31 dezembro 2018

A adoração reformada explicada

Mike Brown e Ewerton B. Tokashiki


O culto semanal de adoração pública é a atividade mais importante na vida cristã.[1] Deus se encontra nele com o seu povo. Ele nos fala em sua Palavra e sacramentos, e nós respondemos em oração, confissão e com cânticos. Ele se inclina para alimentar nossas almas, fortalecer nossa fé e nos edificar como o corpo de Cristo. Estamos prontos para ouvir, receber e para agradá-lo.

Hoje em dia, os cultos de adoração costumam mais agradar a nós mesmos do que a Deus. Tornou-se comum que os atos do culto se concentrem em entreter o público, parecendo mais como concertos de rock e palestras motivacionais, do que a santa adoração do Deus Trino. Mas a Bíblia nos ordena a “oferecer a Deus a adoração aceitável, com reverência e temor, pois o nosso Deus é um fogo consumidor” (Hb 12.28-29).

Numa igreja reformada que pratica o Princípio Regulador do Culto você não encontrará o último modismo dos cultos evangélicos.[2] Não há bandas de rock, efeitos especiais ou pastores contando histórias irreverentes. Em vez disso, encontrará adoração alegre e reverente ao Deus vivo, uma liturgia bíblica e Cristo sendo proclamado a partir de toda a Escritura, em cada ato do culto.


O QUE É LITURGIA?
A palavra “liturgia” refere-se simplesmente à organização da adoração em um serviço público. Toda igreja tem alguma forma de liturgia. A liturgia que você vivencia numa igreja presbiteriana/reformada tem precedentes históricos: cada parte pode ser encontrada nas liturgias da igreja cristã histórica, especialmente naquelas da Reforma do século XVI e dos primeiros pais da igreja.

Mais importante ainda é que a nossa liturgia está totalmente de acordo com a Palavra de Deus e é cuidadosamente planejada para nos conduzir em um diálogo com o nosso Criador e Redentor. É um diálogo em que Deus fala ao seu povo através da sua Palavra e dos sacramentos, e nós respondemos em nossa oração, confissão e canto.

Deus entra nesse diálogo com o seu povo a cada semana no culto público para renovar conosco o seu pacto da graça. Abaixo está uma breve explicação de cada parte da liturgia reformada.


CONVOCAÇÃO À ADORAÇÃO
O culto inicia com o Deus Trino convocando-nos com sua Palavra para adorá-lo com reverência e respeito. Um texto bíblico, muitas vezes um salmo, é lido como uma convocação ao povo de Deus: “Oh, vamos adorar e curvar-nos; ajoelhem-se diante do Senhor nosso Criador!” (Sl 95.6). Ele nos chama para adorá-lo e receber de sua mão bondosa as boas dádivas que Ele fornece às nossas almas.

O culto não é uma iniciativa humana, mas Deus nos despertando, convencendo, atraindo, estimulando e promovendo a sua santidade em nós, para que correspondamos ao seu chamado e obedeçamos a sua ordenança de adorá-lo. Sabemos que “Deus é quem efetua em vós tanto o querer como o realizar, segundo a sua boa vontade” (Fp 2.13). E Agostinho escreveu que “fizeste-nos para ti e inquieto está nosso coração enquanto não repousa em ti”.


INVOCAÇÃO
Tendo ouvido o chamado de Deus para adorá-lo, respondemos em oração. Como o povo que possui um pacto com Deus invocamos o nome de Deus, confessando que “o nosso auxílio está no nome do Senhor, que fez o céu e a terra” (Sl 124.8).

Esta é a resposta de Deus ao seu povo invocando seu nome. Ele anuncia a sua graça e paz a todos que vêm a ele através de Jesus Cristo. Como ministro designado de Deus, o ministro levanta as mãos e anuncia a bênção de Deus em sua Palavra: “Graça a ti e paz da parte de Deus nosso Pai e do Senhor Jesus Cristo” (Rm 1.7).


LEITURA DA LEI
Deus nos revela a sua vontade para nossas vidas em sua lei, isto é, os mandamentos das Escrituras. A lei de Deus nos diz claramente como devemos viver e o que Deus espera de nós. Também revela a santidade de Deus, bem como a nossa pecaminosidade, pois “se não fosse pela lei, eu não teria conhecido o pecado” (Rm 7.7).


CONFISSÃO DE PECADO
Tendo ouvido Deus falar conosco em sua lei, somos levados a confessar nossos pecados. Em primeiro lugar, fazemos isso pública e coletivamente, confessando a Deus como povo, “contra ti somente pequei e fiz o que é mal diante dos teus olhos” (Sl 51.4). Então, fazemos isso em silêncio, confessando nossos próprios pecados.


LEITURA DO EVANGELHO
Somos incapazes de obedecer perfeitamente a lei de Deus como Ele requer, por isso, tornamo-nos merecedores de sua ira. Todavia, “não há mais condenação para aqueles que estão em Cristo Jesus” (Rm 8.1). A leitura de textos com a instrução, promessas e a certeza da salvação para os que creem em Cristo Jesus complementam, logicamente, a leitura da lei de Deus.


DECLARAÇÃO DE PERDÃO
Tendo confessado nossos pecados a Deus, ouvimos o alegre anúncio de sua promessa de que “se confessarmos os nossos pecados, Ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça” (1Jo 1.9). Como o embaixador de Cristo, o ministro declara o perdão a todos os que confiam em Cristo e se arrependem de seus pecados.


CONFISSÃO DE FÉ
Confessamos juntos o Credo dos Apóstolos, o Niceno ou Calcedônio, ou um parágrafo da Confissão de Westminster, ou questão do Catecismo de Heidelberg. Fazemos isso não apenas para sermos instruídos na fé cristã, mas também como uma oração a Deus na qual declaramos estar unidos na verdade que ele revelou: “Um só Senhor, uma só fé, um só batismo, um só Deus e Pai de tudo ”(Ef 4.5-6). Os credos e confissões resumem com beleza essa verdade revelada.


ORAÇÃO PASTORAL
O ministro ora em favor da congregação, trazendo “o fruto dos lábios que reconhecem o seu nome” (Hb 13.15), bem como a intercessão pela igreja e pelo mundo. Este ato pode ser concluído com a congregação recitando juntos a oração do Senhor.


CÂNTICOS DE LOUVOR
Tendo ouvido a bênção de Deus, nós respondemos levantando nossas vozes para ele e cantando um salmo, um hino ou cântico bíblico. Como está ordenado: “Vinde à sua presença cantando!” (Sl 100.2). As palavras que cantamos ao Senhor são cuidadosamente escolhidas, pois o conteúdo de cada canção deve estar de acordo com as Escrituras e deve nos proporcionar uma compreensão mais profunda de Deus.


OFERTÓRIO
Nós respondemos à graça de Deus com nossas ofertas e dízimos, que são para a propagação do evangelho no mundo e para a formação de discípulos. Fazemos isto como um ato de adoração, sabendo que “cada um contribua segundo tiver proposto no coração, não com tristeza ou por necessidade, porque Deus ama a quem dá com alegria” (2 Cor 9.7).


CÂNTICO DE PREPARAÇÃO
Cantamos em preparação para a refeição que Deus está prestes a nos dar para as nossas almas na pregação de sua Palavra. Cantamos outro salmo, cântico ou hino, essencialmente dizendo ao Senhor: “A tua palavra é lâmpada para os meus pés e luz para o meu caminho” (Sl 119.105).


ORAÇÃO POR ILUMINAÇÃO
Chamamos o Senhor novamente, desta vez pedindo-lhe para que nos dê “o Espírito de sabedoria e de revelação no conhecimento dele, tendo os olhos de nossos corações iluminados, que possamos saber qual é a esperança que Ele nos chamou, quais são as riquezas de sua herança gloriosa nos santos, e qual é a imensurável grandeza de seu poder em relação a nós, os que cremos” (Ef 1.17-19).


O SERMÃO
Tendo pedido a Deus que abra os nossos ouvidos e corações para recebermos a sua Palavra, nós o ouvimos falar enquanto a sua Palavra é lida. Igualmente - “a leitura pública da Escritura” (1Tm 4.13) - é um ato de adoração.

Deus continua a falar enquanto a sua Palavra é explicada e proclamada. Como o apóstolo Paulo disse ao pastor Timóteo: “Prega a Palavra, insta, quer seja oportuno, quer não, corrige, repreende, exorta com toda a longanimidade e doutrina. Pois haverá tempo em que não suportarão a sã doutrina; pelo contrário, cercar-se-ão de mestres segundo as suas próprias cobiças, como que sentindo coceira nos ouvidos; e se recusarão a dar ouvidos à verdade, entregando-se às fábulas” (2Tm 4.2-4). O ministro faz uma exposição fiel do texto, que finalmente nos chama ao arrependimento do pecado e para a fé em Cristo.


CEIA DO SENHOR
Tendo ouvido uma breve instrução da nossa aliança de Deus em sua Palavra, agora nos reunimos com Ele em uma refeição pactual. Como a Palavra pregada nos prometeu o favor de Deus, em Cristo, assim também nosso Pai celestial acrescenta esta confirmação visível de sua promessa imutável. Celebramos juntos para comungar e participar do corpo e sangue de Cristo (1Co 10.16). Não acreditamos que os elementos da ceia se transformem, ou contenham o corpo físico de Cristo, mas cremos que, o pão e o vinho permanecem inalterados, e a presença espiritual de Cristo nos comunica graça, por meio deles, para a nossa santificação.


CÂNTICO DE RESPOSTA
Tendo ouvido a Palavra de Cristo e participado no seu corpo e sangue, “deixamos a Palavra de Cristo habitar em nós, ricamente, cantando salmos e hinos e cânticos espirituais, com ações de graças em nossos corações a Deus” (Cl 3.16).


BENÇÃO FINAL
No culto de adoração, o Deus Trino dá a primeira palavra e a palavra final. E ambas são anúncios de sua graça. Com as mãos erguidas, o ministro abençoa o povo de Deus com a Palavra de Deus, que está disponível a todos os que o recebem por meio da fé: “A graça do Senhor Jesus Cristo, o amor de Deus e a comunhão do Espírito Santo sejam com todos vós” (2Co 13.14).


CÂNTICO DO TRÍPLICE “AMÉM”
Tendo recebido a benção apostólica, cantamos “amém” [que significa “assim seja”] em resposta a cada benção proferida em relação às Pessoas da Trindade.


APRESENTAÇÃO DE VISITANTES E AVISOS
Encerrado o culto solene os visitantes poderão ser apresentados. Deve-se usar de discrição, respeito e alegria pela sua presença, convidando-os a retornar mais vezes, e a continuarem no conhecimento de Cristo.

Os avisos, de modo apropriado, são entregues para notificar, orientar, ou esclarecer as atividades da agenda da igreja local ou situações urgentes.


NOTAS:
[1] Traduzido e adaptado de http://www.christurc.org/reformed-worship-explained/ . Este é apenas um modelo de liturgia reformada de um culto comum, obviamente, há elementos que foram omitidos como batismo, votos e juramentos de ordenação, etc. A ordem, o modo e outros detalhes de como realizar os elementos do culto são chamados de circunstâncias do culto, e devem ser decididos pelo pastor junto aos presbíteros. Barry Gritters observa que “a pregação está no coração e no centro de cada culto de adoração reformado” in: Public Worship ant the Reformed Faith, p. 18. Por isso, o Princípio Regulador do Culto é parte essencial da identidade do culto reformado.
[2] D.G. Buttrick afirma que “o que distingue a adoração Reformada é mais a sua teologia do que a sua prática particular. A tradição presbiteriana/reformada de culto a Deus é para a glória a Deus. O nosso “principal fim” é glorificar a Deus. Assim, a adoração nas igrejas Reformadas tem muitas vezes designada pelo objetivo – o foco é Deus e não os sentimentos religiosas.” D.G. Buttrick, “Worship, Presbyterians and,” in: Mark A. Noll, ed., Dictionary of the Presbyterian & Reformed Tradition in America, p. 281.

30 novembro 2018

A Delegação Inglesa no Sínodo de Dordt

A delegação inglesa foi designada pelo rei, e não pela Igreja.[1] Dos quatro primeiros delegados ingleses incluíam entre eles um bispo e dois futuros bispos. James I, que não simpatizava com os puritanos e presbiterianos na Inglaterra e na Escócia, enviou cinco episcopais para representá-lo. Os calvinistas, apesar de erastianos, seguiram o seu pacífico e moderado conselho. Os delegados eram o Dr. George Carleton (não relacionado ao embaixador britânico), bispo de Llandaff; Dr. Joseph Hall, decano de Worcester; Dr. John Davenant, Mestre do Queens College, em Cambridge, e Professor de Teologia; e o Dr. Samuel Ward, mestre do Sidney Sussex College, em Cambridge, e arquidiácono de Taunton.

As instruções dadas ao Rei James I e aos teólogos ingleses:[2]
1. Nossa vontade e prazer é que a partir deste momento em diante em todas as ocasiões vocês se acostumem com a prática da língua latina, de modo que, quando houver ocasião, vocês possam exercitar as suas mentes com maior desembaraço e facilidade.
2. Vocês deverão em todos os pontos a serem debatidos e disputados resolverem entre si, antecipadamente, qual é o verdadeiro estado do assunto, de modo que, alegre e uniformemente sejam concordes.
3. E se pelos eruditos no debate do tema, emergir qualquer coisa da qual vocês não pensaram antes, deverão se reunir e consultar novamente, e assim resolver entre vocês satisfatoriamente o que está apto a ser mantido. E isso deverá estar de acordo com as Escrituras e à doutrina da igreja da Inglaterra.
4. Seu conselho deve ser àquelas igrejas que seus ministros não entregam no púlpito para as pessoas estas coisas como doutrinas ordinárias, que são os pontos mais altos das escolas, e não servem para capacidade vulgar, mas são disputáveis em ambos os lados.[3]
5. Que eles se conformem às confissões públicas das igrejas reformadas circunvizinhas, com as quais devem ter boa correspondência, sem desonra para elas.
6. Que se alguém quiser opor-se entre aqueles que adicionam as suas próprias opiniões, seu esforço será que certas posições sejam moderadamente estabelecidas, e que possam tender a amenizar em ambos os lados.

(Exeter College, Oxford, MS. 48, folios 1.)

NOTAS:
[1] H.R. Trevor-Roper, King James I and his Bishops (History Today, Sept. 1955), pp. 571-581, citado em http://archive.churchsociety.org/churchman/documents/Cman_106_2_Dewar.pdf acessado em 18/10/2018.
[2] http://archive.churchsociety.org/churchman/documents/Cman_106_2_Dewar.pdf acessado em 18/10/2018.
[3] O texto original trás “Your advise shall be to those churches that theire ministers do not deliver in the pulpit to the people these things for ordinary doctrines which are the highest points of schooles, & not fit for vulgar capacity, but disputable on bothe sides.”

26 novembro 2018

Evangélicos incompreendidos e a morte de John Allen Chau

Por Thomas Kidd


As convicções centrais dos evangélicos, incluindo a necessidade de salvação através de Cristo e o mandato de compartilhar a fé, estão se tornando cada vez mais incompreensíveis para uma cultura americana pós-cristã. Não há melhor ilustração dessa incompreensibilidade na reação da mídia à trágica morte de John Allen Chau, enquanto ele tentava alcançar a sociedade isolada de caçadores da Ilha Sentinela do Norte, na distante da costa da Índia.

As leis indianas proíbem o contato com o povo da Ilha Sentinela do Norte, em parte devido à suposição de que são excepcionalmente vulneráveis a doenças epidêmicas. Reportagens da mídia sugerem que Chau (um graduado da Universidade Oral Roberts) não disse a verdade sobre suas razões para entrar na Índia.

Certamente não defenderia a quebra duma lei a fim de promover os objetivos evangelísticos. É claro que os missionários “fazedores de tendas” têm uma longa história como uma forma de contornar as proibições ao evangelismo aberto. (Eles são trabalhadores ou turistas de longo prazo e compartilham o evangelho em ambientes privados). Embora tenhamos forte apoio das Escrituras para a ideia de que quando as autoridades temporais instruem os crentes a não compartilhar a sua fé, o crente deve obedecer a Deus e não ao homem (At 5.29).

Uma das reações mais incompreensíveis à morte de Chau veio, surpreendentemente, no Wall Street Journal. Eu escrevi um artigo para eles sobre a morte do missionário Michael Riddering em Burkina Faso em 2016, de modo que o Jornal se sabe que é capaz de fazerem uma reportagem compreensiva a tais tragédias. Mas a coluna do jornalista Tunku Varadarajan demonstra desprezo por Chau e, aparentemente, não entende da mentalidade ou das motivações de Chau.

Dado o simbolismo e a óbvia tragédia de sua morte, haverá aqueles que atribuem nobreza a Chau e coragem ... . Mas vá com calma no relato de Chau e no seu fim confuso e martirizado. Ele quebrou a lei indiana ao entrar no país com um visto de turista enquanto intencionava realizar uma missão evangelística. O visto de Chau seria recusado caso mencionasse as palavras “Ilha Sentinela do Norte”… .

O que tivemos no final foi o teatro fútil e fatal de um homem. Mas há uma consequência moral: o missionário encontrou o martírio, os sentineleses tiraram uma vida. Dessa tragédia virá uma nova e vigorosa consciência de quem eles são e do que eles não precisam. E isso inclui Bíblias à prova d'água.

Um atento observador perceberia que, por mais mal elaborado que fosse o plano de Chau, fazia sentido para ele determinadas suposições evangélicas sobre a salvação e a eternidade. "Deixe a Ilha Sentinela do Norte sozinha" faz todo o sentido se o que você crê sobre Deus não tem nada a ver com o seu destino eterno. Se não há vida após a morte (ou se não podemos saber nada sobre a vida após a morte), então o que Chau estava fazendo era o auge da insensatez.

Eu não sei muito sobre os detalhes da fé de Chau, e parecia que ele não estava trabalhando com uma organização missionária. Mas as suas anotações no diário sugerem que ele cria que a reconciliação com Deus através de Cristo é a coisa mais importante na vida. É uma questão de vida ou morte para todos e, portanto, algo pelo qual você daria a sua vida. Isso é lógico, se você aceitar que os evangélicos acreditam que isso é a verdade.

A resposta do Jornal à morte de Chau está em contraste com a cobertura da mídia de Jim Elliot e dos mártires do Equador em 1956. Em particular, a revista Life realizou uma reportagem muito simpática à morte de Elliot e de seus companheiros missionários num ataque de flechas pelos índios Waorani.

A diferença da reportagem certamente tem a ver com o fato de que Chau parece, à primeira vista, mais um ator trapaceiro do que Elliot. Mas o contraste também é uma medida de quanto a cultura americana mudou nas seis décadas seguintes. Uma revista nacional como a Life, em 1956, pelo menos ressoaria com a tentativa de trazer a civilização ocidental para pessoas que eles chamavam de “selvagens da Idade da Pedra”. Mas a Life também representava fielmente a agenda evangélica de Elliot, explicando que ele e seus colegas estavam sob comissão divina ao pregar o evangelho a todas as nações.

Seis décadas depois, vivemos no mundo onde as elites acadêmicas e da mídia são alérgicas à noção de que uma cultura é superior à outra. Muitos evangélicos - especialmente os missionários - aplaudiriam esse afastamento de um senso de superioridade cultural ocidental também. Mas perdura a convicção evangélica sobre a verdade transcendente do evangelho para todas as pessoas. Essa convicção leva muitos a fazerem coisas aparentemente imprudentes para compartilhar o evangelho, mesmo com aqueles que não querem ouvi-lo. Podemos esperar que alguns no mundo da observação denunciem tais evangelistas como tolos e intrometidos.

Esse tipo de desprezo nos proporciona o tipo de status cultural que as Escrituras prometem que teríamos. “Porque a palavra da cruz é loucura para os que perecem, mas para nós, que somos salvos, é o poder de Deus” (1Co 1.18).


Acessado em https://www.thegospelcoalition.org/blogs/evangelical-history/incomprehensible-evangelicals-death-john-allen-chau/

29 outubro 2018

Porque a Esquerda não consegue entender o Islamismo

por Daniel Greenfield



Conhecer a verdade sobre o islamismo destruiria a esquerda.

O maior erro intelectual da esquerda é sua convicção de que o mundo pode ser dividido em uma luta binária pelo poder, na qual ambos os lados concordam a respeito de sua natureza, mas discordam a respeito de seus resultados.

Para os esquerdistas de uma determinada geração, era um problema de classes. Marx começou o Manifesto Comunista esquematizando uma luta fundamental de classes por toda a história humana. Para os marxistas, todas as coisas do mundo poderiam ser desmembradas em uma luta de classes, com os opressores ricos de um lado e os oprimidos de outro.

Não importava que esse modelo não se encaixasse na realidade de que os líderes comunistas haviam vindo de ambientes ricos e seus oponentes provavelmente eram pobres camponeses. Para a esquerda, todas as coisas são definidas pelo modelo. A realidade é uma inconveniência que é suprimida através dos gulags* ou dos esquadrões de fuzilamento.

Atualmente, a variável é a política de identidade. Tudo deve ser interseccional. Há aqueles que ficam do lado direito da história, a favor do aborto, do casamento gay e da imigração ilegal. Todos os que não estiverem a bordo são racistas, mesmo que forem negros ou latinos; sexistas, mesmo que sejam do sexo feminino; ou homofóbicos, mesmo que sejam gays. Novamente, a realidade não interessa. A luta binária é o modelo para tudo.

A esquerda acredita que haja uma luta binária a respeito do futuro da humanidade com somente dois lados. Ela não entende como a direita de fato pensa, e ela não tem espaço para entender sistemas de crenças igualmente convincentes que funcionam fora desse modelo.

É aí que entra o islamismo. Ou não entra.

A esquerda jamais foi capaz de entender a religião. Ela não é tão secular ou ateísta quanto é consumida por um convincente sistema de crenças próprio que não deixa nenhum espaço para a convicção religiosa.

A esquerda não consegue entender nada em termos do que uma determinada coisa seja. Ela só consegue entender as coisas em termos de si mesma. A esquerda não consegue entender a religião nos termos da religião, mas somente nos termos de como a religião se encaixa na esquerda.

Incapaz de entender religião, a esquerda atribui à religião um lugar baseado em seu alinhamento na luta. Seria a religião uma força reacionária que sustenta a ordem existente ou uma força progressista que se opõe a ela? A religião está trabalhando com as classes dominantes ou com os oprimidos? A religião está ao lado da esquerda ou ao lado da direita?

O islamismo é racista, sexista, xenofóbico e homofóbico.

A Fraternidade Muçulmana, que se tornou a aliada islâmica mais próxima da esquerda, foi politicamente influenciada pela Alemanha nazista. Seus líderes ficaram indignados com o fim do feudalismo do califado e mantêm extensas redes de negócios em todo o mundo. Eles incitam revoltas contra as minorias e buscam estabelecer uma teocracia.

Se existe uma organização muçulmana que deveria ser um modelo de grupo reacionário, fascista e fundamentalista, essa organização é a Fraternidade Muçulmana. Mas, em vez disso, a esquerda vive de aconchego com esse grupo violento e odioso. Por quê?

Porque no Ocidente a Fraternidade Muçulmana está alinhada com suas causas progressistas. Portanto, ela não pode ser reacionária. Se a Fraternidade Muçulmana fosse alinhada com os conservadores, então ela seria o inimigo.

Assim, os progressistas não se importam com o que diz o Corão. Ele não significa nada para eles, assim como a Bíblia não significa nada para eles. A religião está do lado da justiça social ou não está. Como os muçulmanos são parte de sua gloriosa coalizão interseccional multiforme, então o islamismo deve ser uma religião boa.

É assim estupidamente simples. E não há quantidade de citações do Corão que fará com que isso mude.

Há nisso um forte elemento de cinismo. O inimigo do meu inimigo é meu amigo. Mas há também uma inabilidade mais profunda da esquerda em entender o islamismo e qualquer outra ideologia que esteja fora de sua visão de mundo.

A esquerda reagiu ao surgimento do ISIS com uma incoerência frenética. Os esquerdistas literalmente não conseguiam entender o que fez com que o Estado Islâmico progredisse, porque ele não se encaixava em nenhum dos modelos políticos esquerdistas. O ISIS não podia existir, entretanto, não havia como negar sua existência. E assim, os intelectuais e os políticos esquerdistas gaguejaram que os membros do ISIS eram niilistas, que não acreditavam em nada, embora ninguém se exploda por não acreditar em nada.

[Segundo a esquerda,] os terroristas muçulmanos não matam as pessoas por causa de Alá, do Corão ou do Califado. Isso não se encaixa no modelo. Eles matam porque, como todos os povos do Terceiro Mundo vitimizados pelo colonialismo, são oprimidos. Um terrorista muçulmano não mata judeus ou americanos porque o Corão ordena que os fiéis subjuguem todos os não muçulmanos. Um migrante muçulmano não ataca sexualmente mulheres alemãs porque o Corão permite que o faça.

Estas são todas reações à opressão ocidental. Os opressores muçulmanos são, na verdade, os oprimidos.

Mas o Estado Islâmico matou outros muçulmanos para estabelecer um califado governado pela lei islâmica. Os muçulmanos oprimidos estavam subitamente agindo como os perversos opressores ocidentais. E, se os muçulmanos podem ser opressores, então todo o modelo binário que a esquerda estava usando para explicar o mundo começa a desabar.

Quando a esquerda se levanta contra as inconsistências de seu modelo binário, ela não revisa o modelo. Ao contrário, tenta entender o motivo pelo qual as pessoas estão agindo tão irracionalmente que não se enquadram no modelo. Por que os brancos pobres da área rural não votam na esquerda? Deve ser porque ouviram programas de rádio conservadores e por racismo. Como pode haver minorias conservadoras? Falsa consciência. Também, pudera, Thomas Sowell e Stacey Dash não são “de fato” minorias.

O islamismo e os muçulmanos estão fundamentalmente fora do modelo da esquerda. Eles são parte de sua própria luta binária entre o islamismo e tudo o mais que existe. Eles têm seu próprio “lado certo da história”.

O islamismo e a esquerda, ambos, reivindicam ter sistemas “perfeitos” que podem criar uma utopia... depois de um monte de matanças. Eles estão alinhados um com o outro, todavia são incapazes de entender um ao outro porque suas visões de mundo não deixam espaço para nada além de seus modelos perfeitos. Os esquerdistas desprezam os fundamentalistas e os islâmicos desprezam os ateus e, mesmo assim, eles estão trabalhando juntos enquanto um ignora aquilo em que o outro crê.

A esquerda não consegue processar a ideia de que a religião transcende a política. Na melhor das hipóteses, os esquerdistas veem a religião como um subconjunto da política. E como o islamismo toma a forma de seu eixo político, ele deve ser progressista. Mas, para os muçulmanos, a política é um subconjunto da religião. A política não pode transcender a religião porque ela é uma expressão da religião.

Os esquerdistas não entendem a religião e, por isso, não conseguem entender os muçulmanos. Eles veem o islamismo como outra religião a ser trazida para dentro de sua esfera de influência para promover a justiça social aos seus seguidores. Eles não conseguem entender que os clérigos muçulmanos não se tornarão pregadores da justiça social, ou que os muçulmanos matam porque acreditam genuinamente em Alá e em um paraíso para os mártires. Essas ideias são estranhas aos esquerdistas.

A aliança entre o islamismo e a esquerda coloca juntas duas visões de mundo de mentalidade bem limitada. A esquerda não consegue reconhecer que o islamismo quer algo diferente de casamento gay, direito ao aborto, salário mínimo de 15 dólares por hora, empregos verdes, e todo o restante da infindável agenda de justiça social, pois o colocaria do mesmo lado dos republicanos e do restante da direita. E isso também não é assim, mesmo.

A esquerda não precisa desistir de suas crenças para entender o islamismo. Mas ela teria que abandonar seu pensamento binário e reconhecer que houve e há outras lutas no mundo, diferentes daquelas que os esquerdistas definem. E isto a esquerda não está disposta a fazer porque uma luta binária é o que torna sua visão de mundo tão abrangente. Se sua visão de mundo não abranger o mundo, então ela não pode exigir o poder absoluto.

A esquerda não consegue aceitar que sua grande luta é realmente um desastroso show secundário em um conflito civilizacional maior, ou que sua agenda não é universal, mas é produto de uma tendência intelectual particular que tem pouca aplicação fora de sua própria bolha. Assim, a esquerda continuará rejeitando a verdade sobre o islamismo porque aprender a verdade sobre ele não somente destruiria sua aliança com o islamismo, mas também destruiria a própria esquerda.


Daniel Greenfield, jornalista do David Horowitz Freedom Center, é um escritor de Nova Iorque que enfoca o islamismo radical.
No blog - http://sultanknish.blogspot.com

06 outubro 2018

Remédios preciosos contra as artimanhas do Diabo - Capítulo 10

Existe outro método do diabo para impedir o serviço dos crentes, consiste em leva-los a pensar que há um pequeno número de pessoas que servem a Cristo e que essas pessoas são os menos importantes, os de menos influência e os mais pobres de todos. Satanás lhes dirá: “Garanto que não querem desperdiçar a sua vida no meio de um povo como este, sem poder, sem influência, ignorantes e pobres. Não vale a pena obedecer a Deus se seu povo é assim”. Como os crentes devem reagir quando o diabo lhes fala desta maneira?

Primeiro, devem recordar que ainda que Satanás chame aos seguidores de Cristo de pobres, e ainda que sejam pobres quanto aos bens do mundo, na realidade são os mais ricos. Não são ricos quanto ao dinheiro, ou quanto aos bens, mas ricos nas bençãos de Deus. Tiago falando deste assunto escreveu: “Meus amados irmãos ouçam: Não escolheu Deus aos pobres deste mundo, para que sejam ricos na fé e herdeiros do reino que prometeu aos que lhe amam?” (Tg 2.5). Estes poucos, pobres e insignificantes cristãos como Satanás lhes chamaria, na verdade são os mais ricos e poderosos do mundo. Ainda que tenham pouco em suas mãos, possuem muito em suas esperanças. Ainda que quase não tenham nada no tempo presente, são os herdeiros do glorioso reino de Deus.

Os crentes também devem recordar que ao longo da história humana, alguns dos crentes são ricos e famosos. Por exemplo Abraão e Jó são dois casos de crentes que eram ricos em bens materiais. Então, Satanás não tem razão em dizer que todos os crentes sempre foram pobres. Alguns crentes são ricos em bens deste mundo e todos são ricos em bençãos espirituais.

As bênçãos espirituais são maiores que todas as riquezas terrenas de todos os inconversos no mundo. O crente mais pobre com bênçãos espirituais, possui mais do que a pessoa mais rica da terra sem elas. As bençãos espirituais satisfazem quando as bênçãos materiais não podem fazê-lo. Jesus falou das bênçãos espirituais como água viva: “O que beber da água que eu lhe darei, jamais terá sede; mas a água que eu lhe darei será uma fonte de água viva para a vida eterna” (Jo 4.14). Os crentes têm bênçãos perduráveis que nunca poderão ser tiradas deles. As bênçãos dos crentes lhes acompanham em todo o tempo: na prisão, no tempo da enfermidade, na hora da morte e na eternidade. Nenhuma das riquezas terrenas podem fazer isto. Quem é realmente pobre? O que crente é chamado de “pobre”, ou o inconverso mais rico da terra?

Satanás está ocultando parte da verdade quando diz que somente há crentes pobres no mundo. Ainda que pareça que seja assim, a realidade é outra. O número total de crentes no mundo é enorme. E o número de crentes que existe no decorrer da história também é expressivo. Apocalipse 7.9 diz que o apóstolo João viu “uma grande multidão a qual ninguém poderia contar, de todas as nações, tribos e povos e línguas, que estavam diante do trono e da presença do Cordeiro”. Ainda que seja possível que muitos crentes vivam em lugares onde existam poucos cristãos e muitos deles sejam pobres e humildes, nem sempre é assim. Em breve virá o dia em que estes crentes pobres e humildes brilharão como o sol. Paulo escreveu acerca de como Deus levantou aos crentes e os fez assentar nos lugares celestiais (Ef 2.6). Haverá um dia em que Deus mostrará ao mundo o quão bendito é o seu povo. Então os ricos da terra invejarão aos crentes, que antes julgaram como pobres.

03 outubro 2018

A igreja em tempo de eleição política

Por Kevin DeYoung


Eu sempre me interessei por política. Estudei religião e ciência política na faculdade. E continuo a ler consistentemente em economia, sociologia, política e eventos atuais. Como pastor, espero que os membros da minha igreja estejam bem informados e engajados no processo político. Como cristãos, devemos levar a sério nossa responsabilidade de ser sal e luz num mundo que é frequentemente podre e escuro.

No entanto, acredito que os pastores devem ter muito cuidado com a forma como lideram suas igrejas em nossa cultura politicamente polarizada. Sei que existem bons irmãos e irmãs que podem discordar desses princípios e suas implicações práticas. Mas, no mínimo, os pastores devem discipular seus líderes e suas congregações ao pensar sobre esses assuntos com sabedoria e teologicamente.

Deixe-me mencionar duas coisas que faço e três coisas que não faço como pastor.

Como pastor, eu oro publicamente por líderes e por questões controversas. Somos ordenados a orar pelas autoridades governamentais, quer concordemos com elas, gostemos delas ou confiamos nelas, ou não (1Tm 2.1-2). Da mesma forma, acho apropriado incluir alguns eventos atuais na oração pastoral semanal. Ao longo dos últimos anos, incluí itens relacionados a Ferguson, Charlottesville, tiroteios policiais em Dallas, a eleição presidencial, casamento gay, Roe v. Wade, o aniversário do assassinato de MLK, e dezenas de eventos que poderiam ser interpretados como “políticos”. No entanto, confio que as orações não eram políticas no pior sentido da palavra. Eu me esforço para ter certeza de que tudo pelo que eu oro tenha amparo bíblico. Durante uma temporada eleitoral, os pastores devem orar para que Deus opere no processo político para nos dar líderes piedosos que são marcados pela habilidade, prudência, honestidade, coragem, humildade e compaixão.

Como pastor, falo de questões controversas, conforme elas surgem do texto das Escrituras. Ao pregar em Êxodo 21, falei sobre a história da escravidão e os males dela em nosso país. Mais adiante, no capítulo, falei sobre o mal do aborto. No capítulo 22, falei sobre a definição bíblica de justiça. Eu também falei sobre o entendimento bíblico do viajante e como cristãos devem amar o estrangeiro e o imigrante (e como isso não se traduz automaticamente em uma determinada política de imigração). Todos estes sermões tocaram em tópicos políticos. Eu não mencionei um candidato, um partido político ou defendo qualquer política ou legislação específica. Eu simplesmente falei sobre questões que estavam manifestamente no texto. Não podemos ensinar todo o conselho de Deus sem nos aventurarmos, de vez em quando, entrar em território difícil, que pode ser impopular em nosso contexto cultural.

Como pastor, não forneço guias eleitorais para a congregação. Eu sei que existem outros pastores que defendem a prática, mas na minha experiência, mesmo os guias eleitorais não-partidários nunca são completamente apartidários. Em 2016, vi um guia de eleitor não-apartidário do Conselho de Pesquisa da Família e outro da Sojourners. Ambos os guias foram projetados para informar os cristãos sobre as questões importantes que enfrentamos na eleição e como pensar sobre essas questões do ponto de vista cristão. Não surpreendentemente, os dois guias falaram sobre questões muito diferentes e apresentaram a visão cristã de maneiras muito diferentes. Apenas um republicano obstinado poderia pensar que o guia do FRC não era partidário. Apenas um democrata rígido podia pensar que o guia dos Sojourners era apartidário.

Admitido isso, reconhecemos que existem outros guias que são menos didáticos e mais informativos. Muitos guias não-partidários fazem uma série de perguntas aos candidatos e registram onde estão as questões-chave. Mas mesmo aqui, os guias que vi ao longo dos anos têm um ângulo definido. Se você tem apenas doze perguntas para fazer aos candidatos, o que você pergunta diz muito sobre as questões que você considera importantes, e a redação de cada pergunta, geralmente, reflete certas prioridades. Em suma, não acredito que os guias eleitorais não-partidários sejam realmente apartidários.

Há também a questão prática de como visitantes e "estrangeiros" tendem a ver esses guias. Para jovens maduros e minorias, a “importância” das guias eleitorais, geralmente, sinalizam “esta é uma igreja para os republicanos.” Podemos dizer que não é a intenção, e acredito que a maioria dos cristãos apaixonados por essas guias são motivados por um desejo sincero de informar as pessoas sobre as questões, mas o fato é que a maioria das igrejas evangélicas brancas já é esmagadoramente republicana. Não vamos dar aos visitantes mais motivos para pensar que essa é uma igreja, principalmente para os conservadores do Partido Republicano (ou vice-versa, se você é conhecido como uma igreja progressista).

Isso significa que alguns candidatos e algumas posições não são melhores que os outros? Claro que não. Eleições é algo realmente importante. Isso tudo significa que eu não me importo com aborto, casamento ou liberdade religiosa (ou reforma da imigração ou reforma da justiça criminal)? Não, eu escrevi sobre todas essas coisas. Eu oro sobre esses assuntos a partir do púlpito, quando apropriado, e eu falo sobre eles no púlpito quando eles aparecem na Bíblia. Eu quero que meu povo seja informado sobre política, assim como espero que eles estejam informados sobre muitas outras coisas. Mas eu não acredito que seja o chamado da igreja, como igreja, fornecer perfis de candidatos, especialmente quando os canais normais para fornecer essas informações nunca são inteiramente objetivos.

Como pastor, eu não encorajo as campanhas de registro de eleitores no saguão da igreja. [2] Eu acredito que votar é uma coisa boa. Quando me mudei de Michigan para Iowa para a minha primeira igreja, fiz questão de votar no primeiro turno de Agosto, no início da manhã, antes de dirigir 12 horas para minha nova casa. Eu acredito que os cristãos fariam bem em se informar e votar. E, no entanto, estou muito pressionado para encontrar autorização escriturística para pensar que os cristãos devem votar como uma questão de obediência a Cristo. Ao conduzir o registro de eleitores na igreja, estamos nos comunicando: “Isto é o que os cristãos devem fazer”. Votar geralmente é uma coisa boa, mas eu não tenho autoridade bíblica para dizer que um cristão deve votar (exercitaríamos a disciplina da igreja em alguém que não o fizesse?), nem penso que votar é uma expressão tão necessária do fruto do Espírito que é responsabilidade da igreja fazer com que as pessoas sejam registradas.

Os puritanos foram sábios em estabelecer o Princípio Regulador para o culto. A igreja não tem autoridade para ligar a consciência ou emitir ordens exceto por explícita garantia bíblica, ou quando deduzida por boa e necessária consequência. Grande parte da polarização política na igreja poderia ser muito ajudada se o Princípio Regulador fosse aplicado a questões culturais, bem como ao culto. O objetivo do Princípio Regulador não é fazer com que todos sejam tendenciosos teologicamente (embora isso também possa ser bom). O objetivo é proteger a liberdade cristã e preservar a unidade dos cristãos, os quais são, em última instância, a manutenção de um testemunho fiel do evangelho em nosso mundo.
Um último pensamento sobre o assunto. Tanto quanto eu espero que os cristãos de mentalidade bíblica votem, devemos ter cuidado para não equacionarmos “sal e luz” com vitórias políticas. O engajamento político é apenas uma maneira de amar o próximo e tentar ser uma presença fiel na cultura. Da mesma forma, não devemos supor que todas as boas causas devem entrar no orçamento da igreja, no boletim da igreja ou no lobby da igreja. Há milhares de maneiras pelas quais os cristãos individuais viverão suas vocações, usarão seus dons e exercerão suas paixões - e a grande maioria dessas maneiras não envolverá anúncios do púlpito ou de atividades patrocinadas pela igreja.

Como pastor, eu não dou projeção pública aos candidatos em nossa igreja (ou à candidatos que visitam nossa igreja), especialmente, durante uma temporada eleitoral. Mesmo com a melhor das intenções, a apresentação de um candidato injeta uma nota de política no culto. É claro que damos boas-vindas a todos os candidatos políticos que venham adorar conosco ou simplesmente para conhecer a nossa igreja, mas pedir (ou convidar) uma apresentação ou reconhecimento durante o culto de adoração, apropria-se indevidamente do propósito da reunião do Dia do Senhor. Eu não quero que haja alguma confusão sobre se a igreja está endossando um candidato, ao observar a sua presença conosco. Também não quero dar ao candidato a oportunidade de ser visto e reconhecido no culto público. Ele (ou ela) deve estar no culto para adorar, não para ser visto como alguém que adora. E se o objetivo é simplesmente atender aos constituintes, esse propósito pode ser melhor realizado em outro local, em outro momento.

Eu entendo que esses três “não” são práticas comuns em igrejas de muitas tradições diferentes. Igrejas republicanas, que apoiam ao Trump, fazem essas coisas. Igrejas democratas, que opõem-se ao Trump, fazem essas coisas. Mas por mais comuns que sejam essas coisas, não acredito que sejam sábias. Eles presumem para a igreja uma autoridade que ela não possui, e eles apresentam um obstáculo à comunhão que não precisa estar presente.

A realidade é que essas práticas são comuns em muitas igrejas, porque muitas delas são politicamente uniformes. Os guias de eleitores ocorrem porque quase todos já concordam com eles. O candidato é reconhecido porque quase todos já votam nesse partido. A inscrição no eleitor acontece porque supomos que as pessoas em nossa igreja vão votar nas pessoas que votamos. Meu receio é que, juntas, essas medidas sejam mais eficazes para limitar o número de pessoas que se sentem à vontade em nossa igreja do que para aumentar o número de pessoas que votam “do modo certo”.

Para ter certeza, os cristãos podem se esforçar em educar e mobilizar seus compatriotas cidadãos americanos, mas a única finalidade, propósito e garantia da igreja é educar e mobilizar nossos concidadãos do céu. Não devemos confundir uma missão com a outra.


NOTAS:
[1] Acessado em https://www.thegospelcoalition.org/blogs/kevin-deyoung/church-election-time/
[2] Nos EUA o voto é voluntário. N. do tradutor.

26 setembro 2018

Remédios preciosos contra as artimanhas do Diabo - Capítulo 9

Continuemos pensando em outras duas maneiras em que o diabo procura afastar os crentes de seu serviço a Deus. Primeiro, lhes fará pensar que tão difícil é seguir a Cristo. Ele lhes dirá que é difícil orar, é difícil pensar constantemente nas coisas espirituais, que é difícil ter comunhão com os outros crentes, difícil de obedecer, etc.

O primeiro remédio contra tal maquinação é o pensar mais na necessidade de servir a Cristo, que nas dificuldades que terão ao servi-lo. Os crentes devem servir a Cristo para mostrar-lhe o seu agradecimento. Os crentes necessitam crescer em santidade para que possam vencer o pecado. Necessitam ser obedientes a Deus para que possam cumprir a sua obra neste mundo. Os crentes necessitam seguir a Cristo para que o propósito de Deus seja cumprido em suas vidas. Não há dúvida que os crentes enfrentarão problemas e dificuldades ao seguir a Cristo, mas os crentes verdadeiros assumem esta responsabilidade, mesmo cientes dos problemas que possam sobrevir-lhes.

Segundo, os crentes devem recordar, que se realmente querem servir a Cristo, Ele lhes ajudará tanto que não lhes será difícil. Talvez, no início não lhes pareça fácil, mas enquanto forem cumprindo a vontade de Deus, descobrirão que experimentam grande gozo ao realiza-la. Enquanto serve a Deus, encontra de modo pessoal que Deus lhe está apoiando, fortalecendo, animando e guiando através do caminho mais difícil. Podemos ver na Bíblia como as pessoas zombavam de Neemias e dos demais judeus que pretendiam levantar novamente os muros de Jerusalém. Todavia, Neemias contava com a fortaleza de Deus como sua ajuda. Neemias 2.20 disse: “O Deus dos céus, Ele nos prosperará, e como seus servos nos levantaremos e edificaremos...”. Igualmente Isaías disse a respeito de Deus: “Saíste ao encontro de quem com alegria para a justiça, dos que acordavam de ti em teus caminhos...” (Is 64.5).

Também os crentes necessitam pensar muito acerca das dificuldades que o próprio Cristo sofreu, de como Ele nunca fugiu do sofrimento. Suportou os piores sofrimentos em corpo e alma para o nosso bem-estar espiritual e para o nosso bem eterno. Em Isaías 50.6 Cristo disse: “Dei meu corpo aos algozes, e minhas bochechas aos que me arrancavam a barba, não escondi o meu rosto das injúrias e dos escarros.” Cristo suportou a ira do Pai, a carga dos nossos pecados, a malícia de Satanás e o ódio do mundo. Porque Cristo sofreu tanto pelos nossos, devemos obedecer-lhe e viver para Ele, ainda que isto signifique que tenhamos que sofrer de alguma forma.

Os crentes devem perceber que servir a Cristo é difícil somente para o seu velho homem, os remanescentes de sua natureza caída. Todos os crentes estão obrigados a despojar-se do velho homem e a passada maneira de viver e a vestir-se do novo homem (Ef 4.22-23). O novo homem tem prazer em seguir a Cristo, é a sua natureza pecaminosa quem não gosta de servir a Deus. Em Romanos 7.22 o apóstolo Paulo disse: “Segundo o homem interior (o novo homem) me deleito na lei de Deus”. Para a nova criatura o jugo de Cristo é fácil e sua carga é leve (Mt 11.30). Para o novo homem os mandamentos de Deus não são pesados, mas sim causa de gozo. Todos os crentes sabem que esta é a verdade, e há algo em seu interior que lhes faz desfrutá-la agradando a Deus.

Finalmente, há grandes recompensas para aqueles que apesar de suas dificuldades seguem a Cristo fielmente. Há galardões no futuro. O céu recompensará tudo. No livro de Hebreus lemos acerca da fé de Moisés que teve por maiores riquezas o vitupério de Cristo que os tesouros dos egípcios, porque contemplava o galardão (Hb 11.26). Além disso, há recompensas nesta vida para aqueles que seguem a Cristo apesar das dificuldades. O Salmo 19.11 disse que ao guardar os mandamentos há grande recompensa. Quão néscios são os crentes que permitem que Satanás lhes roube este grande galardão.

Satanás pode usar outro método para conseguir que os crentes não sirvam à Deus. Pode tratar que pensem equivocadamente acerca do que Cristo fez em favor deles. Ele lhes sugerirá que por ter Cristo realizado tudo pelo seu povo, tendo lhes perdoado, justificado e garantido a sua chegada ao céu, então não há nada que fazer, a não ser contentar e satisfazer-se. Satanás deseja que pensem que pelo fato de Cristo ter sido castigado como seu substituto e que Cristo está no céu preparando um lugar para eles, então, não há necessidade de orar, arrepender-se, de estudar a Palavra, de reunir-se com outros crentes. Enfim, porque Cristo nos salvou, não há necessidade de que lhe sirvamos.

Ao fazer estas sugestões, Satanás está tomando uma parte da verdade e converte-a numa mentira. É certo que se não fosse pela obra salvadora de Cristo, não haveria nenhum crente. Todavia, ser um cristão incluí mais do que o mero receber o que Cristo fez. A Bíblia disse: “Não sois de vós mesmos, porque fostes comprados por preço; glorificai, pois, a Deus em vosso corpo e vosso espírito aos quais são de Deus” (1Co 6.19-20). Os crentes pertencem a Cristo. Eles lhe pertencem a fim de que façam sua vontade motivados por gratidão e amor a Ele. Então Satanás mente quando sugere que uma vez que somos salvos por Cristo, não é necessário servir-lhe.

A verdade é que o que Cristo fez e continua realizando pelos crentes constitui o motivo mais forte para servir-lhe. Cristo lhes livrou do poder dominante do pecado, da ira de Deus, da amargura da morte, dos sofrimentos do inferno. Portanto, eles devem servir com alegria e com muita gratidão. Paulo disse a Tito que “Cristo Jesus entregou-se por nós, para redimir-nos de toda iniquidade e purificar para si um povo zeloso de boas obras” (Tt 2.14). O fato de que Cristo se entregou pelos crentes deve estimulá-los a serem zelosos para fazerem o bem. Esta é a razão do porque os verdadeiros crentes sempre são muito ativos no serviço de Cristo. Por outra parte, se não quiserem servir a Deus devem questionar-se se verdadeiramente são crentes. O apóstolo João escreveu: “O que disse que lhe conhece, mas não guarda seus mandamentos, este é mentiroso, e a verdade não está nele” (1Jo 2.4). Uma vez mais temos que observar o equívoco de Satanás: A pessoa salva não é negligente no serviço do seu Salvador. O verdadeiro crente deseja servir a Cristo de todo coração, custe o que custar, porque Cristo sofreu muito para salvar a cada crente.

08 setembro 2018

Remédios preciosos contra as artimanhas do Diabo - Capítulo 8

Trataremos neste capítulo com dois métodos usados pelo enganador para desabilitar e diminuir a eficácia do testemunho dos crentes.

Primeiro, Satanás tratará de promover que este mundo pareça tão atrativo para os crentes que comecem a esquecerem do propósito de Deus para as suas vidas.

Segundo, Satanás dirá aos crentes que viver a vida cristã apenas lhes trará perigos, sofrimentos e perdas. Muitos foram afetados pelo primeiro método mencionado. Por um tempo foram fiéis seguidores de Cristo, até que Satanás conseguiu que o mundo lhes resultasse mais atrativo que Cristo Jesus. Paulatinamente foram atraídos, cada vez mais, para o mundo, tornando-se frios, indiferentes e incapacitados para as coisas espirituais. Aqueles que se sentem tentados desta maneira devem se fixar nos seguintes remédios.

Primeiro, nada do que este mundo nos oferece tem poder para proteger-nos do mal, ou para garantir-nos o sumo bem. Por exemplo, todo o dinheiro do mundo não pode curar a ninguém de uma enfermidade. O poder e a fama não podem garantir a felicidade de uma pessoa. O poder, a influência e o dinheiro não podem ajudar nos tempos de necessidade espiritual. Devemos pensar muito acerca da debilidade e a impotência de todas as coisas terrenas. Porque permitirão os crentes que tais coisas lhes roubem as bençãos espirituais?

Segundo, tudo o que há neste mundo é vazio e sem valor em si mesmo. O livro de Eclesiastes começa declarando este fato: “Que proveito tem o homem de todo o seu trabalho com que se afana debaixo do sol?” (Ec 1.3). A resposta é clara: a pessoa não ganha nada de valor permanente neste mundo.

Terceiro, todas as coisas nesta vida são incertas, inconstantes e sujeitas a mudança. Por exemplo as riquezas são inseguras. Paulo disse: “Aos ricos deste século manda que não sejam altivos, nem colocam a esperança na incerteza das riquezas, senão no Deus vivo” (1Tm 6.17).

Quarto, todas as coisas que parecem tão atraentes neste mundo na realidade são daninhas e perigosas para a nossa própria corrupção. O Salmo 30.6 disse: “E disse eu em minha prosperidade: Não serei jamais abalado.” Cristo disse que o engano das riquezas despreza a Palavra e a torna infrutífera. Quando os israelitas gozavam de prosperidade, se rebelavam contra Deus. Há um perigo enorme na prosperidade: o perigo de contentar-nos com o mundo presente, o perigo de aceitar o que o mundo nos oferece para mudança de nossas almas.

Quinto, todos os prazeres deste mundo estão mesclados com problemas e preocupações. Não há êxito neste mundo que esteja separado da ansiedade e a preocupação. A tristeza acompanha o prazer mundano, o perigo acompanha a segurança mundana, as perdas acompanham os valores do mundo e as lágrimas acompanham os ídolos mundanos.

Sexto, a Bíblia ensina que os crentes devem apegar-se firmemente às coisas eternas e imutáveis, em vez das coisas passageiras deste mundo. Os crentes do Antigo Testamento têm uma fé em Deus que lhes fez ansiar por uma pátria melhor, a celestial (Hb 11.16). Aqueles crentes queriam o melhor. Buscavam a vida celestial e deixaram tudo o que em outro tempo lhes parecia tão atrativo desta vida terrena. Assim, os crentes devem agir, viver mais à luz da glória vindoura e assim ter mais satisfação nesta vida, paz na hora da morte, e uma coroa de justiça quando Cristo se manifestar.

Sétimo, a verdadeira felicidade não se encontra no desfrute das coisas desta vida. A verdadeira felicidade é tão grande e gloriosa que se pode encontrar somente em Deus. Ainda que os homens desfrutem de muitas coisas no presente, sem Deus serão miseráveis para sempre. A felicidade não se encontra nas coisas que não satisfazem a alma. Somente o conhecimento de Deus pode satisfazer-nos.

Oitavo, a alma do homem possuí mais valor do que todo o mundo. Os homens foram criados para algo muito maior do que tudo o que existe neste mundo. Foram criados para conhecer a Deus, conhecer a Cristo, e gozar da presença de Deus para toda a eternidade. Os crentes não devem permitir que se desviem do serviço a Deus pelas artimanhas do diabo. Não devem crer quando lhes dizem que a felicidade neste mundo é a experiência mais importante. Satanás trata de impedir que os crentes sirvam a Cristo dizendo-lhes que a vida cristã apenas conduz a perdas, tristezas e sofrimento. Satanás trata de instigar que temam os problemas que surgirão como resultado de seguirem a Cristo. Quando Satanás tenta aos crentes deste modo, devem pensar que nenhum problema que sobrevier por seguir a Cristo lhes causará dano em forma permanente. Nada lhes poderá retirar a presença e o favor de Deus, ou perdão dos pecados, o gozo do Espírito Santo e a paz de Deus em suas consciências. Os crentes tentados desta forma devem pensar nos perigos que lhes sobrevirão nesta vida, bem como nos perigos espirituais e eternos, se não seguem a Cristo. “Como escaparemos se pouco considerarmos uma tão grande salvação?” (Hb 2.3). Os crentes sofrerão muito mais se descuidarem dos mandamentos de Deus, que devem obedecer ao que Deus lhes ordena. Sempre considerar que os crentes sofrerão mais por desobedecer aos mandamentos de Deus, do que possam sofrer obedecendo.

Além do mais, os crentes devem recordar que os problemas que lhes são enviados por Deus, são uma forma de guarda-los de maiores problemas. Frequentemente os problemas que sofreram lhes serviu como proteção para evitar perigos maiores: por exemplo, o orgulho, a frieza espiritual, a indiferença, a negligência, a amargura, o amor do mundo, etc. Outra coisa que é necessário recordar é que ao viver uma vida santa e servir a Deus, os crentes ganharão muito mais do que possam perder. O apóstolo Paulo disse a Timóteo que a piedade com contentamento é grande lucro (1Tm 6.6). Há gozo, paz e contentamento em servir a Deus, os quais não podem ser encontrados de nenhuma outra maneira. Portanto, os crentes não devem permitir que os problemas que surgem lhes impeçam de servir a Deus, ou seguir a Cristo. Uma vida piedosa tem maior valor permanente de benção que qualquer outra coisa.

04 setembro 2018

Remédios preciosos contra as artimanhas do Diabo - Capítulo 7

Neste capítulo trataremos de outras duas maneiras de como Satanás tenta aos crentes a pecarem. Satanás lhes fará fixar em outras pessoas que são piores pecadores do que eles e que, portanto, não estejam em perigo. Segundo, Satanás lhes fará pensar que o Cristianismo tem erros e que a Bíblia está equivocada nalgumas coisas. Trataremos destes dois métodos usados pelo Diabo.

Primeiro, Satanás quer que os crentes pensem como aquele fariseu que orava e dizia: “Deus te dou graças porque não sou como os demais homens, ladrões, injustos, adúlteros ...” (Lc 18.11). Esta atitude não é honesta, e é uma prova de que é um hipócrita. Os crentes devem examinar suas próprias vidas em primeiro lugar para ver que pecados existem, antes de ver os pecados de outros (Mt 7.3-4). Os crentes não devem se comparar com outras pessoas, mas devem comparar-se com a Bíblia, com as normas divinas para a sua vida. Os crentes sempre devem recordar que todos os que não se arrependem do pecado sofrerão no inferno. Os mais graves pecados receberão maior castigo do que os menores no inferno. Como ajudará aos perdidos o fato de saber que os sofrimentos de uns, serão maiores que os de outros? A triste realidade é que os castigos do inferno ainda que sejam maiores ou menores, durarão para sempre. Então, ninguém deve crer em Satanás quando diz que os seus pecados não são tão graves, nem tão graves como os de outros e que, portanto, não deve se preocupar.

Segundo, Satanás trata de persuadir aos crentes a não levar à sério o Cristianismo. Ele lhes dirá que a Bíblia está cheia de erros, que as narrativas da Bíblia servem apenas para nos dar uma ideia do que sucedeu e nada mais. Satanás lhes dirá que podem fazer o que sua própria natureza lhes indique, sem preocupar-se acerca do que a Bíblia diz do pecado. Dirá a eles que agora não estão sob nenhuma lei, senão a do Espírito e a liberdade. Estes erros e muitos outros serão usados pelo diabo para confundir, distrair e desorientar aos crentes.

A meta do diabo em tudo isto não é a de ajudar aos crentes a pensar melhor, senão é a de confundir e induzi-los que pequem. Satanás lhes sugerirá que se estão se tornando muito sábios e avançados em sua maneira de pensar, quando na realidade sua meta é induzir que caiam no pecado. O propósito de Deus é bem diferente: Deus se opõe não somente que façamos o mal, senão também a que pensemos nele. Romanos 1.28 disse: “Como eles não aprovaram ter em conta a Deus, Deus os entregou a uma mente reprovada para fazer coisas que não convém.” Muitas pessoas pensam equivocadamente e terminam fazendo coisas que não convém. Este texto nos fala do juízo de Deus que veio sobre os povos gentios da antiguidade. Creio que na atualidade Deus está castigando a muitos ao entrega-los a erros que arruinaram as suas almas.

Portanto, os crentes devem recordar que a verdade da Palavra de Deus deve ser incorporada em cada aspecto de suas vidas. Não basta receber a verdade somente na mente; é necessário amá-la e aplica-la a tudo ao que dizemos e fazemos. Somente assim poderemos pensar corretamente, tomar decisões sábias e livrar-nos dos caminhos néscios e vãos, que tanto nos fazem cair. Todo erro significará o desperdício somente perdido para os crentes. Somente os que recebem e amam a verdade em seus corações usufruirão de um são juízo e um pensamento claro. Os que resistem a verdade de Deus estão em perigo de ser entregues ao erro. “Por quanto não receberam o amor pela verdade ... por isso Deus lhes envia um poder enganoso para que creiam a mentira” (2Ts 2.10-11).

As ideias equivocadas ou errôneas que Satanás deseja que os crentes creiam, somente lhes causarão prejuízo. Paulo disse aos crentes que Deus lhes deu o fundamento verdadeiro para uma correta maneira de viver e de pensar. O fundamento é o próprio Cristo (1Co 3.11-15). Edificam ou constroem-se sobre este fundamento coisas equivocadas, ideias errôneas, ao final tudo isto será queimado. Somente a verdade de Deus durará para sempre. Quão néscio é o mau uso do tempo crendo, ou sustentando ideias errôneas apenas para encontrar que no final de tudo foi um esforço infrutífero.

Todos os ensinos que conduzem a uma vida pecaminosa devem ser rejeitados. Paulo disse que os pastores das igrejas devem ser possuidores fiéis da mensagem da verdade a fim de poderem ajudar aos que estão equivocados e convencê-los de seus erros (Tt 1.9). Deus deu a sua verdade ao seu povo, a fim de que possam ser guiados, protegidos e guardados do erro. Portanto, os crentes devem receber a verdade com mansidão. Deus concede a sua graça aos humildes, ou seja, àqueles que deixam aparte de suas próprias ideias para ser cheios da verdade divina. Quanto mais a graça de Deus enche aos crentes, menos suscetíveis serão a ser afetados por ideias errôneas e crenças falsas.

13 agosto 2018

A interpretação de descendit in inferna por Rufino de Aquileya

Também o seu descenso ao inferno foi claramente preanunciado nos Salmos, onde disse: Levaste-me ao pó da morte; e também: Para que serve meu sangue enquanto permanece sob a corrupção? E também: Eu afundei no seio do abismo, nem poder ficar de pé? Também João disse: És tu o que viria (ao inferno, sem dúvida), ou esperamos outro? De modo que Pedro disse: Cristo, morto na carne, mas vivificado no Espírito; no mesmo Espírito foi pregar aos espíritos que foram trancados no cárcere, os que foram incrédulos no tempo de Noé. Também neste texto se declara o que fez no inferno. Mas o próprio Senhor, como anunciando o futuro, disse por meio do profeta: Não abandonarás minha alma no inferno, nem permitirás que teu justo veja a corrupção. E, apesar disto, profeticamente mostra que se cumpriu, quando afirma: Senhor, tiraste a minha alma do inferno, salvaste-me dos que descendem ao fosso.

NOTAS:
[1] Cf. Rm 10.7; 1Pe 3.18-20; 4.6; Ef 4.8-9. Recordando a declaração na nota 144. O inciso descendit in inferna não se encontrava em R, nem em nos Símbolos orientais. Em Aquileya se inclui esta fórmula, que aparece pela primeira vez na Quarta Fórmula de Sirmio, um Credo do ano de 359 d.C.. Também está em Nicéia e em Constantinopla. Alguns Credos espanhóis do século sexto também incluem (D3) e desde os tempos de são Cesário de Arlés se estende nos Credos das Gálias (DS 25-28). J.N.D. Kelly, Primitivos Credos Cristianos, cit., pp. 446-452. Parece que a conotação original fora sublinhar a realidade da morte de Cristo: a descida ao sepulcro. Na concepção judaico-cristã a alma, ao morrer, passava para o sheol. A base bíblica se pode encontrar em Rm 10.7: “‘Quem descerá ao abismo?’; ou seja, para fazer subir Cristo dentre os mortos”; 1Pe 3.18-19: “Também Cristo, para levar-nos a Deus, morreu uma única vez pelos pecados ... No espírito foi pregar aos espíritos encarcerados”; 4.6: “Por isso, inclusive aos mortos se anunciou a boa nova”. Também em Mt 12.40; At 2.24-27; Ef 4.7-10. Cf. Ch. Perrot, La descente du Christ aux enfers dans le Nouveau Testament, Lum Vie 87 (1968), pp. 5-29. A especulação dos teólogos posteriores dá lugar a duas interpretações: para uns, Cristo foi ao inferno pregar a sua mensagem aos que não puderam ouvi-lo, aos justos do Antigo Testamento. Para a segunda interpretação, predominantemente no Oriente e que Rufino segue, a descida ao inferno é a confirmação da vitória do Redentor sobre a morte e libertação dos justos do Antigo Testamento. Rufino identifica o conteúdo desta cláusula com o da sepultura. São Cirilo disse: “Desceu ao sheol, para ali resgatar os justos. Por acaso, queres, lhe pergunto, que os vivos gozassem da graça de Deus sem ser muitos deles santos? Que não conseguissem a liberdade aqueles que estavam prisioneiros a longo tempo, desde Adão? O profeta Isaías anunciou com voz excelsa muitas coisas acerca dele. Não querias, pois, que o rei o libertasse, descendo com o seu anúncio? Ali estavam Davi, Samuel e todos os profetas. E inclusive o próprio João, que dizia por meio de seus enviados: “tu és o que haveria de vir, ou devemos esperar outro?” (Mt 11.3). Não desejarias que descendo, liberasse a esses homens?”: Cat., IV, 11, pp. 104-105.
[2] Sl 30.10. Não é citado por são Cirilo.
[3] Sl 69.3. Também não é citado por são Cirilo.
[4] Lc 7.20. Rufino interpretando deste modo Lc 7.20, segue a são Cirilo, ainda que no texto evangélico os enviados por João Batista estão apenas a perguntar a Cristo, se ele é o Messias, sem nenhuma referência à descida ao inferno. Alguns Pais põem na boca de João a pergunta quando Jesus vai ao seu encontro no sheol. Cf. Cirilo, Cat., XIV. 9, p. 329.
[5] 1Pe 3.18-20. Este texto, como os foram citados antes (1Pe 4.6; Rm 10.7; Ef 4.8-9), pressupõe como conhecido e pregado a descida Cristo ao inferno, após a sua morte.
[6] Sl 16.10. Cf. Cirilo, Cat., XIV, 4, p. 325.
[7] Sl 30.4. Cf. Cirilo, Cat., ibid.


Extraído de Rufino de Aquileya, Comentário al Símbolo Apostólico – Biblioteca Patrística (Madrid, Editorial Ciudad Nueva, 2001), pp. 83-84.

28 julho 2018

Remédios preciosos contra as artimanhas do Diabo - Capítulo 6

Satanás conduz os crentes ao pecado fazendo-lhes pensar que os que se santificam sofrem muita oposição e dificuldades. Ele lhes diz que enquanto os pecadores gozam da “boa vida”, os que desprezam ao pecado somente experimentam tristezas e problemas. Satanás insiste em lhes inculcar que por serem justos e santos terão problemas. O sussurro do inimigo de que é muito melhor viver numa forma que não lhes ocasione tantos conflitos e que os pecadores não sofrem como os piedosos.

Como devem reagir, e o que pensar os crentes quando Satanás lhes inquieta com estas ideias?

Primeiro, devem recordar que todos os problemas que os filhos de Deus serão usados para o seu bem. Deus nunca envia aflições ao seu povo sem um bom propósito, ainda que no momento não seja possível entende-lo. Em seguida mencionarei alguns dos efeitos que sobrevêm aos piedosos como consequência da aflição: Aprendem acerca da maldade do pecado; o sofrimento lhes faz desprezar ao pecado; o sofrimento lhes faz ter cuidado com o pecado no futuro. O menino que se queima teme ao fogo. As aflições nos ajudam a mortificar ao pecado. As aflições são o crisol onde Deus purifica as impurezas do seu povo. Deus disciplina, corrige e instrui aos crentes para o seu bem, a fim de que participem de sua santidade (Hb 12.10-11). Ainda que a disciplina divina seja no momento dolorosa, produz a piedade e traz muitas bençãos aos crentes.

Deus está treinando ao seu povo: fazendo que estejam numa boa e saudável condição espiritual, o sofrimento é uma parte deste treinamento. O sofrimento lhes torna humildes e sensíveis ao ensino do Espírito Santo. O sofrimento aproxima de Deus e os motiva a orar duma forma mais intensa e sincera. O salmista disse: “Antes que eu fosse humilhado, andava desviado, mas agora guardo a tua Palavra” (Sl 119.67). Também o sofrimento fortalece aos crentes. Crescem mais fortes em seu amor a Deus e pelo seu povo; crescem mais fortes na fé, esperança e gozo.

Segundo, os crentes devem recordar o que é mais importante do que seus problemas. Eles não podem mudar o fato de que Deus lhes ama. As aflições podem resultar em sofrimentos do corpo e da mente, e até mesmo leva-los a perder a vida, mas não podem separá-los do amor de Deus.

Terceiro, os crentes devem recordar que seus problemas na realidade são passageiros e de curta duração. “Por um momento será sua ira, mas o seu favor durará toda a vida. Pela noite durará o choro, mas a alegria virá pela manhã” (Sl 30.5). Na realidade há um breve tempo entre o conhecer da graça de Deus na terra e o gozar da glória de Deus no céu. “Porque ainda um pouco e o que há de vir virá e não tardará” (Hb 10.36-37). Este breve tempo de sofrimento terminará e os crentes estarão com Cristo para sempre. Este tempo de tormenta é o prelúdio da tranquilidade eterna.

Quarto, os crentes devem lembrar que os problemas que lhes ocorrem provêm do grande amor que Deus tem por eles. O Senhor Jesus disse: “Eu repreendo e castigo a todos os que amo” (Ap 3.19). Deus está preparando aos crentes para o céu e, às vezes, esta preparação resulta dolorosa. Todavia, o fato de que Deus procura que estejam preparados para o céu, é prova de que lhes ama grandemente.

Quinto, os crentes devem medir as aflições por seu resultado espiritual e não pela dor que ocasionam. É necessário que vejamos o propósito de Deus em nossos sofrimentos. José sofreu no Egito e foi encarcerado injustamente. Não obstante, o propósito de Deus foi, que por meio de José, salvasse a sua família. Do mesmo modo, Davi foi rodeado de inimigos e esteve em perigo constante no início de sua carreira. Todavia, tornou-se rei e foi honrado por seu povo. Em ambos os casos foi o sofrimento o que conduziu o cumprimento do propósito de Deus. Isto nos ensina que os crentes devem julgar seus sofrimentos não pela dor que produzem, senão por seus resultados espirituais.

Sexto, o propósito de Deus nas aflições nunca é para condenar, ou causar desespero nos crentes. Deus não quer enfraquece-los, ou arruiná-los com a tristeza. Deus quer provar e fortalece-los, seu pensamento nunca é destruí-los. Moisés recordava aos israelitas deste ponto: “Te recordarás de todo o caminho por onde Jehová, teu Deus, te conduziu estes quarenta anos no deserto, para afligir-te, para provar, e para saber o que estava em teu coração, se guardarias, ou não os seus mandamentos” (Dt 8.2). “Para provar”, esse foi o propósito de Deus, não para prejudicar ou destruir.

Finalmente, os crentes sempre devem recordar que as tristezas e as misérias que acompanham o pecado sempre serão maiores e pesadas que a tristeza que, às vezes, acompanha a santidade e a piedade. A tristeza que o pecado acarreta não tem nada de bom. Não possui nenhuma esperança, nem bom propósito. A tristeza que procede do pecado somente conduzido pelo que é temível e terrível, ou seja, o desprezo justo e santo de Deus e sua ira.


26 junho 2018

Remédios preciosos contra as artimanhas do Diabo - Capítulo 5

Por Thomas Brooks
Originalmente publicado em 1652 na Inglaterra

Outra tática do Diabo é a de dizer ao crente que pode aproximar-se do pecado sem cair nele. Ele insistirá com o crente que pode achegar-se a pessoas com vidas pecaminosas, ou que pode estar em lugares onde se cometem atos pecaminosos, sem que nada lhe aconteça. Dirá que pode conviver com os beberrões sem embriagar-se, que pode acompanhar as pessoas imorais sem participar de suas imoralidades. Dirá que pode aproximar-se da porta da prostituta, desde que não suba em sua cama, que pode olhar a beleza de Jezabel, mas não cometer pecado com ela, que pode por as suas mãos na joia de ouro de Acã sempre, mas desde não a roube. Em outras palavras, que pode acercar-se do pecado sem ser afetado por ele. Todavia, com frequência sucede que ao aproximar-se do pecado, de imediato, este o conduz a pecar.

A Bíblia adverte aos crentes a respeito dos lugares e das pessoas que lhes incentivam a pecar. O texto de 1Ts 5.22 lhes manda apartar-se de toda classe de mal. E Pv 4.14-15 diz: “Não entres pela vereda dos ímpios, não siga pelo caminho dos maus. Deixa-o, não passes por ele; afaste-se dele”. Há que evitar tudo o que não é bom, saudável e santo. Não faça nada que pareça mau, ou que tenha a aparência de pecado. Se não quiser ser queimado, deverá afastar-se do fogo. Se não quiser pecar, deverá alongar-se de qualquer coisa que lhe conduziria a pecar; se não o faz, não poderá ter vitória sobre o pecado.

A Bíblia nos fala daqueles que foram vitoriosos sobre o pecado. Se afastaram de tudo o que lhes poderia conduzir a pecar, ainda que somente fosse uma aparência. O Diabo considera como meia vitória, como quase uma conquista, o fato de que não se aparte daquilo que pode conduzi-lo a pecar. O caso de José, é uma ilustração de alguém que se afastou da tentação do pecado. Ainda que a esposa de Potifar lhe provocasse a cometer o adultério, José não a escutava, nem aceitava estar na presença dela. (Gn 39.10). Se você quer usufruir das bençãos de Deus, tem que afastar-se de tudo o que lhe conduz a pecar.

O fato de evitar a aparência do pecado é uma evidência da graça de Deus que lhe eleva acima dos homens que pertencem ao mundo. Desta maneira Abraão viveu uma vida piedosa em meio a um povo imundo. Daniel permaneceu fiel num país onde se adorava a falsos deuses. Timóteo viveu uma vida controlada pelo Espírito de Deus em meio a um povo pagão em Éfeso. Os crentes não devem escutar ao Diabo quando lhes diz que podem acercar-se do pecado, todavia, sem pecar. O ensino da Bíblia é claro acerca disto, afaste-se de qualquer coisa que lhe conduza a pecar.

Outra artimanha usada por Satanás para conduzir aos crentes ao pecado é dizer-lhes que os não arrependidos gozam de uma vida prazerosa e sem problemas. “Veja essas pessoas como pecam e estão felizes, cheias de boas coisas. Não têm preocupações. Una-se a elas e vá se divertir”. Às vezes, Deus é bondoso e abençoa nesta vida aos mesmos que estão destinados à condenação. A maneira que Deus trata uma pessoa nesta vida nem sempre indica o que Deus pensa acerca dessa pessoa. Da mesma maneira Deus, às vezes, envia coisas difíceis às pessoas que são objeto de seu amor. O sol brilha sobre os espinhos e sobre as árvores frutíferas. A boa dádiva de Deus é outorgada aos bons e aos maus. Tanto os bons como os maus gozam de boa saúde, recebem riqueza e abundância; ainda assim, sofrem indistintamente perdas e enfermidades.

o primeiro remédio contra esta tática é despertar-nos de que Deus é contra os que usam as suas bençãos como um pretexto para pecar. O desprezo de Deus é muito forte contra os que, desta maneira, abusam de sua bondade. Os crentes nunca devem pensar que a ternura de Deus lhes dá liberdade para pecar; pelo contrário, sua benignidade deveria conduzi-los para o arrependimento.

Segundo, não há miséria maior nesta vida do que a ausência da correção e a disciplina de Deus. Aqueles cujas vidas sofrem destas marcas devem se preocupar. Se Deus nunca lhes envia problemas, se suas vidas sempre foram fáceis, então estão no pior estado possível. Quando Deus não se preocupa por corrigir e provar uma pessoa, essa pessoa está perdida. Os incrédulos podem se sentir felizes porque Deus não lhes corrige, mas é falso o seu sentimento de segurança. Longe de indicar que tudo está bem com eles, indica o contrário, que tudo está mal. A prosperidade é uma piedra na qual milhões de pessoas tropeçam; tropeçaram, caíram e fraturaram a cerviz de sua alma para sempre.

Terceiro, é certo que os pecadores usufruem de boas coisas nesta vida, mas as suas “bençãos” não são nada comparadas com o que não têm. Os pecadores podem gozar do dinheiro, poder, amigos, saúde, felicidade; mas não conhecem à Deus, nem à Cristo, nem ao Espírito de Deus. Não têm a paz com Deus, nem o perdão de seus pecados. Não são filhos de Deus e não são livres do poder dominante do pecado. Não são objeto da graça de Deus e muito menos têm a esperança de irem para o céu. De que servem todas as bençãos temporais desta vida se não têm o amor de Deus, o perdão de seus pecados, a presença de Cristo e a esperança de glória eterna?

Quarto, as coisas boas desta vida nem sempre são o que aparentam ser. As coisas “boas” sempre estão mescladas com coisas más. O poder e o dinheiro trazem temores, preocupações e não tão somente a felicidade. O Sl 92.7 diz que os ímpios brotam como a erva, que floresce os que praticam a iniquidade, mas que serão destruídos eternamente. Frequentemente, Deus castigará com juízos espirituais as mesmas pessoas que sofrem menos castigos nesta vida. Por juízos espirituais quero dizer que não estão dispostos a arrepender-se, que não se preocupam com suas almas, que suas consciências estão cauterizadas, seus corações endurecidos, estão cegos em relação à verdade de Deus. Juízos semelhantes a estes são piores que todos os sofrimentos e tristezas desta vida terrena.

Quinto, um dia os homens entenderão todas as bençãos que receberam durante a sua vida terrena. “Porque a todo que muito é dado, muito será cobrado” (Lc 12.48). O que dirão estas pessoas por tantas bênçãos que Deus lhes concedeu? Deus é paciente agora, mas a sua paciência e sua bondade deveriam nos guiar ao arrependimento, de outro modo, a sua bondade se converterá num motivo de maior juízo.

22 junho 2018

Remédios preciosos contra as artimanhas do Diabo - Capítulo 4

Por Thomas Brooks
Originalmente publicado em 1652 na Inglaterra

Neste capítulo poderemos observar outro método usado pelo Diabo para induzir aos crentes que caiam no pecado. Satanás lhes diz que é fácil arrepender-se, tão simples como confessálo ao sacerdote. Tudo o que se tem que dizer é: “Senhor tenha misericórdia de mim”, e ele o perdoará. Sussurrará em seu ouvido que o arrependimento é fácil.

Esta mentira do Diabo é muito perigosa. É uma mentira que é usada para enganar a muitos e coloca-los sob o controle e domínio do pecado. O arrependimento não é algo fácil de se obter; está além das forças humanas. Para arrepender-se é necessário o mesmo poder que levantou a Cristo dos mortos, ou seja, é necessário o poder de Deus.

O apóstolo Paulo escreveu a Timóteo que os servos de Deus devem ensinar a verdade com a esperança que Deus conceda arrepentimiento aos ouvintes (2Tm 2:25). O arrependimento não é fácil; o arrependimento é um dom de Deus. O profeta Jeremias perguntou: “O etíope mudará a cor de sua pele, e o leopardo as suas manchas? Assim também, podereis fazer bem, estando habituados a fazer o mal?” (Jr 13:23). As pessoas não podem transformar a si mesmas; falta-lhes o poder de Deus para que possam experimentar essa mudança. O simples fato de dizer: “Senhor tem misericórdia de mim,” não é o arrependimento verdadeiro. Os que usam esta linguagem, sem uma mudança genuína em suas vidas, estão se enganando. Muitos agora estão no inferno porque se equivocaram quanto à natureza do arrependimento.

Há três elementos essenciais no arrependimento. O primeiro elemento é uma mudança substancial; é dar as costas para o pecado e voltar-se para Deus. O arrependimento é deixar as trevas e volver-se para a luz. Isaías disse: “Deixe o ímpio o seu caminho, e o iníquo os seus pensamentos, e voltem-se para Deus” (Is 55:7). O arrependimento significa dar as costas a todo pecado, inclusive ao pecado mais amado. Significa também uma mudança de atitude para com Deus e em relação a tudo o que ele manda. Quando uma pessoa se arrepende verdadeiramente, sabe que não existe nada nela que agrade a Deus, e tudo o que ela possui é o seu pecado. Isto lhe faz voltar-se a Deus suplicando ajuda e perdão. O arrependimento não é fácil. Sempre é difícil e ocasiona dor e vergonha.

O segundo elemento no arrependimento verdadeiro é uma mudança completa de vida. O arrependimento significa uma mudança na vida interior, no que pensa e no que deseja. O arrependimento significa uma mudança tão poderosa na vida, que outros podem vê-la, uma transformação em sua maneira de viver, em seus hábitos, em sua perspectiva. Em Is 1:16 diz que “Lavai e limpai-vos; tirai a iniquidade de vossas obras diante de meus olhos; deixai de fazer o mal; aprendei a fazer bem”. Isto significa uma mudança externa e interna, uma alteração completa de vida.

O terceiro elemento do arrependimento é sua continuidade ao longo de toda a vida do crente. Arrepender-se significa sempre esforçar para guardar a lei de Deus de forma mais completa. Significa aproximar-se cada vez mais de Deus, ainda que ao mesmo tempo, saibamos que não podemos deixar de considerar-nos pecadores. A vida cristã consiste de um processo contínuo de mortificação do pecado. O apóstolo Paulo, que foi usado grandemente por Deus, disse: “Miserável homem que sou! Quem me livrará deste corpo de morte?” (Rm 7:24).

O arrependimento não é próprio da natureza humana. É necessário tanto do poder de Deus para arrepender-se, como para não pecar. “Vinde e voltemos a Jehová porque ele nos abateu e curará; nos feriu e tratará. Ele nos dará a vida depois de dois dias; no terceiro dia nos ressuscitará e viveremos diante dele” (Os 6:1-2). Convença-se que Deus é quem faz todas estas coisas a favor de seu povo. Ele os sara. Ele ata as suas feridas. Ele os vivifica e restaura. O poder e o amor de Deus estão atuando no arrependimento. Sem a misericórdia e o amor de Deus atuando, não é possível ocorrer o verdadeiro arrependimento.

É comum que Satanás diga que o arrependimento é fácil. Mas após ocorrer a queda no pecado, a sua mensagem mudará, pois dirá que o arrependimento é impossível. Uma vez que a pessoa se acostuma ao pecado, o Diabo dirá que o arrependimento é a coisa mais difícil que alguém poderá obter. Ele lhe dirá que é difícil abandonar aos pecados que fazem parte de sua vida. Dirá que não haverá a possibilidade de arrependimento, porque abusou da misericórdia de Deus e desprezou as advertências divinas. Satanás lhe falará de quantas vezes caiu e quão perversos são seus pecados. Ele lhe dirá: “É impossível arrepender-se.”

Os verdadeiros crentes buscarão o arrependimento enquanto há tempo, isto é, hoje! O arrependimento nunca é fácil, mas com a ajuda e com a misericórdia de Deus, é possível desprezar ao pecado e volver-se para Deus.

21 junho 2018

Remédios preciosos contra as artimanhas do Diabo - Capítulo 3

Por Thomas Brooks
Originalmente publicado em 1652 na Inglaterra

Neste capítulo trataremos com outras duas estratégias usadas pelo diabo para fazer com que os crentes caiam em pecado. Primeiro, Satanás lhes fala que os melhores crentes da Bíblia pecaram e, portanto, os crentes também podem pecar. Em segundo lugar, Satanás lhes dirá que não se preocupem com os seus pecados, que Deus é misericordioso para perdoá-los. Então, vejamos a forma de enfrentar estas artimanhas.

Primeiro, às vezes, Satanás diz aos crentes que, como todos aqueles acerca de quem lemos na Bíblia pecaram, então, o pecado não é tão grave. Davi foi um homem que amou a Deus e, todavia, cometeu o adultério. Satanás se apoia neste assunto para dizer-nos que o adultério não é algo tão mal. Noé foi um homem que achou graça diante os olhos de Deus (Gn 6:8), entretanto, em Gn 9:21 lemos que este homem embreagou-se. Satanás dirá aos crentes que tão pouco a embriaguez é um pecado tão grave diante de Deus. O texto de Mt 16:17 nos fala que Pedro foi abençoado pelo Senhor; mas em Mt 26:74 o mesmo apóstolo amaldiçoou e negou ao nosso Senhor Jesus Cristo. Com base nisto, Satanás diz aos crentes que tais pecados não são graves de modo algum.

Satanás tem razão? David, Noé, Pedro e outros filhos de Deus pecaram gravemente contra Deus. Isto significa que os crentes não devem se preocupar com os seus pecados?

Em primeiro lugar, Satanás somente está mencionando uma parte da história. Davi pecou, mas também Davi se arrependeu. O Salmo 51 nos fala de como Davi se sentiu e o que fez após cair no pecado. “Lava-me mais e mais de minha maldad, limpa-me de meu pecado.” (Sl 51:2) Estas não são as palavras de alguém que não se preocupava com o pecado, mas de alguém que estava arrependido, que odiou o seu pecado e pediu perdão à Deus. Da mesma maneira, depois que Pedro amaldiçoou e negou ao Senhor, saiu e chorou amargamente. (Mt 26:75) Por que Pedro chorava? Chorava porque estava consciente de seu pecado e arrependido do que fez. Quando alguém pensa que pode pecar porque os crentes da Bíblia o fizeram, este deve se perguntar se é capaz de arrepender-se como eles o fizeram. A verdade é que muitos pecam da mesma forma que estes homens, mas bem poucos se arrependem como eles. Em outras palavras, ainda que os crentes bíblicos caíram ocasionalmente no pecado, na realidade eles o odiavam. Do mesmo modo, os crentes devem odiar o pecado e desejar afastar-se dele.

Em segundo, note que estes crentes não permaneceram no pecado. Pecaram em ocasiões, mas não viviam no pecado. E ainda quando pecaram, não o fizeram de todo coração. Satanás deseja que os crentes pequem incessantemente, a fim de que se acostumem ao pecado, quer que se sintam a vontade pecando. Isto é muito diferente da forma em que caíram Davi e Pedro.

É necessário recordar que Davi e os demais crentes mencionados sofriam muito a consequência de seus pecados. No Salmo 51, Davi disse que lhe foi tão doloroso como a fratura de um osso. (Sl 51:8). E Deus lhe sentenciou, como consequência de sua falta, dizendo que sempre haveria violência em sua família, e assim aconteceu.

Os pecados de Davi e Pedro estão registrados na Bíblia como uma advertência aos crentes e também para o seu auxílio. Por um lado, Deus não quer que os crentes se desesperem quando pecam, e por esta razão nos mostra que os crentes mais fortes também pecaram. E, por outro lado, Deus adverte aos crentes a não descuidarem em sua luta contra o pecado. Devemos aprender com as quedas dos outros, ou seja, suas quedas podem nos ajudar a não cairmos. Não há nenhuma garantia em nossos anos como crentes, muito menos em nossa fidelidade no passado. Há graça e perdão para os que caíram, mas também há disciplina.

Satanás, além desta tática, trata de obter que os crentes não se preocupem com o pecado, dizendo-lhes que Deus é misericordioso e que sempre os perdoará. O Diabo lhes fala que Deus é um Deus de pura graça e que está disposto a conceder misericórdia, e que sempre estará mais propenso a perdoar que a castigar ao seu povo. Vejamos a continuação de cinco remédios preciosos contra esta tática.

Primeiro, sempre é um sinal de que Deus está contra nós, quando não nos preocupamos com o pecado. Quando vemos que alguém não está preocupado com os seus pecados, podemos ter certeza de que Deus está julgando esta pessoa. É uma coisa terrível quando Deus entrega alguém aos seus próprios pecados. Deus disse, numa ocasião, em relação aos israelitas: “Os deixei, portanto, para a dureza de seu coração; caminharam em seus próprios conselhos” (Sl 81:12). Noutro momento disse: “Efraim é entregue aos ídolos; deixe-o” (Os 4:17). Este foi o juízo de Deus contra eles. Quando Deus abandona a um povo, então, ele não se preocupa com seus pecados.

Segundo, Deus é tanto misericordioso como justo, a sua misericórdia não anula a sua justiça. Satanás oculta esta verdade quando diz que Deus será sempre e somente misericordioso. Quando Adão pecou, Deus em sua justiça expulsou-o para fora do paraíso. Quando o mundo antediluviano se corrompeu, Deus em sua justiça mandou o dilúvio. A menos que os pecadores se arrependam, Deus não lhes perdoará.

Terceiro, os pecados contra a misericórdia de Deus acarretam maior juízo. Quando os homens abusam da misericórdia de Deus, então, vem seu juízo. Esta é a ordem em que Deus atua: primeiro oferece a sua misericórdia, mas se os homens a desprezam, então são julgados. Deus mostrou grande misericórdia e ternura aos israelitas, todavia, eles se afastaram e esqueceram de Deus. Jesus lhes advertiu que não ficaria pedra sobre pedra de seu templo e assim sucedeu (Mc 13:2). Jerusalém e o templo foram destruídos. Muitos judeus foram mortos e outros levados cativos. Os que abusaram da misericórdia de Deus e lhe deram as costas às suas advertências, foram objetos de sua justiça. Por mais que alguém seja abençoado, mais severo será o seu juízo se esquecer-se de Deus. Cafarnaum que foi elevada ao céu, posteriormente foi posta na parte mais baixa do inferno (Mt 11:23).

Quarto, os crentes não devem pensar que tudo está bem devido ao desfrute de algumas bençãos de Deus. Todos de alguma maneira, ou de outra, constantemente recebem benefícios da bondade de Deus. Mas a misericórdia especial de Deus é somente para aqueles que o amam e lhe obedecem. “Todos os caminhos de Jehová são misericórdia e verdade para os que guardam o seu pacto e seus testemunhos” (Sl 25:10). “Os olhos de Jehová estão sobre os que o teme, sobre os que esperam a sua misericórdia.” (Sl 33:18). “Porque como é a altura dos céus sobre a terra, engrandeceu a sua misericórdia sobre os que lhe temem.” (Sl 103:11). Você teme a Deus? Se sim, então, não desejará pecar contra a sua misericórdia.

Quinto, a misericórdia de Deus é um fortíssimo motivo para não pecar. A bondade de Deus nunca deve se converter em pretexto para pecar. A Bíblia diz que devido à misericórdia de Deus, os crentes devem se entregar completamente a ele, seu corpo, sua mente e tudo o que são, a fim de que sejam usados em seu serviço (Rm 12:1). A misericórdia de Deus deve conduzir aos crentes a amá-lo e não a pecar contra ele. Os que têm a misericórdia de Deus como um pretexto para pecar, estão seguindo uma lógica satânica. Quando esta lógica predomina no pensamento de uma pessoa, há motivos para supor que tal pessoa está em perdição. Quando uma pessoa diz que a misericórdia de Deus significa que o pecado não importa, tal pessoa demostra que não está valorizando corretamente este atributo divino. Uma compreensão correta da misericórdia divina, traz como resultado uma atração em relação à Deus e um desprezo pelo pecado.

15 junho 2018

Os pastores antigos que passaram aqui ensinaram tudo errado?

Por Rev. Alan Rennê Alexandrino

Peço licença aos meus amigos aqui no Facebook para falar um pouco a respeito de algo que me é bastante incômodo. E, de início, gostaria de afirmar que este texto, de forma alguma, não é uma expressão de animosidade. Tristeza, talvez. Mas, animosidade, não. Por isso, peço que você me acompanhe até o final.

Não raro, diante de ensinamentos, ouço a pergunta que dá título a este texto. Recentemente participei de uma mesa redonda com o Dr. Mark Jones, e alguém perguntou: "O que dizer desses pastores mais novos, que chegam numa igreja e começam a ensinar coisas que nunca foram ensinadas pelos pastores anteriores? Quer dizer que os pastores anteriores ensinaram tudo errado? Por que eles não ensinaram essas mesmas coisas?"

Eu não considero esse questionamento indevido. Considero natural que o mesmo seja feito, pois, inegavelmente, há muita coisa que aparece diante da igreja de Cristo como "algo novo".

E, para explicar isso, eu gostaria de fazer referência a uma palestra ministrada pelo Dr. Heber Campos Jr., por ocasião do Encontro da Fé Reformada, ano passado, na Primeira Igreja Presbiteriana de Goiânia. O Rev. Heber Campos Jr., numa palestra proferida na Primeira Igreja Presbiteriana de Goiânia, ano passado, a respeito de qual calvinismo tem sido descoberto no Brasil (ACESSE AQUI), fez algumas afirmações muito interessantes que nos ajudam a compreendermos o porquê da nossa dificuldade quando ouvimos algumas coisas que soam como novas aos nossos ouvidos. Ele faz uma comparação entre o que nós continuamos a aprender e a descobrir sobre a nossa fé reformada e aquilo que foi conhecido no início, quando a fé reformada chegou aqui no Brasil. De acordo com ele, o interesse no calvinismo não tem uma longa história no Brasil. Mesmo no século 19, com a chegada do presbiterianismo no Brasil, a fé reformada não se tornou devidamente conhecida. Ele afirma que os parâmetros presbiterianos no século 19 estavam bem confusos, devido a uma teologia mista que era adotada por Simonton, mas não apenas por ele, por outros missionários também. Isso é muito sério, meus irmãos. Essa teologia misturava a fé reformada legítima com a teologia reavivalista, carismática de um movimento americano chamado Segundo Grande Despertamento. Uma consequência disso, de acordo com ele, é que igrejas eram plantadas com ideias misturadas, que nem sempre davam a devida consistência às nossas igrejas. Essa teologia mista ia sendo passada de geração em geração. Novos pastores eram formados com essas ideias, e assim por diante.

Isso ajuda a explicar a dificuldade existente quando a teologia reformada é ensinada em igrejas reformadas. As pessoas estão ouvindo certas coisas pela primeira vez. Elas comparam com aquilo que ouviram ao longo de décadas e chegam à conclusão de que aquilo que lhes está sendo ensinado agora, com toda certeza, não pode ser verdade, afinal de contas, elas passaram a vida inteira ouvindo outras coisas, fazendo outras coisas. “Nossa igreja já tem mais de 150 anos, e esse pastor vem com essas inovações?” Inovações? Inovações porque estão sendo inventadas agora ou porque estamos ouvindo falar apenas agora? Esta é uma pergunta que merece uma reflexão séria e humilde da nossa parte.

Para se ter uma ideia, a literatura reformada e presbiteriana era praticamente inexistente no Brasil até a década de 80. Nossos seminários formavam seus pastores com muitos livros de teólogos liberais. João Calvino foi publicado, pela primeira vez, em português, apenas em 1985. Louis Berkhof, o principal livro de Teologia Sistemática usado em nossos seminários, só foi publicado em português no ano de 1990. E olha que o presbiterianismo chegou por essas bandas em 1859. Um dos pastores mais conhecidos em nossa denominação, durante o início do século 20, foi um homem chamado Erasmo Braga. Ele se tornou conhecido, dentre outras coisas, por seus esforços em prol de um Seminário Unido, que seria um seminário com professores de denominações diferentes: congregacionais, presbiterianos, batistas, assembleianos e, assim por diante. Qual o resultado disso? Uma salada de doutrinas e convicções sendo instiladas nas mentes dos seminaristas, ao passo que doutrinas fundamentais do presbiterianismo eram deixadas de lado. Então, do século 19 até quase o final do século 20 nossos referenciais eram confusos. Tanto é assim que não são poucas as igrejas locais da Igreja Presbiteriana do Brasil, nas quais a Confissão de Fé de Westminster nunca foram e ainda hoje não são mencionadas.

Uma consequência disso é o que acontece, hoje em dia, à medida que tanto os nossos membros quanto pessoas de outras denominações passam a conhecer a fé reformada. Muitos membros de igrejas presbiterianas passam a estranhar igrejas presbiterianas que se tornam presbiterianas e reformadas em sua doutrina e liturgia. E muitas pessoas que conhecem a fé reformada estranham igrejas presbiterianas que são iguais às suas igrejas em sua doutrina liturgia. E quando a fé reformada, o presbiterianismo confessional é descoberto e passa a ser ensinado, rapidamente ele é objeto de acusações como: radicalismo, falta de equilíbrio e até mesmo neopuritanismo.

Recentemente eu tive a oportunidade de conversar com um conhecido pastor veterano a este respeito. Ele reconhece ser fruto de tudo o que foi falado aqui. Suas palavras a mim foram: “Eu confesso que nós temos muito a aprender sobre o que significa ser presbiteriano confessional”. Um amigo pessoal, que é pastor há quase 30 anos, em conversa comigo, também expressou sua felicidade, mas em relação à formação do seu filho no Seminário Presbiteriano do Norte. Suas palavras foram: "Não tínhamos isso na nossa época. A geração de vocês é uma geração privilegiada". O Dr. Heber Jr., diz algo semelhante em sua palestra: “Ainda há muito a ser descoberto; coisas que, outrora, estiveram nas mãos de alguns poucos”.

Não quero aqui dar a entender que os pastores de gerações anteriores agiram de má fé ou qualquer coisa do tipo. Longe disso! Eu os reputo como homens que se doaram pelo evangelho e usaram as ferramentas que lhes foram disponibilizadas.

O que ocorre é algo semelhante ao que é comum em outros campos do conhecimento. A medicina, por exemplo. Pensemos nas gerações anteriores de médicos e nos que são formados hoje em dia. Conquanto existam excelentes profissionais veteranos, é preciso que se entenda que parte de sua excelência é explicada pelo fato de sempre continuarem a estudar, de sempre continuarem a se aperfeiçoar. São médicos, profissionais que acompanham as novas descobertas, as mais recentes produções acadêmicas.

O mesmo ocorre com a formação em nossos seminários.

E eu creio que as nossas igrejas deveriam ser gratas a Deus por isso. Paulo plantou. Apolo regou. E Deus tem supervisionado todo o processo, dando o crescimento para a glória dele!