as suas dimensões, só podem ser aplicados aos regenerados. Mas será que existem princípios bíblicos gerais aplicáveis a todos, regenerados e não-regenerados? Cremos que sim.
Partimos do princípio que Deus é soberano sobre todas as coisas. É do próprio Deus que emana todo padrão ético e moral, pelo qual todos os homens devem pautar suas vidas. Sabemos que todos os homens estão em pecado. “A Escritura diagnóstica o pecado como uma deformidade universal de natureza humana, em todas as circunstâncias e em todas as pessoas”[6]. Isso implica em dizer que o homem não só é pecador, mas manipula pecaminosamente aquilo que está à sua mão, como por exemplo, a internet. O homem, em seu estado de pecado, não implica em ser moral e eticamente neutro. Ele faz escolhas conscientes e deliberadas e colhe frutos disso.
Ao lidarmos com conceitos bíblicos sobre procedimento de todos os homens, encontramos alguns princípios que norteiam nossa ação em todas as esferas da vida. Neste caso, aplicáveis para uma utilização consciente e digna da internet. Lembrando que são princípios bíblicos, não religiosos.
Primeiro princípio: toda ética parte do próprio Deus. A Bíblia nos diz que Deus faz uma revelação geral de si mesmo e do que Ele espera dos homens. “Estes mostram a norma da lei gravada no seu coração, testemunhando-lhes também a consciência e os seus pensamentos, mutuamente acusando-se ou defendendo-se, no dia em que Deus, por meio de Cristo Jesus, julgar os segredos dos homens, de conformidade com o meu evangelho” (Rm. 2:15, 16). Ele estabelece uma norma geral de atuação moral, que serve a toda criatura. Mesmo os povos ditos como mais primitivos, tem na revelação geral de Deus lições suficientes para agir com lealdade, moralidade e ética para com o próximo e suas coisas. J. I. Packer diz: “Deus revela ativamente esses aspectos de si mesmo a todos os seres humanos, de forma que todos os casos de falha em render graças e servir ao Criador com justiça constituem pecado contra o conhecimento, e negações de ter recebido tal conhecimento não devem ser tomadas seriamente”.[7]
Mesmo aqueles que moldam suas vidas pela Palavra Revelada de Deus, as Escrituras Sagradas, tem na revelação geral de Deus normas claras para agir com ética, com moral e com justiça. Segundo princípio: o homem foi criado à imagem e semelhança de Deus. Ele criou o homem e a mulher, e ambos à sua imagem (Gn. 1.26-30). Há verdades que precisam ser salientadas, como por exemplo: o homem foi feito do pó da terra, que é uma declaração literal (Gn. 2.7). Essa criação a partir do pó da terra indica também as limitações morais do ser humano (Gn. 18.27; Sl. 90.3; 103.14). Porém, essas limitações não tornam o homem incapaz de responder dentro de um nível moral e ético tolerável para o convívio em sociedade. É claro que somente a regeneração efetuada por Cristo no coração humano, pode torná-lo definitivamente em nova criatura.
Essa extensão do pecado na vida do ser humano é conhecida como “depravação total”. Essa doutrina bíblica e reformada não nos dirá que o pecado afetou o homem por completo. Se assim fosse, seríamos equiparados aos demônios. A doutrina reformada nos diz que o pecado afetou todas as áreas do ser humano. Não há parte no homem que tenha ficado santa. Os homens vêm ao mundo pecaminosos por natureza (Sl. 51.5), e tornam-se pecadores pela prática (Rm. 3.10-18).
Mesmo sabendo que o âmago do ser humano foi contaminado pelo pecado (Mc. 7.21-23), e que ele não pode produzir nenhum bem que o justifique diante de Deus, isso não implica dizer que o ser humano não tem condições de viver em padrões morais e éticos aceitáveis diante de Deus e dos homens (Lc. 11.13; Rm. 2.14ss.).
A vida em sociedade, respeitando as autoridades, as pessoas e os limites, é mandamento claro do Senhor para que todos os homens observem. Quando há a quebra desses princípios, instala-se a corrupção do caráter, da moral, dos valores num grau intolerável.
A internet deve funcionar estruturada nesses princípios. Ela não é isenta disso. Como agentes do Reino de Deus, devemos ser os primeiros a insistir nesse padrão. A ética nas pequenas coisas é que dará condições de utilizarmos a web sem fazer dela uma arma que nos leva a desrespeitar a lei dos homens e de Deus.
CONCLUSÃO
É um enorme desafio que temos em tornar esse mundo virtual numa ferramenta útil para a humanidade e para o Reino de Deus. Desafio tão grande quanto as conexões da própria internet. Se não começar pela igreja, quem fará essa revolução?
Não podemos nos contentar em sempre apagar a luz da história. Devemos lançar a luz, e temos como fazer isso. Princípios éticos foram mostrados, os quais podem ser seguidos por todos os homens. Mas sabemos que somente uma completa transformação operada no coração humano, é que pode moldar profundamente a atitude do homem.
Pastores e líderes podem começar ensinando em suas igrejas a como desenvolver princípios bíblicos para lidar com esse mundo virtual. As Escolas Dominicais podem ser momentos para que esse assunto seja debatido. Mais artigos sério e reformado deve ser lançado na rede. Igrejas que têm páginas na Web não podem deixar de instruir as pessoas a como usar a internet. Uma mobilização mais acentuada por parte da igreja, com certeza produzirá os seus frutos, e esses serão colhidos, principalmente, por nossos filhos.
BIBLIOGRAFIA
GEISLER, Norman L. Ética Cristã. São Paulo: Vida Nova, 2003.
LOPES, Augustus Nicodemus. Fundamentos da Ética Cristã. Disponível em: http://www.ipb.org.br/estudos_biblicos/index.php3?id=9
MILNE, Bruce. Estudando as Doutrinas da Bíblia. São Paulo: ABU, 1991.
PACKER, J. I. Teologia Concisa: Síntese dos Fundamentos Históricos da Fé Cristã. São Paulo: Cultura Cristã, 1999.
SANTOS, Valdeci da Silva. Benefícios e desafios da cibercultura. Disponível
em:http://www.ultimato.com.br/?pg=show_artigos&artigo=1233&secMest
re=1291&sec=1322&num_edicao=302
Notas:
[1] Muitas provas obtidas no orkut já estão sendo utilizadas em processos de várias naturezas.
[2] Tal prática constitui crime, segundo a Constituição Federal, artigo 5º, tendo a pessoa direito a indenização.
[3] Código Penal, artigo 163: detenção de um a seis meses, ou multa.
[4] Não trataremos aqui sobre a realidade da natureza caída do homem. Disso falaremos no próximo ponto.
[5] Para mais detalhes, ver o artigo Fundamentos da Ética Cristã, de Augustus Nicodemus.
[6] PACKER, Teologia Concisa, p. 78.
[7] Ibid., p. 9.
Rev. Baltazar Lopes Fernandes
3 comentários:
Caro Pastor Ewerton,parabéns por esse excelente artigo.Se não adquirirmos uma visão reformada sobre a internet corremos sério risco de cairmos em várias tentações advindas da mesma.Deus o abençoe.
oi Luiz
Desculpe-me, mas "honra a quem honra", o artigo não é meu, ele pertence ao Rev. Baltazar L. Fernandes, que é uns dos articulistas do nosso blog.
Obrigado por visitar o nosso blog.
Abraços
Pr Ewerton
parabens por ter publicado o artigo então.Abraços
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