29 março 2012

Hendrikus Berkhof

Escrito por Juan Bosch Navarro

Foi um teólogo reformado holandês, nascido 11 de Junho de 1914, em Appeldorn, e faleceu em 17 de Dezembro de 1995 em Leiderdorp. Originário de uma família reformada com traços marcadamente confessionais. Entre 1925 a 1930 cursou no Instituto Reformado de Amsterdam. Após um ano de estudos teológicos na Universidade de Amsterdam, estuda teologia em Leiden. Interessado em especial pela história da Igreja e os seus dogmas. Pregador em Lemele (Overijsel) em 1938. Graduou-se com a tese titulada “A Teologia de Eusébio de Cesaréia” (1939), sob a direção de J.N. Bakhuizen van der Brink. Após contrair matrimônio com Cornelia van den Berg, em 1941, viu-se comprometido com várias atividades de ocupação. Nesse período começou a escrever a sua primeira investigação, que haveria de atrair a atenção dos círculos eclesiásticos durante anos: A História da Igreja (De Geschiedenis der Kerk). Foi nomeado pregador em Zeist (1940-1950). Terminada a Guerra europeia ingressa como docente em Driebergen, centro de renovação da Igreja Reformada Holandesa. Fundador e Reitor do Seminário de Driebergen (1950), cuja finalidade seria conciliar as diversas “tendências” da Igreja Reformada Holandesa. Delegado de sua Igreja na Assembleia do Conselho Mundial de Igrejas em Amsterdam (1948), do qual será membro do seu Comitê Central durante vários anos (1954-1974). Professor de Teologia Dogmática e Bíblica na Faculdade de Teologia de Leiden (desde 1960). Diretor do Conselho Holandês de Igrejas (1974).

Hendrikus Berkhof foi um dos teólogos mais influentes na tradição calvinista do século XX. A partir de sua tese de doutorado sobre Eusébio de Cesaréia evidencia-se a sua orientação dogmática. A sua postura teológica define-se como a de uma teologia reformada ortodoxa, fortemente influenciada por Karl Barth e, orientada para a ética social. Durante uma breve temporada como estudante em Berlim, demonstra apreço pela Igreja Confessante na Alemanha, comparando a luta liderada por Atanásio ao defender a doutrina trinitária no século IV, com a luta da Igreja Confessante a favor do Evangelho e contra o Nacional Socialismo alemão. Em sua obra A História da Igreja (De Geschiedenis der Kerk) procura não somente descrever, senão que também avaliar o desenvolvimento da teologia cristã. Com ela adquire grande acolhida nos círculos protestantes ortodoxos, mas também desperta certa animosidade entre o protestantismo liberal, que encontra demasiado enfoque dogmático. Da época da guerra data a sua obra A Igreja e o Kaiser (De Kerk en de Keizer), sobre a relação entre a Igreja e o Estado no século IV com claros precedentes para a atual situação. A orientação social de Berkhof como teólogo se faz cada vez mais patente, aceitando que a fé ortodoxa outorga forças renovadoras para a sociedade.

Berkhof intencionou com a fundação do Seminário de Driebergen levar a cabo a aproximação das diferentes tendências doutrinárias dentro do calvinismo, sempre buscando a complementação. Deste período destacam-se duas publicações de grande influência: A crise da ortodoxia moderada (De Crisis der Midderorthodoxie) e Cristo e os poderes (Christus em de machten)[1]. Na primeira se mostra crítico com teologia barthiana. No segundo livro deixa transparecer, uma vez mais, o compromisso de Berkhof pelo ético e o social: a fé em Cristo não somente deve animar a vida do indivíduo, como também a vida da sociedade. Coerentemente, em seu Christus de zin der geschiedenis (Cristo o sentido da história), publicado em 1958, intenta unir duas linhas centrais do seu pensamento, a fé ortodoxa e o seu compromisso com a sociedade: Cristo preenche a sociedade em seu padecimento e na superação do padecimento através da ressurreição. A sua ativa participação nas atividades ecumênicas – seria membro do Comitê Central do Conselho Ecumênico das Igrejas durante vários anos – amplia a sua visão teológica e lhe ajuda a reconciliar distintas tendências.

A década de sessenta sacudiria o pensamento teológico em todo o mundo, o que suporia inclusive para Berkhof relegar em segundo plano a relevância dos aspectos puramente especulativos da teologia e incorporar as ciências humanas na educação teológica. Isto significaria um lento passo evolutivo do clássico calvinismo ortodoxo rumo a um calvinismo ecumênico. É perceptível esta evolução em sua visão dos antigos dogmas da igreja sobre a Trindade, a cristologia e a doutrina da graça. Berkhof gozava, até começo da década de sessenta, de grande confiança entre a maioria ortodoxa de sua Igreja. Isto era devido ao surgimento de sua História da Igreja, onde demonstrou sempre ser um fiel defensor dos pontos de vista ortodoxos. Mas lentamente sua visão de alguns temas centrais, como o da doutrina trinitária, estava evoluindo e se afastava gradativamente da ortodoxia comumente aceita. Nos anos sessenta, Berkhof critica pela primeira vez, em forma expressa, o dogma trinitário em sua obra La doctrina del Espiritu Santo.[2] Apesar de tudo, jamais romperia com os laços da tradição, mas buscou indagar cada vez mais a tradição reformada de maneira crítica. A mudança que se adverte em seu pensamento dá lugar a que seus seguidores dentro da Igreja perdessem a confiança nele e a partir de então, tivesse melhor acolhida entre a minoria progressista.

Também foi Berkhof docente de Teologia Bíblica. A exegese bíblica havia se distanciado desde meados dos anos sessenta das típicas questões teológicas, tornando-se mais histórico-analítica, o que significaria um desafio para a dogmática. Na realidade desde o início cria que a própria Escritura pressupunha uma crítica da dogmática. A sua evolução dogmática se explica pela sua leitura da Bíblia.

A trajetória teológica de Berkhof não conclui, todavia, com a jubilação da docência acadêmica. Os frutos seriam recolhidos durante os próximos dez anos. Em 1985 apareceu a quinta edição de sua Christelijke Geloof[3] e seu novo livro 200 Jahre Theologíe Ein Reisebericht.[4] Na nova edição sobre a doutrina da fé, Berkhof repensa a evolução teológica dos dez anos anteriores e responde às críticas às quais haviam se submetido a sua obra a partir de diversas frentes. “A essência do livro, todavia, permanecia praticamente incólume.” É notório a sua mudança frente à chamada “teologia do processo”, cuja premissa não é que Deus está em perpétuo movimento, motivo que deseja incorporar à humanidade, senão que Deus em si evolui, visão na qual Deus também vem à existência pela humanidade. “Isto, segundo Berkhof, disputa com o pensamento básico da crença cristã no sentido de que Deus em sua soberana liberdade efetua a relação com os homens e realiza o mundo” (E.P. Meijering). Em 200 anos de Teologia é visível a mudança de Berkhof em sua forma de entender a teologia. Se no livro História da Igreja havia enfaticamente insistido que o desenvolvimento da teologia a partir do Iluminismo fora um grave erro e, era função da dogmática do século XX voltar ao essencial da Reforma, em 200 anos de Teologia mostra como a humanidade ao longo dos últimos dois séculos havia se esforçado pra precisamente obter isto. Retifica aqui o seu juízo anterior em torno dos teólogos críticos, mas equilibrado como era, Berkhof tratou também de fazer justiça aos teólogos desse período da história da Igreja, considerados como conservadores e confessionais.[5]

Berkhof é lembrado em ambientes calvinistas como crente, como pregador e como teólogo da sociedade num mundo em mudança a quem observou com assombrosa sensibilidade cristã.[6]

NOTAS:
[1] Este livro foi traduzido e publicado em espanhol. Veja* Hendrikus Berkhof, Cristo y los poderes (Grand Rapids, T.E.L.L., 1985). Nota do tradutor.
[2] Este livro foi traduzido e publicado em espanhol. Veja* Hendrikus Berkhof, La doctrina del Espiritu Santo (Buenos Aires, Editorial La Aurora, 1964). Nota do tradutor.
[3]Christelijke Geloof [A Fé Cristã]. Há a tradução em inglês como Hendrikus Berkhof, Christian Faith – An introduction to the study of the faith (Wm. Eerdmans Publishing Co., ed. rev., 1990). Nota do tradutor.
[4] 200 Jahre Theologie: Ein Reisebericht [200 anos de Teologia: Relação de um trajeto pessoal]. Nota do tradutor.
[5] Uma obra omitida pelo articulista, mas de importância para se avaliar a evolução final do pensamento de Berkhof é o seu livro Introduction to the study of dogmatics (Grand Rapids, Wm. Eerdmans Publishing Co., 1985) originalmente publicado em holandês em 1982. O autor nele apresenta em resumo as premissas e a metodologia e uma síntese de sua teologia comprometidamente com a neo-ortodoxia barthiana. Nota do tradutor.
[6] Por causa do seu distanciamento da histórica ortodoxia calvinista Hendrikus Berkhof dificilmente seria avaliado com tanta simpatia. Ele se manteve dentro da tradição reformada, mas não era confessionalmente comprometido com a teologia, nem subscrevia estritamente as confissões reformadas. Nota do tradutor.

Extraído de Juan Bosch Navarro, Diccionario de teólogos/as contemporáneos (Burgos, Editorial Monte Carmelo, 2004), pp. 124-126.

Traduzido por Rev. Ewerton B. Tokashiki

14 março 2012

O princípio básico do Calvinismo

Escrito por H. Henry Meeter

Todo sistema unificado de pensamento é regido por um, ou vários princípios fundamentais que lhe são inerentes. Também é assim com o calvinismo. No princípio do século XX eruditos de diferentes escolas de opinião estudaram profundamente o gênio do movimento calvinista.[1] Entre estes houve alguns que nem chegaram a prever uma unidade orgânica de sistema e se contentaram tão somente em descobrir uma parcela do mesmo; assim, pois, chegaram a caracterizar ao calvinismo como um sistema religioso cuja característica era o espírito da democracia e a ânsia pela liberdade. Chegou a pensar-se que este sentir provinha do amor pela liberdade tão notável no povo suíço. Outros, cuja atenção centrou-se nos aspectos legais do movimento, assim como na nota de sua autoridade, fizeram disto a nota distintiva e a atribuíram à formação que Calvino recebeu como advogado. Outros creram ver o traço distintivo do calvinismo na maravilhosa ordem e sistematização que como pensamento ordenado ele exibe. Isto atribuí-se ao temperamento francês de Calvino que, como o mais famoso dos franceses, dizem que possuía uma assombrosa habilidade de ordenar e organizar fatos em um vasto sistema. Outros creem que o diferencial calvinista constituiu sua ruptura total com o escolasticismo da Idade Média, considerando assim a Calvino como um avançado liberal religioso de seu tempo. Essa característica foi atribuída à formação humanista que recebeu em sua juventude.

Enquanto estas apreciações contém certa verdade e assinalam algumas facetas distintivas do sistema, nenhuma delas, de per si, merece a distinção de ser considerada a característica predominante do calvinismo e muito menos o seu princípio básico. William Hastie chama a estas apreciações de “conjecturas de pensadores geniosos insuficientemente familiarizados com as condições do problema e cujas conclusões não se deveram a um exame completo e exaustivo das informações disponíveis.”[2] Aqueles que tiverem realizado um estudo exaustivo do problema, coincidirão com R. Seeberg ao dizer que “este francês de educação humanista era, acima de tudo, um cristão evangélico, e toda a sua concepção do mundo, de fato, era determinada pelo seu espírito evangélico.”[3]

O princípio básico radica precisamente na esfera das doutrinas evangélicas dos calvinistas, e nestas doutrinas concebidas, não como meras abstrações, senão como verdades vitais que chegam e condicionam tudo em suas vidas. Podemos afirmar, sem lugar para dúvidas, que o princípio básico concerne e se concentra na doutrina de Deus. Por mais científicas que sejam as descrições que os investigadores nos deem do princípio básico do calvinismo, num ponto todos coincidem com o filósofo W. Dilthey quando disse que o enfoque teológico é característico de todo o movimento calvinista em seus primeiros cento e cinquenta anos, e que durante todo este tempo o calvinista coloca em Deus o centro de seus pensamentos.[4] Um exame das confissões calvinistas, especialmente aquelas da primeira época da Reforma, apresenta ampla evidência sobre o particular.[5]

O pensamento central do calvinismo é, consequentemente, o pensamento de Deus. Como alguém pode notar, assim como o metodista põe em primeiro plano a ideia da salvação do pecador, e o batista o mistério da regeneração, e o luterano a justificação pela fé, e o morávio as feridas de Cristo, e o católico grego ortodoxo o misticismo do Espírito Santo e o romanista a catolicidade da Igreja, assim também o calvinista sempre coloca em primeiro plano o pensamento de Deus.[6] O calvinista não parte de certos interesses sobre o homem – por exemplo, a sua conversão, ou a sua justificação - , senão que o pensamento condicionante é sempre este: dar a Deus os seus direitos; procura levar a termo, como conceito regulador de sua vida, aquela verdade da Escritura que diz: “dele, e por meio dele, e para ele são todas as coisas. A ele seja a glória para sempre.”[7]

Sobre este ponto há ampla unanimidade entre os investigadores do calvinismo. Somente quando se trata de expressar esta ideia numa fórmula específica, surge o desacordo. Alguns sugerem que o atributo da existência própria de Deus (aseitas) – como o atributo mais fundamental que possamos afirmar acerca de Deus -, poderia considerar-se como o princípio fundamental do calvinismo. É duvidoso, todavia, que possamos expressar assim princípio básico já que não é algo em Deus – algum atributo específico de seu Ser – que vem a constituir o fundamento do sistema, senão o próprio Deus. Ademais, o termo “existência de per si”, exclui, ao menos diretamente, toda a relação de Deus com o mundo; relação que é necessária para expressar o princípio formativo da concepção calvinista do mundo. Deus existiria por si, ainda no caso de que não existisse mundo. Deve-se, pois, buscar outra expressão para indicar a relação que Deus mantém com o universo criado. Os termos que melhor parecem indicar esta relação são os da frase: a absoluta soberania de Deus; e, que na frase ainda mais específica se expressaria assim: a absoluta soberania de Deus nas esferas natural e moral.

Para não cair em concepções errôneas é conveniente entender bem em que sentido se usa esta frase: a soberania de Deus. Na mente de uma pessoa comum a frase parece suscitar a ideia de que para o calvinista Deus não é mais que um governante, ou senhor do mundo que promulga leis para criaturas – independentemente de seus atributos de amor e graça. Não deve surpreender-nos que A. Ritschl, entre outros eruditos, tenha interpretado assim o princípio calvinista da soberania de Deus, e o tenha considerado inadequado para expressar o princípio básico para a religião – que deve estruturar-se sobre a ideia do amor de Deus. Todavia, nenhum bom calvinista subscreveria uma concepção tão limitada da soberania de Deus. A soberania, mais do que um atributo, é concebido como uma prerrogativa de Deus. O que o calvinista quer dar a entender quando fala da soberania de Deus, é muito mais amplo que a mera ideia de que Deus é o Ser que promulga e sustenta as leis físicas e morais do universo. Deus não é somente o Supremo Legislador e Promulgador da lei, senão que também é o Supremo nas esferas da verdade, da ciência e da arte – tanto como é na esfera moral, na manifestação de seu amor e sua graça e todos os seus benefícios, e na revelação das leis para a conduta humana e nas que operam na natureza. O calvinista crê que Deus não procede arbitrariamente na distribuição dos seus dons, nem no controle providencial sobre o homem e da natureza. A ordem é a primeira lei do céu. As esferas da verdade e do amor, o plano científico e moral, do mesmo modo que no mundo e na natureza, estão sujeitos a uma lei e a uma ordem. Assim, pois, o calvinista descobre no universo criado por Deus e sustentado por sua providência um sistema maravilhoso de leis harmônicas e ordenadas. O calvinismo é um sistema que abrange o todo; é um sistema em que tudo procede e é determinado por Deus. Nesta distribuição e administração de todas as coisas, Deus permanece supremo: “dEle, e por Ele, e para Ele e para Ele são todas as coisas.”

Quando o termo soberania de Deus é corretamente entendido, não como uma frase meramente legalista, como se Deus fosse tão somente o Supremo Legislador e Criador das leis da natureza, senão no sentido mais rico que temos descrito, nada há que impeça que usemos o termo para indicar o princípio básico do calvinismo. Entendido assim, parece ser que este é precisamente o termo mais indicado para designar a absoluta supremacia de Deus em todas as coisas e, consequentemente, o termo apropriado quando se trata de estruturar um sistema no qual Deus seja o centro de tudo. O grande calvinista B.B. Warfield escreveu: “de tudo isto se desprende o princípio formativo do calvinismo. O calvinista é o homem que vê a Deus detrás de todo fenômeno, e em tudo o que acontece reconhece a mão de Deus operando a sua vontade; o calvinista, em todas as atividades de sua vida, adota uma atitude permanente de oração: o calvinista se entrega completamente à graça de Deus e exclui qualquer traço de autossuficiência em toda a obra da salvação.”[8]

Em outro lugar, o mesmo autor afirma que o princípio básico do calvinismo “há que buscá-lo numa profunda apreensão de Deus em toda a sua majestade; compreensão que necessariamente há de levar a um conhecimento exato da amarga realidade da nossa relação de criaturas e, em particular, da nossa relação como criaturas pecadoras ... . O calvinista é o homem que vê a Deus; e tendo visto a Deus em sua glória, por uma parte, experimenta um sentimento de indignidade para comparecer diante dEle como criatura e muito mais como pecador e, por outro lado, o calvinista está cheio do assombro reverente de que, apesar de tudo, Deus recebe aos pecadores. Aquele que sem reservas crer em Deus e, está convencido de que Deus será o seu Deus em todo o seu pensamento, sentimento e vontade – em toda a ampla gama de suas atividades intelectuais, morais e espirituais - e, através de todas as suas relações individuais, sociais e religiosas, é por força da lógica mais estrita um calvinista.”[9]

NOTAS:
[1] Para uma visão da literatura que existe sobre o tema consulte: The Theology of the Reformed Church in its Fundamental Principles (Edimburg, 1904); H. Voigt, Fundamental Dogmatik (Gothal, 1874); H. Bauke, Die Probleme der Theologie Calvins (Alfred Topelmann, Giessen, 1910); H.H. Meeter, The Fundamental Principle of Calvinism (Grand Rapids, Wm. B. Eerdmans Publishing Co., 1930).
[2] W. Hastie, The Theology of the Reformed Church in its Fundamental Principles (Edinburgh, 1904), p. 142.
[3] Reinhold Seeberg, Lehrbuch der Dogmengeschichte, vol. 2, pp. 558-559. Deve-se levar em conta que o termo evangélico é usado aqui num sentido de compromisso com o evangelho, e não como o é usado em suas diferentes nuanças no contexto europeu, norte-americano ou latino. Nota do tradutor.
[4] W. Dilthey, Die Glaubenslehre der Reformation in Preuss, Jahrb. 1887, p. 80. H. Bauke, op. cit., p. 26.
[5] H.H. Meeter, The Fundamental Principle of Calvinism (Grand Rapids, Wm. Eerdmans Publishing Co., 1930), pp. 51-55.
[6] Mason W. Pressly, Calvinism and Science, artigo em Ev. Repertoire, 1891, p. 662.
[7] Rm 11:36.
[8] B.B. Warfield, Calvin as a Theologian and Calvinism Today em Presbyterian Board of Publication, Philadelphia, 1909, pp. 23-24.
[9] B.B. Warfield, op.cit., pp. 22-23.

Extraído de H. Henry Meeter, La Iglesia y el Estado (Grand Rapids, TELL, 1963), pp. 13-18. Originalmente escrito em inglês sob o título de THE BASIC IDEAS OF CALVINISM.

Traduzido por Rev. Ewerton B. Tokashiki

07 março 2012

O discipulado e a igreja local

O discipulado não é uma atividade em que somente os membros estão comprometidos. Os presbíteros docentes e regentes são chamados para liderar a igreja local, e neste processo de cuidar abrange o acompanhar o rebanho em suas necessidades:
1. Visitar os membros que necessitam de assistência.
2. Resolver os desentendimentos entre os membros.
3. Instar aos disciplinados no sincero arrependimento.
4. Orar por/com todas as famílias da igreja.
5. Consolar os aflitos e necessitados.
6. Ser um pacificador em assuntos controversos.
7. Lembrar aos membros da sua fidelidade ao Senhor Deus.
8. Supervisionar o bom andamento das atividades da igreja.

Além dessas atribuições a liderança deve supervisionar a atividade de discipulado dentro da igreja local. Vimos nesse programa que os princípios transmitidos aos discipuladores são também apresentados aos novos convertidos. A convicção favorece a sequência de toda uma estrutura de discipulado. Em primeiro lugar teremos um grupo de discipuladores formados, porém, o primeiro grupo de novos convertidos formados depois destes, já serão discipulados dentro desta visão, e se engajarão no programa como discipuladores. O objetivo é termo uma igreja discipuladora e não apenas um programa de discipulado. Assim, podemos resumidamente listá-los:

1. Formar discípulos com uma cosmovisão cristã. Treinamos o pensamento com premissas bíblicas. Ensinamos que em todas as esferas de sua vida estamos sob o senhorio de Jesus Cristo e, que devemos viver confiantemente.

2. Apresentar o evangelho aplicado para que vivamos relacionamentos saudáveis. O evangelho precisa estar doutrinariamente claro no entendimento de quem ensina, não há outro evangelho (Gl 1:6-9), nem mesmo se pode ensiná-lo com preferências pessoais, excluindo ou adicionando nele o que não procede da Escritura, nem por ela pode ser claramente provado (At 20:25-31; Ap 22:18-19).

3. Integramos do novo convertido nos relacionamentos e estrutura da igreja local. Transformado pela graça de Deus, o novo convertido torna-se membro da Igreja de Cristo e precisa ser preparado para o batismo, treinado para atuar com os seus dons e testemunhar do evangelho em todas as áreas da sociedade.

4. Acompanhamos o crescimento espiritual do novo convertido rumo à maturidade cristã. O modelo de cristãos que queremos formar aponta para a conformidade de Cristo (Rm 8:29).

O Conselho convicto desta ordenança de Cristo precisa estruturar a igreja de modo que facilite a relação de discipulado. Com isto em mente apresento o esboço de uma estruturada para prover uma igreja discipuladora.

I. CURSO PARA FORMAÇÃO DE DISCIPULADORES
A formação de qualquer projeto começa com treinamento. Embora o discipulado aparentemente se configure como um projeto, na realidade ele se delineia por princípios de formação. O discipulado não é apenas um programa, embora ele mantenha uma estrutura como já vimos até aqui. Como parte de sua identidade a liderança local necessita desafiar e, através do ensino bíblico apresentar a responsabilidade da igreja ser discipuladora.

O treinamento inicial de discipuladores que será motivado não pelo método, mas por princípios bíblicos da natureza do discipulado. Obviamente o método do como fazer é indispensável, mas não é o método que produzirá resultados, não é ele que em si é o cumprimento da comissão do Senhor Jesus. Por isso, qualquer tentativa de treinamento onde o claro entendimento da natureza essencial do que é o discipulado resultará no fracasso do método.

II. COORDENAÇÃO DOS DISCIPULADORES
Após o treinamento dos discipuladores eles devem ser coordenados para captarem os “discípulos em potencial”. Embora, por convicção, cada discipulador poderá ter a iniciativa de selecionar quem ele discipulará, enquanto organismo vivo, a igreja local precisa estruturar-se para viver o discipulado. Os supervisores poderão ser o pastor, os presbíteros ou membros designados pelo conselho da igreja local.

A função destes coordenadores é de fazer a ponte entre discipuladores e discípulos em potencial identificados no convívio da igreja local. A coordenação visando à escolha de um discipulador que melhor se identifique, ou que tenha disponibilidade e assim se estabeleça um vínculo de confiança entre discipulador e discípulo. Listo os seguintes casos:

1. Os filhos dos membros que também desejam se tornar membros comungantes da igreja local. Os pais poderão procurar o pastor, ou os coordenadores e manifestar o desejo de seus filhos que serão conduzidos ao discipulado.

2. Os coordenadores ou discipuladores ao identificar os visitantes assíduos deverão cuidar para que sejam procurados, antes ou após os cultos, e sejam abordados com a proposta de iniciarem um discipulado.

3. Deverão ser discipulados os novos convertidos que estão no convívio da igreja. Quem tomará a iniciativa de propor o discipulado para eles serão os coordenadores, embora os discipuladores mais atentos também o podem se oferecer para acompanhá-los.

4. Os membros vindos de outras comunidades evangélicas também deverão ser discipulados. Torna-se necessário este acompanhamento, tanto pelo motivo de integrá-los efetivamente na igreja, bem como visando esclarecer-lhes a identidade doutrinária da IPB. Assim, aquele que congrega na intenção de transferir-se para a igreja local, em seus primeiros momentos de convívio, ele será assistido por um membro maduro e convicto da confessionalidade reformada que o esclarecerá sobre a história, doutrina, disciplina, governo da nossa igreja.

5. Mesmo os casos de discipuladores que desenvolvem o estudo acompanhado com pessoas que não têm convívio com a igreja local precisam notificar o coordenar para que ele possa verificar a disponibilidade e não sobrecarregar alguns, enquanto outros se encontram disponíveis, ou ociosos.

III. ESCOLA BÍBLICA DOMINICAL FORMATIVA
Todos os cristãos independentemente do estágio de maturação que atingiu sempre será um discípulo. Ele carecerá sempre de aprendizado contínuo. Certamente esse convívio com a estrutura de educação cristã da igreja local avançará a integração, o crescimento, e consequentemente a maturação de todos os membros comprometidos com a Escola Bíblica Dominical.

A Escola Bíblica Dominical é um indispensável recurso como parte do treinamento contínuo de discipulado. Entretanto, o modelo convencional de Escola Dominical que apresenta lições aleatórias, sem propor um currículo com um objetivo definido, e sem um alvo claramente direcionado, em geral, torna-se numa instituição que não usa todo o seu potencial educacional.

A proposta de uma Escola Bíblica Dominical Formativa intenciona oferecer cursos de treinamento para os membros da igreja local. Em vez, de se adotar revistas que sigam um currículo temático pronto, os professores são desafiados a preparar cursos para ser aplicados no decurso de um ano. Estes professores serão incentivados a adquirir literatura específica para que se especialize naquela área de estudo. Obviamente o pastor, como presbítero docente, terá a responsabilidade de treinar, orientar na preparação do plano de aulas, indicar a literatura básica e confiável, bem como coordenar a aquisição de textos, ou livros de identidade reformada.

O currículo da EBDF será formado a partir do objetivo de equipar os alunos com o conhecimento necessário em áreas cruciais para a maturação da vida cristã. Algumas sugestões de cursos para a Escola Bíblica Dominical Formativa:
1. Curso de Panorama de Antigo Testamento
2. Curso de Panorama de Novo Testamento
3. Curso de Panorama de História da Igreja Cristã
4. Curso Dons e Ministérios do Corpo de Cristo
5. Curso de Cosmovisão Cristã
6. Curso das Confissões Reformadas
7. Curso de Ética dos Dez Mandamentos
8. Curso dos Credos e das Confissões Reformadas
9. Curso de Lar Cristão

IV. CURSOS PARA TREINAMENTO DE LIDERANÇA
Como parte de sua identidade de igreja discipuladora serão oferecidos cursos de treinamento de liderança. Tanto os novos convertidos ou os membros maduros além do discipulado acompanhado pelo qual passaram, a sua assiduidade nos cultos de doutrina durante a semana, a sua participação como aluno de um dos cursos da Escola Bíblica Dominical Formativa, e mesmo participando dos cultos, ainda terão à sua disposição alguns cursos para liderança.

Estes cursos podem ser oferecidos em módulos que funcionarão no decorrer da semana, ou em finais de semana, dependendo da disponibilidade dos interessados. A proposta é dispor de um instrumento de ensino que facilite aos que interessam em aprender o que não seria ensinado de modo sistemático, num curto espaço de tempo e com didática direcionada.