Escritor por R.C. Roberts
Rudolf Bultmann (1884-1976) catedrático de teologia na Universidade de Marburg, Alemanha. Exerceu grande influência durante toda a sua vida como exegeta, teólogo e crítico historiador do Novo Testamento.
A TEOLOGIA DE BULTMANN
Associado intensamente com a filosofia nascente e existencialista de Martin Heidegger (1889-1976), Bultmann foi especialmente famoso por sua proposta de que os teólogos “desmistificaram” o Novo Testamento. Em sua obra esta desmistificação consistia em entender que os documentos do NT continham, por uma parte, um paradigma antiquado sobre o mundo de qual deveríamos nos libertar se nós, da geração moderna, se quisermos entendê-lo; e, por outro lado, uma mensagem que necessitamos desesperadamente se queremos ser autênticos seres humanos. Assim, considerava a desmistificação como uma atividade profundamente prática e importante a partir do ponto de vista pastoral.
Segundo esta interpretação os documentos do NT poderiam falar às pessoas contemporâneas que não crêem numa divisão tripartida do universo, ou na intervenção miraculosa divina em processos naturais, ou na invasão da personalidade (por espíritos celestiais, ou não). Uma vez que se retire o tom mitológico, a mensagem essencial de salvação do NT (o “kerygma”) poderia chegar as pessoas de hoje, incentivando-as a tomar uma decisão e permitindo-lhes “abrirem-se para o futuro”. Segundo a teologia de Bultmann, esta abertura é o que o NT denomina como fé.
Poderíamos dizer que a “teologia” de Bultmann é pouco mais que uma análise racional hermenêutica para detectar no NT a antiga filosofia de Heidegger. Essa filosofia é basicamente uma teoria da natureza humana e, diz que todos somos, em essência, necessitados de tomar decisões. Deste modo, é óbvio dizer que tomamos decisões, pois é evidente, que se tem em mente o pensamento de Heidegger na obra de Bultmann e, isto torna o caso mais problemático: se tomamos decisões, nos traímos até o ponto em que nos identificamos com qualquer coisa fixa, aceita, passada, estabelecida, permanente ou objetiva. Por exemplo, se pensamos em Deus como um ser que realmente existe, que escuta nossas orações e que tem um plano para nós, nos identificamos com esse Deus (por exemplo, considerando-nos seus filhos), e isto, não é “autêntico”. Ou, se nos identificamos em termos da biografia objetiva de Jesus Cristo, acentuando o personagem histórico como nosso salvador, então, estamos traindo a nossa verdadeira natureza como tomadores de decisões. Ou, ainda, sejam as que foram nossas virtudes permanentes (paciência, compaixão, coragem, fé, esperança, ou amor), estas não podem constituir o nosso verdadeiro eu; não existimos em nossas disposições, senão que somente em nossos atos e, conseqüentemente, no “momento”.
Assim, é uma característica endêmica dos humanos que violemos nossa natureza ao pensar em nós mesmos em termos do que está fixo, o que perdura e o passado; isto é o que o NT chama de pecado. Ser autentico consiste em estar radicalmente aberto para o “futuro”, entendido no contexto da pura “possibilidade”, de onde não há nada aceito, estabelecido, fixo, etc., de onde nada é metafísico, nem histórico (no sentido padrão do passado) ou psicológico.
AS IMPLICAÇÕES ÉTICAS E PASTORAIS
Quais são as implicações se colocada em prática a teologia de Bultmann na prática ética e espiritual de uma igreja local? Um pastor ao estilo de Bultmann não faria nada para estimular nos membros de sua igreja as marcas da personalidade de Cristo, nem intentaria exortar à congregação para que se dedicar a buscar uma mudança social. Tal como comenta Bultmann que “a exigência de Deus... não se dirige, nem à formação de um ‘caráter’ nem a conformação de uma sociedade humana” (Theology of the New Testament, vol. 1, p. 19).
O motivo disto se faz evidente partindo do que foi dito: a espiritualidade cristã, segundo Bultmann, supõe dissociar-se das características da personalidade própria ou de qualquer resultado objetivo que possam alcançar os nossos atos. Enraíza puramente na afirmação de que o sujeito é um tomador de decisões e, transcendente de todas essas “atualidades”. O pastor não tem como objetivo a transformação permanentemente das pessoas, senão que em lugar disto apresenta o “kerigma” momento após momento, para suscitar “decisões” que, no instante seguinte, devem refazer ou cair em falta de autenticidade. Bultmann nega diretamente, baseando-se nos princípios de sua teologia, o paradigma cristão clássico, que sustenta que a obra pastoral consiste em fomentar as virtudes cristãs nos membros da congregação.
Traduzido por Rev. Ewerton B. Tokashiki
Extraído de David J. Atkinson & David H. Field, eds., Diccionário Ética Cristiana & Teología Pastoral (Barcelona, CLIE, 2004), pp. 283-285.
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