29 março 2012

Hendrikus Berkhof

Escrito por Juan Bosch Navarro

Foi um teólogo reformado holandês, nascido 11 de Junho de 1914, em Appeldorn, e faleceu em 17 de Dezembro de 1995 em Leiderdorp. Originário de uma família reformada com traços marcadamente confessionais. Entre 1925 a 1930 cursou no Instituto Reformado de Amsterdam. Após um ano de estudos teológicos na Universidade de Amsterdam, estuda teologia em Leiden. Interessado em especial pela história da Igreja e os seus dogmas. Pregador em Lemele (Overijsel) em 1938. Graduou-se com a tese titulada “A Teologia de Eusébio de Cesaréia” (1939), sob a direção de J.N. Bakhuizen van der Brink. Após contrair matrimônio com Cornelia van den Berg, em 1941, viu-se comprometido com várias atividades de ocupação. Nesse período começou a escrever a sua primeira investigação, que haveria de atrair a atenção dos círculos eclesiásticos durante anos: A História da Igreja (De Geschiedenis der Kerk). Foi nomeado pregador em Zeist (1940-1950). Terminada a Guerra europeia ingressa como docente em Driebergen, centro de renovação da Igreja Reformada Holandesa. Fundador e Reitor do Seminário de Driebergen (1950), cuja finalidade seria conciliar as diversas “tendências” da Igreja Reformada Holandesa. Delegado de sua Igreja na Assembleia do Conselho Mundial de Igrejas em Amsterdam (1948), do qual será membro do seu Comitê Central durante vários anos (1954-1974). Professor de Teologia Dogmática e Bíblica na Faculdade de Teologia de Leiden (desde 1960). Diretor do Conselho Holandês de Igrejas (1974).

Hendrikus Berkhof foi um dos teólogos mais influentes na tradição calvinista do século XX. A partir de sua tese de doutorado sobre Eusébio de Cesaréia evidencia-se a sua orientação dogmática. A sua postura teológica define-se como a de uma teologia reformada ortodoxa, fortemente influenciada por Karl Barth e, orientada para a ética social. Durante uma breve temporada como estudante em Berlim, demonstra apreço pela Igreja Confessante na Alemanha, comparando a luta liderada por Atanásio ao defender a doutrina trinitária no século IV, com a luta da Igreja Confessante a favor do Evangelho e contra o Nacional Socialismo alemão. Em sua obra A História da Igreja (De Geschiedenis der Kerk) procura não somente descrever, senão que também avaliar o desenvolvimento da teologia cristã. Com ela adquire grande acolhida nos círculos protestantes ortodoxos, mas também desperta certa animosidade entre o protestantismo liberal, que encontra demasiado enfoque dogmático. Da época da guerra data a sua obra A Igreja e o Kaiser (De Kerk en de Keizer), sobre a relação entre a Igreja e o Estado no século IV com claros precedentes para a atual situação. A orientação social de Berkhof como teólogo se faz cada vez mais patente, aceitando que a fé ortodoxa outorga forças renovadoras para a sociedade.

Berkhof intencionou com a fundação do Seminário de Driebergen levar a cabo a aproximação das diferentes tendências doutrinárias dentro do calvinismo, sempre buscando a complementação. Deste período destacam-se duas publicações de grande influência: A crise da ortodoxia moderada (De Crisis der Midderorthodoxie) e Cristo e os poderes (Christus em de machten)[1]. Na primeira se mostra crítico com teologia barthiana. No segundo livro deixa transparecer, uma vez mais, o compromisso de Berkhof pelo ético e o social: a fé em Cristo não somente deve animar a vida do indivíduo, como também a vida da sociedade. Coerentemente, em seu Christus de zin der geschiedenis (Cristo o sentido da história), publicado em 1958, intenta unir duas linhas centrais do seu pensamento, a fé ortodoxa e o seu compromisso com a sociedade: Cristo preenche a sociedade em seu padecimento e na superação do padecimento através da ressurreição. A sua ativa participação nas atividades ecumênicas – seria membro do Comitê Central do Conselho Ecumênico das Igrejas durante vários anos – amplia a sua visão teológica e lhe ajuda a reconciliar distintas tendências.

A década de sessenta sacudiria o pensamento teológico em todo o mundo, o que suporia inclusive para Berkhof relegar em segundo plano a relevância dos aspectos puramente especulativos da teologia e incorporar as ciências humanas na educação teológica. Isto significaria um lento passo evolutivo do clássico calvinismo ortodoxo rumo a um calvinismo ecumênico. É perceptível esta evolução em sua visão dos antigos dogmas da igreja sobre a Trindade, a cristologia e a doutrina da graça. Berkhof gozava, até começo da década de sessenta, de grande confiança entre a maioria ortodoxa de sua Igreja. Isto era devido ao surgimento de sua História da Igreja, onde demonstrou sempre ser um fiel defensor dos pontos de vista ortodoxos. Mas lentamente sua visão de alguns temas centrais, como o da doutrina trinitária, estava evoluindo e se afastava gradativamente da ortodoxia comumente aceita. Nos anos sessenta, Berkhof critica pela primeira vez, em forma expressa, o dogma trinitário em sua obra La doctrina del Espiritu Santo.[2] Apesar de tudo, jamais romperia com os laços da tradição, mas buscou indagar cada vez mais a tradição reformada de maneira crítica. A mudança que se adverte em seu pensamento dá lugar a que seus seguidores dentro da Igreja perdessem a confiança nele e a partir de então, tivesse melhor acolhida entre a minoria progressista.

Também foi Berkhof docente de Teologia Bíblica. A exegese bíblica havia se distanciado desde meados dos anos sessenta das típicas questões teológicas, tornando-se mais histórico-analítica, o que significaria um desafio para a dogmática. Na realidade desde o início cria que a própria Escritura pressupunha uma crítica da dogmática. A sua evolução dogmática se explica pela sua leitura da Bíblia.

A trajetória teológica de Berkhof não conclui, todavia, com a jubilação da docência acadêmica. Os frutos seriam recolhidos durante os próximos dez anos. Em 1985 apareceu a quinta edição de sua Christelijke Geloof[3] e seu novo livro 200 Jahre Theologíe Ein Reisebericht.[4] Na nova edição sobre a doutrina da fé, Berkhof repensa a evolução teológica dos dez anos anteriores e responde às críticas às quais haviam se submetido a sua obra a partir de diversas frentes. “A essência do livro, todavia, permanecia praticamente incólume.” É notório a sua mudança frente à chamada “teologia do processo”, cuja premissa não é que Deus está em perpétuo movimento, motivo que deseja incorporar à humanidade, senão que Deus em si evolui, visão na qual Deus também vem à existência pela humanidade. “Isto, segundo Berkhof, disputa com o pensamento básico da crença cristã no sentido de que Deus em sua soberana liberdade efetua a relação com os homens e realiza o mundo” (E.P. Meijering). Em 200 anos de Teologia é visível a mudança de Berkhof em sua forma de entender a teologia. Se no livro História da Igreja havia enfaticamente insistido que o desenvolvimento da teologia a partir do Iluminismo fora um grave erro e, era função da dogmática do século XX voltar ao essencial da Reforma, em 200 anos de Teologia mostra como a humanidade ao longo dos últimos dois séculos havia se esforçado pra precisamente obter isto. Retifica aqui o seu juízo anterior em torno dos teólogos críticos, mas equilibrado como era, Berkhof tratou também de fazer justiça aos teólogos desse período da história da Igreja, considerados como conservadores e confessionais.[5]

Berkhof é lembrado em ambientes calvinistas como crente, como pregador e como teólogo da sociedade num mundo em mudança a quem observou com assombrosa sensibilidade cristã.[6]

NOTAS:
[1] Este livro foi traduzido e publicado em espanhol. Veja* Hendrikus Berkhof, Cristo y los poderes (Grand Rapids, T.E.L.L., 1985). Nota do tradutor.
[2] Este livro foi traduzido e publicado em espanhol. Veja* Hendrikus Berkhof, La doctrina del Espiritu Santo (Buenos Aires, Editorial La Aurora, 1964). Nota do tradutor.
[3]Christelijke Geloof [A Fé Cristã]. Há a tradução em inglês como Hendrikus Berkhof, Christian Faith – An introduction to the study of the faith (Wm. Eerdmans Publishing Co., ed. rev., 1990). Nota do tradutor.
[4] 200 Jahre Theologie: Ein Reisebericht [200 anos de Teologia: Relação de um trajeto pessoal]. Nota do tradutor.
[5] Uma obra omitida pelo articulista, mas de importância para se avaliar a evolução final do pensamento de Berkhof é o seu livro Introduction to the study of dogmatics (Grand Rapids, Wm. Eerdmans Publishing Co., 1985) originalmente publicado em holandês em 1982. O autor nele apresenta em resumo as premissas e a metodologia e uma síntese de sua teologia comprometidamente com a neo-ortodoxia barthiana. Nota do tradutor.
[6] Por causa do seu distanciamento da histórica ortodoxia calvinista Hendrikus Berkhof dificilmente seria avaliado com tanta simpatia. Ele se manteve dentro da tradição reformada, mas não era confessionalmente comprometido com a teologia, nem subscrevia estritamente as confissões reformadas. Nota do tradutor.

Extraído de Juan Bosch Navarro, Diccionario de teólogos/as contemporáneos (Burgos, Editorial Monte Carmelo, 2004), pp. 124-126.

Traduzido por Rev. Ewerton B. Tokashiki

Um comentário:

Tropardi disse...

Ótimo texto. Muito esclarecedor e didático.
Parabéns!