27 julho 2012

Escolhi pregar expositivamente

Em 1994 fui para o Instituto Bíblico de Rondônia, ali iniciei os meus estudos teológicos. Então, comecei a pregar com preparo acadêmico ao aprender a normas e estruturas da homilética, entretanto, a ênfase era o modelo de sermão temático. Na época apenas li superficialmente acerca da pregação expositiva, e não conhecia nenhum pastor que pregasse deste modo. O sermão temático é fácil de preparar exigindo a imaginação e um simples jogo de palavras a partir do tema de um texto da Escritura. Mas sempre me causou insatisfação, sabendo que eu correria o risco de dizer algo que não estava no texto, ou até mesmo de pregar algo que não era o texto.

Durante os meus estudos no STPJMC recebi nova ênfase homilética. Desta vez, a pregação expositiva foi ensinada e exigida nas avaliações de prática de pregação. Li pelo menos três livros sobre pregação expositiva, pois não havia muita coisa em português, e os modelos pregadores brasileiros que eu conhecia eram ainda mais escassos. Terminei a minha graduação convencido que deveria pregar sermões expositivos, mas a prática não estava clara. Eu não sabia direito como isso poderia ser feito.

Após dois anos de pastorado pregando sermões temáticos abandonei este método. Quando decidi pregar expositivamente como parte permanente do meu ministério, não iniciei repentinamente. Primeiro comecei explicando à igreja que pastoreava, os motivos de doravante pregar expositivamente. Também expliquei que faria análises de textos continuados, e não apenas textos isolados a cada Domingo. Em cada sermão comecei a oferecer o contexto histórico, da intencionalidade do autor, da problematização dos destinatários e analisando a estrutura gramatical do texto no esforço de extrair o significado original que o autor inspirado quis comunicar. Confesso que algumas vezes tive receio de estar fazendo errado, e como pastoreava uma igreja do interior de Rondônia, e tinha pouco contato com o meio acadêmico bem como os grandes centros, tive que tentar descobrir e seguir as complicadas orientações que os autores de homilética ofereciam. Ainda continuo lendo, ouvindo, vendo acerca de sermões expositivos e atentamente aprendendo com pregadores que estão comprometidos com este método.

Se você ainda não se decidiu quanto a se prega ou não expositivamente, permita-me neste artigo sugerir que repense acerca da possibilidade de comprometer-se com a pregação expositiva.


Motivos práticos para pregar expositivamente

Posso elencar pelo menos três motivos para se pregar expositivamente: 1) pastoral, 2) exegético e, 3) homilética. Em breves sentenças farei algumas considerações para que você possa refletir e, o faço na esperança de que você assuma este compromisso. A minha intenção é compartilhar algumas sugestões de como fazer algo, que apesar da ampla divulgação recebida, ainda percebo dúvidas e erros no processo do fazer.


Algumas dicas pastorais

1. A direção do Espírito de Deus é vital para que o pregador exponha e aplique a Escritura Sagrada na igreja local. Ao escolher o que pregar, e isto não significa apenas um texto isolado, o pregador carece discernir que alimento deve entregar ao rebanho. Esta necessidade, seja de natureza preventiva ou corretiva, precisa ser identificada com santo discernimento e oração. O pregador que teme ao Senhor, também anseia por ser-lhe fiel, e ao mesmo tempo por amor e zelo, deseja ensinar e corrigir persuadindo os seus ouvintes acerca da vontade de Deus.

2. O pastor trabalha para que a igreja sob seus cuidados seja saudável. Para isto o seu sermão é fogo santo, pão do céu e poder de Deus para comunicar graça aos que ouvem, persuadir os que duvidam e fazer calar os que se opõe ao evangelho de Cristo! Tamanha tarefa não pode ser realizada superficialmente! Deste modo aconselho: ore, ore e ore! Estude, estude e estude! Sob o perigo de ainda assim, ser encontrado inapto para tão grandiosa tarefa. Este compromisso somos chamados para cumpri-lo dominicalmente diante de pessoas que estão sob o nosso cuidado.

3. É uma atitude irresponsável não ter um plano de pregação. Como relatei antes de ser persuadido da necessidade da pregação expositiva, iniciei meus dois primeiros anos de ministério pastoral pregando sermões temáticos. Confesso que cheguei algumas vezes próximo de 1 hora antes de começar o culto e não sabia o que pregaria naquela noite! Pregando expositivamente, especialmente livros inteiros, tenho o texto definido meses com antecedência oportunizando-me tempo para pesquisa, meditação e compreensão estrutural do livro. Outro aspecto prático é perceber que os membros interagem comigo no preparo do sermão, fornecendo dicas de leitura ou ilustrações de situações relacionadas ao texto que serão pregados na sequência.


Algumas dicas exegéticas

1. Eu poderia iniciar aqui pressupondo que você aprendeu a fazer exegese. Se você o sabe, perdoe-me se minhas dicas parecerem primárias, assim, peço que tenha paciência e continue lendo. Estas sugestões têm basicamente o intuito de ser um “como fazer”, e escrevi pensando em seminaristas, pastores inexperientes e pregadores leigos que desejam aperfeiçoar-se na honrada tarefa da pregação.

2. Ok, sigamos então selecionando o livro ou porção das Escrituras. Leia-o todo, e faça isso repetidas vezes, até que seu conteúdo esteja claro em sua mente e consiga resumi-lo em sentenças curtas.

3. Seja diligente em fazer a reconstrução do contexto histórico. Ao ler o texto a data, local, autoria, as circunstâncias, aspectos geográficos, político, culturais, etc. precisam estar vívidos em sua mente. Caso não possa adquirir manuais de introdução sobre o AT ou NT, tenha à mão uma Bíblia de Estudo de Genebra, porque ela oferece na parte introdutória de cada grupo de livros e em cada livro estas informações.

4. Descobrir o ensino intencional do autor é o objetivo do pregador. O que determina significado no texto é responder: o que ele quis dizer? Em havendo, qual problema atacava? Bem como qual dúvida ele esclarecia. E ainda o que ensinou neste texto aos seus leitores? Estruturalmente deve-se observar como do primeiro ao último versículo ele desenvolve o seu raciocínio. Isto resume ao abordar cada passagem qual era a interação do autor em relação aos seus destinatários no contexto original.

5. As conjunções devem ser respeitadas na divisão das perícopes a serem pregadas. E quando possível deve-se observá-las ao fazer as divisões do seu sermão. Estas divisões não são arbitrárias, mas direcionadas pela estrutura gramatical do próprio texto. Se o pregador tem noções gramaticais da língua original isto facilita muito, se não tem, então observe como as traduções mais recentes têm seguido as divisões das perícopes conforme a estrutura do idioma original.

6. No texto escolhido identifique as palavras-chaves ou expressões características do autor e como elas reforçam seu argumento. Verifique se ele recorre aos mesmos argumentos em outros livros que escreveu.

7. Faça a ponte da exegese para a homilética. A verdade descoberta exegeticamente precisa ser afirmada homileticamente. Em outras palavras, você precisa preparar frases tão curtas quanto possível, que resumam a ideia do autor, e fazer isso o mais didático possível. Neste ponto recomendo enfaticamente que você leia um livro de homilética, ou converse com um pregador experiente em como fazer isso. Não se esqueça: na pregação expositiva a estrutura homilética a ênfase do autor precisa ser colocada em relevo apontando a sequência do seu raciocínio em todo o livro.

8. Caso o pregador não domine a gramática das línguas originais recorra às diferentes versões. Entretanto, sempre é recomendável verificar como os tradutores percebem nuanças semânticas ou variações por causa da sintaxe ou da etimologia das línguas originais. Este recurso além de enriquece o conteúdo do sermão, também dinamiza a formulação das divisões do sermão.


Algumas dicas homiléticas

1. Por causa da inexperiência não corra o risco de se frustrar ou entediar seus ouvintes com exageros. Se você decidiu pregar expositivamente e não sabe como iniciar, sugiro que escolha pregar em pequenas porções, livros ou epístolas pequenas. Permita-me ser mais claro: não inicie preparando a sua série expositiva de sermões em livros como Isaías, Ezequiel, Jeremias, Provérbios, ou em Romanos, 1 Coríntios, Hebreus, pelo contrário, a humildade e a sensatez previnem e nos levam a pensar em começar com porções menores como os Dez Mandamentos, algum dos profetas menores, as Bem-aventuranças, ou mesmo todo o Sermão do Monte, Judas, Tiago, etc. Lembre-se se você não tem a experiência, nem a igreja local tem o costume de ouvir sermões, tome cuidado para não estragar algo tão bom por falta de tato pastoral.

2. Acompanhado o estudo de toda porção ou livro, identifique a estrutura dos assuntos. Isto pode ser verificado de dois modos: 1) Na introdução de cada livro da Bíblia de Estudo de Genebra há uma estrutura do conteúdo de todo o livro. Ou, 2) veja como as versões modernas trazem indicadores das divisões naturais. Aqui você saberá no seu planejamento quantos sermões pregará apenas subdividindo as perícopes.

3. Não comece cada sermão apenas pedindo para abrir no texto da sequência como algo mecânico. A introdução do sermão tem evocar a atenção, e convergir os pensamentos do público para a mensagem do texto. Há pregadores expositivos que entendiam os seus ouvintes no início do sermão, pois pensam que pregar lectio continua, ou seja, sequenciado texto após texto do mesmo livro dispensa uma introdução que apresente a relevância do sermão.

4. Lembre-se que um sermão expositivo não é mero comentário exegético do texto. Por vezes a pregação expositiva é antes de tudo um SERMÃO, e abrange todos os seus elementos essenciais. Alguns pregadores expositivos deixam de recorrer à proposição (chamadas por alguns de ideia homilética) e também pensam erroneamente ser dispensável o uso de divisões. Seja didático, você está instruindo e o modo como se faz a fixação da mensagem é importante. A fidelidade não dispensa a clareza.

5. Extraía do texto quais verdades ou princípios são ensinados e contra que pecados são aplicados. Aplique-os de modo prático, com linguagem que não desconsidere a inteligência nem a simplicidade dos seus ouvintes. A aplicação é uma das mais presentes falhas nos pregadores, que se preocupam apenas de expor, explicar, apresentar a verdade, indicar os princípios, mas em geral, omitem em aplicar e nisto não ensinam os presentes a viver de modo prático a Palavra de Deus.


Quais são alguns benefícios de se pregar expositivamente?

1. Edificar crentes com mentes treinadas a raciocinar sistemática, estrutural e gramaticalmente quando estudam e meditam no texto bíblico. A começar com o pregador que numa autodisciplina aprende a estudar e preparar sermões metodicamente construindo uma teologia mais bíblica a partir da exegese, ao mesmo tempo membros que ouvindo estes sermões aprendem como estudar e analisar a Escritura Sagrada. Assim, quer explicita ou implicitamente, pelo exemplo da pregação expositiva, demonstrará como os membros sob seu pastoreio podem efetivamente examinar as Escrituras.

2. O pregador torna a aquisição de literatura criteriosamente seletiva. Todo pregador precisa ter uma biblioteca básica que lhe seja útil no preparo de sermões. Por isso, ele não comprará aleatoriamente todo livro que lhe seduz, e sim aqueles que diante das necessidades de pregar, e adicionar conteúdo possa somar e facilitar o preparo do sermão, dentre as muitas tarefas pastorais.

3. O preparo do sermão expositivo é um hábito saudável no ministério pastoral. Nunca deixará de ser trabalhoso, mas com o tempo a experiência habilitará o pregador a ter facilidade e a satisfação de fazê-lo com menos embaraços técnicos. Uma vez familiarizado com este método possivelmente o pregador não se interessará em expor a Escritura doutro modo.

4. Crie o hábito de ouvir pregadores expositivos. Há pregadores que atravessam o mundo para pregar, mas se indispõe em cruzar a rua para ouvir um sermão! Ouvindo os que sabem fazer é um excelente recurso para se aprender. Atualmente na internet há vídeos de como preparar sermões expositivos. Após ler este artigo acesso-os e continue aprendendo!

21 julho 2012

A ideia de mito na teologia

por Bernard Ramm


O conceito de mito não tem um significado uniforme na teologia contemporânea. A única forma em que este conceito pode ser tratado é observando como usam o termo os diferentes eruditos.

1. “Mito” usado no sentido bom. Emil Brunner y Reinhold Niebuhr são os teólogos que creem que as Escrituras contêm num bom sentido. O raciocínio básico destes homens é que a linguagem acerca de Deus deve, necessariamente, tomar a forma de um mito. As declarações acerca de Deus não são afirmações de fato, tais como as que fazem os cientistas, nem declarações vazias de significado tais como se encontram na mitologia pagã. O “mito” bíblico é o meio de comunicação pelo qual um Deus transcendente faz a sua vontade conhecida ao homem. O meio de expressar aquilo que é histórico e teológico acerca da existência do homem.

Brunner retorna ao conceito de mito diversas vezes em seus escritos. Segundo ele, o elemento importante do mítico no Cristianismo, é que conserva intacto o caráter histórico do Cristianismo. Se removermos o mítico do Cristianismo o fazemos não-histórico e então, se torna uma religião abstrata e insípida. Mas ao mesmo tempo o mito bíblico não foi confundido com o mito pagão. Segundo Brunner há quatro mitos principais: a criação, a queda, a reconciliação e a redenção. O assunto importante em cada um destes mitos é que se referem à linha divisória entre o tempo e eternidade. Também caracteriza o mítico como o que é supra-histórico, escatológico, remoto do sensorial, mas relacionado com este único e essencial. Na análise final é uma maneira balbuciante de expressar a verdade cristã, mas é melhor maneira disponível (TM, pp. 227-396; RR, cap. 26; D, II, 268ss).

O pensamento de Niebuhr é paralelo ao de Brunner de modo muito próximo. Ele contempla o mito como o modo necessário para o qual o Deus eterno se comunica com o homem temporal. (NDM). Cullmann também usa o conceito do mito de modo aprobatório. O princípio do tempo e o fim do tempo são representados miticamente na Escritura (CT, pp. 94ss).

2. “Mito usado num sentido mal, mas aceitável. Bultmann crê que o kerigma primitivo foi marcado por mitos judeus e gregos (KM, pp. 1ss). Bultmann aparentemente opera com dois critérios para assinalar o mitológico. Positivamente o mitológico é qualquer mito redentor gnóstico, típico do grego, ou qualquer mito apocalíptico judaico. Negativamente o mítico é aquilo que vai contra o entendimento científico de ordem do universo. Bultmann não crê que devamos aceitar o mito como tal, mas, por outro lado, não crê que devamos rejeitar abertamente o mito. O mito contém o kerygma, portanto, temos de adentrar através do mito e descobrir o kerygma original. Daí que propõe o seu famoso programa de demitologização para reiniciar a rejeição total do mito pelos eruditos do século XIX, que localizaram propriamente o mitológico das Escrituras cristãs, mas foram muito longe em sua rejeição. Com a ajuda da filosofia existencialista podemos desnudar o mito e indicar o evangelho original.

3. “Mito” usado num sentido mal e inaceitável. Karl Barth define os mitos como contos acerca dos deuses e, portanto, inaceitáveis na teologia cristã. Crê que há mitos, ou fragmentos de mitos nas Escrituras, mas estes mitos não pertencem à substância do testemunho da Escritura enquanto revelação. Por exemplo, diz que o relato de Gênesis da criação é lenda, não mito. “As histórias da criação da Bíblia, não são mitos, nem contos de fadas. Isto não é negar que haja mitos, e acaso contos de fadas nos materiais dos quais foram construídos.” (CD, III/1. p. 84). Enquanto ao programa total de demitologização de Bultmann, Barth foi um crítico persistente. Disse, por exemplo, que toda a primeira parte do Quarto Tema de sua Church Dogmatics é um debate intenso com Bultmann (CD, IV/1, p. ix). Por exemplo, Bultmann em relação à ressurreição declara que não crê no reavivamento de um cadáver (KM, p. 8). Barth, de modo contrário, defende fortemente a ressurreição corporal de Cristo.

Extraído de Bernard Ramm, Diccionario de Teología Contemporánea (El Paso, Casa Bautista de Publicaciones, 3ªed., 1978), pp. 93-95.

03 julho 2012

Indicação novo site reformado!


Queridos leitores

Recomendo a leitura assídua do site POLÍTICA REFORMADA criado pelo nosso irmão Lucas Grassi Freire. Segundo ele a proposta deste site é produzir textos que apresentem uma cosmovisão reformada. O próprio Lucas declara que
os princípios dos textos são: (1) Simplicidade conceitual e escrita, para alcançar pessoas sem muita educação formal; (2) Informativo, explicando o assunto primeiro e depois aplicando os princípios bíblicos; (3) confessional, omitindo quaisquer ensinos contrários à fé reformada; (4) irênico, levando em consideração que irmãos podem genuinamente ter opinião distinta em certas questões mais polêmicas; (5) profissional, emergindo de anos de estudo e ensino na área.

Além de serem escritos boa parte do material também será gravado para transmitir no radio e influenciar mais pessoas.

Expresso a minha admiração pelo zelo acadêmico e amor pela cosmovisão reformada firmemente defendida pelo Lucas.