Os reformadores protestantes têm sido frequentemente vistos como figuras divisivas, responsáveis pela multiplicidade de denominações e pela fragmentação da igreja ocorrida nos últimos 500 anos. No entanto, vários estudiosos têm questionado essa visão, optando por ver os reformadores (pelo menos os magisteriais) mais preocupados com a reforma e renovação da igreja do que com a formação de uma nova igreja. O objetivo deles não era uma nova igreja, mas uma igreja católica reformada.
Observando o Prefácio de Calvino ao seu Catecismo de Genebra (1545),[1] vemos exatamente esse tipo de imperativo ecumênico. A sua visão de unidade é completamente paulina:
"Visto que nos convém esforçar-nos por todos os meios para que a unidade da fé, tão altamente recomendada por Paulo, resplandeça entre nós, a esse fim deve principalmente referir-se a profissão formal de fé que acompanha o nosso batismo comum. Portanto, seria desejável não apenas que um consenso perpétuo na doutrina da piedade surgisse entre todos, mas também que um único Catecismo fosse comum a todas as igrejas."
A sua esperança é que a igreja alcançasse uma unidade de fé, ou, como ele mesmo afirma: "consenso perpétuo na doutrina da piedade". Idealmente, isso significaria que haveria apenas um catecismo entre todos os cristãos.
Mas isso, "por muitas razões", provavelmente não vai acontecer, e isso não parece incomodar muito Calvino. Tudo bem que cada igreja tenha seu próprio catecismo, desde que "a variedade no modo de ensino seja tal que todos sejamos direcionados a um só Cristo, em cuja verdade, unidos, cresçamos em um só corpo e um só espírito, e com a mesma boca proclamemos também tudo o que pertence à soma da fé".
Essa visão cristocêntrica de uma igreja unida é frequentemente esquecida entre os protestantes, mas vale a pena recuperá-la se nosso objetivo for uma igreja completamente reformada.
Ele é particularmente severo com aqueles que, em seus escritos de catecismos, pretendem qualquer coisa além da edificação da unidade da igreja. Um escândalo contra a confissão de fé é um escândalo contra o batismo — isto é, sem uma só fé, como pode haver um só batismo?
"Os catequistas que não visam esse fim, além de prejudicarem fatalmente a igreja, semeando os elementos da dissensão na religião, também introduzem uma profanação ímpia do batismo. Pois onde pode ainda haver utilidade no batismo, a menos que este permaneça como seu fundamento — que todos concordemos em uma só fé?"
Você tem a impressão (ou pelo menos espera) de que Calvino aponta um dedo para outros escritores e três para si mesmo quando escreve:
"Portanto, aqueles que publicam catecismos sejam ainda mais cautelosos, pois, ao produzirem algo precipitadamente, podem, não apenas para o presente, mas também para a posteridade, causar grave dano à piedade e infligir uma ferida mortal à igreja."
Calvino está preocupado que escrever catecismos não se torne um meio de divisão, mas um meio de unidade. E aqueles que desejam escrever novos catecismos devem pensar não apenas na geração atual, mas também nas gerações futuras.
Este imperativo de unidade também fundamenta a sua decisão de escrever uma segunda edição do catecismo em latim. Ele havia escrito originalmente em francês vernáculo, mas depois decidiu traduzi-lo para o latim. Uma das razões pelas quais ele faz isso (a outra é para que as pessoas não deixem de usar seu catecismo anterior) é promover a causa de uma confissão unificada de Cristo, para que igrejas divididas no espaço e no tempo se reconheçam em Cristo. O latim ainda é a língua da igreja ocidental no momento.
"Neste estado confuso e dividido da cristandade, julgo útil que haja testemunhos públicos, por meio dos quais igrejas que, embora amplamente separadas pelo espaço, concordam na doutrina de Cristo, possam se reconhecer mutuamente. Pois, além de que isso tende muito à confirmação mútua, o que é mais desejável do que felicitações mútuas entre elas e que se recomendem devotamente ao Senhor?"
A visão de Calvino sobre a unidade catequética pode ser um tanto ingênua — e, claro, ele não poderia prever o futuro do protestantismo. Mas ele é, sem dúvida, sincero em seus esforços para construir a unidade da igreja. Não podemos duvidar de que os reformadores visavam não o sectarismo, mas sim uma igreja una, santa, católica e apostólica.
Especialmente considerando que os catecismos posteriores, às vezes, degeneraram em ferramentas para afirmar o particularismo denominacional — como armas polêmicas direcionadas a denominações concorrentes —, é ainda mais importante resgatar esse objetivo reformador da catequese ecumênica.
A catequese, antes de tudo, concentra-se em fundamentar os fiéis nos fundamentos da fé, aquilo que a igreja "sempre, em todos os lugares e em todos os tempos" sustentou. É por isso que a catequese está intimamente ligada à fé batismal. Uma fé, um batismo — portanto, um catecismo. Mas, se não, vamos ao menos reerguer a unidade da fé como objetivo da catequese.
Extraído de Artigo do Catechisis
Institute acessado em 16/05/2025.
Nota:
[1] O Catecismo de Genebra [1542/1545] estará disponível em breve com introdução, tradução e notas no livro Ewerton B. Tokashiki, Instruindo o rebanho de Deus: Os catecismos e confissões da Igreja de Genebra (Belo Horizonte, Editora Credo Reformado, 2025).
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